Falsa promessa

Justiça condena Wal Mart por não cumprir propaganda

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9 de junho de 2007, 11h13

A Justiça de Osasco, zona oeste de São Paulo, condenou o hipermercado Wal Mart a devolver o que foi cobrado a mais de um cliente por conta de promoção anunciada e não cumprida. A empresa prometia cobrir as ofertas de seus concorrentes. O juiz, José Tadeu Picolo Zanoni, que apreciou o caso entendeu que ao não cumprir o prometido o supermercado agiu de forma abusiva e tem a obrigação de ressarcir o consumidor.

O advogado José Arnaldo Oliveira de Almeida foi comprar pneus atraído pela promoção e levou um anuncio do concorrente Tenda, que oferecia o produto por um preço mais baixo. O Wal Mart não quis cobrir a oferta com o argumento de que a loja concorrente não seria uma empresa varejista, mas uma atacadista.

O Wal Mart lançou a promessa de cobrir “na hora, no caixa, sem burocracia” as ofertas feitas pela concorrência. O magistrado entendeu que as restrições estabelecidas pelo hipermercado eram tantas que, praticamente, liquidavam a promessa. Entre elas estava a de que a loja concorrente deveria ficar a pelo menos dez minutos de carro do Wal Mart.

O advogado entrou com ação no Juizado Especial Cível. Solicitou indenização por danos morais e materiais. No primeiro caso, alegava que fora vítima de propaganda enganosa e passou por constrangimento ao ficar na fila, em público, esperando uma solução que, ao final, foi desfavorável a ele. No segundo, reclamou o ressarcimento do valor que deveria ser descontado da compra do pneu.

O juiz, no entanto, só acolheu o pedido de indenização por dano material. Para ele, o dano moral que resulta de propaganda enganosa ou inexata, imprecisa, é coletivo e sua reparação deve passar pelo Procon ou pelo Ministério Público. “A busca de reparação individual, como no presente caso, gera um extraordinário aumento de demanda no Judiciário e pode levar a situação de enriquecimento sem causa”, afirmou Zanoni.

No entendimento do magistrado, o tempo de espera na fila não seria fonte de danos de ordem moral. Para ele, o advogado não foi vítima de constrangimento naquela situação, porque os demais clientes não tinham qualquer razão para pensar mal do autor que, sofreu mero aborrecimento, não indenizável.

Leia a íntegra da sentença

JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE OSASCO

Processo controle 1703/06

V I S T O S.

JOSÉ ARNALDO OLIVEIRA DE ALMEIDA move ação de indenização contra WAL MART BRASIL LTDA. Alega, em resumo, que: a) a requerida promete cobrir no caixa ofertas de outros estabelecimentos; b) foi comprar pneus e mostrou a oferta impressa de um concorrente; c) negaram-se a cobrir, alegando que a outra empresa era atacadista, não varejista; d) pede o pagamento do valor da diferença de valores, a título de danos de ordem material, e mais quarenta salários mínimos a título de danos de ordem moral. Junta documentos (fls. 08/13). Foi designada audiência (fls. 14).

Não houve acordo na primeira audiência (fls. 19). A requerida juntou documentos (fls. 20/46). Não houve acordo na segunda audiência (fls. 49), tendo sido adiada a ouvida da testemunha. Foi oferecida contestação (fls. 50/62, com documentos). Os pontos mais importantes serão apreciados a seguir. Na terceira audiência (fls. 71), optou a requerida por juntar declaração assinada pela testemunha que pretendia ouvir (fls. 72).

É o relatório. D E C I D O.

O cerne da questão está na promessa feita pela requerida em cobrir “na hora, no caixa, sem burocracia” as ofertas feitas pela concorrência. A requerida argumenta, e junta fotos, que dentro da loja a promessa aparece com todas as restrições. O autor junta fotos da parte externa do estabelecimento com um grande painel informando a promessa, sem qualquer anotação da existência de restrições.

Ora, o estabelecimento precisa informar sempre as restrições que, no caso, são tantas, que praticamente liquidam a promessa. Veja-se, por exemplo, que o estabelecimento da concorrência deve estar a dez minutos de locomoção de automóvel, a contar da loja. A contar da porta de entrada da loja ou a partir da porta de entrada do estacionamento da loja? Dez minutos em dia útil, na hora do rush, ou dez minutos com trânsito favorável?

No caso, apesar da juntada de documentos demonstrando que dentro da loja as restrições estão explicadas e constam do anúncio ao público, temos que: a) as restrições não constam, nem sequer de forma resumida ou indicativa, no painel fotografado pelo autor; b) não foi demonstrado que, no dia dos fatos, existissem as restrições agora mostradas pela requerida. É o caso de presumir que, naquele dia, tais restrições não estavam à vista. Se estivessem, seria fácil para o gerente da loja providenciar uma foto datada para a juntada aos autos. Hoje em dia é enorme o número de pessoas que andam com telefone celular equipado com máquina fotográfica.

No tocante à alegação de ser o Tenda um estabelecimento atacadista, isso não procede, no presente caso. Isso porque um estabelecimento atacadista vende coisas em quantidades maiores que um estabelecimento varejista. O anúncio de fls.09 demonstra isso: lata de milho verde com dois quilos; balde de maionese com três quilos; lata de ervilhas com dois quilos. São quantidades que não combinam com o uso doméstico. Os pneus, no entanto, eram vendidos por unidade. Não se exigia a compra de cinco, dez, vinte unidades. Assim, neste caso, o Tenda era igual a um estabelecimento varejista. A restrição da requerida, assim, é abusiva e não pode prevalecer. Ela deve devolver o valor pago a mais pelo autor.

No caso dos danos de ordem moral, o autor os pede em razão: a) da propaganda enganosa; b) do constrangimento de ficar na fila do caixa esperando uma solução. Importante dizer que o dano moral decorrente de uma propaganda enganosa ou inexata, imprecisa, é coletivo. A reparação do dano deve passar pelo Procon ou pelo Ministério Público. A busca de reparação individual, como no presente caso, gera um extraordinário aumento de demanda no Judiciário e pode levar a situações de enriquecimento sem causa. A provocação do Procon e do Ministério Público para que atuem em casos assim deveria ser mais incentivada.

No tocante ao constrangimento de ficar na fila esperando por uma solução é preciso analisar melhor. O autor não ficou esperando porque seu cheque ou seu cartão de crédito tinham algum problema. Ficou esperando porque a requerida discordou do seu pedido e, como a promessa é resolver, na hora, no caixa, sem burocracia, a questão deveria ser examinada de pronto. Foi examinada e negaram razão a ele. A razão, pelo menos neste grau de jurisdição, está ficando com o autor. A lesão ao seu direito foi submetida ao Judiciário e está sendo apreciada. Essa é a regra e o autor, como advogado, sabe disso. Em caso de lesão, pedem-se as providências.

O tempo de espera na fila não é fonte de danos de ordem moral. Os demais freqüentadores não tinham qualquer razão para pensar mal do autor. Percalços assim são comuns no dia-a-dia de quem vai aos super e hipermercados. Os demais freqüentadores, também ocupados e apressados, certamente nem deram muita atenção. O autor, então, passou por mero aborrecimento, não indenizável.

Ante o exposto julgo parcialmente procedente o pedido inicial para condenar a requerida a devolver ao autor a quantia de R$ 59,88, que deverá ser monetariamente corrigida desde a data do fato (29 de abril de 2006) e acrescida de juros de mora a partir da citação. Não há condenação em custas nesta fase processual.

P.R.I.

Osasco, 18 de maio de 2007.

JOSÉ TADEU PICOLO ZANONI

Juiz de Direito

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