Avaliação responsável

Juiz trabalhista precisa de cautela ao reconhecer dano moral

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19 de julho de 2007, 0h00

Não é nova a noção de que a dignidade da pessoa humana deve ser preservada e que para isso são necessários instrumentos que garantam a real possibilidade de dar efetividade às normas de proteção. O Código de Hamurabi (1690 a.C.) é apontado como sendo, possivelmente, o primeiro instrumento a consagrar um rol de direitos comuns a todos os homens, tais como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade etc. Desde então, diversas outras codificações se ocuparam do tema.

No Brasil, a Constituição de 1988 é um marco. Promulgada em meio ao processo de abertura política em um país recém saído dos anos de chumbo da ditadura, tem clara orientação democrática. É possível identificar no texto da Carta que o legislador constituinte preocupou-se com a proteção dos direitos da personalidade, talvez movido pelo medo de ver se repetirem cenas vividas nos vinte anos antecedentes.

O artigo 1º, da Constituição, em seu inciso III estabelece que a dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil. Já o artigo 4º, estabelece em seu inciso II que as relações internacionais da República Federativa do Brasil regem-se pelo princípio da prevalência dos direitos humanos. O inciso X do artigo 5º, também da CF, estabelece que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, sendo assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Trata-se, sem dúvida alguma, de um avanço louvável a preocupação do legislador constituinte no que se refere à proteção desses direitos, invioláveis e irrenunciáveis por sua própria natureza. É indiscutível, também, que a sociedade já não mais se cala diante da sua violação ou simples ameaça de violação. E é assim que deve se comportar uma sociedade composta de seres humanos cientes da sua importância.

Na Justiça do Trabalho, tem-se visto o ajuizamento de ações que têm por objeto a reparação moral. Com certa freqüência, os fundamentos da pretensão são sérios e a violação facilmente demonstrada. É o que se dá, por exemplo, com ações ajuizadas em face de uma conhecida instituição bancária que, com a finalidade de desobedecer a uma decisão que proibia a dispensa dos empregados no município do Rio de Janeiro, resolveu transferi-los para a cidade de Niterói para que, assim, pudesse rescindir os contratos de trabalho em curso.

Ocorre que a tentativa foi frustrada com nova decisão que reconheceu que a transferência se deu com a finalidade de burlar aquela primeira e os empregados (gerentes, caixas, etc) passaram, então, a cumprir o horário de trabalho rasgando velhos papéis em um lugar apelidado de “porão”, sem a menor condição de higiene e salubridade, ao lado de insetos e até mesmo de ratos. Reconhecendo a humilhação de que foram vítimas esses empregados, a Justiça do Trabalho vem condenando aquela instituição no pagamento de indenizações por dano moral.

É compreensível que as pessoas, no nosso caso o trabalhador, busque a reparação de direitos que entende serem lesados. Contudo, nem sempre é cabível a reparação moral. Muitas vezes a própria lei estabelece a forma de reparar o mal sofrido. Como exemplo, podemos citar a violação, pelo empregador, da obrigação de conceder o intervalo mínimo de uma hora para repouso e alimentação. Em que pese já ter visto ações com pedido de condenação do empregador no pagamento de indenização por dano moral com base nisso, e sem que nenhum outro prejuízo fosse alegado, entendo que reparação, nesse caso, está prevista na própria lei, conforme estabelece o parágrafo 4º do artigo 71 da CLT.

É preciso ter cautela e os juízes têm grande responsabilidade, na medida em que devem saber avaliar a pretensão deduzida e reconhecer a existência de dano moral a ser reparado. Com o tempo, a sociedade atingirá o estado de homeostase esperado e passará a utilizar-se do direito de ação, nesse particular, como meio de defesa e não de ataque.

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