Clamor das empresas

Obras públicas: editais restritivos não evitam acidentes

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24 de julho de 2007, 0h00

Os investimentos em obras de infra-estrutura, em especial saneamento e transportes, anunciados pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, compõem parte importante do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). Posso afirmar, com experiência de mais de 40 anos como dirigente de uma média empresa de construção civil do Nordeste, que os objetivos esperados estão longe de serem alcançados.

A contribuição que o setor pode dar para que o desenvolvimento do PIB seja igual ou superior a 5% será utópica se não houver uma mudança imediata do atual modelo de gestão das obras públicas. Isso é mais importante até do que a própria ampliação dos recursos financeiros. Apenas para lembrar, no início dos anos 60, todos os engenheiros – inclusive eu – sonhavam com uma nomeação para o Departamento Nacional de Obras Rodoviárias (DNER), a fim de trabalharem na execução do Plano Qüinqüenal de Obras Rodoviárias (PQOR).

Tive então a oportunidade de percorrer a RIO-BAHIA, durante a sua construção. Foram mais de 1.500 km, alguns em trechos extremamente adversos, executados em menos de quatro anos. Em contrapartida, no modelo atual, a duplicação de apenas 13 km da BR 101 em Sergipe, iniciada há mais de 10 anos, está longe de ser concluída. Lembro outros planos muito bem sucedidos, hoje inexistentes, como o Planasa para o saneamento, o Nacional de Habitação etc.

Por essas e outras razões o Sinduscon/SE, que atualmente presido, tem levado a vários fóruns, inclusive a Secretaria de Planejamento do Governo da República, propostas de um novo modelo, que contempla:

1) Lei específica relativa a licitações de obras públicas em substituição a Lei 8.666: Como a concepção inicial de combate à corrupção está totalmente desvirtuada, defendemos entre outras medidas:

a) Separação das obras em dois grupos: as de baixa e as de alta complexidade técnica, independentemente do valor. Para as primeiras, editais simplificados, exigências técnicas e financeiras mínimas e obrigatória inversão de fases: primeiro, abertura dos preços propostos; depois, apresentação da documentação, apenas do vencedor. Neste caso as exigências devem ser compatíveis com a baixa complexidade técnica e não com o vulto da obra e obrigado a aceitar consórcio de no mínimo três empresas. A fórmula seria altamente agilizadora e moralizadora dos procedimentos licitatórios;

b) Novo critério de inexeqüibilidade;

c) Punições rigorosas para contratados e contratantes que não cumprirem as condições estabelecidas na licitação e no contrato.

2) Democratização das obras públicas — Convocação da absoluta maioria das empresas de construção, hoje alijadas dos processos licitatórios por meio de “Editais Criativos”, a se integrarem no PAC. Para tanto, todas as obras tecnicamente divisíveis seriam obrigatoriamente licitadas em lotes, grandes, médios e pequenos.

Por que não licitar pontes, obras de drenagem, paisagismo etc. separadamente, em lugar de um pacote, com uma única empresa vencedora, que subcontrata as menores “matando”, com preços baixíssimos, em relação ao que o Governo paga? Isso, além de tudo, ainda compromete o pagamento dos impostos, encargos sociais e trabalhistas, medicina, saúde e segurança do trabalho, sem falar na qualidade. Por que não licitar a transposição do Rio São Francisco em 60 lotes, ao invés dos 06 anunciados?

As grandes empresas, não mais que 50, num universo superior a 100.000, estão excessivamente estocadas de contratos. A grande maioria tem que se contentar com o papel secundário de subempreiteiros ou “gatos”. Ainda assim as multinacionais brasileiras da construção, titulares de vários contratos de altíssima complexidade técnica e milhões de dólares, dispersam energia e capital humano na captação de obras menores pelo interior do Brasil, o que fazem agrupando várias pequenas para tornar grande, no conjunto, o objeto da licitação. Com isso, os “editais criativos” e as exigências absurdas excluem automaticamente as pequenas e médias empresas, abrindo caminho para que as grandes construtoras encareçam as obras em cerca de 30%.

A prática mostra que as exigências absurdas, o aleijamento das empresas médias e pequenas dos processos licitatórios e a falta de competição só trazem prejuízos à Nação. Sabemos que editais restritivos, até nas obras mais complexas, não evitam acidentes e sim projetos executivos bem elaborados e fiscalização adequada. As pequenas e médias empresas perderam nos últimos 20 anos, por falta de contratos com preços justos, a função de preparação de mestres, engenheiros etc., como as escolinhas e times de base fazem com os jogadores de futebol. Daí a grande falta dos profissionais da Construção Civil que hoje é sentida principalmente pelas grandes empresas.

3) Orçamento de obras públicas — uniformização dos critérios com o cálculo do preço básico, contemplando custo direto, indireto, impostos e taxas, todos calculados com transparência e o LBO (Lucro Bruto da Obra) ao invés do BDI que tantas controvérsias tem gerado.

Ainda no modelo proposto: os órgãos federais sucateados poderiam contratar a gestão das obras a executar com os estaduais correspondentes. Por exemplo, os DERs estão melhor estruturados e bastante ociosos por falta de recursos. A eles poderiam, mediante contrato de gestão, ser delegadas as obras do DNIT.

Outro ponto fundamental seria restabelecer planos de obras que garantam, após a contratação, os recursos necessários à conclusão no prazo contratual, evitando-se a dependência anual de emendas e o conseqüente envelhecimento de obras inacabadas, outro sorvedouro de recursos. Hoje, obras que poderiam ser realizadas em um a dois anos, se arrastam por dez a vinte com enormes prejuízos à Nação. Fala-se em mais de 2000 obras paralisadas, muitas iniciadas sem nenhuma necessidade ou prioridade, com gastos inúteis de bilhões de reais.

O Sinduscon-SE ([email protected]) disponibiliza suas propostas e aceita discuti-las com todos que desejarem conhecê-las.

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