Vitima culpada

Pedestre negligente é culpado pelo próprio atropelamento

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31 de julho de 2007, 13h45

O pedestre que atravessa avenida em lugar impróprio e inseguro é culpado pelo acidente de que foi vítima. Ao fazer a travessia, agiu sem a cautela necessária, com imprudência e negligência. Em casos como esse, não se pode exigir do motorista responsabilidade pelo acidente e o dever de indenizar. A culpa é exclusiva da vítima.

Com esse fundamento, o Tribunal de Justiça do Paraná reformou sentença de primeira instância e afastou o dever de indenizar do espólio de Ariovaldo Pereira de Lima (Eunice Guese de Lima e Waldir de Lima) e Osvaldo Palma. A indenização favorecia José Carlos dos Santos que foi atropelado em agosto de 2000, quando tentava atravessar a avenida Mauá, em Maringá (PR).

O acidente aconteceu quando a vítima saia de sua empresa, a Metal Santos. José Carlos foi atropelado pelo Santana, de cor branca, placas AHX-2550, de propriedade de Ariovaldo Pereira de Lima e que era dirigido por Osvaldo Palma.

José Carlos entrou na Justiça com ação de reparação de danos morais e materiais. A vítima sustentou que a culpa pelo acidente foi exclusiva do motorista porque, no seu entendimento, não agiu com cautela e prudência ao deixar de fazer manobra capaz de impedir a colisão.

Os acusados sustentaram que não se pode exigir do motorista atenção ao que se passa em torno da pista. De acordo com eles, em frente ao local da colisão, havia portões, churrasqueiras e grades que impediam a visão do pedestre que atravessou a avenida correndo. A atitude da vítima, de acordo com os acusados, não permitiu a parada do veículo.

Ainda de acordo com a defesa, José Carlos dos Santos assumiu o risco da travessia da avenida e que o motorista dirigia o veículo com velocidade compatível para o local e atento às normas de trânsito.

A Indiana Seguros S/A também apelou com o argumento de que não seria responsável pelos danos morais. Para a seguradora, como não houve o pagamento de prêmio para a cobertura citada, não se poderia aceitar o entendimento de que os danos morais estão englobados no conceito de danos pessoais.

Em primeira instância, a Justiça condenou os acusados a pagar, solidariamente, R$ 7,5 mil como indenização por danos morais e R$ 1,5 mil por danos materiais, já descontado o DPVAT. O magistrado entendeu pela culpa concorrente das partes. No caso do autor, ao atravessar uma avenida de grande porte, em local onde não existe passagem própria para pedestres e, no caso do motorista, em agir com negligência e imperícia ao não diminuir a velocidade do veículo ao ter, presumidamente, avistado o autor. O juiz ainda condenou a seguradora a reembolsar os segurados nos valores decorrentes da sentença até o limite da apólice.

A 9.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por votação unânime, aceitou o recurso dos acusados para reconhecer a culpa exclusiva da vítima e julgou improcedente a ação de indenização por danos morais e matérias. A turma julgadora ainda condenou a vítima ao pagamento das custas processuais e honorários, da ação primária, arbitrados em R$ 1 mil e os acusados a arcar com as custas e os honorários, da ação secundária, estabelecidas em R$ 700,00.

Leia a íntegra da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL Nº. 414451-4

3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE MARINGÁ

APELANTE 1: ESPÓLIO DE ARIOVALDO PEREIRA DE LIMA E OUTROS

APELANTE 2: INDIANA SEGUROS S.A.

REC. ADESIVO: JOSÉ CARLOS DOS SANTOS

APELADOS: OS MESMOS

RELATOR: DESEMBARGADOR EUGÊNIO ACHILLE GRANDINETTI

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES

DE ATROPELAMENTO. PEDESTRE QUE ATRAVESSA DE INOPINO A PISTA, SEM A CAUTELA NECESSÁRIA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA CARACTERIZADA. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. CONDENAÇÃO DO AUTOR AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DA LIDE PRIMÁRIA (R$ 1.000,00 – HUM MIL REAIS) E CONDENAÇÃO DOS REQUERIDOS AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ORIUNDOS DA LIDE SECUNDÁRIA (R$ 700,00 – SETECENTOS REAIS), SENDO AMBAS AS CONDENAÇÕES CORRIGIDAS MONETARIAMENTE PELO INPC DO IBGE A PARTIR DESTA DATA.

RECURSO ADESIVO DE JOSÉ CARLOS DOS SANTOS PROVIDO.

RECURSO DE APELAÇÃO DE INDIANA SEGUROS S.A. PREJUDICADO.

RECURSO DE APELAÇÃO DE ESPÓLIO DE ARIOVALDO PEREIRA DE LIMA E OUTROS PREJUDICADO.

1 – RELATÓRIO

José Carlos dos Santos propôs Ação de Reparação de Danos Materiais e Morais em face do Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima, Eunice Guesi de Lima, Waldir Lima e Osvaldo Palma, em virtude do acidente automobilístico ocorrido em 23/08/2000, que culminou no atropelamento do autor.

Às fls. 65 a 67, os requeridos requereram denunciação da lide à Indiana Seguros S.A., a qual restou deferida pelo MM. Juiz a quo à fl. 69.

Assim sendo, ao final, a lide primária foi julgada parcialmente procedente para o fim de:


a) declarar que as partes litigantes concorreram igualmente para a ocorrência do acidente;

b) condenar os requeridos ao pagamento de danos morais no montante de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais);

c) condenar os requeridos ao pagamento de danos materiais no importe de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), ou seja, R$ 3.000,00 (três mil reais), descontados a indenização recebida a título de DPVAT, no valor de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais).

Ademais, sobre a quantia arbitrada no item “b”, incidirá correção monetária e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da presente data, bem como sobre a quantia arbitrada no item “c”, incidirá correção monetária e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês deste 21/09/2000, data do documento de fl. 19.

Com base no artigo 21 do Código de Processo Civil, não foram as partes condenadas ao pagamento de honorários advocatícios, sendo condenadas somente ao pagamento das custas processuais proporcionais de 50% (cinqüenta por cento).

Quanto à lide secundária, esta foi julgada procedente para condenar a Indiana Seguros S.A. à reembolsar os litisdenunciantes, nos termos da apólice de fl. 68.

Condenou, ainda, a litisdenunciada a pagar as custas processuais referentes à denunciação da lide e os honorários advocatícios do procurador dos réus-denunciantes, os quais foram arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da indenização por danos morais acima estabelecido, eis que esta foi a controvérsia da lide secundária. Tudo em conformidade com o que dispõe o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.

Inconformados com a sentença, Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima, Eunice Guesi de Lima, Waldir Lima e Osvaldo Palma, interpuseram recurso de apelação (fls. 178 a 187), requerendo a procedência do recurso, sustentando, para tanto, culpa exclusiva da vítima. Assim, alega que não se pode exigir do condutor do veículo, atenção quanto ao que se passa em torno da pista de rolamento, de modo que em frente ao local da colisão, existiam portões, churrasqueiras, grades etc., o que impedia a visão da pessoa do autor, que “saiu correndo” para atravessar a pista de rolamento, vindo de encontro com o carro, não havendo tempo suficiente para parar o veículo.

Do mesmo modo, Indiana Seguros S.A., inconformada com os fundamentos da sentença a quo, interpôs recurso de apelação (fls. 192 a 200), aduzindo, em síntese, (1) que não deve prosperar a versão acerca de culpa concorrente às partes, vez que resta evidente a culpa exclusiva do autor que assumiu o risco da travessia da avenida e a ausência de culpa do réu que conduzia seu veículo com velocidade permitida para o local e atento às normas de trânsito. Ademais, (2) requer, ainda, a reforma no tocante aos juros de mora aplicados à razão de 1% (um por cento), vez que, de 21/09/2000 até 12/01/2003, deve ser aplicado 0,5% (meio por cento) ao mês, de acordo com o antigo Código Civil.

Finalmente, (3) aduz a apelante que caso seja mantida a condenação, seja reduzido o quantum à título de danos morais em no máximo 5 (cinco) salários mínimos.

Quanto à lide secundária, (4) aduz a seguradora apelante, que inexiste responsabilidade desta no tocante aos danos morais, vez que não houve o pagamento de prêmio para a cobertura citada, não se podendo, também, comungar do entendimento de que os danos morais estão englobados no conceito de danos pessoais. No mais, diz que em tendo aceitado a denunciação da lide, mesmo que de forma parcial, não está obrigada ao pagamento de honorários da lide secundária.

Ao seu turno, José Carlos dos Santos, interpôs recurso de apelação adesivo (fls. 210 a 221), aduzindo, em síntese: a) culpa exclusiva do condutor do veículo, que não observou o dever de cautela e prudência ao não efetuar manobra capaz para impedir a colisão; b) que são devidos os valores à título de lucros cessantes, estes compreendidos no período do seu afastamento (23/08/2000 a 25/10/2000), seja em caráter de pró labore (R$ 500,00) e queda do faturamento da empresa em 58% (cinqüenta e oito por cento) – (R$ 5.250,00); c) que deve ser excluído do montante indenizatório o desconto de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais) a título de seguro obrigatório – DPVAT, de modo que não se pode descontar do autor o seguro obrigatório eis que custeado pelo mesmo; d) Finalmente, no que diz respeito à condenação a título de danos morais, em restando provada a culpa exclusiva dos requeridos, deverá a indenização se dar pelo valor equivalente a 50 (cinqüenta) salários mínimos, ou seja, R$ 15.000,00 (quinze mil reais), com exclusão do pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono dos apelados e do pagamento das custas processuais.

Recursos tempestivos, preparados (fls. 188, 201 e 222) e respondidos (fls. 203 a 209, fls. 225 a 232 e fls. 233 a 245).


É o relatório.

2 – VOTO E SUA MOTIVAÇÃO

Extrai-se do conteúdo cognitivo dos autos que, em 23 de agosto de 2000, por volta das 15:30 horas, o autor saiu de sua empresa Metal Santos, situada à Avenida Mauá, nº 2.021, na cidade de Maringá, Paraná, pretendendo fazer a travessia da rua, da direita para esquerda (no sentido do tráfego de veículos), quando ocorreu a colisão deste com o veículo Santana, cor branco, placa AHX-2550, de propriedade do 1º requerido (Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima) e conduzido pelo 2º requerido (Osvaldo Palma).

O infortúnio acima referenciado provocou a queda do autor e as conseqüentes lesões descritas no Boletim de Ocorrência de Acidente de Trânsito (fl. 18). Posto isto, vem o autor, em decorrência do acidente acima referido, pleitear reparação de danos morais e materiais em desfavor dos requeridos.

Em síntese, através das provas carreadas aos autos, concluiu o MM. Juiz a quo (fls. 156 a 163), pela culpa concorrente das partes. No caso do autor, ao atravessar uma avenida de grande porte, em local onde não existe passagem própria para pedestres e no caso do condutor do veículo, em agir com negligência e imperícia ao não diminuir a velocidade do veículo ao ter, presumidamente, avistado o autor.

Dessa forma, condenou os requeridos ao pagamento dos danos morais e materiais ao autor, na proporção de 50% (cinqüenta por cento) para cada um, compensando-se os honorários advocatícios e rateando as custas processuais em 50% (cinqüenta por cento) para cada parte.

No mais, tendo em vista à denunciação da lide à Indiana Seguros S.A., julgou procedente o pedido reconhecendo o direito de regresso dos requeridos e para condenar à litisdenunciada à reembolsar os valores decorrentes da sentença até o limite da apólice de fl. 68.

Pois bem. Cumpre-nos, antes de tecermos qualquer manifestação acerca das demais insurgências trazidas nos recursos de apelação e adesivo, ponderarmos a questão acerca da culpa pela colisão.

A priori, tanto os requeridos quanto à seguradora apelante, discordam da sentença a quo com intuito de reconhecer a culpa como sendo exclusiva do autor. Assim sendo, sustentam que não se poderia exigir do condutor do veículo, atenção à tudo o que se passa em torno da pista de rolamento e que existiam portões, grades, churrasqueiras em frente ao estabelecimento do autor, o que impedia a visão da pessoa do autor, que ao atravessar a pista, veio de encontro com o carro, não havendo tempo suficiente para parar o veículo. No mesmo sentido, aduz a seguradora, que o autor assumiu o risco da travessia da avenida e que o 2º requerido conduzia o veículo com velocidade compatível para o local e atento às normas de trânsito.

Por outro lado, aduz o autor, que a culpa pela colisão é exclusiva do 2º requerido, vez que, este não observou o dever de cautela e prudência ao não efetuar manobra capaz para impedir a colisão.

De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, dispõe o artigo 69, da seguinte forma:

“Art. 69. Para cruzar a pista de rolamento o pedestre tomará precauções de segurança, levando em conta, principalmente, a visibilidade, a distância e a velocidade dos veículos, utilizando sempre as faixas ou passagens a ele destinadas sempre que estas existirem nem distância de até cinqüenta metros dele, observadas as seguintes disposições:

I – onde não houver faixa ou passagem, o cruzamento da via deverá ser feito em sentido perpendicular ao de seu eixo;

II – para atravessar uma passagem sinalizada para pedestres ou delimitada por marcas sobre a pista:

a) onde houver foco de pedestres, obedecer às indicações da luzes;

b) onde não houver foco de pedestres, aguardar que o semáforo ou o agente de trânsito interrompa o fluxo de veículos;

III – nas interseções e em suas proximidades, onde não existam faixas de travessia, os pedestres devem atravessar a via na continuação da calçada, observadas as seguintes normas:

a) não deverão adentrar na pista sem antes se certificar de que podem fazê-lo sem obstruir o trânsito de veículos;

b) uma vez iniciada a travessia de uma pista, os pedestres não deverão aumentar o seu percurso, demorar-se ou parar sobre ela sem necessidade.” (grifo nosso)

Entretanto, pelo que se denota dos autos, tais disposições e/ou medidas preventivas não foram tomadas pelo autor, vindo este a dar causa ao acidente, consoante demonstrado adiante.

Conforme se denota do boletim de ocorrência, fl. 18, o veículo conduzido pelo requerido trafegava pela Avenida Mauá, procedente da Rua Pombal e sentido à Rua Vidal de Negreiros, quando defronte ao numeral 2.021, colheu o autor que cruzara da direita para a esquerda.

Constata-se, ainda, no croqui de fl. 18, que o veículo do autor procedeu uma frenagem de 17,60 (dezessete metros e sessenta centímetros) no local da colisão, com vistas a evitar o colhimento do autor.


Posto isto, diante de todos os elementos trazidos nos autos, bem como diante das provas testemunhais, não há como dar procedência aos argumentos sustentados pelo MM. Juiz a quo, no que pertine à parcela de culpa do condutor do veículo, sob a alegação de que “deveria o segundo réu tê-lo avistado e desde logo diminuído sua velocidade para evitar a colisão.” (fl. 160)

Para tanto, corroboram com a tese sustentada pelos requeridos e também pela seguradora apelante, os seguintes fatos. Vejamos:

Transitava o autor na sua mão de direção, imprimindo velocidade compatível com a avenida (60 KM/h) e de acordo com a frenagem constante no croqui de fl. 18, tentou evitar a colisão ao avistar o autor, ora pedestre.

Destaque-se que o boletim de ocorrência foi confeccionado não só com base na declaração do condutor, mas de acordo com dados técnicos colhidos no local, os quais são suficientes para definir a marca de frenagem do veículo, dentre outros elementos.

Anote-se, também, que as tabelas de frenagem trazidas pelas partes, (fls. 04 e 64) estão em consonância com os elementos dos autos, com vistas a comprovarem que o condutor do veículo encontrava-se em velocidade compatível com o local, ou seja, 60 KM/h (sessenta quilômetros por hora).

Infere-se, também, à fl. 140, ofício do SETRAN atestando que a velocidade máxima no local da colisão era de 60 Km/h.

O juízo que se faz, deste modo, é de que o requerido vinha seguindo pela pista esquerda em velocidade compatível com o local quando a vítima, tentando atravessar a mesma, de forma inadvertida e sem a devida cautela e atenção necessária, deu causa à colisão.

Resta claro, assim, que a culpa pelo acidente foi da própria vítima, que agiu de forma negligente iniciando a travessia quando a avenida não oferecia condições para uma travessia segura.

Discorrendo sobre o assunto, CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, in “Responsabilidade Civil”, 2ª ed. Forense, fls. 83, anota:

“Na etiologia da responsabilidade civil, como visto, são presentes três elementos ditos essenciais na doutrina subjetiva, porque sem eles não se configura: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta; um dano; e o nexo de causalidade entre uma e outro. Não basta que o agente aja procedido contra direito, isto é, não se define a responsabilidade pelo fato de converter um ‘erro de conduta’; não basta que a vítima sofra um ‘dano’, que é elemento objetivo do dever de indenizar, pois se não houver um prejuízo a conduta antijurídica não gera obrigação ressarcitória. É necessário se estabeleça uma relação de causalidade entre a antijuridicidade da ação e o mal causado, ou, na feliz expressão de DEMOGUE, ‘é preciso esteja certo que, sem esse fato, o dano não teria acontecido. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a certas regras; é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria.” – (grifo nosso)

O cerne da questão diz respeito á culpabilidade pela ocorrência do acidente, sendo que os requeridos imputam a culpabilidade pelo acidente ao autor, este, por sua vez, imputa a conduta imprudente ao condutor do veículo.

Observe-se o seu depoimento de fls. 129 e 130:

“(…) e quando encerrou a conversa passou a fazer a travessia da Av. Mauá, olhando para sua esquerda antes de iniciar o cruzamento; o carro mais próximo que o depoente avistou era um veículo Gol “escuro” e estava a uma distância aproximada de trinta a quarenta metros do depoente; como havia espaço suficiente, o depoente passou a fazer o cruzamento e quando já havia ultrapassado a primeira faixa (havia duas faixas para dois carros seguirem no mesmo sentido) e estava quase finalizando a travessia, estando próximo ao “canteiro central”, foi atropelado pelo veículo Santana; (…) o local onde o depoente atravessou não tinha faixa de segurança para pedestre. (…)” – (grifo nosso)

No mais, infere-se do depoimento do condutor do veículo às fls. 131 e 132:

“(…) o depoente conduzia o veículo Santana (táxi) pertencente ao falecido Sr. Ariovaldo Pereira de Lima, sendo que o depoente havia saído da Rua Pedro Taques e entrado na Av. Mauá, seguindo sentido centro-rodoviária; a loja Metal Santos fica próxima do Jornal O Diário; em frente a loja Metal Santos, havia grades, portões e churrasqueiras em cima da calçada; o autor surgiu de trás de um desses equipamentos e foi cruzar a Av. Mauá; o depoente freou e acionou a buzina, mas não conseguiu evitar a colisão; (…)” – (grifo nosso)

Assim sendo, não há como impor a culpa pelo acidente ao condutor do veículo, ora apelado, pois, além dos depoimentos constantes nos autos, há que se consignar que o autor mantém comércio no local da colisão há longa data, sabedor que o fluxo de veículos é intenso no local, entretanto, como consignado pelo MM. Juiz a quo, “realizou, também, travessia de risco, uma vez que o fez avistando um carro vindo a certa distância em sua direção (“Gol escuro”), isto é, o autor se arriscou ao atravessar a avenida antes deste passar.” (fl. 161)


Assim, não se pode esperar que o motorista evite o acidente quando o pedestre adentra na pista de uma hora para outra.

Com as devidas adaptações, é o entendimento jurisprudencial:

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – RESPONSABILIDADE CIVIL – ATROPELAMENTO DE CICLISTA – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA CARACTERIZADA – DEVER DE INDENIZAR AFASTADO RECURSO DESPROVIDO.”

(TJ/PR, Apelação Cível nº 347677-7, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. JOSÉ AUGUSTO GOMES ANICETO, julgada em 01/02/2007) – (grifo nosso).

“Apelação Cível. Indenização. Acidente de trânsito. Atropelamento. Rodovia. Manobra defensiva da motorista. Hesitação no momento de transpor a rodovia. Culpa exclusiva da vítima. Recurso desprovido. I – Não caracteriza culpa do condutor de veículo que, ao proceder à manobra defensiva, acaba por atropelar transeunte que hesita na travessia da pista. II – Ainda que a demanda trâmite sob o benefício da assistência judiciária gratuita, há de se condenar o vencido ao pagamento do ônus sucumbencial, porém, albergado pela condição suspensiva descrita no art. 12 da Lei 1060/50. III – Recurso que não merece provimento.”

(TJ/PR, Apelação Cível nº 364691-1, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. TUFI MARON FILHO, julgada em 23/11/2006) – (grifo nosso).

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – ATROPELAMENTO – RESPONSABILIDADE – INTELIGÊNCIA DO ART. 186 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO – AFASTAMENTO – CULPA EXCLUSIVA DA VITIMA – TRAVESSIA EM LOCAL IMPRÓPRIO – SENTENÇA CONFIRMADA. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, cuja base se fixa na demonstração da culpa do requerido, cumpre ao Autor desincumbir-se do ônus da prova, especialmente ao que dispõe o art. 186 do Código Civil brasileiro. A responsabilidade do condutor do veículo requer a prova da imprudência, negligência ou imperícia; à mingua de tais provas, não pode ser chancelada a culpa, máxime quando há conduta inadvertida da vitima na travessia da avenida, em local impróprio para pedestre. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.”

(TJ/PR, Apelação Cível nº 357017-4, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN, julgada em 05/10/2006) – (grifo nosso).

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – RESPONSABILIDADE CIVIL – ATROPELAMENTO – PEDESTRE QUE ATRAVESSA DE INOPINO A PISTA, SEM A CAUTELA NECESSÁRIA – CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA CARACTERIZADA – DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. RECURSO DESPROVIDO”

(TJ/PR, Apelação Cível nº 336514-8, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. JOSÉ AUGOSTO GOMES ANICETO, julgada em 03/08/2006) – (grifo nosso).

Finalmente, há que ser considerado, ainda, a reportagem retirada do Jornal O Diário (estabelecimento que fica em frente à loja do autor), onde, ao mencionar o acidente, colheu também a declaração do filho do autor, Sr. Marcelo Santos:

“(…) O acidente aconteceu por volta das 16h30. De acordo com Marcelo Santos, filho de “Bigode”, o empresário teria atravessado displicentemente a avenida sem perceber a aproximação de um automóvel. (…)” – (fl. 63) – (grifo nosso)

Em face de todos estes elementos, conclui-se que não há provas concludentes que apontem no sentido de que o motorista tenha sido o responsável pelo acidente, apontando o conjunto probatório totalmente em outra direção, ou seja, para culpa exclusiva da vítima.

Neste sentido, em reconhecendo culpa exclusiva da vítima, restam prejudicadas as análises do recurso de apelação interposto por Indiana Seguros S.A. e o recurso adesivo interposto por Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima e outros, excluindo o dever de indenizar os danos decorrentes do atropelamento.

Desta forma, em sendo atribuída culpa exclusiva da vítima, voto no sentido de dar provimento ao recurso de apelação interposto por Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima, Eunice Guesi de Lima, Waldir Lima e Osvaldo Palma, com vistas à reconhecer a culpa exclusiva da vítima e via de conseqüência, julgar improcedente a demanda, restando, ademais, prejudicada a análise da denunciação da lide à seguradora denunciada Indiana Seguros S.A. e do recurso adesivo interposto por José Carlos dos Santos.

Assim sendo, condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios devido ao patrono dos requeridos, estes fixados no importe de R$ 1.000,00 (hum mil reais), tendo levado em consideração o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, tudo em conformidade com o que dispõem os §§ 3º e 4º, ambos previstos do artigo 20, do Código de Processo Civil, corrigidos monetariamente a partir desta data pelo INPC do IBGE.

No tocante à lide secundária, em restando improcedente a demanda, condeno os requeridos denunciantes ao pagamento das custas processuais oriundas da denunciação da lide e honorários advocatícios devidos ao patrono da seguradora, estes fixados no importe de R$ 700,00 (setecentos reais), com fulcro nas alíneas “a”, “b” e “c”, ambas previstas no § 3º, do artigo 20, do Código de Processo Civil, corrigidos monetariamente a partir desta data pelo INPC do IBGE.

Neste sentido a jurisprudência:

“Vencedor na ação originária – principal – o réu denunciante deve responder pelos honorários advocatícios do denunciado, a serem arbitrados com moderação.”

(Ac. unân. da 1ª Câm. do TAMG de 22/12/82, na apelação 22.034, rel. juiz Sálvio de Figueiredo Teixeira; RJTAMG 15/291) – (grifo nosso)

3 – DISPOSITIVO

Ante ao exposto, acordam os julgadores integrantes da 9.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso de apelação interposto por Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima, Eunice Guesi de Lima, Waldir Lima e Osvaldo Palma, com vistas à reconhecer a culpa exclusiva da vítima e via de conseqüência, julgar improcedente a demanda, restando, ademais, prejudicada a análise da denunciação da lide à seguradora denunciada Indiana Seguros S.A. e do recurso adesivo interposto por José Carlos dos Santos, para condenar o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios da lide primária, estes fixados no importe de R$ 1.000,00 (hum mil reais) corrigidos monetariamente pelo INPC do IBGE a partir desta data e também para condenar os requeridos denunciantes, isto é, Espólio de Ariovaldo Pereira de Lima, Eunice Guesi de Lima, Waldir de Lima e Osvaldo Palma ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios oriundos da lide secundária, estes fixados no importe de R$ 700,00 (setecentos reais), corrigidos monetariamente pelo INPC do IBGE a partir desta data, tudo em consonância com as demais disposições constantes no corpo deste acórdão.

Participaram do julgamento o Senhor Desembargador TUFI MARON FILHO, presidente com voto, e o Senhor Desembargador EDVINO BOCHNIA.

Curitiba, 05 de julho de 2007.

EUGÊNIO ACHILLE GRANDINETTI

Relator

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