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Juiz pode impor multa mesmo sem pedido da parte

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28 de junho de 2007, 0h01

A Companhia Vale do Rio Doce e a Valia (Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social) deve pagar multa diária de R$ 100 caso descumpra a decisão judicial de fazer a correção da aposentadoria de um funcionário. A decisão é da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG).

De acordo com a Turma, não é necessário o pedido do reclamante para que a Justiça imponha multa em caso de descumprimento de decisão judicial. Para o relator, desembargador José Murilo de Morais, “tal medida visa a assegurar o resultado prático da decisão, independendo a sua aplicação, inclusive, de pedido inicial, a teor do caput e parágrafo 5º do artigo 461 do CPC”.

O funcionário entrou com uma ação, pedindo o pagamento da diferença na complementação de aposentadoria. Ainda segundo ele as horas extras e o adicional de insalubridade sempre foram pagos de maneira incorreta.

Já a empresa alegou que não era competência da Justiça do Trabalho julgar sobre o pedido de diferença de complementação de aposentadoria. Argumentou que a filiação dos empregados da empresa à entidade de previdência privada é facultativa e não faz parte do contrato de trabalho, sendo a relação, mantida com a Valia, de natureza civil.

Para o desembargador, “a complementação de aposentadoria é uma vantagem que indiscutivelmente tem origem no pacto laboral, o qual continua a produzir efeitos, em muitos casos, mesmo após a sua extinção” e, portanto, a Justiça do Trabalho tem competência para examinar a matéria.

Leia a decisão

Processo : 00900-2005-060-03-00-7 RO

Data de Publicação : 26/05/2007

Órgão Julgador : Quinta Turma

Juiz Relator : Desembargador Jose Murilo de Morais

Juiz Revisor : Juiz Convocado Rogerio Valle Ferreira

RECORRENTES: BRAZ CANUTO COELHO, FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE – CVRD

RECORRIDOS: OS MESMOS

RELATÓRIO

O acórdão de fls. 619/623, proferido por esta 5ª Turma, negou provimento ao recurso das reclamadas e deu provimento ao do reclamante “para, afastando a prescrição extintiva, determinar o retorno dos autos à origem, para julgamento do restante do mérito, como entender de direito”.

Volvendo os autos ao juízo da Vara de Itabira, o juiz Alexandre Wagner de Morais Albuquerque julgou parcialmente procedente a reclamatória.

Foram interpostos recursos pelas partes.

O reclamante, insistindo no pedido de condenação ao pagamento de indenização por perdas e danos e indenização substitutiva.

A 2ª reclamada, Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social – Valia, discordando da condenação ao pagamento de diferenças de complementação de aposentadoria, e contra a determinação relativa à apresentação do valor da reserva matemática para correção da referida complementação

A 1ª reclamada, Companhia Vale do Rio Doce, redargüindo a preliminar de incompetência desta Justiça e a prejudicial de prescrição total; no mérito, insurgindo-se contra o deferimento das diferenças de complementação de aposentadoria; sucessivamente, requerendo que as diferenças em questão sejam calculadas a partir do trânsito em julgado da decisão proferida no processo 1770/98.

Contra-razões às fls. 692/695, 699/701 e 702/708.

As guias de depósito recursal e custas encontram-se às fls. 664/665 e 688/689.

Dispensado o parecer da Procuradoria Regional do Trabalho.

V O T O

Conheço de todos os recursos porque próprios, tempestivos e regularmente preparados os patronais, analisando-os conjuntamente. Não conheço, todavia, das matérias relativas à incompetência desta Justiça e prescrição total, dado que já decididas no acórdão de fls. 619/623. Determino que seja observado o requerido à fl. 682 pela 1ª reclamada.

1. Complementação de Aposentadoria

A controvérsia estabelecida refere-se à integração das parcelas deferidas no processo nº 1770/98 (e não o de nº 425/00 indicado pela 1ª reclamada à fl. 679 e muito menos o de nº 00965/99 citado pela 2ª à fl. 662) na complementação de aposentadoria do reclamante, conforme decisões juntadas às fls. 16/32, tendo a sua aposentadoria por tempo de serviço sido concedida em 25.6.97, como dá notícia a carta de concessão do INSS à fl. 263.

Consoante os fundamentos lançados às fls. 641/645, o juízo sentenciante fez constar da sua decisão todas as parcelas deferidas no referido processo, deferindo a complementação de aposentadoria com alicerce nas regras inscritas nos arts. 20 e 21 do Regulamento Básico da 2ª reclamada acostado às fls. 313/346, normativo que considerou ter vigido à época da inscrição do reclamante na 2ª reclamada como contribuinte-mantenedor em 31.5.1977, conforme ficha de inscrição de fl. 258 (e não em 26.12.74, como constou na decisão à fl. 641, por erro material), indeferindo, outrossim, os pedidos de indenização substitutiva por perdas e danos e cominação de multa diária.


Impõe-se, primeiramente, definir qual Estatuto e Regulamento devem ser observados para efeito de apuração da complementação de aposentadoria devida ao reclamante, isso considerando a sua filiação à 2ª reclamada em 31.5.1977: se o de capa verde declinado pela 2ª reclamada à fl. 662 (juntado às fls. 270/312); se o de capa azul no qual se alicerçou a condenação (acostado às fls. 313/346). Apesar da dificuldade de se aferir a questão, tendo em vista a falta de elementos que indiquem a vigência desses normativos, utilizo do entendimento consagrado no item I da Súmula 51 do TST para solucionar tal impasse, segundo a qual “as cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento”. E orientando-me por essa diretriz, verifico que o Estatuto e Regulamento adotados pelo juízo sentenciante mostram-se mais benéfico ao reclamante, principalmente considerando o que dispõe o art. 97 (fl. 346) do normativo:

Aos participantes que ingressaram na Valia antes de 1º de janeiro de 1978 não se aplicam:

I – os limites de idade fixados nos artigos 25 e 27 deste Regulamento Básico;

II – o limite de 3 (três) vezes o teto estabelecido para as contribuições à previdência social, para efeito de incidência de contribuições sobre o salário-de-participação a que se refere o artigo 21 deste Regulamento Básico.

Por conseguinte, inexistindo disposição nesse sentido no Regulamento e Estatuto que a 2ª reclamada reputa aplicáveis ao reclamante, deve ser observado o normativo consignado na decisão, acostado às fls. 313/346, para exame da matéria controversa.

O caput do art. 20 desse Regulamento prescreve que “as suplementações referidas no artigo 19, itens II e III, serão calculadas com base no salário-real-de-benefício do participante”, fl. 332, dispondo o § 1º que “entende-se por salário-real-de-benefício a média aritmética dos salários de participação do contribuinte-ativo sobre os quais incidirem as contribuições para Valia nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao mês da data do início da suplementação”.

O artigo seguinte (21) assim dispõe:

Art. 21 – Entende-se por salário-de-participação, no caso de contribuinte-ativo, as soma das parcelas relativas aos itens de remuneração que comporiam o salário-de-contribuição para o IAPAS caso não existisse qualquer limite superior de contribuição para esse Instituto, excetuando-se:

a) diária e ajuda de custo de viagens, inclusive as de treinamento e aprendizado recebido e ministrado, mesmo quando excedente de 50% (cinqüenta por cento) do salário do contribuinte-ativo;

b) abono de férias;

c) gratificação por treinamento ministrado;

d) abono para aluguel de casa;

e) ajuda de custo de instalação e adaptação;

f) substituição remunerada em cargo de confiança;

g) toda e qualquer prestação in natura;

h) quebra de caixa.

Como constou nos fundamentos alinhavados às fls. 642/643, o cotejo das decisões relativas ao processo 1770/98 (fls. 13/32), demonstra que ao reclamante foram deferidas as seguintes parcelas:

1) 15 minutos, a título de intervalo não gozado, exceção feita a 02 dias da semana, no período de 05/94 a 05/96, com adicional de 50%;

2) adicional de insalubridade, no percentual de 20%, a ser calculado sobre o salário mínimo, com reflexos nas férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%, aviso prévio e no cálculo das horas extras;

3) minutos que excedem a jornada, antecedentes e posteriores, quando superiores a cinco, em sua integralidade, nos termos do Precedente 23 da SDI.

O confronto das decisões proferidas, relativas ao processo 1770/98, com o artigo 21, do Regulamento Básico em análise, permite concluir que das parcelas deferidas ao reclamante nos autos do Processo supra citado o tempo extra (minutos residuais e pela ausência do intervalo não concedido) e o adicional de insalubridade, estes com reflexos nas férias + 1/3, exceto as indenizadas, 13º salário e no cálculo das horas extras, são as que integram a base de cálculo do salário de participação.

Referidas parcelas têm natureza salarial, não fazem parte do rol de exceções previstas no artigo 21, do Regulamento da segunda reclamada e comporiam o salário contribuição do reclamante para cálculo de seus benefícios junto ao órgão previdenciário.

Logo, por força do ‘caput’ do artigo 21, do Regulamento, também devem integrar o salário-participação do reclamante para fins de suplementação de aposentadoria.

Note-se que se o reclamante tivesse recebido integralmente as horas extras e o adicional de insalubridade, este com os reflexos acima mencionados durante o seu vínculo, também teria ocorrido a integração dessas parcelas no seu salário-participação, por força, como já dito, do ‘caput’ do artigo 21, elevando-se, assim, a suplementação de aposentadoria que o reclamante recebe hoje.


[…]

Registre-se, por oportuno, que o fato de o regulamento restringir o cálculo do salário-real-de-benefício às 12 (doze) últimas contribuições imediatamente anteriores ao mês da data do início da suplementação não afetam o pedido do reclamante, porquanto as contribuições foram inferiores à devida por culpa da primeira reclamada que não quitou a tempo e modo as parcelas salariais devidas ao reclamante.

Nesse contexto, as parcelas relativas ao tempo extra (minutos residuais e pela ausência do intervalo não concedido) e o adicional de insalubridade, estes com reflexos em 13ºs salários, férias + 1/3, exceto as indenizadas, e no cálculo das horas extras, concedidas no processo 1770/98, de cunho nitidamente salarial e não incluídas nas exceções discriminadas no art. 21 do Regulamento Básico da 2ª reclamada vigente à época da filiação do reclamante, integram realmente o seu salário-de-participação para cálculo da suplementação de sua aposentadoria, nada havendo o que ser modificado no aspecto.

Se as diferenças em questão são devidas por força de regra inscrita no Regulamento Básico da 2ª reclamada, afiguram-se irrelevantes os fundamentos lançados em suas razões recursais fundadas na antítese Previdência Social x Previdência Complementar, data venia.

E também não prejudica o fato de o § 1º do art. 20 do Regulamento Básico prever que o cálculo do salário-real-de-benefício deve considerar apenas as 12 últimas contribuições imediatamente anteriores ao mês da data do início da complementação de aposentadoria, dado que as contribuições foram inferiores às que o reclamante fazia jus por culpa única e exclusiva da 1ª reclamada, que não quitou a tempo e modo as parcelas salariais que lhe eram devidas.

Equivoca-se a 1ª reclamada ao afirmar que as diferenças deferidas neste feito somente poderão ser calculadas “a partir do trânsito em julgado da decisão proferida na ação trabalhista anteriormente ajuizada”, fl. 682, pois como dá notícia a ata de fl. 33, as partes entraram em composição em 14.8.03, já tendo ocorrido, portanto, o trânsito em julgado daquela decisão, por força do parágrafo único do art. 831 da CLT.

Da mesma forma incorreu em erro a 2ª reclamada ao afirmar que “a r. sentença determinou que a recorrente apresente o valor da reserva matemática para a correção da complementação de aposentadoria do Recorrido, sob pena de execução”, fl. 663, pois tal obrigação foi imposta exclusivamente à 1ª reclamada, como se vê dos fundamentos às fls. 644/645 (itens 3 e 4).

A metodologia a ser observada na apuração dos valores foi pormenorizadamente especificada no julgado recorrido, como se infere dos fundamentos às fls. 644/645, itens 3 e 4, tendo o juízo sentenciante determinado que “o recolhimento deverá ser feito nos termos dos estatutos e regulamentos da Valia, inclusive em relação ao teto previsto em seus artigos, observando-se, ainda, o período de deferimento das referidas parcelas, comprovando-se nos autos, sob pena de execução”, podendo qualquer outra questão que porventura se mostre pertinente ser dirimida pelo juízo da execução.

Desprovejo.

2. Indenização. Multa Diária

O reclamante insiste na condenação da 1ª reclamada em indenização, a título de perdas e danos, pelas diferenças que deixou de receber na complementação de sua aposentadoria, e, da 2ª reclamada, em indenização substitutiva, com cominação pecuniária a ser fixada na forma do art. 645 do CPC, em caso de descumprimento da determinação judicial de correção da aposentadoria complementar.

Na forma como foi postulada, a pretensão relativa à condenação das reclamadas ao pagamento de indenizações por perdas e danos e substitutiva afigura-se inócua (fl. 8, letras a, b. c e d), dado que o descumprimento das obrigações que lhes foram impostas enseja a imediata execução dos valores inadimplidos a título de salários vencidos e vincendos, como constou na decisão, o que já satisfaz o objetivo almejado.

Quanto ao pedido de cominação de multa diária por atraso na entrega do valor da reserva matemática, tal medida visa a assegurar o resultado prático da decisão, independendo a sua aplicação, inclusive, de pedido inicial, a teor do caput e § 5º do art. 461 do CPC.

Destarte, fixo a multa de R$100,00 por dia de atraso na apresentação do valor da reserva matemática pela 1ª reclamada, assim que intimada a fazê-lo pelo juízo da execução, que deverá conceder-lhe prazo razoável para tanto, e de igual valor por dia de atraso no cumprimento da obrigação da 2ª reclamada concernente à correção da aposentadoria complementar após a apresentação da reserva matemática.

Provejo parcialmente.

ISTO POSTO,

Conheço dos recursos, não conhecendo das matérias relativas à incompetência desta Justiça e prescrição total. No mérito, dou provimento parcial ao do reclamante para fixar a multa de R$100,00 por dia de atraso na apresentação do valor da reserva matemática pela 1ª reclamada, assim que intimada a fazê-lo pelo juízo da execução, que deverá conceder-lhe prazo razoável para tanto, e de igual valor por dia de atraso no cumprimento da obrigação da 2ª reclamada concernente à correção da aposentadoria complementar após a apresentação da reserva matemática. Aos das reclamadas, nego provimento. Mantenho o valor arbitrado à condenação, por ainda compatível. Determino que seja observado o requerido à fl. 682.

FUNDAMENTOS pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Quinta Turma, julgou o presente processo e, à unanimidade, conheceu dos recursos, não conhecendo das matérias relativas à incompetência desta Justiça e prescrição total; no mérito, sem divergência, deu provimento parcial ao do reclamante para fixar a multa de R$100,00 por dia de atraso na apresentação do valor da reserva matemática pela 1ª reclamada, assim que intimada a fazê-lo pelo juízo da execução, que deverá conceder-lhe prazo razoável para tanto, e de igual valor por dia de atraso no cumprimento da obrigação da 2ª reclamada concernente à correção da aposentadoria complementar após a apresentação da reserva matemática; aos das reclamadas, negou provimento, mantido o valor arbitrado à condenação, por ainda compatível; determinando que seja observado o requerido à fl. 682.

Belo Horizonte, 22 de maio de 2007.

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