Contrato em grupo

Sul América deve indenizar família de advogado com diabetes

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20 de junho de 2007, 0h00

A Sul América Aetna Seguros e Previdência deve cumprir a obrigação de pagar seguro de vida contratado por um associado da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (Caasp), que tinha diabetes e hipertensão. A seguradora não quis pagar a indenização à família do segurado. Argumentou que houve má-fé, uma vez que as doenças eram pré-existentes. A primeira instância paulista não aceitou o argumento.

O juiz José Luiz Germano, da 2ª Vara Cível do Fórum de Pinheiros, em São Paulo, determinou o pagamento de R$ 42 mil devidos à Marina Mendes de Carvalho, mulher do advogado segurado. Ele ponderou que o contrato foi feito em grupo e não houve exame para identificar doenças pré-existentes. Para aderir ao contrato, era necessário apenas preencher uma proposta.

Entretanto, o ponto mais importante da sua decisão foi quando observou que a pessoa que tem diabetes e a hipertensão, apesar de serem doenças pré-existentes, pode viver tanto quanto qualquer outra se tiver os devidos cuidados e hábitos saudáveis.

“Uma pessoa sem doenças outras, mas que fume excessivamente está muito mais sujeita a diversos males, inclusive a aquisição de doenças capazes de levá-la à morte. E nem por isso o fumante está impedido de contratar seguro de vida”, lembrou.

Ele sugere que a seguradora arque com os custos de um exame de saúde prévio, caso queira “fazer uma rigorosa seleção para vetar quem tem má saúde”.

Germano concluiu que não houve deslealdade ou má-fé que fizessem com que o valor da indenização não fosse pago pela segurado.

Leia a determinação:

Segunda Vara Cível do Fórum Regional de Pinheiros – Capital

Processo 02.010073-7.

Vistos.

Sul América Aetna Seguros e Previdência S.A. opôs os presentes embargos ao processo de execução que lhe move Marina Mendes de Carvalho, alegando que é credora da quantia de R$ 42.000,00, devida pelo falecimento de seu marido, mas a patologia era pré-existente à contratação do seguro, o que viciou o contrato por falta de boa-fé; que há excesso de execução porque foram incluídos no cálculo honorários de advogado; que fez o depósito do valor em questão, mas a correção monetária é de apenas R$ 660,00; que a autora não provou os fatos constitutivos de seu direito; que a execução não procede.

Os embargos foram respondidos a fls. 65 com os argumentos de que não houve má-fé e o contrato foi feito em grupo, para toda a categoria de advogados; que a contratação não foi precedida de exame médico; que a doença só teve início depois da contratação do seguro; que o falecido sempre foi ativo e aparentemente saudável, mal sabendo de seu real estado de saúde; que os embargos não procedem.

As partes foram intimadas a especificar provas e houve nomeação de perito médico a fls. 113, cujo laudo está a fls. 140, sobre o qual as partes puderam se manifestar, tendo inclusive sido feita a apresentação de memoriais.

É o relatório.

Decido.

Os presentes embargos procedem apenas em parte. Não se pode dizer que segurado tenha agido de má-fé para beneficiar-se indevidamente do seguro. O seguro contratado nem sequer é individual, mas em grupo, feito para toda a classe dos advogados.

Ao que tudo indica, o segurado sabia que tinha diabetess e hipertensão, mas isso não o desqualifica para ser segurado, mesmo que tais males tenham sido omitidos na ocasião da celebração do contrato.

É que uma pessoa com diabetess e pressão alta, desde que faça o devido controle dessas doenças e tenha hábitos saudáveis, pode viver tanto quanto qualquer outra, sem tais males. Dieta e atividade física são importantes aliados nessa tarefa.

Uma pessoa sem doenças outras, mas que fume excessivamente está muito mais sujeita a diversos males, inclusive a aquisição de doenças capazes de levá-la à morte. E nem por isso o fumante está impedido de contratar seguro de vida.

A seguradora se beneficiou com a contratação em grande escala e uma categoria profissional, que não morre mais que qualquer outra. É claro que um ou outro vai morrer mesmo, seja desta ou daquela doença, pré-existente ou não. Todos morrem por alguma doença, nem que seja a senilidade.

Se de fato a seguradora quer fazer uma rigorosa seleção para vetar quem tem má saúde, ela que arque com os custos de um prévio exame médico, assim como são feitas vistorias para a feitura de seguro em veículos usados.

Deixar a pessoa pagar o prêmio do seguro por anos a fio e depois procurar motivos nem sempre sinceros para negar o pagamento da indenização é fácil.

Até mesmo as pessoas que se matam não tornam o seguro indevido, se não houve uma prévia meditação, se não há uma fraude comprovada. Há um percentual estatístico de mortes por suicídio, assim como mortes por diabetess e problemas cardíacos. E tudo isso é levado em conta nos cálculos atuariais.

O segurado em questão não descobriu que estava com aids ou câncer e correu para fazer um milionário seguro individual às vésperas de sua morte. Isso sim seria uma safadeza, uma deslealdade, que o direito não pode admitir.

O que temos aqui é uma contratação coletiva de uma pessoa que tinha males que não são sinônimos de morte. Não houve a deslealdade ou a má-fé que fazem com que o valor da indenização não seja devido.

O pagamento do prêmio foi feito por anos e o valor segurado não tem nada de abusivo. Procede apenas a alegação de excesso quando há inclusão dos honorários, pois estes devem ser arbitrados por despacho do juiz.

Antes da propositura da ação, o valor do seguro deve ser apenas corrigido pela tabela prática do TJSP, desde a data do óbito até a propositura da ação. Depois da propositura incidem juros de 1% ao mês e mais os honorários arbitrados no despacho inicial da execução.

Assim, julgo procedentes em parte os presentes embargos, nos termos do parágrafo anterior, que fica integrando este dispositivo. Como a parte embargada decaiu de parte mínima do pedido, a seguradora pagará integralmente as custas em reembolso e os honorários do advogado da parte contrária, que arbitro em 10% sobre o valor atualizado da execução.

Estes honorários são para os embargos, de modo que devem ser cumulados como os que foram arbitrados para a execução.

P.R.I.

São Paulo, 16 de maio de 2007.

JOSÉ LUIZ GERMANO

Juiz de Direito

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