Servindo à mídia

Dirigente da OAB teme “estado policialesco” no país

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2 de junho de 2007, 0h00

“O Brasil caminha para o estado policialesco e sob os efeitos do chavismo”. A crítica é de Ercílio Bezerra, presidente do colégio de presidentes de Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil. O recado digire-se a postura da Polícia Federal nas últimas operações. As afirmações foram feitas nesta sexta-feira (1/6) durante a primeira reunião do colégio na gestão Cezar Britto.

Para Bezerra, que é presidente da OAB do Tocantins, os agentes dessas operações “estão contaminados e animados com os efeitos nefastos do chavismo, o que é preocupante”.

“Vige hoje a máxima de primeiro se prende, preferencialmente com prévio aviso à imprensa, para depois, se investigar e eventualmente apenar”, disse o dirigente.

Ele entende que é crescente uma onda de ações e operações policialescas que, em regra, têm como objetivo servir à mídia, para só depois se apurar eventuais desvios de condutas.

Leia discurso de Ercílio Bezerra

“Há duas décadas deixei esta bela cidade em busca de um sonho, hoje retorno com os cabelos já grisalhos, mas na qualidade de dirigente da minha Seccional Tocantinense, fato que me enche de orgulho e redobra a emoção.

Muitas coisas maravilhosas aconteceram nesta jornada, mas o que importa destacar neste momento dentre tantas, é a presença da OAB na vida de todos nós, advogados e dirigentes, que ao longo de nossas histórias, cada um a seu modo e forma, contribuiu para a formação deste edifício cívico, onde a defesa do Estado Democrático e as ações cidadãs são lemas irrefutáveis.

Hoje sem dúvida alguma, tenho que pedir vênia aos ilustres colegas, para agradecer a oportunidade oferecida pelo eminente batonier Cezar Britto, de nomear-me como Coordenador deste Colégio de Presidentes, sei muito bem que sua Excelência assim o fez imbuído muito mais no sentimento de amizade fraterna que nos cerca do que dos meus atributos administrativos e intelectuais, sabidamente diminutos, mas mesmo assim buscando superar estas deficiências, encararei o desafio certo de que aos liderados não é permitida a deserção, mas apenas e tão somente o dever de cumprir a missão posta.

Neste encontro trataremos de importantes temas, não apenas aqueles cuja natureza são meramente institucionais, os quais de forma sempre propositiva tem-se apresentado em nossos encontros, como novos rumos para a OAB e para a advocacia.

São nestas oportunidades que procuramos fazer o dever de casa, corrigirmos a rota, buscarmos enfim definir políticas e ações voltadas para a melhoria das atividades daqueles que são a razão de nossa existência enquanto entidade, os advogados.

Por outro lado, pela própria história da Ordem, forjada em ambiente de luta permanente em defesa do estado democrático, das liberdades individuais e da democracia que estes encontros, também reclamam que apresentemos nossas contribuições para a sociedade brasileira.

Não é mais possível que assistamos de forma pacífica e passiva a crescente escalada de violência que assola o País ao mesmo tempo que se vislumbra uma total falta de políticas públicas para combater este câncer social, gerando um sentimento perante à sociedade brasileira de que o aumento de salário dos deputados e senadores é muito mais importante do que qualquer outro assunto submetido à apreciação de suas excelências, que de excelentes quase sempre não têm absolutamente nada.

Quando eventualmente se propõem discutir o tema violência, preferem apresentar como medida de combate apenas a redução da maioridade penal, de forma irresponsável e visando apenas a opinião pública, pois defender a criminalização é sempre bom para os holofotes de plantão.

Esquecem, meus caros Colegas, que não é criminalizando, recolhendo ao lixão social dos cárceres, aos esgotos das cadeias, que se combate de forma efetiva a violência. Não é preciso ser nenhum cientista social, para se saber que tais medidas, as vezes paliativas, jamais terão o resultado cantado e decantado em prosa e verso, como mecanismo único de combate eficaz à violência.

Todos nos sabemos que para se combater esse mal, é preciso que se desenvolvam políticas públicas voltadas para a melhoria das condições sociais e econômicas dos cidadãos, e isso, somente poderá ocorrer pela revolução da educação, sem investimentos concretos na educação, sem politicagem ou ações meramente eleitoreiras, jamais se chegará a qualquer porto seguro.

É preciso pois que passemos por uma verdadeira revolução educacional, onde o superavit primário não supere a busca permanente do saber. Onde a simples redução da maioridade penal não seja a solução para a crise de violência. Enfim, quando todas as forças políticas, efetivamente se conscientizarem que somente pela melhoria do sistema educacional e da educação brasileira, se poderá encontrar a verdadeira saída para todas as crises.

Vivemos hoje momentos de tormentosa situação política, onde a insegurança jurídica tomou conta de todos os cidadãos. Não se sabe a que ponto o Estado pode estar interferindo nas nossas atividades, nem muito menos gozamos da mínima privacidade, seja ela familiar ou profissional.

A bisbilhotice da vida privada, não mais é própria para os artistas televisivos ou de qualquer outra mídia, todos, sem exceção, passaram a ser alvos de um grande “big brother”, o olho do grande irmão passou a velar indiscriminadamente.

Políticos (na maioria das vezes merecedores), profissionais liberais, todos foram nivelados ao mesmo patamar daqueles que têm como ofício a delinqüência, para sob quaisquer argumentos terem suas vidas devassadas por medidas policiais e/ou judiciais que arrasam vidas, destroem famílias, julgam antecipadamente, para depois, serem esquecidos por uma outra operação pirotécnica, que por sua vez, igualmente, será substituída por maia uma outra.

Não se está aqui neste espaço, a defender a impunidade ou imunidades, mas o respeito aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal, pilares do estado democrático, uma vez que nos últimos anos, tem-se visto uma crescente onda de ações e operações policialescas, que em regra tiveram como objetivo primeiro servirem à mídia, para em segundo plano buscarem apurar eventuais desvios de condutas. Vige hoje a máxima de primeiro se prende, preferencialmente com prévio aviso à imprensa, para depois, se investigar e eventualmente apenar.

Ainda não estamos vivendo num estado totalitário, mas, certamente, temos vistos sinais claros que essa chaga política ronda as ações do governo ou dos seus luminares. Parece que muitos estão contaminados e animados com os efeitos nefastos do chavismo. Isso é preocupante. E, como bem falou nosso Presidente Roberto Busato, tais idéias cheiram a mofo.

A Ordem tem sempre o dever de se indignar com qualquer notícia de corrupção, tem igualmente o dever de ser agente propositor da busca permanente pela faxina que tanto a sociedade brasileira reclama, porém, não pode se calar quando se confunde atividade policial, com medidas policialescas. Quando os fins justificam os meios. Quando os métodos superam a metodologia.

Assim, firme nestes propósitos, deverá a Ordem está em permanente estado de vigilância, para ao um só tempo defender a sociedade daqueles que teimam em fazer do público o privado, que insistem em confundir recursos públicos, com renda pessoal. Mas também a Ordem não tergiversará na vigilância do Estado Democrático de Direito, da ampla defesa e o devido processo legal.

Dentro de nossas atividades meramente corporativas, é preciso que na consulta destes lideres que hoje aqui se reúnem, busquemos elementos e mecanismos para combatermos a crescente onda de tornar o advogado dispensável.

Se o Judiciário não julga, atribui-se aos advogados a responsabilidade pelo marasmo do andamento processual, pela existência de inúmeros recursos, como se tais instrumentos legais, tivessem sido inseridos na legislação infraconstitucional pelos advogados, como se legisladores fossem.

Se alguém é preso e em seguida colocado em liberdade, atribui-se com exclusividade a atuação dos advogados, esquecendo-se que se revogada foi a medida, é porque vícios havia nela que determinavam a imediata revisão. Mas tem-se a nítida impressão que se pretende associar a atuação do advogado com a impunidade daquele que foi posto em liberdade, como se isso implicasse numa absolvição sumária e a soltura implicasse no fim da ação policial ou judicial.

Por outro lado, se algum advogado comete um deslize ético ou penal, a profissão torna mais importante que o delito, passando-se sempre a noticiar que o advogado fulano, cometera isso ou aquilo. Na imensa maioria das vezes, não tem o delito nenhuma relação com a atividade profissional, mas o que efetivamente interessa e a condição de advogado. Esquecem que somos um universo de aproximadamente 600.000 (seiscentos mil), e que pela própria dimensão e da natureza humana, não seria possível que todos jamais cometesse um deslize.

Mas neste aspecto, a Ordem ao longo de sua história tem demonstrado que não coaduna com deslize ético. Na última década promoveu uma verdadeira batalha em busca da lisura ética dos seus inscritos, puniu de forma exemplar aqueles que eventualmente esqueceram do dever ético, basta ver que o CFOAB no último triênio teve um índice de mais de noventa por cento de condenação. É o que sempre se diz, nos sabemos cortar na própria carne.

Não podemos do mesmo modo, deixar passar sem registro, a necessidade cada vez maior de se manter empunhada a bandeira da defesa da sociedade e do cidadão, consubstanciada na defesa das prerrogativas, não prerrogativas do advogado, mas para o advogado defender seus clientes e via de conseqüência à sociedade.

Há que se reconhecer e patentiar de forma definitiva a idéia de que ao se defender as prerrogativas, não se busca privilégios ou imunidades meramente classistas ou corporativistas, busca-se acima de tudo, defender a sociedade, pois não há falar em justiça sem que seus agentes, por todos os vértices estejam não imunizados, mas garantidos por instrumentos legais, que lhe possam dar guarida para com altivez e independência, atingirem com eficiência e eficácia a plena defesa. Isso sim é o pleno exercício do estado de direito. Sem prerrogativas não há defesa, sem defesa não há justiça.

Outra frente de batalha permanente para a OAB é o Exame de Ordem, pois já se tornou freqüente no Congresso Nacional, projetos visando o fim de tal mecanismo, que todos nos sabemos, demonstrou ser ao longo de sua história, ser um eficiente meio de aferição da qualidade do ensino jurídico.

Certamente que ainda vão continuar tentando extingui-lo. Mas graças ao bom senso dos nossos Presidentes, aliados aos profícuos trabalhos dos presidentes das comissões de exame de ordem nas seccionais, estamos praticamente fechando a unificação do exame, com aplicação das provas de forma terceirizada. Inúmeras vantagens surgem desta nova fase, podemos destacar o grau de profissionalização; a unificação dos temas; a transparência do certamente, dentre outras.

Mas não devemos baixar a guarda, novos desafios surgirão, mas são estes mesmos desafios que reclamam a realização desse encontro, pois novas idéias e propostas certamente surgirão, tornando cada vez mais eficiente nosso exame de ordem que já se tornou referência para outras profissões, tanto é que a cada dia também estão adotando como meio de aferição da qualidade do ensino superior nacional.

Agradeço mais uma vez ilustre Presidente Cezar a missão que me foi confiada, e concluo, fraterno colega Miguel Cançado, nosso anfitrião: vir à Goiás é sempre bom, voltar a Goiânia é melhor ainda”.

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