Pirataria de oficina

Cade definirá limite entre propriedade industrial e concorrência

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11 de julho de 2007, 19h50

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) tem uma árdua tarefa pela frente. Definir o limite entre propriedade industrial e concorrência. O caso concreto se refere a uma Representação protocolada na Secretaria de Direito Econômico para que seja declarado ilícito o comportamento das montadoras Ford, Fiat e Volkswagen que andam impedindo o mercado paralelo dos fabricantes de autopeças de reposição.

O que o Cade deve definir é se a cópia de parte de uma autopeça de reposição fere a Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) e se proibir este tipo de trabalho infringe a Lei de Proteção da Concorrência (Lei 8.884/94).

A autora da Representação é a Anfape (Associação Nacional dos Fabricantes de Autopeças). A Anfape reclama que as montadoras têm ingressado com ações de busca e apreensão contra empresas que fabricam peças de reposição de automóveis usados, com a alegação de que tal atitude fera a Lei 9.279/96. Segundo a associação, já são dezenas de pedidos dessa natureza, todos aceitos pela Justiça. Há ainda notificações extrajudiciais, para que as empresas parem de vender e fabricar as autopeças.

Para a Anfape, o que as montadoras querem é concentrar esse tipo de mercado, o que é infração contra a ordem econômica. “A montadora detém a patente para proteger seu investimento e evitar que a concorrente, outra montadora, crie um produto igual ao seu. Só que o mercado de reposição não concorre com esse mercado, são mercados distintos”, defende Laércio Farina, advogado da Anfape.

De acordo com Farina, com a expansão da venda de seminovos, as montadoras transferiram parte de sua lucratividade para o mercado de reposição. Se o consumidor comprar separadamente todas as peças do seu veículo em concessionárias, pagará no total de sete a oito vezes o valor do carro na concessionária, como apurou o Ministério Público de São Paulo. “As montadoras estão enfrentando concorrência distinta e quem ganha com isso é o consumidor. Restringir o mercado de autopeças encarece o seguro e incentiva o furto de peças de carro. O preço final é repassado ao consumidor e não às montadoras. Por isso a necessidade de se declarar ilícita a atitude da Ford, Fiat e Volks”, explica o advogado.

Metodologia

O registro das autopeças é feito como desenho industrial no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). De acordo com o advogado Newton Silveira, do Cruzeiro Newmarc Propriedade Intelectual, o objetivo é proteger a marca estética do produto.

Este tipo de registro tem características próprias. Ele é exclusivo por 10 anos, prorrogáveis por mais três vezes cinco anos, o que resulta num total de 25 anos. Para ser renovado o registro, a montadora precisa apresentar dois requisitos: novidade e originalidade. Quando as condições não são cumpridas, o registro recebe o “carimbo” de mal concedido. Quem tem a intenção de fabricar essas peças, pode fazê-lo com o argumento de que o registro é nulo.

“Se o desenho está devidamente registrado, a montadora tem direito de pedir busca a apreensão na Justiça, porque a criação está protegida pela propriedade industrial”, diz Silveira.

Quem quer “copiar” a peça usa a chamada engenharia reversa. Ou seja, a pessoa desmonta o invento e a reproduz. Para Laércio Farina, se alguém faz um carro idêntico ao de uma montadora, infringe a lei. Mas se copia um parte do produto, ser vendido exclusivamente para reposiçãom, sem enganar o consumidor, age licitamente.

“O que temos é o conflito da lei de propriedade industrial e a lei de proteção à concorrência. Fomos a um órgão técnico justamente para que se estabeleça a linha divisória. O que a Anfape defende é que a ação da montadora claramente afronta a lei antitruste, porque a cópia de parte de uma autopeça, para reposição, não configura afronta a lei que protege a criação”, finaliza Farina.

O presidente da entidade, Renato Ayres Fonseca, ressalta que, diferentemente da compra de um carro, a aquisição de autopeças para reposição não está atrelada a atributos como design, potência, economia de combustível, gosto pessoal. Segundo ele, o que o consumidor procura é durabilidade e preço acessível.

“A maioria das peças visuais de um veículo não é intercambiável. O design não possui nenhum apelo de venda quando tratamos da reposição”, diz.

Notícia alterada nesta quarta-feira (18/07), às 16h35, para acréscimo de informações.

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