Grito de alerta

Presidente do TJ paulista pede verba fixa do orçamento

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11 de junho de 2007, 18h10

O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Celso Limongi, afirmou nesta segunda-feira (11/6) que o Judiciário paulista é uma instituição sucateada, sem verba para contratar juízes e funcionários, submersa em toneladas de papéis e desacreditada por três estatísticas desalentadoras. São 17 milhões de processos na primeira instância, 600 mil recursos à espera de julgamento no maior tribunal do país e um déficit de 419 magistrados.

“Essa é uma situação que revolta a sociedade e angustia os magistrados”, afirmou Limongi, durante o seminário da Frente Parlamentar de apoio à Autonomia Financeira do Poder Judiciário. O seminário aconteceu no auditório Franco Montoro, na Assembléia Legislativa de São Paulo, e foi coordenado pelo deputado Rodolfo Costa e Silva (PSDB). Participaram do encontro a juíza Andréa Maciel Pachá, da 1ª Vara da Família de Petrópolis (RJ) — que nesta quarta-feira (13/6) será sabatinada pelo Senado para ocupar uma vaga no CNJ — a ex-secretária-adjunta da Justiça de São Paulo Evane Kramer e o presidente da seção paulista da OAB, Luiz Flávio Borges D’Urso.

Limongi defendeu que o Judiciário paulista necessita de uma mudança urgente apoiada na autonomia financeira e administrativa da instituição. Segundo ele, a deficiência na prestação do justo à população é, em grande parte, motivada pela gestão administrativa da Justiça. “A função do Judiciário é preservar a dignidade humana. Mas para dizer o justo, e dizer com celeridade, é preciso planejamento e isso só acontece com uma lei que garanta independência financeira.”

O presidente do TJ paulista quer negociar com o Executivo e o Legislativo que ao Judiciário seja destinada uma parcela fixa do orçamento. Além disso, quer garantir uma arrecadação própria, por meio do recolhimento e gerenciamento de taxas judiciárias e emolumentos. O percentual dessa arrecadação seria discutido com o Executivo e o valor iria para um fundo próprio de investimento. O projeto de Limongi se espelha em grande parte na chamada “reforma silenciosa”, colocada em prática pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

De acordo com a juíza Andréa Maciel Pachá, o TJ do Rio criou um fundo especial para a administração da Justiça por meio de duas normas estaduais (Lei 2.524/96 e Lei 3.217/99). Em 1996, esse fundou passou a receber recursos de custas, emolumentos, contribuições, receitas de concursos e aluguéis de espaços do Judiciário. Em 1999, foi acrescido de taxas judiciais e 20% dos atos extrajudiciais. No ano passado, a receita desse fundo chegou a R$ 276 milhões. “Essas receitas são aplicadas na construção e ampliação de prédios, em serviços de informatização e na aquisição de material permanente”, afirmou a juíza.

O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, destacou que a independência administrativa e financeira é fundamental para o Judiciário cumprir sua função jurisdicional. Ele lembrou que a OAB encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei para minimizar os efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, em que amplia de 6% para 8% o limite de gastos.

Evane Kramer, ex-secretária-adjunta da Justiça de São Paulo, defendeu uma autonomia administrativa e financeira vinculação a uma parcela fixa da arrecadação global do Imposto de Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS). “Seria um modelo parecido com os das universidades paulistas”, afirmou da ex-secretária.

Bola de Neve

De acordo com Limongi, a cada dia útil 26 mil processos dão entrada na Justiça paulista. A procura pelo Judiciário faz aumentar, a cada hora, em 3,2 mil o número de ações. É como se cada juiz acumulasse dois novos processos a cada 60 minutos. “Os magistrados se sentem sufocados tanto pelo volume como pela falta de recursos capaz de modificar esse quadro desalentador”, afirmou o presidente do TJ.

Limongi reconheceu que o tribunal que dirige não tem juízes suficientes para, no curso prazo, reverter esse quadro. “Para abrir um concurso público tenho que ficar de olho no orçamento até ter a certeza de que tenho recurso suficiente para pagar os vencimentos”, disse o desembargador. O presidente do TJ reconheceu, ainda, que descumpriu a lei que o obriga a todo ano dar aumento ao funcionalismo do Judiciário. “Estamos sempre a depender da sensibilidade dos governadores, que garanta a suplementação orçamentária”, completou.

Nos quatro primeiros meses do ano, a Justiça paulista só fez aumentar seu acervo de processos pendente de julgamentos. Além disso, o número de litígios que deram entrada na maior Justiça do país foi maior que o de sentenças. De janeiro a abril cerca de 1,5 milhão de novos feitos deram entrada no primeiro grau do Judiciário, enquanto o número de decisões produzidas foi de 907,8 mil, de acordo com levantamento do próprio tribunal.

Março foi o mês mais produtivo, quando os juízes de primeira instância julgaram 324,3 mil processos. Janeiro foi o mais fraco, com apenas 58,8 mil sentenças. Março registrou o maior número de entrada de autos, num total de 431 mil, seguido por abril (395 mil), janeiro (378 mil) e fevereiro (324 mil). Em todos eles, o número de processos instaurados foi maior que o de julgados.

Em maio, a primeira instância, porta de entrada dos litígios judiciais, acumulava um total de 17 milhões de processos em andamento. O quadro apresentou o melhor desempenho em fevereiro, quando registrou pouco mais de 16 milhões feitos.

Outro dado apreensivo: o volume acumulado este ano registrou uma alta de quase 60% em relação ao número de processos que aguardavam julgamento em 2002, quando foi realizado o primeiro relatório anual de gestão. Ou seja, em apenas cinco anos os feitos em andamento saltaram de 10,4 milhões para mais de 16 milhões.

Enquanto na entrada o aumento se deu aos saltos, gradativo e sistemático na saída o crescimento foi bem mais lento nos últimos cinco anos. Entre 2002 e 2006 perto de 1 milhão de processos foram somados aos já existentes em primeiro grau, com destaque para o biênio 2003-2004, quando o salto foi de 11,7 milhões para 13,4. Na outra ponta, a do número de sentenças, em vez de crescimento houve queda de 2,8 milhões para 2,4 milhões.

Em 2005, o acumulado chegou a 14,8 milhões, confirmando que o sistema virara uma bola de neve. A nova gestão do tribunal paulista prometia esforços para frear a avalanche, mas bateu novo recorde: o ano terminou com o número de processos beirando os 16 milhões (15.995.916). Os juízes, com enorme esforço, conseguiram acabar o primeiro ano da administração Limongi proferindo 3.360.037, também um recorde.

Os números, preocupantes, revelam também o trabalho quase alucinado dos magistrados de primeiro grau. Em abril, realizaram 134 mil audiências, cumpriram 66 mil precatórias e os tribunais do Júri fizeram 564 sessões de julgamento. No setor de adoções foram efetivadas 377, das quais apenas uma por estrangeiros. Nos Juizados Cíveis a média de acordos é de cerca de 14 mil por mês, uma avalanche para tão poucos juízes.

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