Seguro de vida

Seguradora deve restabelecer contratos com consumidores

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12 de julho de 2007, 16h32

A 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais mandou uma seguradora restabelecer os contratos com os consumidores de Juiz de Fora (MG), cancelados em 7 de setembro de 2006. Caso não cumpra a liminar, a empresa terá de pagar multa diária de R$ 1 mil.

Segundo a desembargadora Evangelina Castilho Duarte, a liminar “visa garantir a integridade patrimonial de um grande grupo de consumidores, que está sendo atingido em razão de supostas abusividades praticadas pela fornecedora, direito que prevalece sobre o interesse meramente econômico da sua revogação”.

De acordo com ela, a liminar deve ser mantida para os segurados que não optaram por nenhuma das novas modalidades de contrato de seguro de vida e acidentes pessoais, propostas pela seguradora. Já para os que aceitaram um novo contrato, a decisão não terá validade. “Se o consumidor se manifestou pela renovação contratual, aderindo a outras cláusulas, deve ser respeitada a sua escolha”, afirmou.

A ação foi apresentada pelo Ministério Público. O órgão alegou que vários segurados receberam, em setembro de 2006, uma carta da seguradora, informando que os contratos não seriam renovados. A carta oferecia migração para um novo contrato, que estipulava elevado reajuste dos prêmios por faixa etária e ainda retirava a cobertura por invalidez permanente total por doença. O MP alegou que a seguradora excluiu os contratos em decisão unilateral.

Com base no Código de Defesa do Consumidor, o juiz da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG) atendeu o pedido do MP, determinando que a seguradora restabelecesse todos os contratos não renovados.

Ao recorrer ao TJ mineiro, a seguradora argumentou que a liminar iria prejudicá-la, gerando a desestabilização econômica das apólices. Observou também que ofertou aos consumidores novas opções de contratação e que alguns as aceitaram.

Para a relatora, se o pedido do Ministério Público for julgado procedente no final do processo, “haverá o reconhecimento da abusividade contratual, podendo os segurados que já aderiram a novos contratos pleitearem o retorno à situação anterior”.

Leia a decisão:

AGRAVO 1.0145.06.340974-5/001 – COMARCA DE JUIZ DE FORA – AGRAVANTE(S): PORTO SEGURO CIA SEGUR GERAIS – AGRAVADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS – RELATORA: EXMª. SRª. DESª. EVANGELINA CASTILHO DUARTE

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PARCIAL PROVIMENTO, VENCIDO EM PARTE O SEGUNDO VOGAL.

Belo Horizonte, 12 de junho de 2007.

DESª. EVANGELINA CASTILHO DUARTE – Relatora

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

A SRª. DESª. EVANGELINA CASTILHO DUARTE:

VOTO

Tratam os autos de agravo de instrumento contra decisão que deferiu antecipação de tutela pleiteada pelo Agravado nos autos da ação civil que move contra a Agravante, determinando que esta se abstenha de cancelar os contratos de seguro de vida e por invalidez, se abstenha de notificar os segurados a respeito da rescisão contratual, restabeleça os contratos cancelados em 07 de setembro de 2006, mantendo-os como foram firmados, e oficie os segurados no sentido de comunicar-lhes a respeito do aludido restabelecimento, tudo sob pena de multa diária de R$1.000,00.

A Agravante alega que a medida concedida implica em desrespeito à legislação securitária e às normas setoriais expedidas pela SUSEP, impondo-lhe gravíssimos prejuízos, já que gera a desestabilização econômica das apólices.

Observa que ofertou aos consumidores novas opções de contratação, com condições semelhantes, tendo alguns deles se manifestado favoravelmente neste sentido, aderindo a uma das opções oferecidas.

Enfatiza que não houve aquiescência expressa de todos os consumidores no sentido de restabelecer os termos do contrato cancelado e que não se configurou o periculum in mora a justificar a urgência da medida concedida.

Requereu a concessão do efeito suspensivo ao presente Agravo e o seu provimento para reformar a r. decisão recorrida, suspendendo a medida deferida.

Subsidiariamente, requereu a manifestação deste e. Tribunal a respeito da limitação do alcance da medida concedida, que deve se restringir aos segurados que manifestarem expressamente a sua vontade e que não tenham aderido a uma das novas apólices.

De conformidade com o art. 82 do CDC, incumbe ao Ministério Público, à União, aos Estados, aos Municípios, ao Distrito Federal, às entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, e às associações legalmente constituídas há pelo menos um ano, através de ação civil pública, defender interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

Interesses difusos são aqueles cujos titulares são pessoas indeterminadas, mas ligadas por circunstâncias de fato, conforme conceito expresso no art. 81, parágrafo único, inciso I do Código de Defesa do Consumidor.


Já os direitos coletivos, conforme definição do art. 81, parágrafo único, inciso II do CDC são aqueles transindividuais de natureza indivisível, de que são titulares grupo, categoria ou classe de pessoas unidas por um mesmo liame jurídico.

Por outro lado, são individuais homogêneos, conforme definição do art. 81, parágrafo único, inciso III do CDC, aqueles direitos que possuam uma origem comum.

Finalmente, cumpre esclarecer que direitos indisponíveis, por definição, são aqueles dos quais não se pode dispor, ou seja, aqueles que não têm conteúdo econômico determinado, não admitindo renúncia ou transação. Estes são personalíssimos e fundamentais, abrangendo a liberdade, a educação, a saúde, a cultura, a honra, o nome e a intimidade.

Para o deslinde da questão, importa determinar a natureza dos direitos pleiteados, esclarecendo-se que devem ser caracterizados como direitos meta-individuais, para que seja aferida a legitimidade do Agravado para pleiteá-los em juízo.

Indispensável a delimitação do litígio, o pedido e a causa de pedir, para a correta caracterização dos interesses transindividuais, apurando-se sua indivisibilidade, operação essencial para a distinção entre as suas espécies, se difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

No caso em exame, o Agravado pretende o restabelecimento de situação contratual unilateralmente cancelada pela Agravante, que impôs aos segurados novas formas contratuais que contêm cláusulas prejudiciais se analisadas em detrimento das outrora vigentes.

Trata-se, portanto, de defesa de tutela de interesses individuais homogêneos, definidos pelo art. 81, parágrafo único, III do CDC. São direitos que possuem uma origem comum. Casos como tais, entretanto, exigem a determinação dos sujeitos lesados.

Determinados os pedidos e a causa de pedir a fixar a natureza transindividual da tutela pretendida, emerge a legitimidade do Agravado para figurar no pólo ativo da demanda, expressa no art. 82, incisos I, III e IV da Lei 8.078/90.

Saliente-se que, a antecipação de tutela, nos termos do art. 273, CPC, tem cabimento quando estiverem presentes a verossimilhança das alegações e a prova inequívoca dos fatos invocados pela parte, convencendo-se o Juiz da conveniência do deferimento.

Estando o MM. Juiz “a quo” convencido da presença dos requisitos legais, pode deferir a medida pleiteada.

Saliente-se que, no caso em exame, busca-se o restabelecimento de contrato cancelado pela Agravante de forma supostamente arbitrária, causando prejuízos ao segurados, os quais deverão ser reparados.

Neste aspecto, verifica-se que, caso sejam julgados procedentes os pedidos, os efeitos da decisão retroagirão, alcançando diversas relações contratuais em andamento e relações extintas, já que alguns consumidores optaram pela renovação contratual pelos novos termos unilateralmente impostos pela Agravante.

Verifica-se, então, que tais efeitos são muito mais drásticos do que o efeito do suposto julgamento desfavorável, qual seja, o efetivo cancelamento do contrato outrora firmado pelos consumidores, a imposição de novas cláusulas contratuais e a cobrança das parcelas devidas e não pagas em razão da antecipação da tutela.

Observa-se que sequer restou demonstrado o desequilíbrio econômico supostamente gerado pela manutenção dos contratos e o suposto comprometimento da atividade da Agravante.

Acrescente-se que, na presente hipótese, é prudente manter a decisão agravada, decidindo em desfavor da Agravante, vez que o Magistrado a quo se encontra em poder do todas as provas para a análise da questão.

Nesse sentido já se manifestou este e. Tribunal:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – TUTELA ANTECIPADA – PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO ADSTRITA A LEVANTAMENTO DE DEPÓSITO JUDICIAL – ARTIGO 588, CPC – REQUISITOS DEMONSTRADOS – DEFERIMENTO CONTRA O INSS – POSSIBILIDADE – LEI 9.494/97 – MEDIDA DE CUNHO SATISFATIVO. O parágrafo terceiro do artigo 273 do CPC, determina que a execução da tutela antecipada, no que couber, seja procedida conforme os incisos II e III do artigo 588 deste mesmo Diploma Processual, ao que a prestação de caução subsume-se a pedidos de levantamento de depósito em dinheiro. Presente a prova da verossimilhança do direito alegado e do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, impõe-se seja mantida decisão que deferiu pedido de antecipação da tutela em primeiro grau de análise. É cabível o deferimento de tutela antecipada, nos moldes do artigo 273 do CPC, contra o Instituto Nacional do Seguro Social, em ação que vise o recebimento de benefício previdenciário, uma vez que não se contraria as normas estabelecidas pela Lei 9.494/97, sendo o cunho satisfativo um dos efeitos da sentença a ser proferida”. (TAMG – AI. n. 359.643-2 – Terceira Câmara Cível – Relatora: Juíza Teresa Cristina da Cunha Peixoto – DJ 08.05.2002).


Ademais, a medida concedida visa a garantir a integridade patrimonial de um grande grupo de consumidores, que está sendo atingida em razão de supostas abusividades praticadas pela fornecedora, direito que prevalece sobre o interesse meramente econômico da sua revogação.

Frisa-se que, mesmo não tendo sido analisado o mérito da questão, é possível concluir que a medida antecipatória deferida não gera danos materiais expressivos à Agravante, que, caso seja liberada da referida obrigação, poderá cobrar pelos prêmios não pagos e pelas importâncias pagas a menor, conforme retro mencionado.

Por fim, com relação à inaplicabilidade da referida medida aos consumidores que optaram pela renovação contratual pelos novos termos sugeridos pela Agravante, tem-se que razão lhe assiste, devendo ser limitado o alcance da medida antecipatória àqueles segurados que não fizeram opção por nenhuma das novas modalidades contratuais.

Ora, se o consumidor se manifestou pela renovação contratual, aderindo a outras cláusulas, deve ser respeitada a sua escolha, presumindo-se, a princípio, que esta lhe é vantajosa.

Entretanto, se ao final da presente demanda, o pedido for julgado procedente, haverá o reconhecimento de abusividade contratual, podendo os referidos segurados pleitear o retorno à situação anterior, caso concluam pela pertinência de tal medida.

DIANTE DO EXPOSTO, dou parcial provimento ao agravo de instrumento apresentado por PORTO SEGURO – CIA. DE SEGUROS GERAIS, reformando a decisão recorrida apenas para limitar os seus efeitos aos contratos não renovados.

Custas recursais, pela Agravante, por ter decaído da maior parte de seu pedido.

O SR. DES. CABRAL DA SILVA:

VOTO

Acompanho a Relatora.

O SR. DES. ROBERTO BORGES DE OLIVEIRA:

VOTO

Peço vênia para divergir do voto proferido pela Eminente Relatora, no que pertine à concessão da tutela antecipada.

A antecipação da tutela jurisdicional, como é sabido, pressupõe uma pretensão guarnecida por prova inequívoca, suficiente a demonstrar a verossimilhança da alegação, além do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Note-se que tais requisitos são cumulativos, estando a concessão da tutela antecipatória vinculada à comprovação dos mesmos. Faz-se necessária, portanto, uma rigorosa e exata verificação de seus pressupostos, quando da análise de seu deferimento.

Importante ressaltar as palavras do ilustre doutrinador Calmon de Passos, no que tange ao requisito da prova inequívoca:

“… Havendo prova inequívoca, autorizadora da antecipação, há possibilidade de exame do mérito. As provas por acaso ainda passíveis de produção, se vierem a realizar-se, revestir-se-ão, necessariamente, em face daquela inequivocidade, do caráter de irrelevantes ou impertinentes. Se ainda há provas a produzir e são elas relevantes e pertinentes, inexiste a prova inequívoca autorizadora da antecipação.” (CALMON DE PASSOS, J.J. Inovações no CPC. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 12.)

No mesmo norte, o entendimento jurisprudencial:

A) “ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – ART. 273, CPC – REQUISITOS – AUSÊNCIA – NÃO CABIMENTO. Para a concessão da tutela antecipada são necessários, além dos requisitos inerentes à medida cautelar, aqueles outros, denominados de ‘prova inequívoca’ e ‘verossimilhança’, bem assim o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Não demonstrados de plano, ausente base legal para o deferimento da pretensão.” (TJMG – AI – 1.0024.06.279423-5/001 – 1ª CC – Rel. Des Geraldo Augusto – j. 17-04-2007).”

B) “EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA – NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA – RECURSO IMPROVIDO. AUSENTES os REQUISITOS autorizativos da TUTELA ANTECIPADA e evidente a necessidade de prova dos fatos aduzidos, deve ser mantida a r. decisão agravada.

Com efeito, da análise das peças processuais acostadas ao instrumento recursal, parece-me que a vexata quaestio está a envolver matéria complexa, havendo necessidade, ainda, da produção de prova dos fatos constitutivos do direito invocado na inicial, que justifiquem a outorga da procuração que implicará na assinatura da escritura definitiva do imóvel.” (TJMG – AI – 1.0433.06.194841-3-001 – 14ª CC – Rel Des. Hilda Teixeira da Costa – j.15-03-2007)”.

Com tais fundamentos, entendo, data venia, que na hipótese em tela a tutela antecipada deve ser indeferida.

Isto porque, considerando que a controvérsia dos autos paira sobre a possibilidade de se manter em vigência um contrato de seguro de vida firmado entre as partes, não vislumbro a existência dos elementos autorizadores da pretensão antecipatória.

Com efeito, nas ações em que se debate pedidos de restabelecimento de contratos de seguro de vida está ausente o elemento prova inequívoca eis que a questão é complexa, polêmica e que demanda interpretação pormenorizada, que não pode ocorrer de forma precipitada.

Noutro giro, quanto ao perigo de dano, alega o Agravado que vários segurados não teriam a renovação dos seus contratos de Seguro de Vida, nos quais contribuíram por anos para a sua manutenção, deixando de receber as apólices pactuadas, se porventura ocorrer algum infortúnio. Ainda, a manutenção da tutela, dispensaria o Judiciário de julgar centenas de demandas individuais.

Ocorre que o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação deve ser aferido sempre pelo juízo de probabilidade e jamais pelo simples e genérico juízo amplo de possibilidade. O denominado receio de dano deve, pois ser objetivamente fundado.

Com efeito, a parte Agravada amparou-se em alegações genéricas, cuja ocorrência está condicionada a um evento futuro e incerto, o que a afasta a incidência e a caracterização do requisito de perigo de dano.

Pelo exposto, dou provimento ao Agravo e, em conseqüência, revogo a liminar de tutela antecipada concedida.

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