Danos do regime

Político perseguido em ditadura deve receber R$ 50 mil por danos

Autor

20 de junho de 2007, 9h41

Um político perseguido durante o regime militar deve receber R$ 50 mil de indenização por danos morais e materiais. A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que condenou a União a indenizar Astrogildo Pomatelli Rodrigues, líder partidário no município de Capitão Leônidas Marques (PR), entre 1964 e 1966.

Segundo o juiz federal Márcio Antônio Rocha, convocado no tribunal, “o autor sofreu constrangimentos inaceitáveis”. Ele foi perseguido por motivos políticos e teve que se esconder, comprometendo seu convívio familiar. Há prova demonstrando a invasão da propriedade do político. Ele teve que se ausentar de casa.

Ainda de acordo com o juiz, não ocorreu, como argumenta a União, prescrição do pedido, pois o marco inicial para contagem do prazo prescricional é a edição da Lei 10.559/2002, que regula o procedimento para indenizar os perseguidos políticos no período de 1946 e 1988.

O ex-líder partidário alegou ter sido vítima, na época, de perseguição política do Exército Brasileiro. Na época, era presidente municipal de um partido de oposição ao regime militar, teve sua casa invadida e ocupada, o que o obrigou a se esconder no mato durante meses, passando por privações.

A família também teria ficado prisioneira dos militares, sem poder sair de casa e sofrendo humilhações. Além disso, o autor da ação alegou ter sofrido grande prejuízo material pela perda de safras e de animais durante a época, além de ter ficado impedido de trabalhar no mesmo período.

O juiz entendeu que a indenização é devida. Porém, manteve o valor fixado em primeira instância, devido às circunstâncias do caso, ao contexto político e social em que ocorreram os fatos e às razões que motivaram os abusos do regime. Também foi determinado o pagamento de indenização pelos danos materiais e lucros cessantes, valor a ser apurado em liquidação de sentença.

Leia íntegra da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL 2005.70.05.004119-8/PR

RELATOR: Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

ADVOGADO: Luis Henrique Martins dos Anjos

APELANTE: ASTROGILDO POMATELLI RODRIGUES

ADVOGADO: Danubio Cunha da Silva e outro

APELADO: (Os mesmos)

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 02A VF DE CASCAVEL

EMENTA

ADMINISTRATIVO. DANO MORAL. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. REGIME MILITAR. LEI 10.559/2002. PRESCRIÇÃO. PROVA DOS DANOS CAUSADOS. INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS DE FATO. MOTIVAÇÃO. RAZOABILIDADE.

A Lei nº 10.559/2002, que regulou o procedimento para indenizar os perseguidos políticos no período de 1946 a 1988, constitui o marco inicial para a contagem do prazo prescricional para o requerimento da indenização.

Prova dos autos que demonstra a ocorrência de invasão da propriedade do autor por forças do exército, circunstância que levou-o a ausentar-se de casa para salvar-se.

Reconhecido o direito do autor à indenização em face da perseguição política por conta da sua condição de filiado a partido de orientação contrária ao regime militar. Indenização devida, inclusive, em face da prova da ocorrência de agressões físicas e morais aos seus familiares. Caso em que a filha do autor, em ação precedente, já obteve indenização por ter sido vítima de abuso sexual naquele mesmo contexto fático que embasa a presente demanda.

O arbitramento da indenização advinda de danos morais de levar em conta o bom senso e razoabilidade, atendendo às peculiaridades do caso, não podendo ser fixado quantum que torne irrisória a condenação, tampouco valor vultoso que traduza enriquecimento ilícito.

Hipótese em que, sopesadas as circunstâncias do caso concreto, o contexto político e social em que ocorreram os fatos, e as razões que motivaram os abusos por parte do regime, mantém-se a indenização arbitrada em R$ 50.000,00.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido o Relator, negar provimento às apelações e à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 28 de março de 2007.

Juiz Márcio Antônio Rocha

Relator para Acórdão

APELAÇÃO CÍVEL 2005.70.05.004119-8/PR

RELATOR: Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

ADVOGADO: Luis Henrique Martins dos Anjos

APELANTE: ASTROGILDO POMATELLI RODRIGUES

ADVOGADO: Danubio Cunha da Silva e outro

APELADO: (Os mesmos)

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 02A VF DE CASCAVEL

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária de reparação de danos morais e materiais consequentes a supostos perseguições sofridas após a Revolução de 1964 que, depois de regularmente processada, foi julgada procedente na instância de origem, condenada a ré na indenização de R$50.000,00, mais correção monetária e juros de mora, pelos danos morais, e nos danos materiais e lucros cessantes a serem apurados em liquidação de sentença.

As parte apelaram. A ré, alegando prescrição, negando a qualidade de anistiado do demandante e a prova dos danos reclamados e insurgindo-se contra os juros moratórios de 12% ao ano e a honorária de 10% do valor da condenação. O autor, pretendendo a elevação da indenização pelos danos morais para R$100.000,00 e buscando a modificação do termo inicial da correção monetária e dos juros de mora, bem como a elevação da taxa da honorária de 10% para 20%.

Os recursos foram respondidos.

Subiram os autos.

É o relatório.

Dispensada a revisão.

VALDEMAR CAPELETTI

Relator


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Data e Hora: 29/03/2007 19:23:33

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.70.05.004119-8/PR

RELATOR: Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

ADVOGADO: Luis Henrique Martins dos Anjos

APELANTE: ASTROGILDO POMATELLI RODRIGUES

ADVOGADO: Danubio Cunha da Silva e outro

APELADO: (Os mesmos)

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 02A VF DE CASCAVEL

VOTO

A sentença recorrida deve ser reformada.

Reza o art. 8º, do ADCT/88:

“Art. 8º. É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos. (Regulamento)

§ 1º – O disposto neste artigo somente gerará efeitos financeiros a partir da promulgação da Constituição, vedada a remuneração de qualquer espécie em caráter retroativo.

§ 2º – Ficam assegurados os benefícios estabelecidos neste artigo aos trabalhadores do setor privado, dirigentes e representantes sindicais que, por motivos exclusivamente políticos, tenham sido punidos, demitidos ou compelidos ao afastamento das atividades remuneradas que exerciam, bem como aos que foram impedidos de exercer atividades profissionais em virtude de pressões ostensivas ou expedientes oficiais sigilosos.

§ 3º – Aos cidadãos que foram impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional específica, em decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica nº S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e nº S-285-GM5 será concedida reparação de natureza econômica, na forma que dispuser lei de iniciativa do Congresso Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da promulgação da Constituição.

§ 4º – Aos que, por força de atos institucionais, tenham exercido gratuitamente mandato eletivo de vereador serão computados, para efeito de aposentadoria no serviço público e previdência social, os respectivos períodos.

§ 5º – A anistia concedida nos termos deste artigo aplica-se aos servidores públicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nos Ministérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividades profissionais interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bem como em decorrência do Decreto-Lei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978, ou por motivos exclusivamente políticos, assegurada a readmissão dos que foram atingidos a partir de 1979, observado o disposto no § 1º.

Por sua vez, dispõe a Lei 10.559/02, que regulamenta o art. 8o do ADCT/88:

Art. 1o O Regime do Anistiado Político compreende os seguintes direitos:

I – declaração da condição de anistiado político;

II – reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade, nas condições estabelecidas no caput e nos §§ 1o e 5o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

III – contagem, para todos os efeitos, do tempo em que o anistiado político esteve compelido ao afastamento de suas atividades profissionais, em virtude de punição ou de fundada ameaça de punição, por motivo exclusivamente político, vedada a exigência de recolhimento de quaisquer contribuições previdenciárias;

IV – conclusão do curso, em escola pública, ou, na falta, com prioridade para bolsa de estudo, a partir do período letivo interrompido, para o punido na condição de estudante, em escola pública, ou registro do respectivo diploma para os que concluíram curso em instituições de ensino no exterior, mesmo que este não tenha correspondente no Brasil, exigindo-se para isso o diploma ou certificado de conclusão do curso em instituição de reconhecido prestígio internacional; e

V – reintegração dos servidores públicos civis e dos empregados públicos punidos, por interrupção de atividade profissional em decorrência de decisão dos trabalhadores, por adesão à greve em serviço público e em atividades essenciais de interesse da segurança nacional por motivo político.

Parágrafo único. Aqueles que foram afastados em processos administrativos, instalados com base na legislação de exceção, sem direito ao contraditório e à própria defesa, e impedidos de conhecer os motivos e fundamentos da decisão, serão reintegrados em seus cargos.

Art. 2o São declarados anistiados políticos aqueles que, no período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente política, foram:

I – atingidos por atos institucionais ou complementares, ou de exceção na plena abrangência do termo;

II – punidos com transferência para localidade diversa daquela onde exerciam suas atividades profissionais, impondo-se mudanças de local de residência;

III – punidos com perda de comissões já incorporadas ao contrato de trabalho ou inerentes às suas carreiras administrativas;

IV – compelidos ao afastamento da atividade profissional remunerada, para acompanhar o cônjuge;

V – impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional específica em decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica no S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e no S-285-GM5;

VI – punidos, demitidos ou compelidos ao afastamento das atividades remuneradas que exerciam, bem como impedidos de exercer atividades profissionais em virtude de pressões ostensivas ou expedientes oficiais sigilosos, sendo trabalhadores do setor privado ou dirigentes e representantes sindicais, nos termos do § 2o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

VII – punidos com fundamento em atos de exceção, institucionais ou complementares, ou sofreram punição disciplinar, sendo estudantes;

VIII – abrangidos pelo Decreto Legislativo no 18, de 15 de dezembro de 1961, e pelo Decreto-Lei no 864, de 12 de setembro de 1969;

IX – demitidos, sendo servidores públicos civis e empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações públicas, empresas públicas ou empresas mistas ou sob controle estatal, exceto nos Comandos militares no que se refere ao disposto no § 5o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

X – punidos com a cassação da aposentadoria ou disponibilidade;

XI – desligados, licenciados, expulsos ou de qualquer forma compelidos ao afastamento de suas atividades remuneradas, ainda que com fundamento na legislação comum, ou decorrentes de expedientes oficiais sigilosos.

XII – punidos com a transferência para a reserva remunerada, reformados, ou, já na condição de inativos, com perda de proventos, por atos de exceção, institucionais ou complementares, na plena abrangência do termo;

XIII – compelidos a exercer gratuitamente mandato eletivo de vereador, por força de atos institucionais;

XIV – punidos com a cassação de seus mandatos eletivos nos Poderes Legislativo ou Executivo, em todos os níveis de governo;

XV – na condição de servidores públicos civis ou empregados em todos os níveis de governo ou de suas fundações, empresas públicas ou de economia mista ou sob controle estatal, punidos ou demitidos por interrupção de atividades profissionais, em decorrência de decisão de trabalhadores;

XVI – sendo servidores públicos, punidos com demissão ou afastamento, e que não requereram retorno ou reversão à atividade, no prazo que transcorreu de 28 de agosto de 1979 a 26 de dezembro do mesmo ano, ou tiveram seu pedido indeferido, arquivado ou não conhecido e tampouco foram considerados aposentados, transferidos para a reserva ou reformados;

XVII – impedidos de tomar posse ou de entrar em exercício de cargo público, nos Poderes Judiciário, Legislativo ou Executivo, em todos os níveis, tendo sido válido o concurso.

§ 1o No caso previsto no inciso XIII, o período de mandato exercido gratuitamente conta-se apenas para efeito de aposentadoria no serviço público e de previdência social.

§ 2o Fica assegurado o direito de requerer a correspondente declaração aos sucessores ou dependentes daquele que seria beneficiário da condição de anistiado político.”


Os autos dão conta de que o autor, em 17.05.02, requereu com base na Medida Provisória 2.151/02 a declaração de anistiado político e o pagamento de indenização, não logrando deferimento (fls. 19/23 e 87/97). De outra banda, a prova testemunhal é insuficiente para suprir essa deficiência: Dyonisio Lopes, diz que o autor foi preso e perseguido pelo Exército, sem esclarecer a motivação (fl. 101); Amália Felisbina Stack Petersen e Fredolino Otávio Stack depuseram com base na memória familiar (fls. 102 e 103). De resto, os depoimentos de Juvelina Amann, Amália Felisbina Stack Petersen, Jandira Matielo e Fredolino Otávio Stack (fls. 41/46) ou são comprometidos pelo vínculo familiar ou pelos fatores já apontados. Afigura-se claro, por conseguinte, que o demandante não é anistiado político, sendo inaplicável a Lei 10.559/02.

Destarte, não subsiste a fundamentação do ato sentencial no tocante à prescrição, mostrando-se aplicável à espécie, sem outras achegas, o disposto no Decreto 20.910/32:

“Art. 1º – As Dividas Passivas Da União, Dos Estados E Dos Municípios, Bem Assim Todo E Qualquer Direito Ou Ação Contra A Fazenda Federal, Estadual Ou Municipal, Seja Qual For A Sua Natureza, Prescrevem Em Cinco Anos Contados Da Data Do Ato Ou Fato Do Qual Se Originarem.

(…)

Art. 3º – Quando O Pagamento Se Dividir Por Dias, Meses Ou Anos A Prescrição Atingira Progressivamente As Prestações, A Medida Que Completarem Os Prazos Estabelecidos Pelo Presente Decreto.”

No caso vertente, cogita-se da prescrição do fundo de direito, não apenas das prestações periódicas:

“Fundo de direito é a expressão utilizada para significar que o direito de ser funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos a modificações que se admitem com relação a esta situação jurídica fundamental, como reclassificações, reenquadramento, direito a adicionais por tempo de serviço, direito a gratificações por prestação de serviço especial etc. A pretensão do fundo de direito prescreve, em direito administrativo, em cinco anos a partir da data da violação dele, pelo seu não reconhecimento inequívoco. Já o direito a receber as vantagens pecuniárias decorrentes dessa situação jurídica fundamental ou de suas modificações ulteriores é mera consequência daquele, e sua pretensão, que diz respeito ao quantum, renasce cada vez que é devido (dia a dia, mês a mês, ano a ano, conforme a periodocidade em que é devido o seu pagamento), e, por isso, se restringe às prestações vencidas há mais de cinco anos” (STF, Tribunal Pleno, RE 110.419/SP, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJU de 22.09.89).”

Os fatos da causa teriam ocorrido entre janeiro de 1964 e dezembro de 1966. A ação foi ajuizada em setembro de 2005. Mesmo que se remontasse o termo inicial à época da chamada redemocratização, marcada pelo advento da Lei 6.683, de 28 de agosto de 1979, o lapso prescricional da situação jurídica fundamental do direito invocado pelo autor de há muito se teria consumado.

Portanto, tenho como prescrita a presente ação.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da ré e à remessa “ex officio” e julgar prejudicado o apelo do autor.

VALDEMAR CAPELETTI

Relator

Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, por:

Signatário (a): VALDEMAR CAPELETTI

Nº de Série do Certificado: 42C50B8B

Data e Hora: 29/03/2007 19:23:30

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.70.05.004119-8/PR

RELATOR: Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

ADVOGADO: Luis Henrique Martins dos Anjos

APELANTE: ASTROGILDO POMATELLI RODRIGUES

ADVOGADO: Danubio Cunha da Silva e outro

APELADO: (Os mesmos)

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 02A VF DE CASCAVEL

VOTO DIVERGENTE

Peço vênia ao Exmo. Relator para divergir.

Com o advento da Lei 10.559/2002, regulou-se o procedimento para indenizar os perseguidos políticos no período de 1946 a 1988. Nesse contexto, apesar de os danos causados terem ocorrido em entre 1964 e 1966, a prescrição da pretensão reparatória, in casu, inicia-se a partir da edição da referida Lei, eis que, com sua edição, houve o reconhecimento do direito à reparação, importando em renúncia tácita à prescrição.

Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ANISTIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. EXAME EM RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA DE LEI FEDERAL NÃO DEMONSTRADA. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. NÃO-OCORRÊNCIA. LEI 10.559/2002. RENÚNCIA TÁCITA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. Ao Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial, não compete a análise de contrariedade ao texto constitucional, conforme o art.


105, inc. III, da Constituição Federal.

2. Cabe ao recorrente, além de apontar o dispositivo infraconstitucional que entende violado pelo acórdão recorrido, demonstrar em que consistiu a alegada contrariedade ou negativa de vigência.

3. A superveniência da Lei 10.559, de 13/11/2002, que regulamentou o disposto no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, constitui renúncia tácita à prescrição, porquanto passou a reconhecer, por meio de um regime próprio, direito à reparação econômica de caráter indenizatório aos anistiados políticos.

4. Recurso especial conhecido e improvido.

(REsp 767.931/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 21.03.2006, DJ 10.04.2006 p. 287)

Portanto, tendo sido ajuizada a ação em 2005, não houve prescrição.

Quanto ao cerne da lide, de fato, o conjunto probatório não está fortemente amparado, pois só existe a prova testemunhal e a juntada de depoimentos dos autos nº 2002.70.05.008349-0. Contudo, no referido processo, a filha do autor da presente ação foi indenizada justamente porque militares tomaram a sua casa e foi inclusive vítima de abuso sexual. A União foi condenada a indenizá-la.

Aqui, é o pai da família que seria, dentro desse contexto, alvo de perseguição política. O depoimento da filha, no processo 2002.70.05.008349-0, ora utilizado como prova emprestada às fls. 41/43, é extremamente coerente no sentido de narrar com detalhes o ocorrido. Verbis:

(…) que quando tinha cerca de 16 anos de idade a autora e sua família tiveram a casa cercada por soldados fardados do Exército, os quais estavam para prender o pai da autora, o qual era presidente de um partido político vinculado ao político Brizola do Rio Grande do Sul (…); que chegaram a entrar a força, várias vezes, dentro da casa onde a autora e sua família residiam sempre a procura do pai da autora o qual estava refugiado no mato e a autora e sua família sequer podiam levar comida até lá, porque a noitinha os soldados cercavam a casa e as tarefas da agricultura, tais como, alimentar o gado e os porcos tinham que ser feitas todas de dia, porque no início da noite a autora e sua família se trancavam com medo; (…)

O autor sofreu constrangimentos inaceitáveis. Passou período sendo perseguido por motivos políticos, teve de se esconder e o convívio familiar ficou completamente comprometido, com sua família aflita pela situação tensa em que se encontrava.

Conforme a jurisprudência do STJ (REsp. 602401), na concepção moderna do ressarcimento por dano moral, prevalece a responsabilização do agente por força do simples fato da violação, de modo a tornarem-se dispensáveis outras provas do prejuízo em concreto, ao contrário do que se dá quanto ao dano material.

No arbitramento da indenização advinda de danos morais, o julgador deve se valer do bom senso e razoabilidade, atendendo às peculiaridades do caso, não podendo ser fixado quantum que torne irrisória a condenação e nem tampouco valor vultoso que traduza enriquecimento ilícito.

Considerando as peculiaridades do presente caso, entendo correto o valor fixado pelo Juízo a quo, qual seja, R$ 50.000,00, eis que dentro dos parâmetros da razoabilidade.

Diante do exposto, voto no sentido de negar provimento às apelações e à remessa oficial.

Juiz Márcio Antônio Rocha

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