Perda do patrimônio

É inconstitucional confiscar juros creditados no FGTS

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29 de julho de 2007, 0h00

Os trabalhadores demitidos por justa causa, nos termos do artigo 7º, da Lei 5.107/66, tiveram confiscados o valor da correção monetária e dos juros creditados, pelo tempo do serviço que prestou à empresa em que foi demitido por justa causa, a favor do FGTS. Como adverte o ministro José Delgado, do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no Resp 258.039/PR), a correção monetária “não se constitui em um plus; não é uma penalidade, sendo, tão-somente, a reposição do valor real da moeda, corroído pela inflação. Portanto, independe de culpa das partes litigantes.”

Desta forma, a correção monetária do saldo de FGTS é utilizada para evitar a perda do valor de face do depósito efetuado pelo empregador, pois a inflação corrói o dinheiro, o patrimônio, do trabalhador. Portanto, a correção não se traduz em ganho, mas, sim, repise-se, evita a perda do valor depositado no FGTS, do patrimônio.

Por sua vez, os juros representam um ganho do trabalhador pelo fato de não poder dispor da moeda, depositado em sua conta de FGTS, no momento que melhor lhe aprouver, ou seja, não possui liqüidez para ser utilizado a seu bel prazer, mas tão-somente nas hipóteses legais.

Nesse sentido é a conceituação de juros por Keynes, John Maynard (A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. São Paulo: Atlas. 1992, pg. 137), ipsis litteris:

“Deveria ser óbvio que a taxa de juros não pode ser um rendimento da poupança ou da espera como tal. Quando alguém acumula suas economia sob a forma de dinheiro líqüido, não ganha juro, embora economize tanto quanto antes. Pelo contrário, a simples definição da taxa de juros diz-nos, literalmente, que ela é a recompensa da renúncia à liqüidez por um período determinado, pois a taxa juros não é, em sim, outra coisa senão inverso da relação existente entre uma soma de dinheiro e o que se pode obter desistindo, por um período determinado, do poder de comando da moeda em troca de uma dívida.”

Ademais, para alguns economistas os juros podem ser considerados também como preço pago pelo uso do capital.

A perda da correção monetária e dos juros remuneratórios consistem em perda de patrimônio do trabalhador, de sua propriedade, com efeito de confisco, na medida que há perda do valor de face, corroída pela inflação (correção monetária) e também pelo fato de perder os juros, pela impossibilidade de liqüidez imediata do capital, que nesse ínterim é utilizado pelo Fundo, constituindo, assim, em enriquecimento sem causa do citado Fundo.

Podemos observar que a atualização monetária é debitada na conta do FGTS do trabalhador para creditar a conta do Fundo, em última análise do governo.

Assim, o artigo 7º, da Lei 5.107/66, é inconstitucional frente ao artigos 141, caput, e parágrafos 16, 31; 145, 146, todos da Magna Carta de 1946.

A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946, determinava a Garantia (artigo 141, parágrafo 16) e a Inviolabilidade do Direito de Propriedade (artigo 141, caput), não haveria pena de confisco (artigo 141, parágrafo 31). Por sua vez, a Ordem Econômica e Social tinha como princípios fundamentais a justiça social, conciliando a liberdade de iniciativa com a valorização do trabalho humano, assegurando a existência digna. O trabalho era considerado obrigação social (artigo 145). A União somente por lei especial poderia intervir no domínio econômico, observando o interesse público, entretanto limitado pelos Direitos Fundamentais assegurados na Constituição (artigo 146).

Note-se também que as Constituições de 1967, 1988, também garantem o direito de propriedade; eventual efeito de confisco somente poderia ser determinado por normas constitucionais e não infraconstitucional. Com efeito, o citado dispositivo, não foi recepcionado por essas Constituições.

Evidencia-se, portanto, que o artigo 7º, da Lei 5.107/66 é inconstitucional, pois fere o direito de propriedade como garantia de direito fundamental (o não confisco do patrimônio – propriedade), contraria os princípios da justiça social, da valorização do trabalho humano, da existência digna, da não intervenção na ordem econômica em prejuízo dos direitos fundamentais.

A propriedade privada cumpre sua função social ao garantir a subsistência individual e familiar, valorizando o trabalho e a existência digna. Entretanto, a norma em comento ao determinar a perda da correção monetária e juros, descumpre sua função social, eis que retira o patrimônio mínimo do trabalhador, sua indenização a fim de garantir sua subsistência, no período de desemprego.

O confisco é a retirada compulsória da propriedade privada pelo Estado, sem indenização. Na espécie, trata-se de forma velada, indireta, de confisco, que ocorre com a perda da correção monetária e dos juros do saldo da conta vinculada de FGTS, na medida que há perda do patrimônio mínimo de subsistência do trabalhador, eis que ao perder o emprego, o trabalhador também perde uma parcela de seu FGTS.

Observe-se que a Constituição de 1946 proibia a pena de confisco, portanto o trabalhador demitido por justa causa não poderia ser penalizado com a perda de correção monetária e juros de sua conta de FGTS, de efeito confiscatório.

Devido a alta inflação nas décadas de 70 e 80, a perda da correção monetária e dos juros em alguns casos representaram mais de 80% do valor do saldo do FGTS.

Os economistas informam que a inflação criada pelo governo é uma forma de tributação, que em regra onera os mais pobres, através do imposto inflacionário.

Concluímos, portanto, que o artigo 7°, da Lei 5.107/66 é inconstitucional, frente a Constituição de 1946, e também não foi recepcionado pelas Constituições de 1967, 1988, pois além de ter penalizado o trabalhador com o efeito de confisco, referente a perda da correção monetária e dos juros, pelo período em que trabalhou na empresa, utilizaram o imposto inflacionário também com efeito de confisco, e ainda sem a devida limitação pelos Direitos Fundamentais como a garantia e a inviolabilidade ao direito de propriedade, vedação ao confisco em sentido amplo, existência digna (dignidade da pessoa humana), e da justiça social, empobrecendo o trabalhador e gerando o enriquecimento sem causa do “Fundo” (governo).

Observamos que a Lei 8036/90 revogou o artigo 7º, da Lei 5.107/66.

Dessarte, os trabalhadores demitidos por justa causa entre julho de 1977 e 10 de maio de 1990 (devido a prescrição trintenária do FGTS), podem estar buscando o Poder Judiciário em face da Caixa Econômica Federal objetivando assegurar a devida atualização de sua conta de FGTS, pelo período que laborou na empresa em que fora demitido.

A Defensoria Pública Da União em São Paulo, se instada por pessoas hipossuficientes economicamente, ajuizará a devida ação ordinária.

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