Marcas trocadas

Distribuidora de gás não pode usar botijão da concorrência

Autor

11 de julho de 2007, 19h11

A Consigaz, distribuidora de gás de cozinha, está proibida de envasar o produto em botijões de outras empresas distribuidoras do produto. A decisão é da 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. A ação é movida pela Agência Nacional do Petróleo, Agip, Supergasbras e Copagaz, que alegaram prática de comércio de botijão pirata por parte da concorrente.

A prática do botijão pirata consiste em engarrafar e vender gás de cozinha, o GLP, em vasilhames com a marca de outra empresa estampada em alto relevo. O argumento das empresas distribuidoras e da ANP foi que a medida afronta as normas da Agência Nacional do Petróleo, a Lei de Propriedade Industrial e o Código de Defesa do Consumidor.

As distribuidoras também afirmaram que a empresa que tem sua marca gravada no botijão assume sozinha a responsabilidade pela manutenção dos vasilhames, que deve ser minuciosa para evitar acidente com o consumidor. Já os botijões piratas podem não receber manutenção adequada e, portanto, oferecem grande risco aos usuários.

O desembargador federal Benedito Gonçalves, relator, acolheu o argumento. “Ao estabelecer que a distribuidora não pode, sem acordo prévio, comercializar botijão que contenha a marca de outra, quando cheio de GLP, almeja as partes, dentre outros objetivos, assegurar a responsabilidade civil do distribuidor e do revendedor em caso de acidente, bem como garantir a requalificação do recipiente pelo distribuidor detentor da marca nele estampada”, reconheceu.

O presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de GLP, Sergio Bandeira de Mello, comemorou a decisão. “O Judiciário dá um exemplo na defesa das Agências Reguladoras que foram criadas para proteger o consumidor, ampliando a competitividade e a qualidade no segmento. Além de ampliar a segurança no uso do GLP”, garante Bandeira de Mello.

Segundo ele, as companhias que apenas colocam o GLP em botijão de terceiros sabem que será difícil a comprovação de sua responsabilidade em caso de fraude no peso do produto, por exemplo, ou em caso de sinistro, porque o consumidor não terá como provar qual empresa envasou o gás. Os botijões piratas representam 10% do mercado de abastecimento em São Paulo.

Leia a decisão

Leia a decisão

Leia a decisão

Apelação Cível 2002.51.01.012816-0

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL BENEDITO GONCALVES

APELANTE: AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS – ANP

PROCURADOR: ANA CAROLINA DE FIGUEIREDO BRANDÃO SQUADRI

APELANTE: AGIP DO BRASIL S/A E OUTRO

ADVOGADO: CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO E OUTROS

APELANTE: SUPERGASBRAS DISTRIBUIDORA DE GÁS S/A E OUTROS

ADVOGADO: CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO E OUTROS

APELANTE: COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA

ADVOGADO: CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO E OUTROS

APELADO: CONSIGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA

ADVOGADO: LUIZ GUILHERME GOMES PRIMOS E OUTRO

ORIGEM: TERCEIRA VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (200251010128160)

RELATÓRIO

Embargos de declaração de COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA (fls. 1559/1570) alegando, em suma:

a) omissão do v. acórdão recorrido quanto ao “cerceamento de defesa e o prematuro encerramento da instrução probatória (C.F., art. 5°, incisos LIV e LV e CPC, artigos 126 e 132). Os embargantes alegaram em sede de apelação que houve cerceamento do direito de defesa no julgamento em primeiro grau, pois (i) não foram intimados da r. decisão que facultou às partes a especificação de provas e (ii) a produção da prova pericial de engenharia é de imprescindível importância para a constatação da existência ou não de um lacre indestrutível apto a identificar os botijões de outras marcas envasados pela CONSIGAZ. Demonstraram que o prematuro encerramento da instrução probatória implicou ofensa ao artigo 5°, incisos LIV e LV da Constituição Federal e aos artigos 126 e 332 do Código de Processo Civil” ;

b) omissão do v. acórdão recorrido quanto ao “poder discricionário da ANP — CF, artigos 170, parágrafo e 174, caput; art. 8°, inciso XV, da lei n° 9.478,de 06 de agosto de 1997. Foi alegado no decorrer de todo o processo a impossibilidade de o Poder Judiciário interferir no sistema de destroca de botijões de gás, pois tal sistema foi disciplinado pela ANP, no exercício legítimo do poder discricionário que a lei lhe confere. Sobre a competência da ANP para regular a matéria é claro o art. 8°, inciso XV, da lei n° 9.478, de 06 de agosto de 1997: “a ANP terá como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis, cabendo-lhe (…) regular e autorizar as atividades relacionadas com o abastecimento nacional de combustíveis, fiscalizando-as diretamente ou mediante convênios com outros órgãos da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios”. (…) Como bem ressaltou o voto vencido, a censura do ato administrativo emanado no exercício de um poder discricionário apenas é possível na hipótese de haver a prática de alguma ilegalidade, o que não ocorreu em momento algum. (…) Requerem, portanto, que a E. Turma Julgadora manifeste-se acerca da compatibilidade entre o v. acórdão embargado e os artigos 170, parágrafo, 174, caput, da Constituição Federal e 8°, inc. XV, da lei n° 9.478, de 06 de agosto de 1997”;


c) omissão do v. acórdão recorrido quanto ao “princípio da isonomia e concorrência desleal — CF, art. 5°, caput, e art. 20, inc. II, da lei n° 8.884, de 11 de junho de 1994. Argumentaram os embargantes que a permissão conferida à embargada para que envasilhe botijões de outras marcas fere o princípio da isonomia e provoca uma situação de concorrência desleal, com explícita violação dos artigos 5°, caput, da Constituição Federal e 20, inciso II, da Lei n° 8.884, de 11 de junho de 1994. Ao não investir em botijões (função mais importante e dispendiosa das distribuidoras de GLP) a embargada consegue praticar preços muito menores no mercado, além de não ser responsabilizada em caso de acidente. Ressalte – se que o investimento não se esgota na compra de botijões, mas em toda uma cadeia, que vai da destroca ao recondicionamento. A distribuidora que pretende vender mensalmente dez botijões, deve possuir necessariamente mais que o dobro desses botijões com a sua marca. Isso porque, muitos são destruídos, outros perdidos, alguns passando por um processo de recondicionamento e muitos ficam retidos nas casas dos próprios consumidores. Algumas distribuidoras sofrem de deficiência de escala, e, para superá-la, sem fazer investimentos, enchem botijões de outras marcas, tal como faz a embargada. Além disso, a cada recuperação de botijões no centro de destroca, antes de envasá-los, as distribuidoras devem submetê-las a testes, a fim de garantir a segurança do consumidor. O investimento não para por aí. Os centros de destroca são de propriedade e administração de terceiros, sendo necessário que se pague por cada botijão destrocado. Sob o amparo do v. acórdão embargado, a CONSIGAZ não precisa fazer nenhum desses investimentos, provocando uma situação antiisonômica e uma feroz concorrência desleal. Ela vende botijões de GLP mais barato que as outras distribuidoras porque não precisa fazer todo o investimento acima apontado, produzindo um quadro de desequilíbrio econômico. A situação foi bem compreendida no voto vencido, no qual se afirmou que: “ao ser assegurado judicialmente à Autora o direito de engarrafar o botijão de outra marca, a mesma está “isenta de qualquer investimento em botijões, desde a destroca até o recondicionamento, obtendo uma vantagem econômica indevida, provocando uma desastrosa concorrência desleal. Isso porque, ao não ter que suportar os elevados gastos em investimentos, a CONSIGAZ consegue vender os botijões de GLP abaixo do preço de mercado , praticado pelas demais distribuidoras , entre elas, as apelantes”.

Mas o voto vencedor, ao permitir que a embargada envasilhe botijões de outras marcas, não trouxe qualquer consideração a respeito do tema. Nada afirmou a respeito da quebra de isonomia e da situação de concorrência desleal impostas com o v. acórdão embargado (…)”;

d) omissão do v. acórdão recorrido quanto à “utilização deturpada da decisão judicial — CC , art. 422. Foi comprovado nos autos que a CONSIGAZ está utilizando a tutela antecipada que lhe foi concedida em franco desrespeito aos requisitos impostos na r. sentença e no v. acórdão embargado para que ela possa encher botijões de outras marcas. Ou seja, alega no processo uma coisa e na prática faz outra, em nítida afronta ao princípio da boa – fé (CC, art. 422). Em nota técnica, a ANP informa que, aproveitando-se do fato de não precisar destrocar os botijões, nem zelar por seu estado de conservação, a embargada está consumindo uma quantidade de gás muito superior àquela que o seu universo de botijões permitiria (fls. 1.458 – 1.464), em clara demonstração da situação antiisonômica e de estímulo à concorrência desleal trazida pelo v. acórdão embargado (…)”;

e) omissão quanto à “violação ao direito marcário e ao dever de informar – CDC, art. 6º, incisos II e III ; arts. 129, 190, inc. II e 194 da lei n. 9.279, de 14 de maio de 1996. Segundo o v. acórdão embargado, o direito das embargantes à marca estaria preservado pois (i) “o gás que é envasado é produzido por monopólio pela Petrobrás, e não difere entre as distribuidoras” e (ii) “o botijão é bem fungível, podendo ser substituído por outro da mesma espécie e qualidade, contanto que fabricado com as mesmas especificações, o que é o caso dos botijões de todas as distribuidoras”. Entretanto, dois argumentos foram simplesmente desconsiderados: (i) o conteúdo dos botijões nem sempre é o mesmo e (ii) não se pode desprezar a conservação e segurança dos botijões vendidos (…)” ;

f) omissão do v. acórdão embargado quanto ao “princípio da boa – fé e ao dever de informar – CC , art. 422; CDC, art. 6º , incisos II e III. Ao transformar em uma improvisada colcha de retalhos o sistema de destroca de botijões, a r. sentença de primeiro grau, no que foi acompanhado pelo v. acórdão embargado, determinou que “quando lançar mão da medida pleiteada, assinalar os botijões que envasilha com o nome e as cores da companhia, distintas das cores dos demais botijões em circulação, para salvaguardar o direito do consumidor à incolumidade física e à identificação da procedência do produto”. Apesar de o direito de defesa dos embargantes ter sido cerceado , impedindo –se a realização de perícia para avaliar a eficácia dos métodos de identificação do botijão, caso ocorra uma explosão, foi demonstrado que as referidas cautelas são inúteis, pois não existe qualquer tipo de identificação indestrutível. (…) E ainda que o método previsto na r. sentença para a identificação dos botijões seja adequado, foi demonstrado nos autos que a embargada está utilizando botijões de outras marcas sem cumprir os requisitos impostos no v. acórdão, pois os botijões estão sendo pintados com cores idênticas às de outras empresas que atuam no mercado ( fls. 1.211 – 1.356). Há melhor prova de que o sistema criado com a r. sentença não funciona ? Não é evidente que a embargada vem violando sistematicamente o princípio da boa – fé (CC, art. 422)? E o v. acórdão embargado não trouxe uma palavra sequer a respeito desse fato. (…)”;


g) omissão do v. acórdão recorrido acerca da “novidade trazida com a resolução n. 15, de 18 de maio de 2005, da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (…) Ou seja, nada foi dito sobre a possibilidade de a ANP regular, se necessário, o sistema de destroca de botijões, questão fundamental ao desfecho deste processo. (…)”.

Embargos de declaração da AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS – ANP (fls. 1572 / 1574) pretendendo seja sanada a seguinte omissão: “A 6ª Turma Especializada deste Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no v. acórdão embargado, não apenas violou os artigos 2º, 5º, caput (inviolabilidade do direito à vida e isonomia) e incisos XXIX, XXII, LIV e LV; 170, inciso V; art. 174, caput; 177, §2º, incisos I e III da Constituição Federal; 1º, incisos III, V e 194 da Lei nº 9.279/1996 e 20, inciso II da Lei nº 8.884/1994 como deixou de se manifestar sobre a ocorrência, na sentença, de violações a estes preceitos constitucionais e legais, sobre as quais a ANP e as demais apelantes, nos recursos de apelação interpostos, haviam requerido pronunciamento (…)”.

Resposta da partes Embargadas, às fls. 1577/1578, repetida às fls. 1579/1580 e 1585/1586.

Autos conclusos (fls. 1587), na forma regimental, trago o feito em mesa, para julgamento.

É o relatório.

RIO DE JANEIRO, 09 DE MAIO DE 2007.

ROGÉRIO VIEIRA DE CARVALHO

Desembargador Federal – Relator

VOTO-VENCEDOR

Reporto-me às notas taquigráficas de fls. 1608/1618, como fundamentação e razões de decidir expressivas do meu voto.

Rio de Janeiro, 30 de maio de 2007.

BENEDITO GONÇALVES

DESEMBARGADOR FEDERAL

VOTO-VISTA

Trata-se de recursos de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos em face do v. acórdão de fl. 1552, em que esta 6ª Turma Especializada, por maioria, negou provimento aos recursos de apelo, para manter in totum a sentença, que julgou procedente o pedido para declarar a inexistência da obrigação da autora de destrocar botijões de gás de outras marcas, assegurando-lhe, ademais, o direito de engarrafá-los, até o limite de sua cota homologada pela ANP, caso se torne necessário para manter suas atividades.

O E. Relator p/acórdão não conheceu dos embargos da AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO – ANP (certidão de fl. 1589) e deu provimento aos embargos opostos por COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA (certidão de fl. 1588), emprestando-lhes efeitos infringentes, para anular a sentença e os efeitos da tutela antecipada, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para prosseguimento do feito, sob o entendimento de que, para assegurar a viabilidade técnica de identificação dos botijões de gás, imprescindível a produção de prova técnica – perícia de engenharia.

Peço vênia ao E. Desembargador para divergir do entendimento de Sua Excelência, e, assim, negar provimento aos recursos, como passo a demonstrar adiante.

Destinam-se os embargos da AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO – ANP a suprir alegada omissão por falta de pronunciamento jurisdicional acerca de dispositivos constitucionais e legais, tidos por violados, com o notório propósito de prequestionamento como requisito de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário.

Ocorre, todavia, que a simples afirmação da embargante de se tratar de embargos com propósito de prequestionamento não é suficiente ao acolhimento do recurso, sendo necessário se subsuma a irresignação integrativa a uma das hipóteses do art. 535 do CPC, e não a mera pretensão de ver emitido pronunciamento jurisdicional sobre dispositivos legais e constitucionais outros. In casu, inexiste qualquer omissão no julgado, conforme alegado, sendo certo que, na formação de seu convencimento, não está o julgador obrigado a examinar todos os questionamentos suscitados pelas partes, desde que decida sob fundamentos suficientes para sustentar a manifestação jurisdicional. Ademais, a despeito da necessidade de interposição de embargos declaratórios para fins de futura interposição dos recursos especial e extraordinário, não implica que se deva fazer expressa menção a violação de dispositivos legais, sob o argumento de que a ausência de prequestionamento inviabiliza o conhecimento dos referidos recursos, pois o prequestionamento a ser buscado refere-se à matéria versada no dispositivo de lei tido por violado, não se exigindo sua literal indicação.

Nesse sentido, há vários julgados deste órgão fracionário negando provimento a recurso de embargos opostos com o mesmo desiderato. Só para citar os mais recentes, de minha relatoria, têm-se as Apelações Cíveis nºs. 2000.02.01.073098-5/RJ e 2001.51.01.016683-1/RJ, julgadas, respectivamente, em sete de março e sete de fevereiro do corrente ano, nas quais, em sede de embargos, pretendia-se a expressa menção aos dispositivos constitucionais e legais invocados, incapazes de influenciar no resultado do julgamento. Reconheceu-se, em tais precedentes, da mesma forma que o E. Relator p/acórdão, no presente caso, a inexistência dos vícios que autorizam a oposição de embargos, com a diferença de que, ao invés de não conhecer dos recursos interpostos, houve por bem a Turma lhes negar provimento. Isto porque, constatando-se que não existem os defeitos apontados nos recursos (omissão, contradição ou obscuridade), deles se conheceu, posto que se lhes examinou o mérito, apenas não se lhes acolheu. Sobre o tema, assevera Manoel Caetano Ferreira Filho (in Comentários ao Código de Processo Civil, Editora Revista dos Tribunais, Vol. 7, p. 326) que é igualmente decidido o mérito “toda vez que o juiz ou tribunal afirma que na decisão embargada não há obscuridade, contradição ou omissão” e que “ainda quando não o afirme explicitamente, o juiz ou tribunal que, ao julgar os embargos, decidem pela existência ou inexistência daqueles vícios, estão declarando que deles conheceram”. Júlio César Bebber preleciona que “Salta aos olhos a profunda diferença entre não conhecer do recurso e negar provimento. Se o tribunal disser que não conhece do recurso, deixa-lhe de examinar a substância da impugnação. Nada, absolutamente nada, fica sabendo a respeito do acerto ou desacerto da decisão recorrida” (in Recursos no Processo do Trabalho, Editora LTr, p. 70).


Nesse contexto, não obstante a firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto à interrupção do prazo para interposição de outros recursos, independentemente do conhecimento dos embargos de declaração manejados tempestivamente, a conclusão pelo não conhecimento do presente recurso não é a técnica de julgamento dos embargos de declaração seguida por este Colegiado, o qual, repita-se, ao decidir sobre o mérito do recurso, como no presente caso, rejeita-o ou não o prover, posto que ultrapassado o prévio juízo de admissibilidade positivo. Assim, deve ser negado provimento ao recurso.

Por seu turno, o recurso da empresa COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA discorre sobre cerceamento de defesa, em razão de não ter sido facultado à embargante o direito de produzir prova pericial com vistas a comprovar a inexistência de um lacre indestrutível a identificar os botijões de outras marcas (OM) envasados pela autora.

Ao analisar os apelos interpostos, na condição de Relator do feito, posicionei-me sobre o tema da seguinte forma, em sede de preliminar:

“Inicialmente, rejeito a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, pois, subsidiando os elementos constantes dos autos suficientemente o convencimento seguro do Juízo sobre a questão, não está o magistrado obrigado a anuir com a realização de perícia, conforme reclamado pelas empresas Apelantes, sendo certo que as questões suscitadas são eminentemente de direito, restando não configurado, na hipótese, o alegado cerceamento de defesa”. (fl. 1468)

Com efeito, a quaestio iuris diz respeito à legalidade de ato normativo, emanado da Agência Nacional do Petróleo – ANP (Resolução ANP nº 15/2005), por meio do qual a autarquia veda à distribuidora de gás liquefeito de petróleo o envasilhamento, a guarda ou comercialização de botijão de outra marca de distribuidor, quando cheio de GLP. A inicial, outrossim, contem pedido expresso de autorização para o engarrafamento de botijões de outras marcas, até o limite da cota da autora homologada pela ANP, e a desobrigação de destrocá-los.

Como se vê, o exame para deslinde da controvérsia reside em averiguar se houve abuso do poder regulamentar nas restrições impostas pela agência reguladora no regular exercício de seu poder de polícia, cuja solução passa, inexoravelmente, pelo julgamento da legalidade da Portaria MINFRA nº 843/90 e da Resolução ANP nº 15/2005, matéria estritamente de direito. Portanto, o reconhecimento, ou não, da legalidade da norma restritiva, sendo questão eminentemente de direito, dispensa a dilação probatória, por desnecessária a produção de outras provas além daquelas constantes dos autos.

O direito vindicado na presente demanda, repita-se, deve ser decidido sob a perspectiva eminentemente de direito, à luz das normas de direito administrativo e dos princípios que o informam, sendo suficiente a análise das questões de fato e de direito apresentadas para o convencimento seguro do Juízo sobre o tema, a dispensar a produção de prova pericial de qualquer espécie.

Nesse contexto, diante da omissão apontada pela recorrente quanto à preliminar suscitada em razões de apelação, sobre a qual não houve pronunciamento desta Turma, consigna-se no julgado a inocorrência de cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, na hipótese de matéria estritamente de direito, devendo ser negado provimento ao presente recurso.

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos.

BENEDITO GONÇALVES

DESEMBARGADOR FEDERAL

VOTO

Trato, inicialmente, dos embargos declaratórios deflagrados pela Agência Nacional de Petróleo-ANP, às fls. 1572/1574, que – à guisa de prequestionamento – elencam inúmeros dispositivos legais e constitucionais, cujo conteúdo pretendem ver declarado, ante a alegada omissão do v. acórdão a seu respeito. Não reputo que os embargos declaratórios se prestem ao desiderato desta Recorrente, porquanto, mesmo a título de prequestionamento a viabilizar recursos às instâncias superiores, exige-se que sejam observadas as hipóteses previstas no art. 535 do Estatuto Processual. Nesse sentido: “Mesmo nos embargos de declaração com fim de prequestionamento, devem-se observar os lindes traçados no art. 535 do CPC (obscuridade, dúvida, contradição, omissão e, por construção pretoriana integrativa, a hipótese de erro material). Esse recurso não é meio hábil ao reexame da causa” (STJ-1a Turma, Resp 11.465-0-SP, rel. Min. Demócrito Reinaldo, j. 23.11.92, rejeitaram os embs., v.u., DJU 15.2.93, p. 1.665)”

De fato, a ANP não delineou, a partir do posicionamento perfilhado pelo v. acórdão, qualquer das situações descritas no art. 535 do CPC, que impusesse o pronunciamento deste E. Tribunal. Destarte, entendo que não foi satisfeito o requisito de admissibilidade recursal, pelo que este recurso não deve ser conhecido.


Não obstante, os embargos declaratórios deflagrados por COPAGAZ –Distribuidora de Gás Ltda. e Outras, às fls. 1559/1570, não padecem dos mesmos vícios que o anterior recurso. A partir das conclusões alcançadas pelo E. Colegiado, por ocasião do julgamento do apelo, o recurso vai alinhavando pontos que reputa omissos, relativamente a matéria infraconstitucional e constitucional, pretendendo inequivocamente efeitos modificativos.

Em que pese a excepcionalidade com que se admitem efeitos infringentes aos embargos declaratórios – dada a inequívoca restrição legal contida no art.535 do Estatuto Processual – deve o julgador sempre buscar o aprimoramento da prestação jurisdicional, na linha do entendimento consagrado pelo E. STF: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OBJETO. Visando os embargos de declaração ao aprimoramento da prestação jurisdicional, hão de ser recebidos e julgados a partir da melhor compreensão, considerada a angústia do representante processual e da própria parte. (…)” (STF – AI 458565 AgR-ED/RJ – 1a Turma – rel.: Min. Marco Aurélio – DJU 19.08.2005)

E ainda: “(…) EMBARGOS DECLARATÓRIOS. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Os declaratórios longe ficam de configurar crítica ao órgão investido do ofício judicante. Ao reverso, contribuem para o aprimoramento da prestação jurisdicional, devendo ser tomados com alto espírito de compreensão.” (STF- RE 154159/PR – 2a Turma – rel.: Min. Marco Aurélio – DJU 08.11.96)

Com esta amplitude é que passo a analisar os pontos enfocados no recurso das terceiras interessadas, mormente porque a matéria aqui controvertida envolve vários aspectos que dizem respeito ao direito da concorrência, ao direito do consumidor, propriedade industrial, enfim, ampla gama de institutos jurídicos que, entrelaçados, se prestam a conduzir interpretação jurídica mais adequada à hipótese sob exame. Muitas vezes a preponderância da análise de uma situação concreta sobre um prisma jurídico gera graves questionamentos de outra parte. Daí, toda a moderna disciplina da ponderação de interesses.

Destarte, o v. acórdão sedimentou a conclusão do E. Colegiado consoante a seguinte ementa “in verbis”: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PORTARIA 843/90 DO MINFRA. ENGARRAFAMENTO DE BOTIJÕES DE GÁS DE OUTRAS MARCAS. É VIÁVEL A UTILIZAÇÃO DE VASILHAMES DE OUTRAS MARCAS POR DISTRIBUIDORAS DE GÁS, DESDE QUE DEVIDA E INEQUIVOCAMENTE IDENTIFICADA A ORIGEM DO FORNECEDOR, A FIM DE RESGUARDAR DIREITO DO CONSUMIDOR. APELO IMPROVIDO. 1. A discricionariedade administrativa encontra limite nos cânones constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade. Destarte, não pode o Poder Judiciário admitir que a Administração, exercendo seu poder regulamentar, venha a impor restrições que ofendam aos ditames mencionados. 2. A regulamentação existente admite que distribuidoras utilizem vasilhames de outras distribuidoras, desde que haja pacto a este respeito. É de se concluir, pois, que não há fratura no sistema de distribuição de gás pela simples utilização de vasilhames de terceiros, desde que, à toda evidência, reste inequivocamente demonstrada a marca da distribuidora que envasou o produto comercializado. A r. sentença observou estas cautelas. 3. Apelação improvida.”

Pois bem. O entendimento do E. Colegiado se pautou na premissa estrutural de que não haveria razoabilidade nas restrições perpetradas pela Agência Reguladora da atividade de distribuição de gás (ANP), por seus instrumentos de regulamentação (Portarias e Resoluções), no engarrafamento de botijões de gás de outras marcas DESDE QUE DEVIDA E INEQUIVOCAMENTE IDENTIFICADA A ORIGEM DO FORNECEDOR, A FIM DE RESGUARDAR O DIREITO DO CONSUMIDOR. Ora, a preocupação da r. sentença, corroborada pela maioria do douto Colegiado, foi compatibilizar o mercado de distribuição de gás, de modo a não favorecer a sua concentração e, ao mesmo tempo, preservar a segurança do consumidor. Em ambos os casos, o foco do julgamento foi preservar o direito difuso dos consumidores, que se favorecem com um mercado competitivo, bem como têm inequívoco conhecimento de quem está a comercializar o produto, no caso, de manuseio altamente perigoso.

Não obstante tais considerações tenham ficado explicitadas no voto condutor do julgamento, volto ao julgado para lhe assegurar o próprio conteúdo, com o olhar fixo no aprimoramento da prestação jurisdicional. Mister se faz, pois, viabilizar a efetiva tutela daqueles valores, os quais foram privilegiados pelo entendimento deste E. Tribunal. Nesse passo, em que pese haver expressa menção à inexistência de cerceamento de defesa na ausência de perícia técnica de engenharia, penso que o fio condutor do entendimento do E. Tribunal a respeito da matéria faz presunção — de natureza técnica – no sentido da possibilidade de identificação inequívoca de quem está comercializando o produto, independentemente da marca em relevo existente no botijão.


Com efeito, penitencio-me pelo fato de formular tal presunção, desprovida de suporte especializado – abalizado em perícia técnica de engenharia. Tal assertiva, inclusive, pode cair no vazio – se houver impossibilidade técnica – frustrando o próprio comando da sentença. Aqui, então, curvo-me às considerações formuladas pelas Embargantes – terceiras interessadas – quanto à imprescindibilidade da perícia em questão.

Inegavelmente, existem distribuidoras de gás que detém um padrão de qualidade, extraído de seu comportamento no mercado consumidor, que se tranqüiliza com a segurança dos produtos por ela comercializados. Esta conduta no mercado, sem dúvida, angaria expressiva parcela da clientela, a qual pode vir a ser comprometida, se o consumidor não puder identificar com exatidão quem fornece o produto adquirido, consoante imposição do art. 6º, inc. II e III do Código de Defesa do Consumidor, sobre o qual não se pronunciou o E. Colegiado. E, aí, diante de um impasse de natureza técnica, poder-se-ia fomentar a prática de atos de deslealdade comercial.

Com efeito, a possibilidade de pactuação quanto às trocas de botijão entre as distribuidores, prevista na regulamentação controvertida (Resolução ANP nº15/2005), faz crer que entre as contratantes exista acordo quanto aos padrões de qualidade ou, por outra, que as contratantes assumam o risco quanto à sua fatia no mercado consumidor. De resto, impõe-se registrar que qualquer regulamentação a ser estabelecida, neste caso, pela Agência Nacional de Petróleo não poderá suprimir, por óbvio, o direito à informação do mercado consumidor quanto ao fornecedor da mercadoria aqui em debate.

Embora a r. sentença de primeiro grau tenha sido cautelosa quanto às exigências de identificação do fornecedor do produto, presumiu – tal qual a maioria da E. Sexta Turma Especializada – a viabilidade técnica das imposições formuladas. E, em que pese o fato, de não ter havido requerimento das partes pela produção da prova em questão, deveria o MM. Juiz “a quo” – de ofício – determiná-la, nos precisos termos do art. 130 do Estatuto Processual “in verbis”: “Art. 130. Caberá ao juiz de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.”

Colho, ainda, notas ao referido artigo de THEOTÔNIO NEGRÃO, em sua obra “Código de Processo Civil e legislação processual em vigor”, 39a., ed. Saraiva, 2007, São Paulo, pg. 264: “2a. O juiz deixou de ser mero espectador inerte da batalha judicial, passando a assumir uma posição ativa, que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de provas, desde que o faço com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório’ (RSTJ 129/359)”

Assim sendo, reconheço omissão no v. acórdão quanto ao disposto no Código de Defesa do Consumidor, mais precisamente em seus art. 6º, inc. II e III, relativamente ao direito de informação inequívoca do mercado quanto ao fornecedor do gás comercializado. Desse modo, de sorte a preservar o aludido direito e preservar o comando dos direitos difusos dos consumidores, reconheço que a ausência de prova pericial, impôs mácula no julgado de primeiro grau, cuja anulação é de rigor, devendo o presente recurso comportar excepcionalmente efeitos infringentes.

Corolário do acima exposto, é que a r. decisão , que deferiu a tutela antecipada (fls. 567 /568) não encontrava, nos autos, por igual, prova inequívoca dos fatos que embasavam o requerimento , que, por isto, os efeitos infringentes, atribuídos ao v. acórdão recorrido, têm o condão de , pela mesma razão, anular os efeitos da tutela antecipada.

ISTO POSTO:

Não conheço dos embargos declaratórios da ANP e dou provimento aos embargos de declaração de COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA (fls. 1559/1570), reconhecendo omissão quanto ao disposto no art. 6º, II e III, do Código de Defesa do Consumidor, sanando-a para admitir a imprescindibilidade de produção de prova técnica – perícia de engenharia – de modo a assegurar a viabilidade técnica de identificação dos botijões de gás, conferindo, em conseqüência, efeitos infringentes ao recurso, anulando a r. sentença, assim como a tutela antecipada , e determinando o retorno dos autos ao MM. Juiz “a quo” para prosseguimento do feito, como entender de direito.

É COMO VOTO.

RIO DE JANEIRO, 09 DE MAIO DE 2007.

ROGÉRIO VIEIRA DE CARVALHO

Desembargador Federal – Relator

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

VOTO-VISTA (NO GABINETE)

DF BENEDITO GONÇALVES: Egrégia Turma, pela certidão de julgamento, nos processos nºs 10 e 11 da mesa – embargos de declaração –, o Relator para o acórdão foi o Doutor ROGÉRIO V. DE CARVALHO, que não conhecia dos embargos da Agência Nacional de Petróleo e deu provimento aos embargos da Copagaz Distribuidora de Gás Ltda. Pediu vista o Desembargador BENEDITO GONÇALVES, e na ocasião aguardou a vista o Desembargador FREDERICO GUEIROS.


Então, profiro os votos-vista:

(Lê)

“Trata-se de embargos de declaração opostos em face de acórdão que, por maioria, negou provimento aos recursos de apelo, para manter in totum a sentença que julgou procedente o pedido, para declarar a inexistência da obrigação da autora de destrocar botijões de gás de outras marcas, assegurando-lhe, ademais, o direito de engarrafá-los até o limite de sua cota, homologada pela ANP, caso se torne necessário para manter sua atividade (….)

(….) Assim, deve ser negado provimento ao recurso da ANP.”

Como vota o Doutor FREDERICO GUEIROS nos embargos da ANP? Ou continuo o voto, julgando os embargos da Copagaz?

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

VOTO-VOGAL

DF FREDERICO GUEIROS: Vou acompanhar Vossa Excelência nesse particular.

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

VOTO-VISTA (NO GABINETE)

DF BENEDITO GONÇALVES: Continuando o voto, e no final proclamamos o resultado:

(Lê)

“Por seu turno, o recurso da empresa Copagaz discorre sobre cerceamento de defesa em razão de não ter sido facultado à embargante o direito de produzir prova pericial (….)

(….) Nesse contexto, diante da omissão apontada pelo recorrente quanto à preliminar suscitada em razões de apelação, sobre a qual não houve pronunciamento desta Turma, consigna-se no julgamento a inocorrência de cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide na hipótese de matéria de direito, devendo ser negado provimento a este recurso.”

Assim, nego provimento ao recurso da ANP, pelos motivos já mencionados, e nego também provimento ao recurso da Copagaz.

É como voto.

(VOTO-VISTA DF BENEDITO GONÇALVES)

(RELATOR DF ROGÉRIO V. CARVALHO)

(PRESIDENTE DF BENEDITO GONÇALVES)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

ESCLARECIMENTOS

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Senhor Presidente, eu queria esclarecer ao nobre Vogal que tanto a ANP como essa empresa alegam outras razões nos seus embargos de declaração. É claro que, se existem dez razões para se chegar a uma conclusão positiva, basta ao julgador fundamentar uma delas. Mas existem outras nove.

Se a maioria supera a alegação de omissão quanto à necessidade da prova pericial, penso que é preciso revisitar as outras alegações postas nos declaratórios, quer da Autarquia, quer da empresa.

Eu não conheci do recurso da Autarquia porque ela se limita a mencionar dispositivos sem fazer a demonstração da omissão, o que não foi o caso da empresa.

Como bem disse o Doutor BENEDITO, a questão que está em jogo é o poder de polícia da ANP, e o voto condutor e o acórdão embargado entenderam que poderia se dar uma interpretação a esta norma da ANP em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

VOTO-VOGAL

DF FREDERICO GUEIROS: Agradeço as observações do eminente Desembargador ROGÉRIO, mas, com a devida vênia, vou acompanhar o eminente Desembargador BENEDITO GONÇALVES, e faço isso na esteira de pronunciamentos outros meus.

Como os Senhores todos sabem, embora eu esteja fora da função judicante há quatro anos – voltando agora –, na Presidência tive de enfrentar alguns pedidos de suspensão de segurança, em que se debatia fundamentalmente essa questão do poder de regulamentar, da interferência do Estado em face da regra constitucional que privilegia a livre iniciativa.

E eu sempre me posicionei no sentido de que isso é necessário, sobretudo em atividade de risco – como a de bujão de gás, como essas questões de combustível, gasolina, tancagem, e até mesmo o próprio capital necessário para uma empresa poder desenvolver, “girar” seu negócio em uma área dessa natureza.

De modo que o voto do eminente Desembargador BENEDITO GONÇALVES, no viés jurisdicional, que não foi aquele outro que eu experimentei nas suspensões de segurança e de antecipação de tutela, mas, de toda sorte, eu sempre me filiei e tive essa preocupação. Senão, nós não precisaríamos ter o poder regulatório do Estado nessas questões, que devem ter necessariamente uma regulamentação, exatamente na medida em que são atividades até de grande risco. E vemos a toda hora acontecer, sobretudo nas áreas dessas comunidades hipossuficientes, incêndios catastróficos, e quando se vai verificar, foi um botijão de gás mal feito.

Essa é uma preocupação que eu sempre guardei e, por essas razões, com a devida vênia, Doutor ROGÉRIO, vou acompanhar.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Mas, Doutor GUEIROS, a motivação do voto de Vossa Excelência na verdade conduz ao provimento dos embargos de declaração, porque o acórdão da apelação discrepou do voto condutor do voto do Relator, a dizer que era possível a destroca, desde que houvesse uma identificação…


DF FREDERICO GUEIROS: Exatamente. Identificação, esse poder regulatório. É nisso que eu fico.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Mas a ANP proíbe isso. A resolução da ANP expressamente proíbe isso. Só admite quando há expressa convenção entre as empresas.

DF FREDERICO GUEIROS: Mas é isso que está no voto do Doutor BENEDITO. Não é isso?

DF BENEDITO GONÇALVES: Se Vossa Excelência perceber, lendo o voto anterior, a destroca foi por convenção e a autora nunca provou esse acordo com as empresas.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): O voto condutor admitiu que era possível essa destroca…

DF FREDERICO GUEIROS: Mas desde que observadas as regras reguladoras.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Não havendo a convenção. Mas se o voto de Vossas Excelências é no sentido de que não é possível isso, de que o acórdão se omitiu quanto a isso, a conclusão é o provimento dos declaratórios, para atribuir efeitos modificativos.

DF BENEDITO GONÇALVES: Vou esclarecer o seguinte: o voto do Relator do acórdão, que foi Vossa Excelência, entendeu nos embargos de declaração, na outra assentada, que deveria a prova pericial ser imprescindível e devolvia o processo para a Primeira Instância, sob a alegação de que, no acórdão vencedor, o Relator foi omisso quanto à defesa cerceada da perícia.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Aliás, essa é uma pretensão tanto da Consigaz como da ANP.

DF BENEDITO GONÇALVES: Muito bem. Agora, em sede embargos de declaração – eu fui vencido e estamos trabalhando no acórdão por maioria da Turma –, reconheço no meu voto que o acórdão foi omisso quanto à perícia. Então…

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): E quanto aos demais?

DF BENEDITO GONÇALVES: …faço juízo de admissão do recurso: houve omissão. Portanto, vou analisar a omissão. Só que no meu entendimento, que continuo afirmando, a matéria é saber são legais ou ilegais os atos da ANP. Por isso eu digo que não precisa de perícia, e nego provimento ao recurso, em um primeiro momento.

Entretanto, se Vossa Excelência, que foi Relator do acórdão cujos em embargos foram interpostos sob sua relatoria, entende que há outras questões nos embargos, superada esta, volta a Vossa Excelência para trazer em outra assentada o seu pronunciamento sobre os demais itens dos embargos de declaração. Eu não poderia, como Vogal, adentrar as demais questões dos embargos.

DF FREDERICO GUEIROS: Vossa Excelência ficou restrito ao exame daquele ponto.

DF BENEDITO GONÇALVES: Exatamente. Repito: os embargos foram interpostos perante sua relatoria. Nós, vogais, não podíamos adentrar, avançar. Então, voltaria para o Relator do acórdão, para se manifestar agora sobre os demais itens dos embargos.

Posso proclamar?

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

RETIFICAÇÃO DE VOTO

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): No relatório que lancei nos autos, a Copagaz alega que o acórdão embargado se omitiu quanto ao poder discricionário da ANP – art. 170 e seus §§ e 174, caput, e art. 8º, XV, da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997.

Foi alegada no decorrer de todo o processo a impossibilidade de o Poder Judiciário interferir no sistema de destroca de botijões de gás, pois tal sistema foi disciplinado pela ANP, no exercício legítimo do poder discricionário que a lei lhe confere.

Pelo que depreendi da sessão de hoje, a maioria endossa esse entendimento – tanto o Presidente quanto o Doutor GUEIROS. E, efetivamente, o acórdão em que fui autor do voto condutor não enfrenta expressamente essa questão relativa ao poder de polícia da ANP, apenas dizendo que a discricionariedade administrativa encontra limite nos cânones constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade.

De forma que, reexaminando essa questão, empresto minha adesão aos doutos fundamentos expendidos no voto do eminente Relator da apelação cível, que se acham às fls. 1468/1472.

Vencido quanto à omissão no que diz respeito à necessidade da perícia, adoto, para sanar a omissão das outras, os dizeres do voto de fls. 1468/1472, da lavra do eminente Desembargador Federal Doutor BENEDITO GONÇALVES. E vencido também nos declaratórios da ANP.

Assim, superada a barreira do conhecimento, dou provimento aos embargos de declaração para sanar as demais omissões, nos termos do voto de fls. 1468/1472, e em conseqüência atribuir efeitos modificativos ao venerando acórdão embargado, para dar provimento aos recursos e à remessa necessária.

DF BENEDITO GONÇALVES: Concluindo o julgamento, vamos proclamar o resultado.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): …(Vozes sobrepostas)… Tem que ver se esse é o entendimento de Sua Excelência também.

DF BENEDITO GONÇALVES: Claro. Nos demais itens que Vossa Excelência manifestou os embargos, como vou divergir.. Não, vou dar provimento… Não, vou negar provimento. O acórdão está certo, vou dar provimento.


DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Estou reconhecendo que o acórdão e o voto condutor omitiram-se quanto às matérias outras que não as da necessidade da perícia, e corrijo essa omissão com os dizeres mesmos do voto do eminente Desembargador Federal Doutor BENEDITO GONÇALVES, que se acha às fls. 1468/1472. Em conseqüência, dou provimento aos embargos e atribuo efeitos modificativos para dar provimento aos recursos e à remessa necessária. É como está no voto da apelação de Vossa Excelência.

DF FREDERICO GUEIROS: Vossa Excelência volta ao julgamento do recurso, acompanhando o Doutor BENEDITO GONÇALVES.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): O Doutor BENEDITO.

DF BENEDITO GONÇALVES: Porque eu estava entendendo que não havia omissão e estava negando provimento aos embargos. Mas assim fazendo, fica o acórdão inconclusivo, o que não adianta.

Então, com essa modificação, eu também acompanho Vossa Excelência, dando provimento aos embargos e à remessa, porque a sentença foi pela procedência do pedido.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Exatamente, nos termos do voto…

DF BENEDITO GONÇALVES: Então, estamos dando provimento aos embargos e à remessa necessária.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Para julgar improcedente o pedido.

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

RATIFICAÇÃO VOTO-VOGAL

DF BENEDITO GONÇALVES: Como vota o Doutor FREDERICO GUEIROS?

DF FREDERICO GUEIROS: Acompanho, porque esse foi o meu pensamento. O resultado do julgamento seria do julgamento do recurso, não agora o dos embargos, mas lá atrás, quando devolveu ao Tribunal o exame da questão, meu entendimento era esse: na questão de mérito, o julgamento, a meu ver, deveria ser de reforma da sentença.

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (10M)

PROCESSO Nº 2002.51.01.012816-0 (11M)

DECISÃO

DF BENEDITO GONÇALVES: Concluindo o julgamento dos processos nºs 10 e 11 da pauta de mesa…

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Vossa Excelência foi o vencedor em tudo.

DF BENEDITO GONÇALVES: O Relator do acórdão sou eu de novo, voltou para mim. Em um primeiro momento, Sua Excelência não conhecia do recurso da ANP…

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Eu continuo não conhecendo do recurso da ANP.

DF BENEDITO GONÇALVES: …e dava provimento aos embargos de declaração da Copagaz, com efeitos infringentes. Após o voto-vista do Desembargador Federal BENEDITO GONÇALVES, que negava provimento aos embargos – eram dois: ANP e Copagaz –, acompanhando pelo Desembargador Federal FREDERICO GUEIROS – usando da faculdade regimental não –, para poder, então, concluir o julgamento e as demais questões dos embargos da Copagaz e da ANP, o Desembargador Federal ROGÉRIO V. DE CARVALHO, usando os fundamentos do Relator ao julgar a apelação, deu provimento aos embargos e à remessa.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Aos recursos e à remessa. Para atribuir efeitos modificativos.

DF BENEDITO GONÇALVES: Aos embargos, atribuindo efeitos modificativos, e à remessa, para julgar…

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Eu fiquei vencido em parte. A Turma, por maioria, conheceu dos embargos da ANP, vencido o Desembargador Federal ROGÉRIO V. DE CARVALHO. Quanto ao mais, superada a questão, à unanimidade, deu-se provimento aos embargos, atribuindo-lhes efeitos modificativos.

DF BENEDITO GONÇALVES: Sua Excelência deu para a perícia, com um fundamento só. Agora, dá por todos… Ele pediu com fundamento…

…(Aparte em off)…

DF BENEDITO GONÇALVES: Vencido o Relator para o acórdão, que dava parcial provimento. Era parcial?

…(Apartes em off)…

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Por maioria, houve o conhecimento dos embargos da ANP. E, à unanimidade, a Turma deu provimento aos embargos.

DF BENEDITO GONÇALVES: Aos dois embargos.

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): E atribuiu efeitos modificativos.

…(Aparte em off)…

DF BENEDITO GONÇALVES: Não, Sua Excelência não conhecia, por um fundamento

DF ROGÉRIO V. CARVALHO (RELATOR): Mas acontece que eu modifiquei o meu voto para sanar… (inaudível)… E peço a juntada da degravação. Eu sanei os demais vícios adotando como fundamento os dizeres do voto do Relator na apelação. Sua Excelência vai ter que fazer o acórdão porque ele foi o vencedor na preliminar.

(VOTO-VISTA DF BENEDITO GONÇALVES)

(RELATOR DF ROGÉRIO V. CARVALHO)

(PRESIDENTE DF BENEDITO GONÇALVES)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 535, II, DO CPC. OMISSÃO EXISTENTE QUANTO À ARGÜIÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE NÃO RECONHECIDA. OMISSÃO VERIFICADA QUANTO AO TEMA REFERENTE AO PODER DISCRICIONÁRIO DA ANP. ATO NORMATIVO QUE IMPEDE DISTRIBUIDORA DE UTILIZAR BOTIJÕES DE OUTRAS MARCAS (OM) PARA ENGARRAFAMENTO DE GÁS LIQÜEFEITO DE PETRÓLEO – GLP. LEGITIMIDADE. DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. PODER DE POLÍCIA. SEGURANÇA DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EXCEPCIONAIS EFEITOS MODIFICATIVOS, PARA DAR PROVIMENTO AOS APELOS E À REMESSA.


– Hipótese em que, após reconhecer a omissão apontada quanto à preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa e superá-la, em conformidade com o voto-vista proferido pelo relator da apelação, e diante da retificação de voto do relator p/ acórdão que, apreciando as demais omissões apontadas nos embargos da empresa embargante e da ANP, aderiu integralmente à fundamentação daquele relator quanto ao reconhecimento da legitimidade do ato normativo que impede distribuidora de utilizar botijões de outras marcas (OM) para engarrafamento de gás liquefeito de petróleo, houve por bem o Colegiado acolher ambos os embargos, emprestando-lhes excepcionais efeitos modificativos, para dar provimento aos apelos e à remessa, e julgar improcedente o pedido.

– Reconhecida a omissão suscitada quanto à preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, que se supre para consignar no julgado a inocorrência de cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, na hipótese de matéria estritamente de direito. O exame para deslinde da controvérsia reside em averiguar se houve abuso do poder regulamentar nas restrições impostas pela agência reguladora no regular exercício de seu poder de polícia, cuja solução passa, inexoravelmente, pelo julgamento da legalidade da Portaria MINFRA nº 843/90 e da Resolução ANP nº 15/2005, matéria estritamente de direito, de modo que, o reconhecimento, ou não, da legalidade da norma restritiva, sendo questão eminentemente de direito, dispensa a dilação probatória, por desnecessária a produção de outras provas além daquelas constantes nos autos.

– Igualmente reconhecida a omissão quanto ao tema referente ao poder discricionário da Agência Nacional do Petróleo – ANP, que se supre para consignar que tem referida Autarquia legitimidade, com fulcro no princípio da discricionariedade, para impor a observância de regras rígidas de segurança relacionadas à atividade de distribuição de GLP, bem como a de normas necessárias à sua operacionalização, com o objetivo de garantir a defesa do consumidor e o abastecimento nacional. Ao estabelecer que a distribuidora não pode, sem acordo prévio, comercializar botijão que contenha a marca de outra, quando cheio de GLP, almeja o administrador, dentre outros objetivos, assegurar a responsabilidade civil do distribuidor e do revendedor em caso de acidente, bem como garantir a requalificação do recipiente pelo distribuidor detentor da marca nele estampada, conforme compromisso assumido pelas empresas do setor no Código de Auto-Regulamentação, o que restaria inviabilizado caso fosse permitido o enchimento de OM, tendo em conta que as distribuidoras não iriam arcar com os custos de requalificação de seus botijões para serem comercializados por outras.

– Recursos de embargos providos para, emprestando-lhes excepcionais efeitos modificativos, dar provimento aos recursos de apelação e à remessa necessária, julgando-se improcedente o pedido

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:

Decide a 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por maioria, conhecer do recurso da ANP e, no mérito, por unanimidade, dar-lhe provimento, e ao recurso da COPAGAZ DISTRIBUIDORA DE GÁS LTDA, na forma do voto do Relator p/acórdão.

Rio de Janeiro, 30 de maio de 2007 (data do julgamento).

BENEDITO GONÇALVES

Relator p/ acórdão

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!