Punição da Embratel

Empresas preferem pagar danos que melhorar estrutura, diz juiz

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18 de junho de 2007, 14h44

Se a empresa não se ajusta e continua a prejudicar inúmeros consumidores e a própria Justiça, só resta aplicar uma pena que mexa no seu bolso. O entendimento é da 4ª Vara Cível de Blumenau (SC), que condenou a Embratel a pagar R$ 150 mil de danos morais a um cliente. Ele teve o nome incluído em cadastros de inadimplentes, devido a uma conta de pouco mais de R$ 30, que pagou em dia.

Para o juiz Emanuel Schenkel do Amaral e Silva, uma empresa com o porte da Embratel tem, ou deveria ter, recursos tecnológicos suficientes para evitar erros como o que aconteceu com o cliente. Ele afirmou, ainda, que indenizações de valores relativamente pequenos diante do faturamento de algumas empresas fazem com que elas prefiram pagar os danos a melhorar o funcionamento.

De acordo com os autos, a inscrição do cliente foi feita em maio de 2002 e se referia a uma conta de fevereiro do mesmo ano. A Embratel alegou que o cadastro foi feito devido uma fatura vencida de dezembro de 2002. Mas, como explicar a inscrição do cliente sete meses antes dele ter deixado de pagar a conta? Para o juiz, o argumento só comprovou a falta de cuidado da empresa. “Os documentos que juntou na tentativa de demonstrar a regularidade da inscrição evidenciam ainda mais suas falhas operacionais”, afirmou.

Além do problema com as datas e com os valores da fatura, a empresa também se equivocou com o número do telefone. A suposta conta vencida, de dezembro, remetia a um número que não pertencia mais ao cliente. A Embratel contestou. Alegou falhas da operadora local, que não teria passado os dados corretamente. De acordo com o juiz, “nestes casos a Embratel possui obrigação de conferi-los antes de fazer o lançamento em cadastro restritivo”.

Segundo o juiz, o valor estabelecido deve-se à gravidade do caso, já que a empresa poderia ter evitado o erro. “O dano moral assume o caráter substancialmente punitivo, desprezando-se o suposto enriquecimento sem causa, para obrigar a empresa de telefonia a medidas administrativas que proporcionem maior respeito ao cliente”, afirmou.

Ele levou também em consideração o fato de a empresa ser “reincidente contumaz no desrespeito a normas simples de boa conduta comercial, prejudicando inúmeros clientes e a própria Justiça que se vê obrigada a equacionar sua má-atuação, fomentando, ainda, numerosas demandas, sinalizando que prefere a lide a ajustar-se”.

O cliente foi representado pelo advogado Eduardo Vieira, do escritório Arrabaça & Advogados Associados.

Leia a sentença:

SENTENÇA

1- Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por João Leopoldino de Souza Filho em face de Embratel – Empresa Brasileira de Telecomunicações S/A, já qualificados.

Alegou o autor, em síntese, que foi impossibilidade de abrir conta em instituição financeira em razão de ter sido inscrito pela ré em cadastro desabanador pela ausência de pagamento de fatura telefônica; que a conta foi paga no vencimento, o que caracteriza a irregularidade da inscrição; que figurou nos cadastros restritivos por mais de 4 (quatro) anos e só foi excluído mediante reclamações; que a atitude da ré configura ato ilícito passível de indenização pelos abalos psicológicos causados; que a verba indenizatória deve levar em consideração o potencial econômico da empresa de telefonia.

Pediu, nestes termos, danos morais em quantia a ser fixada e gratuidade judiciária.

Também em resumo, a ré, que a inscrição ocorreu em razão do inadimplemento de fatura vencida em 22.12.2002, no valor de R$ 15,25 (quinze reais e vinte e cinco centavos), relativa a utilização do terminal telefônico (41) 443-1599; que as informações foram repassadas pela operadora local; que inexistindo pagamento agiu em exercício regular de direito ao inscrever o autor; que os dano morais não foram provados; que meros transtornos do dia-a-dia não geram abalos psicológicos passíveis de indenização; que a quantia fixada não deve gerar enriquecimento ilícito.

O processo seguiu seus trâmites legais. É o relatório do essencial.

2- DECIDO:

Julgo antecipadamente a lide por se tratar de questão de direito e de fato sem necessidade de produção de prova em audiência (art. 330, I, do CPC).

É incontroverso que a ré inscreveu o nome do autor em cadastro desabonador em razão da ausência de pagamento de fatura telefônica, e que, devidamente alertada pelo consumidor acerca de suposta equívoco, exclui-o dos aludidos cadastros, conforme demonstram as declarações de fls. 12 e 13, emitidas, respectivamente, em 31.03.2006 e 04.05.2006.

Assim, a controvérsia gira em torno da regularidade, ou não, desta inscrição e da verificação dos conseqüentes abalos morais gerados pela atitude da ré.

Colhe-se dos autos que existem duas versões distintas para os fatos. O autor alega que foi inscrito indevidamente em razão de fatura telefônica vencida em 10.02.2002, no valor de R$ 33,83 (trinta e três reais e oitenta e três centavos), referente a linha (41) 272-9584, paga pontualmente, e que a inscrição perdurou por cerca de quatro anos.

Por outro lado, a empresa de telefonia sustenta que agiu em exercício regular de direito porque a negativação diz respeito a outro terminal telefônico, cujo número é (41) 443-1599, e que teve a fatura vencida no dia 22.12.2002, no valor de R$ 15,25 (quinze reais e vinte e cinco centavos) inadimplida.

Ocorre que, pelos elementos constantes dos autos, deve-se dar credibilidade à versão apresentada pelo autor porquanto a da ré não guarda consonância com os acontecimentos narrados.

É que bem se vê da declaração de fl. 12 que a inscrição efetuada em 21.05.2002 diz respeito a uma fatura vencida em 10.02.2002 e, muito embora, não traga o seu valor, já faz desmoronar a tese da ré que alega que a inscrição se deu em razão de fatura da operadora local vencida em 22.12.2002, ou seja, mais de sete meses após o próprio registro da inscrição combatida.

Aliás, mesmo que fosse admitida a tese da empresa ré de que a inscrição diz respeito a outra linha telefônica, ainda assim, estariam evidentes os erros praticados a invalidar a inscrição.

Acontece que os próprios documentos que juntou referentes a esta outra linha, de número (41) 443-1599 (fls. 46/47) demonstram que no mês que teria havido inadimplência (vencimento de dezembro de 2002) já não mais pertencia ao autor eis que transferida para terceiro, pessoa jurídica de nome Supermercado D´Orla Ltda.

Neste ponto, a alegação de que o erro toca à operadora local, que teria repassados os dados cadastrais de maneira incorreta, também não vinga porquanto consabido que nestes casos a Embratel possui obrigação de conferí-los antes de fazer o lançamento em cadastro restritivo (TJSC, 2006.000543-1, de Lages, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Lu, j. 19.09.2006).

Portanto, de todos os ângulos que se aborda, restam evidente os erros cometidos pela ré.

Não fosse tudo isso, o autor trouxe aos autos a fatura que gerou a inscrição (fl. 17) e o respectivo comprovante de pagamento (fl. 16), demonstrando que a quitação foi pontual, não havendo dúvidas que a empresa de telefonia praticou ato ilícito passível de indenização nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil, pois, ao tempo da inscrição, a fatura encontrava-se regularmente quitada.

Neste sentido:

“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS CONTRA COMPANHIA TELEFÔNICA – INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – DÍVIDA INEXISTENTE – OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR – CONDENAÇÃO NO VALOR EQUIVALENTE A 100 SALÁRIOS-MÍNIMOS – VALOR QUE SE MOSTRA DESPROPORCIONAL AO DANO SUPORTADO – REDUÇÃO – APELO PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJSC, Ap. Cív. 2006.014580-7, de Turvo, Rel. Des. Substituto Jaime Ramos, j. 01.08.2006)

Em relação aos prejuízos pelo abalo moral, é sabido que os mesmos são presumidos, sendo dispensada sua comprovação (TJSC, Ap. Cív. 04.033742-8, de Curitibanos, Rel. Des. José Volpato de Souza, j. 25.02.2005).

Ultrapassadas as questões que dizem respeito à responsabilidade pelo evento e ao prejuízo arcado, passa-se à fixação da verba indenizatória.

É sabido que a valoração da indenização deve ser feita moderada e prudentemente, através de livre apreciação eqüitativa do juiz, devendo representar para o lesado uma satisfação capaz de neutralizar, ou ao menos amenizar, os efeitos dos transtornos causados, sem configurar enriquecimento sem causa (TJSC, Ap. Cív. 99.011909-2, de Itajaí, Rel. Des. Sérgio Paladino, j. 21.11.2000).

Do autor e sua condição social, nada se apurou. Não teve participação alguma no evento. Pagou a fatura que gerou a inscrição no vencimento. Teve abertura de conta negada em instituição financeira em virtude da inscrição (fl. 15).

A ré, por sua vez, é instituição de grande porte com recursos suficientes para tomar cautelas impedindo que circunstâncias como essa ocorram. Erros desta natureza, de tão grosseiros, são inadmissíveis, mormente em virtude da alta capacidade tecnológica posta à disposição deste tipo de instituição. Deveria tomar mais cuidado ao proceder o lançamento dos seus consumidores nos cadastros restritivos. Os documentos que juntou na tentativa de demonstrar a regularidade da inscrição evidenciam ainda mais suas falhas operacionais porque demonstram que que a outra linha que seria responsável pela inscrição já tinha sido transferida a terceiros quando da prestação dos serviços.

Portanto, agiu com culpa gravíssima. Nestes casos, onde é evidente que a instituição tem boa experiência profissional e que tinha meios evidentes de minimizar a ocorrência, é que o dano moral assume o caráter substancialmente punitivo, desprezando-se o suposto enriquecimento sem causa, para obrigar a empresa de telefonia a medidas administrativas que proporcionem maior respeito ao cliente. Condenações módicas em casos como o ocorrido, jamais terão efeito persuasivo desejado, sendo infinitamente mais atraente para o ofensor continuar o procedimento, bem mais barato e cômodo, que é litigar com alguns insatisfeitos, do que mudar rotinas.

Finalmente, percebe-se que a parte ré é freqüentadora do Fórum, sendo reincidente contumaz no desrespeito a normas simples de boa conduta comercial, prejudicando inúmeros clientes e a própria Justiça que se vê obrigada a equacionar sua má-atuação, fomentando, ainda, numerosas demandas, sinalizando que prefere a lide do que ajustar-se.

Assim, a conclusão a que se chega, é que, a tão falada indústria do dano moral, corre agora ao inverso, porquanto, ao que tudo indica, os valores não estão servindo ao fim pretendido, devendo por isso mesmo serem aumentados como medida pedagógica e punitiva (TJSC, Ap. Cív. 2004.033603-1, de Itajaí, Rel. Des. Carlos Prudêncio).

Com isto, certamente, poremos termo à ilicitude, ao desrespeito ao cidadão, bem como à necessidade de vir à Justiça pela falta cometida.

Assim sendo, atendendo aos parâmetros acima expostos, a parte ré agiu com culpa gravíssima, fixando-se a título de danos morais o valor de R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais).

3- Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por João Leopoldino de Souza Filho em face de Embratel – Empresa Brasileira de Telecomunicações S/A para condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais) em virtude dos danos morais sofridos pelo autor, corrigida monetariamente pelo INPC-IBGE e acrescida de juros de mora de 12% (doze por cento) ao ano a partir da data desta sentença (TJSC, Ap. Cív. 2002.005478-5, de São Joaquim, Rel. Des. Alcides Aguiar, j. 18.11.2004), até o efetivo pagamento.

Condeno, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação (art. 20, § 3º do CPC).

P.R.I.

SC), .

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