Despesa com funeral de funcionário não pode ser interpretada como dívida de trabalho. Devido às circunstâncias, o ato deve ser reconhecido como empréstimo emergencial, em um caso de natureza civil e não trabalhista. Com esse entendimento, o Tribunal Superior do Trabalho não autorizou a empresa Rodoviário União, de Brasília, a descontar das verbas rescisórias as despesas do funeral de um funcionário, vítima de um acidente.
De acordo com o ministro Vieira de Melo Filho, o desconto não tem respaldo legal. “As despesas sequer podem ser enquadradas como adiantamento salarial, pois, a exemplo do salário, o adiantamento pressupõe contrapartida de prestação de serviço, o que, obviamente, não poderia ocorrer em face do falecimento do empregado.”
O motorista morreu, em 1998, num acidente na BR-040, próximo a Luiziânia (GO). Ele dirigia uma carreta a serviço da empresa. Como não houve acerto de suas verbas rescisórias, a viúva ajuizou ação. Ela pedia o pagamento do saldo de salário, 13º, FGTS, férias vencidas, horas extras e providências para o recebimento do seguro de vida. Segundo a viúva, as verbas não foram pagas após a morte do trabalhador.
A empresa afirmou que o valor devido a título de verbas rescisórias era de R$ 1,3 mil. Entretanto, teria antecipado as despesas, num total de R$ 2,2 mil, com o funeral do empregado e de seu filho – que viajava junto com o pai e também morreu no acidente. O restante do valor, R$ 1,4 mil, a transportadora dispensou a viúva do pagamento.
A 13ª Vara do Trabalho de Brasília acatou parcialmente os pedidos da viúva. E rejeitou a pretensão da empresa de descontar das verbas rescisórias as despesas com o funeral. De acordo com a primeira instância, a situação não se enquadrava em nenhuma hipótese legal.
Insistindo na validade dos descontos, a transportadora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho de Brasília. Alegou que não foi aplicado no salário, o artigo 462 da CLT, que veda ao empregador a possibilidade de descontar valores fora das situações expressamente previstas, mas sim nas verbas rescisórias, que teriam caráter indenizatório.
Na contestação, a transportadora alegou ter tido uma atitude “humanitária”. “Se não houvesse o adiantamento dos valores, a família do ex-empregado não teria condições financeiras de ofertar-lhe um enterro digno”. A empresa questionou, ainda, que, “se mantida a orientação da lei, jamais os empregadores se tornarão solidários com os empregados e familiares nos momentos de tragédia”. Para a Rodoviário União, essa atitude conduziria as relações laborais a um “nefasto individualismo egoísta e desumano, que não deve ser incentivado por decisões como a da Vara do Trabalho”.
O TRT-DF acolheu os argumentos da empresa e modificou a sentença. Ao permitiu a dedução das despesas, entendeu que caberia à viúva provar que foram feitas por outra pessoa que não a empresa “ou, pelo menos, que tenha recebido tal benefício a título gratuito”.
O espólio do trabalhador recorreu ao TST. O ministro Vieira de Melo votou favoravelmente ao recurso. O voto foi seguido pelos demais integrantes da 1ª Turma.
“Abstraindo-se o aspecto humanitário da atitude da empresa e a obrigação moral da família assistida de solver as despesas, tem-se que resta caracterizado, no caso, empréstimo emergencial feito à família do empregado falecido, não havendo relação desta dívida com o contrato de trabalho, sendo injustificada, portanto, a possibilidade do desconto, mormente sem autorização”, declarou Vieira de Melo.
Por fim, o ministro caracterizou o caso como de natureza civil, e não trabalhista. “Assim, a via de ressarcimento a ser buscada deve ser outra que não a compensação com as verbas trabalhistas”, concluiu.
RR-647978/2000.9
TST exclui descontos de despesas com funeral nas verbas rescisórias
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento a recurso de revista movido pela viúva de um motorista de carretas e restabeleceu sentença de primeiro grau que não autorizou o desconto das despesas feitas com o funeral feita pela Rodoviário União Ltda., de Brasília (DF), das verbas rescisórias devidas ao empregado, vítima de um acidente. O relator, ministro Vieira de Melo Filho, ressaltou que o desconto não tem respaldo legal, e que as despesas “sequer podem ser enquadradas como adiantamento salarial, pois, a exemplo do salário, o adiantamento pressupõe contrapartida da prestação de serviço, o que, obviamente, não poderia ocorrer em face do falecimento do empregado.”
O motorista morreu num acidente na BR-040 em 1998, próximo a Luiziânia (GO), quando dirigia uma carreta a serviço da Rodoviário União. Como não houve acerto posterior, a viúva ajuizou a reclamação trabalhista, onde pedia o pagamento do saldo de salário, 13º, FGTS, férias vencidas e proporcionais com abono, horas extras e providências para o recebimento do seguro de vida que, de acordo com a inicial, não foram pagos após a morte do trabalhador.
Na contestação, a transportadora afirmou que o valor devido a título de verbas rescisórias era de R$ 1.305, mas que teria antecipado as despesas, num total de R$ 2.200, com o funeral do empregado e de seu filho – que viajava com o pai na carreta e morreu no mesmo acidente. O resultado, portanto, era um saldo devedor de R$ 1.432, que deveria ser ressarcido à empresa pelos herdeiros do motorista, mas do qual os dispensava. A 13ª Vara do Trabalho de Brasília deferiu parcialmente os pedidos formulados pela viúva e rejeitou a pretensão da empresa de descontar das verbas rescisórias as despesas com funeral, já que não se enquadravam em nenhuma hipótese legal.
A empresa recorreu ao TRT/DF insistindo na validade dos descontos, alegando que não foram feitos no salário – o artigo 462 da CLT veda ao empregador a possibilidade de descontar valores fora das situações expressamente previstas – e sim nas verbas rescisórias, que teriam caráter indenizatório.
Nas razões de recurso, a transportadora disse ter tido uma atitude “humanitária”, pois, se não houvesse o adiantamento, “a família do ex-empregado não teria condições financeiras de ofertar-lhe um enterro digno”. Prosseguindo, questionou que, “a ser mantida essa orientação, jamais os empregadores se tornarão solidários com os empregados e familiares nos momentos de tragédia”, o que “conduziria as relações laborais a um nefasto individualismo egoísta e desumano, que não deve ser incentivado por decisões como a da Vara do Trabalho”. O TRT/DF modificou a sentença e permitiu a dedução das despesas, por entender que caberia à viúva provar que foram feitas por outra pessoa que não a empresa “ou, pelo menos, que tenha recebido tal benefício a título gratuito”.
Foi a vez, então de o espólio do trabalhador recorrer ao TST. O ministro Vieira de Melo votou pelo conhecimento e provimento do recurso, e foi seguido pelos demais integrantes da Primeira Turma. “Abstraindo-se o aspecto humanitário da atitude da empresa e a obrigação moral da família assistida de solver as despesas, tem-se que resta caracterizado, no caso, empréstimo emergencial feito à família do empregado falecido, não havendo relação desta dívida com o contrato de trabalho, sendo injustificada, portanto, a possibilidade do desconto, mormente sem autorização”, registrou o relator. Foi, portanto, de operação de natureza civil, e não trabalhista. “Assim, a via de ressarcimento a ser buscada deve ser outra que não a compensação com as verbas trabalhistas”, concluiu. (RR-647978/2000.9)