Derrama injusta

Carga tributária só reduz com mudança em cálculo do PIB

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12 de julho de 2007, 0h00

No início de dezembro, um cálculo do Procurador-Geral da Fazenda Nacional estarreceu. Luiz Inácio Adams declarou que o Estado nacional cobra na Justiça e em instâncias administrativas “aproximadamente um trilhão de reais das empresas nacionais em impostos e contribuições”. Ao calcular todo o montante em litígio, ou seja, adicionando-se aquilo que estados e municípios também cobram do contribuinte, a soma equipara-se ao PIB brasileiro, nada modesto, R$ 1,93 trilhão.

A situação tributária atual ainda aponta mais fatores que fazem o tesouro do estado suspirar de esperança. De um total de 125 mil empresas que aderiram ao Refis, primeiro programa nacional de recuperação fiscal de empresas, cerca de 100 mil já foram excluídas. Outras 100 mil estão excluídas do Paes, criado em 2003. O Refis III, ou Paex, criado em 2006 pela Medida Provisória 303, apesar de sua curta duração – apenas 2 meses – representou a última esperança para cerca de 250 mil contribuintes para quitação de seus débitos com a Receita Federal e INSS.

Com o pagamento dos débitos, a Receita arrecadou R$ 1,9 bilhão, em agosto e setembro de 2006, e a Previdência, R$ 472 milhões.

A grande quantidade de empresas excluídas destes parcelamentos (cerca de 160 mil até o momento, do Refis e do Paes) chama a atenção para um problema: todo o débito destes devedores está consolidado. Foram apresentadas garantias para a fazenda pública, os devedores foram obrigados a desistirem das discussões judiciais e a exclusão faz com que os valores não pagos sejam, imediatamente, cobrados por meio de execuções fiscais. Serão propostas ações, ou simplesmente se dará continuidade às ações suspensas por força dos parcelamentos.

Assim, a situação equivale à derrama praticada por Portugal contra os mineiros e que foi o motivo bastante para os primeiros movimentos de luta pela independência de nosso país.

A derrama estava prevista desde os primeiros códigos jurídicos de constituição do Império Português. Era um instrumento que garantia certa quantia mínima para os cofres do imperador, capaz de fazer frente à necessária expansão do império, dos negócios e de sua defesa. Motivos nobres na opinião dos letrados daquela época. A arrecadação mínima estava estabelecida em 20% do montante de qualquer transação em seu território. Quando esses 20% eram insuficientes para atingir determinada quantia bruta (calculada regionalmente), cabia ao imperador determinar a derrama para conseguir seus objetivos de estado. Foi assim em Minas Gerais, quando do declínio das rendas da mineração. A derrama foi extremamente injusta e gerou os movimentos de libertação.

A derrama na época de Lula talvez tenha fundamentos tão nobres quanto os do império português. O Partido dos Trabalhadores já declarou inúmeras vezes pretender “fazer justiça social usando os impostos”. Ou seja, à maneira de Robin Hood, “tirar dos ricos e dar aos pobres”. Essa foi a justificativa para a propositura, por exemplo, do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) progressivo quando da gestão de Luisa Erundina na prefeitura de São Paulo nos anos 80 e 90.

Os mecanismos de cobrança de impostos se multiplicam e ficam cada vez mais eficazes até por contarem com a colaboração dos contribuintes que – cada vez mais – entendem que a regularidade fiscal é sinônimo de cidadania e melhor desempenho empresarial. A escalada da receita tributária sobre o PIB mostra-se voraz: no período de 1994 a 2005, a carga tributária brasileira saltou de 27,9% do PIB para 34,9%, em 2002, e – finalmente – para 37,4%, em 2005. Portanto, considerando apenas os primeiros 3 anos de governo Lula, a carga galgou mais 2,5% sobre o PIB. Em 2006, atingiria 38,8% do PIB, mas o recálculo deste PIB a fez recuar para 34,5%.

Os relatórios do Ministério da Fazenda informam o esforço, empreendido pelo governo federal para reduzir seus gastos correntes, e as políticas desenvolvimentistas a que se propõe, permitindo assim crescimento econômico e redução na arrecadação. Na teoria, tudo se encaixa e faz sentido, pois um governo com cofres tão abarrotados poderia promover mais distribuição de renda e igualdade social. Mas os argumentos ideológicos – agora ou no “tempo do rei” – teimam em se mostrar contrários a realidade. Afinal, por ora somente se consegue reduzir a chamada carga tributária com a mudança da metodologia de cálculo do PIB.

Pois, restará explicar porque a carga fiscal brasileira é injusta e regressiva. A Federação do Comércio (Fecomércio) divulgou estudos recentes que provam o inexplicável: as famílias de renda mensal de 2 salários mínimos, que enfrentavam uma carga tributária média de 28,2%, em 1996, acabaram o ano de 2004 arcando com 48,9%. Já aquelas com renda entre 2 a 3 mínimos saltaram de 22,6% para 38% de sua renda comprometida com impostos nos mesmos anos. Na outra ponta, as poucas famílias brasileiras com renda mensal de 20 a 30 mínimos evoluíram de 14,8% para 28,7%. Conclusão: quanto mais riqueza, menor o peso dos tributos.

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