Bem da União

Manifestantes devem desocupar área da União, decide juiz

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29 de junho de 2007, 18h54

O juiz federal Georgius Luís Argentini Principe Credidio, da 20ª Vara Federal de Salgueiro (PE) expediu, nesta sexta-feira (29/6), Mandado de Reintegração de Posse para que se desocupe área invadida por manifestantes em Cabrobó (PE). A ação foi ajuizada pelo advogado da União, Jones Oliveira Cruz.

A Polícia Federal e a Funai deverão acompanhar a desocupação da área. A multa estabelecida é de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

O juiz determinou que as lideranças do movimento sejam citadas nominalmente. Cerca de 1.200 pessoas estão no local. Ele recomendou ainda cautela à Polícia. “Adverte-se, desde logo, que a ordem de reintegração deverá ser cumprida com as máximas cautela, calma e ponderação pelos oficiais de Justiça e Policiais Federais”, observou.

Para o juiz, os documentos apresentados demonstram que a área constitui bem da União, destinado à execução do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional.

Os manifestantes avisaram que não vão sair da área, mesmo após receber a ordem judicial. “A previsão é tentar negociar para ninguém sair, mas se for preciso, haverá enfrentamento”, afirma o secretário de política Agrícola e Meio Ambiente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Orocó (PE), José Barros, uma das lideranças do movimento.

Desde terça-feira (27/6), um acampamento foi montado em Cabrobó (PE) para impedir a continuidade das obras de transposição do São Francisco. Representantes de 16 povos indígenas da Bacia do rio estão no local. O bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio (aquele da greve de fome) visitou a invasão.

Segundo o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, a área ocupada já foi desapropriada para a execução das obras. Portanto, é de propriedade da União.

Na segunda-feira (25/6), o 2º Batalhão de Construção e Engenharia do Exército começou as obras de destacamento e de topografia para a transposição do rio.

Leia a Reintegração de Posse

2007.83.04.000221-0

AUTOR : UNIAO FEDERAL

DEFENSOR PUBLICO DA UNIAO: JONES OLIVEIRA DA CRUZ

RÉU : INTEGRANTES DOS MOVIMENTOS SOCIAIS CONTRA A TRANSPOSIÇÃO DO RIO SAO FRANCISCO

DEFENSOR PUBLICO DA UNIAO: JONES OLIVEIRA DA CRUZ

20a. VARA FEDERAL – Juiz Substituto

Objetos: 02.01.01 – Imóveis/Móveis – Bens – Civil

1. Trata-se de ação de reintegração de posse proposta pela UNIÃO FEDERAL contra integrantes não identificados de “Movimentos Sociais contra a Transposição do Rio São Francisco”, os quais totalizam aproximadamente mil e duzentas (1200) pessoas. Narrou a demandante que, por intermédio do 2º Batalhão de Construção e Engenharia do Exército, deu início à execução do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, no Município de Cabrobó, Estado de Pernambuco; porém, os demandados, com a intenção de impedir a continuidade dessas obras, invadiram a área do “Eixo Norte”. Relatou que a ocupação, além de caracterizar esbulho possessório, impossibilita, por completo, a execução das obras do Projeto de Integração, de maneira a causar-lhe prejuízos patrimoniais, bem como de cunho social. Pediu, assim, a reintegração liminar na posse do imóvel, assim como a fixação de multa para os casos de descumprimento ou novo esbulho e turbação. A petição inicial (fls. 02/19) foi instruída com documentos (fls.20/92 ).

Decido.

2. É necessário principiar por observar que, em demandas possessórias com elevado número de demandados, como no presente caso, mostra-se inviável exigir-se a qualificação e a citação de cada um dos ocupantes do imóvel, quando tiver sido ele invadido por milhares de pessoas (STJ, REsp nº 154.906-MG, Rel. Barros Monteiro, j. 04.05.2004).

Assim :

“REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL INVADIDO POR TERCEIROS. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS OCUPANTES. INDEFERIMENTO DA INICIAL. INADMISSIBILIDADE.

– Citação pessoal dos ocupantes requerida pela autora, os quais, identificados, passarão a figurar no pólo passivo da lide. Medida a ser adotada previamente no caso.

– Há possibilidade de haver réus desconhecidos e incertos na causa, a serem citados por edital (art. 231, I, do CPC). Precedente: Resp n. 28.900-6/RS. Recurso especial conhecido e provido.”

(STJ, 4ª. Turma, RESP nº 362365/SP, Rel. Barros Monteiro, j. 03/02/2005, DJ 28/03/2005, p. 141, RDDP 26: 233).

Portanto, far-se-á a citação pessoal, tanto que possível, dos líderes dos Movimentos Sociais, ao passo que os demais ocupantes serão citados por editais.

3.Dispõe o art. 1.210, da Lei Federal nº 10.406/02 – Código Civil :

“Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.”

Por seu turno, o art. 71, do Dec.-lei nº 9. 760/46, estabelece o seguinte :

“Art. 71. O ocupante de imóvel da União, sem assentimento desta, poderá ser sumariamente despejado e perderá, sem direito a qualquer indenização, tudo quanto haja incorporado ao solo, ficando ainda sujeito ao disposto nos arts. 513, 515 e 517, do Código Civil.”

Nesta linha, os 926, 927 e 928, do Código de Processo Civil, disciplinam a demanda que visa à tutela da posse :

“Art. 926 – O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no de esbulho.”

Art. 927 – Incumbe ao autor provar:

I – a sua posse;

II – a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;

III – a data da turbação ou do esbulho;

IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração.”

“Art. 928 – Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração; no caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada.

Parágrafo único.

Por conseguinte, os pressupostos da concessão da reintegração de posse são aqueles discriminados nos incisos I a IV, do art. 927 do CPC, dentre os quais dois se apresentam como especialmente exigentes : i. a posse do demandante sobre o imóvel, que é o pressuposto fundamental e comum a todas as formas de tutela possessória; ii. o esbulho praticado pelo demandado, decisivo no caracterizar ou não a “força nova”, sem a qual fica de pronto afastada a possibilidade de proteção provisional da posse.

É mister recordar, neste ponto, que na fase preliminar do procedimento a cognição é superficial, isto é, a decisão que dela resulta “não é um prejulgamento, mas um instrumento em cognição provisória de proteção do direito de posse. A liminar, portanto, tem mais natureza de antecipação de execução do que cautelar, mas guarda o caráter de provisoriedade, sujeita que fica ao exame mais profundo na cognição plena que seguir.” (Vicente Greco Filho. Direito Processual Civil Brasileiro. Vol. 3. São Paulo : Editora Saraiva, 1987. p. 224).

Vai daí que, não é de “exigir-se prova cabal, completa e irretorquível dos requisitos alinhados no artigo [referindo-se ao art. 927, CPC]. Trata-se – não é demasia repetir – de cognição incompleta, destinada a um convencimento superficial e a orientar uma decisão de caráter eminentemente provisório. Não se poderia exigir, para uma provisão judicial destinada a duração não maior que a do processo, o mesmo grande convencimento necessário ao julgamento definitivo do mérito.” (Adroaldo Furtado Fabrício. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. VIII. Tomo III. Rio de janeiro : Editora Forense, 1992. p. 325).

Na hipótese, conquanto derivado de um juízo sumário e incompleto de cognição, o elementos probatórios exibidos pela demandante, notadamente os documentos que instruíram a petição inicial, deixam entrever a presença dos requisitos do art. 927 do CPC, bem assim a disponibilidade jurídica do imóvel (fls.20/92).

Deveras, os documentos que instruíram a petição inicial demonstram que a área invadida constitui bem da União, destinado à execução do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, quer dizer, a demandante é possuidora da área.

Note-se que a posse direta e a disponibilidade física sobre a coisa decorrem seguramente da escritura de compra e venda e das plantas, ao passo que o esbulho é demonstrado pelos demais elementos, além de constituir fato notório, porque amplamente divulgado pelos meios de comunicação no decorrer desta semana (art. 334, inc. I, do CPC).

Neste ponto, cumpre mencionar o seguinte precedente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região :

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 487, DO STF. APELAÇÃO IMPROVIDA.

– Constituem requisitos indispensáveis, para a procedência da ação de reintegração de posse, a posse do autor e o esbulho praticado pelo réu.

– As provas carreadas aos autos demonstram o preenchimento de ambos os requisitos, tendo em vista que restou comprovado, pela União, ser ela a legítima proprietária da fração litigiosa do imóvel, bem como o esbulho perpetrado.

– Não está o Magistrado, ao julgar a matéria, adstrito a examiná-la de acordo com o pleiteado pelas partes, mas, sim, com o seu livre convencimento (art. 131, do CPC), utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso concreto.

– Hipótese de incidência da Súmula nº 487, do STF, que dispõe, in verbis: “Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada.”

– Apelação improvida. Sentença mantida incólume.”

(TFR – 5ª Região, AC nº 230062/PB, Rel. Élio Wanderley de Siqueira Filho, j. 28/04/2005, DJU 20/05/2005, p. 901).

Destarte, é razoável admitir a presença dos requisitos do art. 927, do CPC, de sorte que o deferimento da medida liminar se impõe.

4. Cumpre, por fim, arbitrar o importe da multa, levando-se em consideração as diretrizes veiculadas nos arts. 461, § 4º, e 921, do CPC.

É assente que, para “a aplicação da sanção pecuniária, deve sempre o Magistrado atentar para a razoabilidade da pena, fixando-a de maneira que, conquanto não estabelecida em valor irrisório, não se torne um ônus demasiadamente gravoso de suportar”. (TRF – 5ª Região, 1ª Turma, AG nº 43990/CE, Rel. José Maria Lucena, j. 05/12/2002, DJ 03/12/2003, p. 1027).

Tendo em conta a relevância dos bens jurídicos que constituem o objeto substancial do processo, bem ainda à vista da média estabelecida para hipóteses semelhantes, afigura-se razoável a fixação da multa no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

5. Defiro a medida liminar, de modo que ordeno a reintegração da demandante na posse do imóvel “Eixo Norte” do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, no Município de Cabrobó, Estado de Pernambuco, descrito e caracterizado nos documentos constantes dos autos (fls. 20/23 e 27/29), com fundamento nos arts. 926 e 929, do CPC.

Fixo a multa, para os casos de descumprimento da presente ou de nova turbação ou esbulho, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

6. Expeça-se mandado de reintegração. Requisite-se ao Departamento da Polícia Federal força policial para acompanhar a diligência.

Requisite-se, ainda, o acompanhamento da “FUNAI” para o cumprimento das diligências.

Adverte-se, desde logo, que a ordem de reintegração deverá ser cumprida com as máximas cautela, calma e ponderação pelos oficiais de Justiça e Policiais Federais.

Por ocasião da diligência, o oficial de Justiça deverá, tanto que possível, identificar e qualificar os líderes dos movimentos ocupantes encontrados nos imóveis, os quais deverão ser citados. Sem prejuízo, citem-se os demandados não-identificados por editais

Cite-se, ainda, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI.

7. Expedidos todos os expedientes necessários ao integral cumprimento da presente, dê-se vista dos autos ao Ministério Público Federal.

Int.

Salgueiro, 29 de junho de 2007.

GEORGIUS LUÍS ARGENTINI PRINCIPE CREDIDIO

Juiz Federal

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