Furacão de problemas

Juiz acusa Paulo Medina de modificar decisão em favor de preso

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27 de junho de 2007, 21h36

A atuação de Paulo Medina como ministro do Superior Tribunal de Justiça é novamente questionada. Desta vez, é o juiz Odilon de Oliveira, da 3ª Vara Federal de Campo Grande, quem acusa Medina de suprimir trechos de uma sentença para justificar um Habeas Corpus em favor do empresário Fahd Jamil.

Jamil foi condenado, em junho de 2005, a 20 anos de prisão por narcotráfico. Em novembro desse ano, Medina não aceitou o primeiro pedido de HC ajuizado pelo empresário. No entanto, em janeiro de 2007, ele foi posto em liberdade por uma decisão do próprio ministro. Desde então, Jamil está foragido.

Segundo Oliveira, Medina teria favorecido o empresário, tido como o maior traficante de drogas da fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai. Ele foi incluído pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, na lista de pessoas proibidas de negociar com empresas e cidadãos americanos.

Medina alegou que Jamil era réu primário, tinha bons antecedentes e que o próprio juiz de Campo Grande reconhecia isso. O ministro concluiu que não havia motivos para manter o pedido de prisão.

"Não há, aqui, apontamento judicial da realidade objetiva ensejadora da prisão provisória, vale dizer, os atos ou fatos envolvendo o paciente, supedâneos a amparar o decreto prisional, devidamente descritos pelo Código de Processo Penal, não foram explicitados pelo juiz a monocrático e pelo Tribunal a quo, o que redunda na inexistência de fundamentação da decisão e contrariedade ao mandamento legal", anotou o ministro.

No final de maio, o juiz Oliveira, que decretou a prisão de Jamil, encaminhou documento ao STJ afirmando que existem indícios de que Medina tenha suprimido os maus antecedentes do réu para justificar sua liberdade ou pode ter sido enganado por um assessor. Tanto o STJ quanto o gabinete do juiz confirmam o documento, mas não o forneceram à imprensa.

O advogado do ministro, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, negou que seu cliente tenha se beneficiado ao conceder o Habeas Corpus. Segundo ele, o ministro prestigiou jurisprudência que entende só caber determinação de prisão para apelar de sentença condenatória se presente “um dos motivos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal”. O ministro disse ainda que o juiz não apontou concretamente os “elementos concretos ensejadores da medida”.

O ministro Medina sustenta ainda que “se a manutenção do paciente no cárcere durante todo o tramite procesual não lhe retira o direito de recorrer em liberdade, mormente se respondeu-o em liberdade, porquanto a situação fática não tem o condão de convolar-se em motivo cautelar. Se o paciente ostenta primariedade e, por outro lado, não havendo indicação judicial a demonstrar o periculum libertatis, apontando a sentença primeva e o acórdão, tão-somente, textos legais impeditivos da existência concomitante do direito ambulatório e direito de recorrer, não há como subsistir o decisum prisional.”

Para o advogado, a decisão do ministro é absolutamente de acordo com a jurisprudência do Tribunal. Faz parte do dia de qualquer tribunal mudar, reformar decisões de juízes de primeira instância, por óbvio. Segundo o advogado, querer esmiuçar toda e qualquer decisão do ministro, ao longo de 40 anos como juiz, questionando o sentido de cada palavra em seus votos é um atentado à independência que se exige e espera do Poder Judiciário. Ressalta, ainda, que não consta nenhum procedimento contra o Ministro em poder do Ministro Nilson Naves.

Histórico

O ministro Paulo Medina, que está afastado do tribunal desde maio, é acusado de negociar, por intermédio de seu irmão Virgílio Medina, que é advogado, uma liminar concedida no ano passado para liberar 900 máquinas caça-níqueis apreendidas em Niterói (RJ), por R$ 1 milhão.

O suposto esquema foi revelado durante a Operação Hurricane, organizada pela Policia Federal. Ele nega a acusação e se irrita com a repetição da informação rotineira na imprensa cada vez que o assunto é abordado. Apesar de não estar mais nas manchetes dos jornais, continua nas “beiradas de reportagens”, segundo ele.

“A imprensa tem de parar de julgar. Não vou aceitar que ela dê a minha sentença”, afirmou o ministro à ConJur. Medina faz questão de ressaltar que tem 40 anos de magistratura e bons antecedentes: “sou correto, tenho a vida limpa e não posso ser confundido com um meliante”.

Uma comissão, formada pelos ministros Gilson Dipp, Denise Arruda e Maria Thereza de Assis Moura, analisa o caso do ministro. As conclusões da comissão deverão ser levadas ao pleno do Tribunal em agosto.


A Operação Hurricane da Polícia Federal foi deflagrada no dia 13 de abril nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e no Distrito Federal para deter supostos envolvidos em esquemas de exploração de jogo ilegal (caça-níqueis) e venda de sentenças, após cerca de um ano de investigações.

Na ocasião, o irmão do ministro, Virgílio Medina, foi preso. Também foram presos os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 2ª Região José Eduardo Carreira Alvim e José Ricardo Regueira, o juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Ernesto da Luz Pinto Dória, e o procurador regional da República João Sérgio Leal Pereira. Os juízes e o procurador foram soltos em seguida.

Entre os detidos estavam, ainda, Anísio Abraão David, ex-presidente da Escola de Samba Beija-Flor de Nilópolis; Capitão Guimarães, presidente da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro; Antônio Petrus Kalil, conhecido como Turcão, apontado pela Polícia como um dos mais influentes bicheiros do Rio; a corregedora da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Suzi Pinheiro Dias de Matos, entre outros. Há, ainda, 19 réus e quatro denunciados presos.

[Texto alterado em 28/06/2007, com novas informações]

Leia o Habeas Corpus 19.210/MS que libertou Jamil

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 19.210 – MS (2006/0054706-3)

RELATOR : MINISTRO PAULO MEDINA

RECORRENTE : FAHD JAMIL (PRESO)

ADVOGADO : ANTÔNIO CLAÚDIO MARIZ DE OLIVEIRA E OUTRO

RECORRIDO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO CÁRCERE PARA APELAR. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. IRRELEVÂNCIA. PERICULUM LIBERTATIS. AUSÊNCIA. MOTIVOS CONCRETOS. INEXISTÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA.

A exigência judicial de ser o réu recolhido ou mantido na prisão para manejar recurso deve, necessariamente, ser calcada em um dos motivos constantes do artigo 312 do Código de Processo Penal e, por força dos artigos 5º, XLI e 93, IX, da Constituição da República, o Magistrado deve apontar os elementos concretos ensejadores da medida.

Se a manutenção do paciente no cárcere durante todo o trâmite processual não lhe retira o direito de recorrer em liberdade, mormente se respondeu-o em liberdade, porquanto a situação fática não tem o condão de convolar-se em motivo cautelar.

Se o paciente ostenta primariedade e, por outro lado, não havendo indicação judicial a demonstrar o periculum libertatis , apontando a sentença primeva e o acórdão, tão-somente, textos legais impeditivos da existência concomitante do direito ambulatório e direito de recorrer, não há como subsistir o decisum prisional.

Ordem CONCEDIDA para que o paciente possa aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação.

DECISÃO

Trata-se de Recurso Ordinário em habeas corpus impetrado por Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, em favor de FAHD JAMIL, contra acórdão proferido pela Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que, por maioria, concedeu parcialmente a ordem para afastar a determinação do prévio recolhimento do paciente à prisão como condição para apelar (fl. 477).

O recorrente foi condenado à pena de 20 (vinte) anos e 3 (três) meses, em regime integralmente fechado e multa de R$ 3.400,00 (três mil e quatrocentos reais), como incurso nas sanções dos artigos 12, caput, 14, c/c 18, inciso I, da Lei 6.368/76 e 1º, incisos I e II da Lei 8.137/90 e 1º, incisos I e VII, e § 1º, inciso I e 4º da Lei 9.613/98, impedido de recorrer em liberdade.


Desta proibição, o recorrente impetrou habeas corpus junto ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, tendo sido a ordem concedida, por maioria, parcialmente para afastar a determinação do prévio recolhimento do paciente à prisão como condição para apelar, em acórdão assim ementado (fl. 477):

"HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECRETAÇÃO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. REGULARIDADE. APELAR EM LIBERDADE. DIREITO. PRÉVIO RECOLHIMENTO À PRISÃO. CONDICIONAMENTO. INADMISSIBILIDADE.

1. Presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não há óbice à decretação da prisão preventiva, por ocasião da sentença condenatória, do réu que respondeu ao processo em liberdade.

2. O art. 594 do Código de Processo Penal não foi recepcionado pela Constituição da República, dado que a garantia do devido processo legal, que implica o direito à ampla defesa e o direito de recorrer, não pode ser condicionada ao prévio recolhimento do réu à prisão.

3. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida para afastar a determinação de prévio recolhimento do paciente à prisão como condição para apelar".

Recorre agora a esta Corte Superior de Justiça pugnando pela possibilidade de recorrer em liberdade, eis que neste estado permaneceu durante todo o trâmite da ação penal.

Aduz que, embora a sentença primeva reconhecesse a sua primariedade, não demonstrou motivos concretos quando determinou seu recolhimento ao cárcere.

Alega, ainda, que não estão presentes os motivos ensejadores da medida extrema. Requer o provimento ao recurso para que possa aguardar o trânsito em julgado da condenação em liberdade.

O Ministério Público Federal opina pelo desprovimento do recurso, em parecer assim fundamentado (fl. 518):

"HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS. INOCORRÊNCIA.

1. No caso sob luzes, a decretação se deu nos moldes exigidos pelo art. 312 do CPP, apontando o magistrado fatos concretos que trazem risco à ordem pública e à garantia da aplicação da lei penal

.

2. Em tema de prisão cautelar, deve se prestar máxima confiabilidade ao magistrado singular, mais sensível aos acontecimentos do processo

(precedentes).

3. Discutir a existência in concreto dos fatos apontados pelo julgador, importa em análise de provas, vedada nesta via.


4. Parecer pela denegação da ordem."

É o relatório.

Decido.

O pedido cinge-se na possibilidade de o paciente aguardar em liberdade o trânsito em julgado da decisão condenatória. Segundo a Constituição da República, a liberdade só pode ser restringida quando alguém estiver em "flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente (…)". (art. 5º, LXI, CF/88).

Por outro lado, em consonância com a garantia fundamental, o art. 93, IX da Carta Política, estabelece que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder

Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (…)"

Atualmente, há cinco hipóteses legais de prisão provisória:

– Prisões cautelares: flagrante (arts. 301 e 302, CPP), preventiva (art. 312, CPP), e temporária (Lei 7.960/89);

– Prisões processuais: em virtude de sentença condenatória recorrível (art. 393, I, CPP), em razão de decisão de pronúncia (arts. 282 e 408, § 1º, CPP).

Segundo vasto entendimento doutrinário e jurisprudencial, ainda que se faça, didaticamente, a distinção entre prisões processuais e prisões cautelares como espécies de segregação provisória, certo é que, a partir da promulgação Constituição da República, passou-se a classificar todos os tipos de custódia como cautelares, com exceção, óbvio, daquela decorrente de condenação passada em julgado.

In casu, a custódia deu-se em virtude de decisão que ordenou o recolhimento ao cárcere, posto que condenado como incurso nas sanções do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, crime equiparado a hediondo.

A fundamentação de 1º grau está fundamentada nos seguintes termos (fl. 214):

"Reedito o que ficou assentado no capítulo anterior, sobre o perfil dos acusados, à vista também da magnitude da lesão e sobretudo da natureza dos delitos da Lei 6.368/76, o que, repita-se, torna evidente o alto grau de nocividade dos réus à sociedade.

A ordem pública, pois, recomenda o recolhimento de cada um, para evitar-se que prossigam os réus no seu rosário de crimes. Por outro lado, residindo na fronteira

Brasil/Paraguai, não há dúvidas de que, pelo somatório das penas, os réus tão logo tenham conhecimento de suas condenações, fugirão para o outro lado, de onde poderão, com facilidade administrar seus bens e interesses. Esta Seção Judiciária relaciona muitos exemplos disso.

Desse modo, a prisão de todos os réus é necessária para assegurar a efetiva aplicação da lei penal."

Como corolário da regra supra citada, dispôs o art. 594 do mesmo Codex:

"O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto."


Na mesma esteira, mas orientado pelos princípios do Movimento da Lei e da Ordem, o art. 35 da Lei 6.368/76, determina, litteris :

"O réu condenado por infração dos artigos 12 ou 13 desta Lei não poderá apelar sem recolher-se à prisão."

Por sua vez, dispõe a Lei 8.072/90, em seu art. 2º, § 2º, in verbis :

"Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade."

Evidentemente que o art. 35 da Lei nº 6.368/76 não subsiste em vista deste último que, expressamente, permite o apelo sem que se imponha a prisão para tanto, tanto em relação aos crimes hediondos como os delitos assemelhados, como é a hipótese.

Outrossim, de acordo com o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88) e a garantia de fundamentação das decisões judiciais (arts 5º, LXI e 93, IX, CF/88), a prisão cautelar só pode provir do efetivo periculum libertatis, consignado em um dos motivos da prisão preventiva, quais sejam, a garantia da ordem pública ou econômica, a conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (art. 312, CPP).

Dessa feita, para atender à determinação constitucional de fundamentação dos atos decisórios, os acontecimentos, caso proporcionados pelo indiciado ou réu, devem ser realçados – e não conjecturados – pelo magistrado, como forma de demonstrar o caráter de imprescindibilidade da prisão, legitimando-a.

O entendimento é pacífico neste Tribunal:

"PENAL. PROCESSUAL. TENTATIVA DE ROUBO. PRISÃO PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.

1. Para a decretação da prisão provisória, sob o argumento de imprescindibilidade para as investigações do inquérito, impõe-se a efetiva demonstração do periculum libertatis, mediante a exposição de motivos concretos, sendo insuficiente para tanto meras conjecturas.

2. Recurso Ordinário provido, para revogar o decreto de prisão provisória contra o paciente, por ausência de fundamentação." (RHC 11992/RJ;

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS 2001/0137270-4. Relator Min. EDSON VIDIGAL)

"HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. DECISÃO BASEADA NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO E MOTIVOS GENÉRICOS DE OFENSA À ORDEM PÚBLICA. PRECEDENTES DO STJ.

1. O édito constritivo de liberdade deve ser concretamente fundamentado, com a exposição dos elementos reais e justificadores de que o réu solto irá perturbar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal. A gravidade do delito, por si só, não é razão suficiente para autorizar a custódia cautelar. Precedentes.

2. Ordem concedida para revogar o decreto judicial de prisão preventiva expedido em desfavor do ora paciente, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de eventual decretação de prisão cautelar devidamente fundamentada." (HC 29888/SP; Fonte DJ DATA:05/04/2004 PG:00290. Relator Min. LAURITA VAZ.Data da Decisão 04/03/2004)


O art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90 deve ser interpretado a partir das prescrições constitucionais, no sentido de que o juiz deverá demonstrar a presença de quaisquer dos motivos autorizadores da constrição cautelar, de modo a estabelecer a obrigatoriedade da submissão do acusado à prisão caso deseje manejar o inconformismo recursal.

A jurisprudência – ainda que em menor densidade que os entendimentos doutrinários – é no sentido de que a exigência de recolher o réu à prisão para recorrer deve estar baseada em motivos concretos, conforme determina o art. 312, CPP:

"HABEAS CORPUS. ADVOGADO. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. RÉU QUE RESPONDEU SOLTO AO PROCESSO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. DECRETO DE PRISÃO. INSUFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

1. O acórdão do Tribunal a quo, convalidando decisão do Juiz de primeiro grau que negou ao Paciente o direito de recorrer em liberdade, não erigiu motivo suficiente para a custódia cautelar que, segundo a ordem constitucional vigente, deve ser tida como exceção, exigindo do magistrado a indicação concreta de sua necessidade.

2. Milita em favor do Réu o fato de que a ele foi deferido o pedido de revogação da prisão preventiva, inicialmente decretada pelo Juízo Federal processante, após seu interrogatório, porquanto foram considerados inexistentes os requisitos para a custódia cautelar.

Além disso, mesmo residindo em região fronteiriça, compareceu a todos os atos processuais, sem criar nenhum embaraço à instrução criminal, respondendo ao processo em liberdade.

3. Nesse contexto, consubstancia constrangimento ilegal a determinação de recolher-se o réu à prisão, sem indicação concreta de uma das hipóteses previstas no art. 312 do CPP. Precedentes do STJ.

4. Ordem concedida para determinar a expedição do competente alvará de soltura em favor do ora Paciente, se por outro motivo não estiver preso, para que possa aguardar o julgamento da apelação em liberdade, sem prejuízo de eventual decretação de custódia cautelar, devidamente fundamentada." (HC 28132 / MA ; Fonte DJ DATA:04/08/2003 PG:00351. Relator Min. LAURITA VAZ)

Não obstante ser o paciente primário e possuir bons antecedentes, circunstâncias essas reconhecidas na sentença, determinou-se, para exercer o direito de recorrer, sua manutenção na prisão sem que se tenha apontado os motivos cautelares para tanto.

O decisum atacado não traz os motivos justificadores da medida.

No mesmo sentido, sem quaisquer inovações, a decisão do Tribunal a quo. Onde a natureza cautelar da prisão?

Limitou-se a decisão guerreada a, friamente, indicar leis sem qualquer atividade hermenêutica, olvidando-se, lado outro, de apontar fatos concretos caracterizadores dos motivos legais a ensejar a custódia preventiva.

Não há confundir decreto prisional objetivo, sintético, com decisão fundamentada. O próprio decisum atacado não traz os motivos justificadores da medida.

Deve-se ressaltar que a decretação do encarceramento cautelar depende, necessariamente, da existência de elementos concretos de probabilidade – sem os quais torna-se incabível a constrição excepcional – do réu empreender fuga ou colocar em risco a ordem pública ou instrução processual ou aplicação da lei penal (art. 312, CPP).


Não há, aqui, apontamento judicial da realidade objetiva ensejadora da prisão provisória, vale dizer, os atos ou fatos envolvendo o paciente, supedâneos a amparar o decreto prisional, devidamente descritos pelo Código de Processo Penal, não foram explicitados pelo juiz a monocrático e pelo Tribunal a quo, o que redunda na inexistência de fundamentação da decisão e contrariedade ao mandamento legal.

Impende registrar que a Súmula 9 desta Corte deve ser compreendida no sentido de que não fere o princípio do estado de inocência a determinação da prisão cautelar para apelar, quando presentes os fundamentos previstos no art. 312 do CPP.

Não pretendeu o enunciado, portanto, abarcar decisões arbitrárias, sem que a constrição esteja revestida da cautelaridade necessária aos escopos do processo.

Dessa forma, não basta ao magistrado, para decretar o encarceramento provisório, apontar, de forma genérica e sem fundamentação concreta, textos legais impeditivos do direito ambulatório do acusado, afigurando-se ilegal basear o decreto prisional na natureza do delito em si, e na suposta gravidade, pois se trata de fundamento não elencado no rol taxativo do art. 312, CPP.

Do exposto, registro que inexistem motivos, concretamente fundamentados suficientes para firmar o periculum libertatis , descabendo decretar a prisão em face de simples sentença condenatória recorrível ou exigir que o paciente se recolha ao cárcere para apelar.

Assim, se o encarceramento provisório não é revestido de cautelaridade, não é a decisão condenatória recorrível suficiente a alicerçar a manutenção da medida, pois, qualquer segregação anterior ao trânsito em julgado da condenação deve ser absolutamente necessária, característica emprestada pela efetiva existência do periculum libertatis .

Posto isso, CONCEDO a ordem para revogar a prisão decretada – se por outro motivo não estiver preso – para que o paciente possa aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 24 de janeiro de 2007.

MINISTRO PAULO MEDINA

Relator

Reportagem alterada na quinta-feira (28/6) para correções

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