Crimes virtuais

Setores divergem na condução do projeto sobre crimes virtuais

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16 de junho de 2007, 10h23

O Projeto de Lei de relatoria do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que trata dos crimes cometidos pela internet, tem causado divergências em setores da sociedade. Enquanto a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) ressalta que o projeto “está sendo discutido abertamente”, a Ordem dos Advogados do Brasil lamenta o “distanciamento com que a proposta vêm sendo conduzida”. Ambos, no entanto, concordam sobre a importância de uma lei nesse sentido.

O PLS 76/2000 tipifica condutas feitas mediante uso de “sistema eletrônico, digital ou similares”, de rede de computadores, ou que sejam praticadas contra rede de computadores, dispositivos de comunicação ou sistemas informatizados e similares. A proposta está em trâmite atualmente na Comissão de Constituição e Justiça do Senado em sua 8ª versão. Ela foi apresentada na forma de Substitutivo condensando três projetos anteriores que tramitavam no Congresso sobre o mesmo tema.

O vice-presidente do Conselho Superior de Tecnologia da Informação da Fecomércio, o advogado Rony Vainzof, diz que o Código Penal brasileiro não admite a tipificação de condutas por analogia. Para ele, são necessários dispositivos que especifiquem atos praticados por meios digitais. O advogado, que participou das audiências públicas ao qual o projeto foi submetido, afirma que ele foi “amplamente discutido” até chegar em sua atual versão.

Especialista em crimes de Tecnologia da Informação, Vainzof afirma ser totalmente favorável à atual redação da proposta. Ele cita como benefícios que ela traz o aumento da pena para ilícitos cometidos por meios eletrônicos.

Vainzof, no entanto, menciona um ponto do projeto cuja interpretação pode gerar conflito. Segundo ele, a lei obrigará os provedores de acesso a informar à Justiça quando souberem da prática de algum delito virtual. Segundo o especialista, “isso não significa que eles terão de vigiar a internet, mas sim de informar quando souberem da existência de algum ilícito”. Quanto a essa responsabilização, “embora eu não seja contra, esse ponto pode gera polêmica”, diz.

Já o presidente da Comissão Especial de Tecnologia da Informação do Conselho Federal da OAB, Alexandre Atheniense, lamentou o fato de a entidade não ter sido convocada para a próxima audiência pública que discutirá a matéria. Segundo ele, até a noite de sexta-feira (15/6), a OAB não havia recebido qualquer comunicação oficial sobre a reunião prevista para o dia 20 de junho.

De acordo com Atheniense, “estranhou o distanciamento que o senador Eduardo Azeredo estabeleceu com a OAB”. Ele lembra que a Ordem tem participado dos debates sobre o tema desde 99, quando foi apresentada a primeira versão do projeto. No entanto, quando a relatoria da matéria passou para as mãos de Azeredo, houve muitas mudanças no texto e a OAB até então não teve oportunidade de conferir as alterações, afirma. Também estranho é o fato de que o senador “não queria sequer admitir esta audiência pública”, alega o o representante dos advogados. Ele reforça que se, a qualquer momento surgir o convite, a entidade estará pronta para oferecer sua assistência.

Atheniense diz ser “totalmente favorável à necessidade da lei”. Ele salienta como pontos positivos da proposta o fato de ela incluir novas tipificações para condutas que até então não eram cobertas pela legislação penal atual. E também o fato de ela responsabilizar os provedores pelo armazenamento das informações dos usuários para eventualmente disponibilizá-las à Justiça quando pedido.

O advogado, porém, faz algumas ponderações. Segundo ele, “algumas partes do projeto apresentam uma certa característica de analogia” perante o Código Penal. “Não podemos sair criando muita novidade”, alerta.

A Lei dos cibercrimes

O Substitutivo apresentado pelo senador Eduardo Azeredo aglutinou três projetos de lei, o PLC 89, de 2003, o PLS 76, de 2000, e o PLS 137, de 2000. Uma resenha didática sobre o projeto menciona pareceres internacionais tomados como parâmetro. Dentre eles, a Convenção sobre o Cibercrime, realizada em 2001 pelo Conselho da Europa e ratificada pelo Senado dos Estados Unidos. O senador ressalta a “harmonia brasileira com os termos da convenção entre o que ela recomenda e aquilo que está sendo proposto nos projetos de lei ao qual oferecemos este presente Substitutivo”.

Os crimes tipificados no Substitutivo são: ‘roubo de senha’, que constitui o chamado “phishing”; ‘falsificação de cartão de crédito’, que inclui também cartão de débito e dispositivos de captura de dados desses cartões; ‘falsificação de telefone celular ou meio de acesso a sistema’; ‘calúnia, difamação e injúria’, quando praticados mediante uso de informática; ‘difusão de Código Malicioso para causar dano’, a chamada difusão de “vírus”; ‘acesso não autorizado’; ‘obtenção não autorizada de informação e manutenção, transporte ou fornecimento indevido de informação obtida desautorizadamente’; ‘divulgação não autorizada de informações disponíveis em banco de dados’; ‘furto qualificado por uso de informática’; ‘tentado contra a segurança de serviço de utilidade pública’, quando o serviço for de informação ou telecomunicação; e ‘ataques a redes de computadores’, que consiste na interrupção ou perturbação de serviço de telecomunicação.

A última alteração do projeto, que tramita na Comissão de Constituição e Justiça, foi a supressão dos dispositivos que faziam menção à chamada “legítima defesa digital”. Os dispositivos definiam que não haveria crime quando o ato fosse praticado na hipótese de “defesa digital”. Ou seja, seria possível devolver um ato criminoso com outra conduta similar.

Segundo a resenha didática do projeto, de autoria do senador Flexa Ribeiro, o artigo 25 do Código Penal e o artigo 44 do Código Penal Militar, definem o instituto da Legítima Defesa. “Embora o Relator tenha tido a intenção de aplicá-la ao mundo digital”, a presença da legítima defesa na Parte Geral de ambos os códigos “irradia efeitos para todos os tipos penais da Parte Especial, cabendo ao juiz, e somente a ele, a sua interpretação na alegação caso a caso”, defende o texto.

Ainda consta na proposta as obrigações dos provedores de acesso à internet. Dentre elas, a de manter “dados aptos à identificação do usuário e das conexões por ele realizadas” e de fornecê-los às autoridades competentes para fins de investigação quando solicitado.

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