Sucessão de deveres

Débitos trabalhistas são transferidos junto com a marca

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21 de junho de 2007, 0h00

A transferência da marca de uma empresa gera sucessão trabalhista. O entendimento é da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, que negou o recurso da dona de uma pastelaria condenada a arcar com os débitos trabalhistas de outra empresa, pertencente a seu pai.

Segundo a relatora da matéria, desembargadora Deoclecia Amorelli Dias, “quando o sócio-proprietário, insolvente, cede a outros o direito de uso e exploração da marca, tem-se a verdadeira sucessão trabalhista, considerando-se a amplitude e versatilidade dos artigos 10 e 448, da CLT”.

A própria dona da pastelaria confessou que, com a autorização do pai, utilizou o nome fantasia da empresa para angariar sua clientela. Uma vez que o pai não permaneceu com patrimônio suficiente para pagar suas obrigações com os funcionários, a Turma concluiu que houve sucessão trabalhista pela transferência da marca.

Citando uma decisão anterior do TRT da 3ª Região, a desembargadora considerou que “as marcas de indústria e comércio integram o patrimônio da empresa e representam, muitas vezes, seu bem mais valioso”. Assim, os trabalhadores podem exigir seus direitos “junto à expressão monetária deste patrimônio incorpóreo, sobretudo ao se considerar que o fruto de sua mão-de-obra está a ele agregado; o bem usufrui renome no mercado graças à sua contribuição”.

Leia a decisão

Processo: 02258-2006-149-03-00-2 AP

Data de Publicação: 18/05/2007

Órgão Julgador: Primeira Turma

Juiz Relator: Desembargadora Deoclecia Amorelli Dias

Juiz Revisor: Desembargador Manuel Candido Rodrigues

Agravante: MARCELA PRADO PAIVA – ME

Agravados: ADRIANO SILVA CAROLINO (1)

BAR E PASTELARIA EDMAR LTDA. (2)

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Agravo de Petição, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

Através da r. decisão de f. 50/53, complementada à f. 61, o MM. Juiz Renato de Sousa Resende julgou improcedentes os embargos de terceiro e imputou à embargante “multa de 1% sobre o valor da causa” por litigância de má-fé, entendendo que: “ocorre (…) autêntica confusão empresarial e sucessão trabalhista, com tentativa de fraude contra credores. Não restam dúvidas de que ambas as empresas utilizam-se do mesmo nome fantasia – Pastelucho (fls. 38/41). Além disso, exercem a mesma atividades, qual seja, lanchonete e comércio de pastéis (fls. 08 e 13). Acontece, ainda, que é o Sr. Mário de Paiva Neto, executado e pai da embargante, quem administra ambas as empresas, fato este confirmado na própria inicial (fl. 04). Vê-se, também, que o oficial de justiça, em todas as oportunidades em que deveria citar e/ou intimar o segundo embargado, se dirigia a “sede” da ora embargante, sem qualquer constrangimento ou ressalva do executado (fls. 33/37)”.

A embargante agrava às f. 66/77, argüindo, em preliminar, nulidade por cerceio de defesa, uma vez que a instrução foi encerrada ex abrupto e não lhe foi dada oportunidade de impugnação ou produção de provas. Suscita, outrossim, nulidade do próprio ato de constrição, em face da nomeação “compulsória” do depositário fiel. No mérito, insiste em sua existência jurídica autônoma, sem correlação com o executado.

Contraminuta às f. 81/87, argüindo o não-conhecimento do recurso, por inadequação. Ao final, busca por nova condenação da embargante nas penas de litigância de má-fé.

Dispensado o parecer escrito da d. PRT, na forma do art. 82, do Regimento Interno deste Regional.

É, em síntese, o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO ARGÜIDA EM CONTRAMINUTA PELO EXEQÜENTE

Ainda que a agravante tenha erroneamente denominado seu apelo de recurso ordinário, o princípio da “Fungibilidade recursal” permite que a peça seja perfeitamente aceita como agravo de petição. Aliás, o agravado incorreu no mesmo erro, intitulando sua contraminuta de contra- razões (f. 81).

O recurso foi subscrito por legítimos procuradores (v. f. 06) e observou o prazo legal de interposição (v. f. 61-verso e 66).

Presentes os pressupostos de admissibilidade, o apelo merece conhecimento, ficando rejeitada a preliminar trazida em contraminuta.

OUTRAS PRELIMINARES DE NULIDADE POR CERCEIO DE DEFESA

Seria o caso de se decretar a nulidade do julgamento primeiro (d.v.), tendo em vista que o MM. Juiz a quo passou à prolação do decisum logo após a manifestação do exeqüente-embargado, sem sequer ouvir a parte-embargante acerca das alegações trazidas pela adversa.

Entretanto, a agravante, em suas razões de recurso (f. 75), confessa o fato determinante e suficiente à tomada de uma decisão, conforme se verá em sede de mérito.

Com firme apoio no art. 796, “a”, da CLT, rejeita-se a preliminar.

DE NULIDADE DA PENHORA

As questões relativas à validade do ato de penhora devem ser levantadas diretamente no juízo executório, sendo de todo impertinentes aqui, em embargos de terceiro. O presente instrumento processual encontra-se enclausurado nos estreitos limites do art. 1.046/CPC.

Rejeito.

MÉRITO

Eis a declaração da agravante que se revela bastante ao decreto da sucessão trabalhista:

“o que ocorreu foi o seguinte, a Marcela com autorização de seu pai, utilizou o nome fantasia da empresa deste, para angariar sua clientela” (f. 75).

Como se vê, a embargante confessa que está a explorar idêntico ramo de negócio de seu pai (executado), valendo-se do mesmo nome do antigo estabelecimento-executado (Pastelucho) “para angariar sua clientela”.

Ora, as marcas de indústria e comércio integram o patrimônio da empresa (cf. art. 59, da Lei 5.772/71) e representam, muitas vezes, seu bem mais valioso. Logo, o trabalhador pode buscar o adimplemento de seus direitos junto à expressão monetária deste patrimônio incorpóreo, sobretudo ao se considerar que o fruto de sua mão-de-obra está a ele agregado; o bem usufrui renome no mercado graças à sua contribuição.

E quando o sócio-proprietário, insolvente, cede a outros o direito de uso e exploração da marca (caso inconteste dos autos), tem-se verdadeira Sucessão Trabalhista, considerando-se a amplitude e versatilidade dos art. 10 e 448, da CLT.

Neste sentido o seguinte julgado do Terceiro Regional:

“EMENTA: SUCESSÃO. OCORRÊNCIA. Na economia moderna, o patrimônio imaterial de uma empresa, representado substancialmente pela sua marca industrial ou comercial, significa mais do que todo o conjunto de seu patrimônio material. É o que se verifica em empresas multinacionais, cuja produção se fragmenta através de várias empresas, situadas, na maior parte, em países de terceiro mundo, onde a mão-de-obra é mais barata, enquanto a detentora da marca apenas comercializa os produtos, possuindo, como patrimônio, substancialmente, apenas a marca. Nesse contexto, a transferência da marca, maior patrimônio de empresa, revela a ocorrência da sucessão trabalhista, principalmente se considerarmos que a executada não permaneceu com patrimônio físico suficiente para a satisfação de suas obrigações” – AP-00878-2005-107-03-00-4, Relatora Alice Monteiro de Barros.

Assim sendo, não se há cogitar de absolvição.

Desprovido.

DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, ARGÜIDA EM CONTRAMINUTA

A meu sentir, sequer a pena instituída na instância a qual deveria subsistir, não havendo provas robustas de que embargante e executado estivessem se valendo de ato de simulação.

Mas como essa sanção não foi questionada pela embargante em suas razões de agravo, ela se mantém incólume.

Não há espaço para nova pena, porém.

Desprovido.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Primeira Turma, à unanimidade, rejeitou a preliminar de inadmissibilidade argüida em contraminuta e conheceu do agravo de petição; no mérito, sem divergência, negou-lhe provimento. Custas, pela agravante, em R$44,26 (quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos).

Belo Horizonte, 14 de maio de 2007.

DEOCLECIA AMORELLI DIAS

Desembargadora Relatora

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