Nova gestão

Asfor Rocha promete melhorar a imagem de juízes após operações

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22 de junho de 2007, 12h59

O novo corregedor nacional da Justiça, Cesar Asfor Rocha, que tomou posse no último dia 15 de junho, afirmou que não hesitará em mostrar e explicar os deslizes internos do Poder Judiciário. Segundo ele, uma de suas tarefas é melhorar a imagem dos juízes por causa das operações da Polícia Federal. As afirmações foram feitas em entrevista ao jornalista Fernando Teixeira, do jornal Valor Econômico.

Outra medida que Asfor Rocha pretende adotar é a de melhorar a imagem da Corregedoria dentro do próprio CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que precisará mostrar resultados, de acordo com ele.

Ministro do Superior Tribunal de Justiça desde 1992, Asfor Rocha promete, ainda, mudar a forma de atuação da Corregedoria e priorizar o julgamento dos casos dentro do próprio CNJ, garantindo o distanciamento necessário à análise dos casos.

Veja a entrevista:

Valor— Durante o debate sobre a reforma do Judiciário, o sr. era favorável ao controle externo do poder?

Cesar Asfor Rocha quando foi anunciado, o controle externo do Poder Judiciário foi apresentado como um instrumento milagroso para acabar com todas as deficiências da Justiça. Eu sempre tive a consciência de que não seria assim, porque muitas deficiências dizem respeito à morosidade, que é a maior reclamação do jurisdicionado e não decorre apenas de alguma deficiência do trabalho do magistrado, mas de alguma deficiência do sistema processual, com um volume muito grande de recursos, e de deficiências de investimento em informática.

Valor — Então o sr. não era contra a ingerência de elementos estranhos ao Judiciário sobre ele?

Asfor Rocha Não, era apenas quanto à expectativa que estava sendo criada. O CNJ tem como seu principal papel a gestão do Judiciário, porque não havia uma consciência de tratar a Justiça como uma unidade só. Os tribunais, sobretudo os estaduais, achavam que tinham independência para fazer seu próprio gerenciamento, se comportavam como ilhas isoladas. O juiz não é vocacionado para a gestão. Todo o seu preparo é para julgar, cuidar de processos, fazer sentenças.

Valor — E quanto ao papel da corregedoria do CNJ?

Asfor Rocha — havia uma queixa, de uma certa maneira procedente, de que as corregedorias de cada tribunal tinham certas inibições de analisar com rigor ou absoluta isenção os processos disciplinares contra magistrados vinculados ao próprio tribunal. Com o CNJ nós possibilitamos o estabelecimento de processos disciplinares em um órgão nacional que está distante dos fatos, e com isso têm-se a impressão – que é real – de que haveria uma maior isenção.

Valor — Mas o sr. acha que nestes dois primeiros anos de existência a corregedoria do CNJ conseguiu dar uma resposta ao problema, se até hoje recebeu mais de 1,5 mil denúncias e não puniu nenhum juiz?

Asfor Rocha os dois primeiros anos do CNJ foram dedicados à instalação do órgão. Ele não tinha precedentes, não havia uma experiência nacional neste sentido. E muitas vezes têm-se usado a representação ao CNJ em substituição a um recurso judicial. Quem perde um processo nunca se conforma de ter perdido, e algumas vezes atribui o fracasso a um desvio de conduta do magistrado, quando isso não ocorre. Evidentemente, há os processos de maior gravidade, e estes estão em trâmite no CNJ. Eles são transformados em sindicância e têm de se estabelecer todo o direito de defesa e todos os recursos que podem ser utilizados pela parte, o que gera um procedimento que pode resultar em demora.

Valor — Há um procedimento da corregedoria criticado por alguns conselheiros que é a resistência em analisar questões jurisdicionais, ou seja, o conteúdo das ações que estão nas mãos de um juiz denunciado no CNJ. Mas essa análise ajudaria a descobrir, por exemplo, se uma sentença foi vendida. Isso deve mudar?

Asfor Rocha — isso tem que ficar no âmbito de atuação e da competência de cada magistrado. Não há crime de interpretação. Não é, inclusive, da competência do CNJ interpretar se o direito de uma decisão judicial foi bem ou mal aplicado. No que diz respeito à aplicação do direito em si, isso foge do papel do CNJ.

Valor — Mesmo no caso de uma sentença comprada que é totalmente absurda, como a liberação de jogos de bingos por liminares, mesmo diante de reiteradas decisões em contrário do Supremo Tribunal Federal? Como então descobrir se uma sentença foi comprada?

Asfor Rocha por outros elementos. Pelo conteúdo em si da decisão, não, pois isso está na competência de cada magistrado. Uma decisão fora do padrão pode ser apenas um indício que resulte em perplexidade com relação ao magistrado. É preciso de indícios veementes de que a postura do juiz tenha sido decorrente de influências nocivas que o levaram a cometer um desvio de conduta. A análise específica da decisão judicial, de saber se o juiz aplicou o direito, por mais absurda que seja a sentença, sem nenhum indício de que haja motivações espúrias, foge à análise de qualquer controle disciplinar.

Valor — Então não há o que fazer diante de uma decisão deste tipo…

Asfor Rocha essas decisões, digamos assim, esdrúxulas, quando praticadas não por uma consciência própria do juiz, mas por outras influências, não são difíceis de se constatar. No mundo de hoje é absolutamente impossível o cometimento de desvios sem que a pessoa seja flagrada. Os meios de controle e de informações são muito vastos. Eu tenho consciência de que o único modo de não se descobrir que uma falha foi cometida é não cometer a falha. E isto vai aparecer por meio de denúncias. Se uma pessoa dá uma sentença que aos olhos de todos é absurda, gera suspeitas, desperta a idéia de que houve alguma influência indevida. E isso começa a ser comentado entre os colegas.

Valor — Mas a denúncia é feita por uma parte insatisfeita com o resultado legítimo do julgamento…

Asfor RochaO que eu quero dizer é que só o fato de uma decisão ter sido proferida não justifica. Há juiz que pode dizer “eu sempre julgo assim”. Há juízes mais liberais na atuação criminal, outros mais rigorosos. Há os mais fiscalistas, mais sensíveis aos direitos postulados pelo fisco, e outros mais sensíveis aos direitos postulados pelos contribuintes…

Valor — Outra política adotada pela corregedoria do CNJ foi a de delegar trabalho às corregedorias locais. Há quem ache isso arriscado, pois as corregedorias locais são conhecidas pelo corporativismo. O sr. pretende mudar isso?

Asfor Rocha em princípio, vou procurar resolver aqui esses processos disciplinares, no âmbito da corregedoria nacional de Justiça. Mas esta forma de atuação depende da visão que cada corregedor tem. Não quero dizer que é melhor do que a forma de atuação do ex-corregedor, é uma questão de modo de gerenciamento. Mas há questões menores, diferentes dos casos em que há indícios de que a sentença foi vendida. É perigoso deixar esses casos mais graves no tribunal local, eles devem ser decididos na corregedoria nacional.

Valor — O sr. anunciou que pretende fazer um mapeamento das ações contra juízes existentes no Brasil. O que o CNJ poderá fazer quando tiver essas informações disponíveis?

Asfor Rocha estamos fazendo um levantamento dos processos contra magistrados e servidores para identificar os casos de maior gravidade e os processos mais antigos. Com isso terei uma idéia de quais corregedorias de tribunais que requerem maior atenção e irei até elas saber a razão da existência de processos tão antigos ou de um número muito grande em proporção ao de magistrados. Se por acaso eu perceber que há alguma corregedoria que está sendo complacente, então proponho ao CNJ a avocação desses processos.

Valor — E o que fazer com os processos criminais?

Asfor Rocha os processos criminais tendem a ter um curso mais demorado do que os disciplinares, porque a legislação processual penal exige uma formalidade — muitas vezes exagerada — que tem que ser obedecida, sob pena de nulidade do processo. Nós temos que saber qual a razão da demora. Se nós apurarmos que a demora na apuração do processo, mesmo penal, decorrer de um certo corporativismo ou um desvio de conduta, seja ele qual for, a corregedoria vai ter atuação. Ela pode inclusive instaurar um procedimento disciplinar contra o juiz que está julgando o caso.

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