Simples brincadeira

Simples vaia a trabalhador por colegas não dá indenização

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21 de julho de 2007, 0h00

Trabalhador vaiado não tem direito de receber indenização por danos morais. O entendimento é da 10ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas). Os juízes negaram, por unanimidade, o recurso de um empregado da empresa Comércio de Bebidas Paulínia. Ele pretendia receber indenização por dano moral porque foi vaiado pelos colegas.

“O propalado dano a direito personalíssimo proveniente de situações vexatórias, nas quais o trabalhador se sinta humilhado e desrespeitado intimamente deve vir acompanhado de prova robusta”, ressaltou a juíza relatora, Elency Pereira Neves. Para ela, é indispensável que a prova evidencie a presença de todos os fatores que configurem o direito à indenização: a ação ou omissão, o dano, o nexo de causalidade entre ambos e o dolo ou culpa do agente.

O trabalhador pediu indenização porque, num churrasco de confraternização entre os empregados, um grupo de colegas, motivado pela entrega de um prêmio a uma equipe de vendas, passou a vaiar os integrantes da equipe a qual ele pertencia.

Ele e seus colegas de equipe teriam se sentido humilhados e foram embora da festa. De acordo com o autor da reclamação trabalhista, a perda do prêmio por sua equipe ocorreu por causa de um erro na apuração das metas de vendas, cometido pela empresa.

O trabalhador alegou, por fim, que o episódio “impediu o curso natural de sua vida profissional e pessoal, levando-o a um descontrole de natureza psicológica causado pelo trauma do vexame enfrentado”.

A relatora considerou que a prova oral produzida no processo não comprovou a situação vexatória alegada pelo trabalhador. A primeira testemunha afirmou que esteve no churrasco e que não houve desavenças, mas uma certa “gozação” dos participantes.

“Não houve qualquer comportamento impróprio dos demais empregados no churrasco de confraternização, seja em manifestação por palavras, seja em atos e gestos capazes de criar situação vexatória e constranger o trabalhador, incutindo sentimentos de humilhação ou inferioridade, de forma a afetar a sua dignidade”, concluiu a juíza. Para ela, o reclamante pode ter experimentado um sentimento de frustração pessoal, pela perda do prêmio — um automóvel — mas não por atitudes de humilhação dos colegas.

Processo 1.068-2004-122-15-00-1

Leia a decisão

PROCESSO Nº 01068-2004-122-15-00-1 RO

RECORRENTE: LUCIANO ROCHA

RECORRIDO: COMÉRCIO DE BEBIDAS PAULÍNIA LTDA

ORIGEM: VARA DO TRABALHO DE SUMARÉ

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL – RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR POR ATOS DE SEUS EMPREGADOS E PREPOSTOS: O propalado dano a direito personalíssimo proveniente de situações vexatórias, nas quais o trabalhador se sinta humilhado e desrespeitado intimamente deve vir acompanhado de prova robusta que evidencie a configuração dos pressupostos autorizadores da responsabilidade aquiliana, quais sejam: a ação ou omissão, o dano, o nexo de causalidade entre ambos e o dolo ou culpa do agente.

Da r. sentença de fls. 244/247, que julgou procedentes, em parte, os pedidos, recorre o reclamante, através das razões de fls. 249/267, sustentando fazer jus à reparação por danos morais, em função do desvio de conduta de outros empregados da empresa que, motivados pela entrega de certo prêmio a outra equipe de vendas em um churrasco de confraternização, passaram a vaiar os integrantes da equipe do autor, que se sentiram humilhados e tiveram de abandonar o local.

Prossegue, afirmando que o erro na apuração das metas de vendas e a correspondente perda do prêmio se deu por culpa exclusiva da reclamada, apontando, por fim, que o episódio impediu o curso natural de sua vida profissional e pessoal, levando-o a um descontrole de natureza psicológica causado pelo trauma do vexame enfrentado. Aduz, ainda, fazer jus à indenização por quilômetro rodado, já que utilizava seu próprio veículo para o trabalho, sem qualquer ajuda de custo. Pugna pelo provimento do apelo.

Contra-razões às fls. 269/271, pela manutenção do julgado originário.

Isento de preparo.

Ausente parecer da D. Procuradoria.

É o relatório.

VOTO:

Conheço do recurso ordinário.

INDENIZAÇÃO – DANOS MORAIS – RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR POR ATOS DE SEUS EMPREGADOS E PREPOSTOS – NECESSIDADE DE PROVA ROBUSTA:

De início, cumpre consignar que tanto a nova ordem jurídica relacionada à responsabilidade civil como a anterior definiam que a culpa daquele que praticou o dano acarretaria a responsabilidade objetiva da pessoa sob cuja direção se encontravam, pouco importando, assim, ter essa pessoa infringido ou não o dever normal de vigilância.

Assim é, já que a responsabilidade civil do empregador por ato causado por seu empregado, dentro do estabelecimento – ou até mesmo fora dele, em circunstâncias especiais – no exercício do trabalho que lhes competir, ou em função dele, deixa de constituir hipótese de responsabilidade civil subjetiva, segundo entendimento ultrapassado da súmula 341 do STF, para se transformar em uma hipótese legal de responsabilidade civil objetiva, consoante o disposto no artigo 932 do novo Código Civil, in verbis:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;

II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

IV – os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

V – os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

De especial relevo, por sinal, a regra constante do artigo 933 do mesmo estatuto, in verbis:

Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Todavia, é certo que o ordenamento jurídico civil, sensível à essa situação, assegura, àquele que reparou o dano de outrem, direito regressivo de reembolso da soma indenizatória que despendeu, conforme o disposto no artigo 934 do mesmo estatuto, in verbis:

Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.

Após fixada essa premissa, no que toca à responsabilidade objetiva do empregador, passa-se à análise da ocorrência do dano moral e respectivo valor indenizatório arbitrado na origem.

Com efeito, na relação de emprego, empregado e empregador encontram-se submetidos ao cumprimento de certas obrigações, sendo incumbência do primeiro prestar trabalho não-eventual em proveito do segundo, a quem fica subordinado juridicamente, mediante pagamento de uma contraprestação. Cabe, ainda, ao empregador, dentre outros deveres, assegurar a todos os seus empregados meio ambiente de trabalho sadio, posto que tal condição constitui direito subjetivo de todo trabalhador, reconhecido, por sinal, pelo própria ordem constitucional que inclui, entre outras garantias, não só o direito de o trabalhador ter reduzido os riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art.7º, XXII), mas também assegurou ao sistema de saúde, dentre outras atribuições, colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho, e executar ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador (art.200, II e VIII).

Esse extenso rol de proteção à saúde do trabalhador, adotado pela nova ordem constitucional de 88, leva em conta o reconhecimento de que o modelo econômico de produção instituído pelas empresas – em especial nos países em desenvolvimento, forjado pela globalização e sob o rótulo de modernização – propiciam competitividade exacerbada, através do que se pode chamar do binômio máximo de produtividade x com o mínimo de dispêndio (grifou-se), na busca desenfreada pelo lucro, gerando excessivo traço de impessoalidade e desunião entre os próprios trabalhadores da empresa e, por conseqüência, a utilização de procedimentos moralmente reprováveis, o que concorre para que o ambiente de trabalho, ao invés de imperar a harmonia e solidariedade entre todos os empregados, seja palco de diversos conflitos, contribuindo, por fim, no desencadeamento de uma série de distúrbios ao trabalhador, que afetam a saúde e a integridade física ou psíquica do trabalhador.

Relevante salientar, ainda, que a configuração do dano moral no âmbito do Direito do Trabalho – ou em função dele – pressupõe a violação à honra pessoal do empregado e o dano deve ser proveniente de situações vexatórias, nas quais o trabalhador se sinta humilhado, desrespeitado intimamente. Imperioso, pois, que o propalado dano a direito personalíssimo venha acompanhado de prova robusta que evidencie a configuração dos pressupostos autorizadores da responsabilidade aquiliana, quais sejam: a ação ou omissão, o dano, o nexo de causalidade entre ambos e o dolo ou culpa do agente.

Na hipótese, em apreço, ao contrário do articulado nas razões recursais, não restou comprovado pela prova oral a situação vexatória apontada, senão vejamos:

1ª Testemunha, Fernando Morília, fls. 191/192:

“….que o depoente esteve no churrasco de entrega do referido prêmio, que todas as equipes compareceram no referido churrasco sendo que foi declarado vencedor outra equipe, que não houve desavenças no churrasco mas uma certa “gozação” dos participantes…”

2ª testemunha, Marcelo de Andrade Lacerda, fls. 192/193:

“…que o depoente foi demitido antes da premiação “mata baratas”…”

Como se vê, não houve qualquer comportamento impróprio dos demais empregados no churrasco de confraternização, seja em manifestação por palavras, atos e gestos capazes de criar situação vexatória e constranger o trabalhador, incutindo sentimentos de humilhação, inferioridade, de forma a afetar à sua dignidade.

Frustração pessoal, contudo, pode ter ocorrido pela perda do prêmio (automóvel), mas não por atitudes de humilhação dos demais colegas de emprego a direito personalíssimo seu. Nada a modificar.

REEMBOLSO DE DESPESAS – INDENIZAÇÃO QUILÔMETRO RODADO:

O recorrente pretende obter indenização em decorrência da utilização de veículo de sua propriedade para a prestação dos serviços.

De início, cumpre consignar que há evidente contradição fática entre o trajeto a ser percorrido apontado na peça de ingresso (250 Km/dia) e a afirmação em depoimento pessoal (fl. 190), onde confessou que “rodava em torno de 50/60 Km por dia…”, situação essa que, de início, já compromete a pretensão.

Ainda que assim não fosse, o autor não demonstrou a existência de ajuste entre as partes nesse sentido, a justificar o deferimento da pretensão, sendo relevante notar, mais uma vez, que a cláusula coletiva transcrita na inicial (40ª – fl. 08) não guarda qualquer correspondência com as normas coletivas carreadas aos autos (fls. 103/156).

Por fim, se o reclamante utilizava veículo próprio para o desempenho de suas funções, fazia-o por iniciativa própria, razão pela qual a reclamada não estava obrigado a ressarcir/indenizar as despesas efetuadas. Nada a modificar.

Pelo exposto, decido conhecer do recurso ordinário do reclamante e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos da fundamentação supra.

ELENCY PEREIRA NEVES

JUÍZA RELATORA

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