Atravessou o Júri

Promotor pede ação contra promotor que o ofendeu em juizo

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8 de julho de 2007, 0h00

A imunidade judiciária é ilimitada? Se não é, qual o limite do promotor de justiça – que tem como prerrogativa a inviolabilidade de opinião – nas manifestações contra adversários numa sessão do Júri? As perguntas foram feitas ao Judiciário paulista, com outra provocação: o membro do Ministério Público pode abusar dessa garantia para ofender a dignidade e o decoro de outro profissional do Direito, sem que incorra em crime?

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça foi chamado para resolver a questão e decidir se recebe ou não queixa-crime, apresentada por um promotor e sua mulher, defensora pública, contra outro promotor de justiça. O julgamento foi suspenso com dois votos favoráveis e um contra a ação penal privada. Votaram pela recepção da ação os desembargadores Vallim Bellocchi e Sousa Lima. O relator, Mohamed Amaro votou contra.

Francisco Taddei Cembranelli acusa o promotor Hidejalma Muccio de crime de injúria. Segundo Cembranelli, o colega teria ofendido a dignidade de sua mulher, a defensora pública Daniela Sollberger, e do casal, durante sessão no plenário 6 do 1º Tribunal do Júri. O fato aconteceu em fevereiro do ano passado, quando do julgamento de Adilson Ferreira Leite pelo crime de homicídio. O casal sustenta na ação penal privada que a inviolabilidade do promotor de justiça não é ilimitada e que o suposto abuso não pode ser tolerado.

Quatro frases que foram apresentadas como de autoria de Hidejalma provocaram a queixa do casal: “… se seu filho tomasse um tiro na cabeça, não teria coragem de dizer isso”, “… se eu tivesse que falar que a senhora era mulher de um promotor, teria que falar coisas desairosas sobre o casal”; “… cada um tem o marido que escolheu e a mulher que escolheu”; e “o marido da defensora é um grande condenador e neste processo teria pedido a condenação”. De acordo com a Ação Penal Privada, ao fazer as afirmações Hidejalma teria ofendido e jogado o nome, a honra e a respeitabilidade do casal no lixo.

Hidejalma se defende com o argumento de que não há justa causa para a ação penal porque estava possuído do ânimo de debater, movido pelo interesse público e não de ofender a honra dos denunciantes. Para ele, não se pode falar de crime de injúria por conta das afirmações feitas no julgamento. Segundo o promotor de justiça, as expressões apontadas como injuriosas não significam ato desonroso como aponta o casal. Alega que esclareceu, no pedido de explicações feito pelos ofendidos, o sentido das expressões que usou no debate e que desta forma afastou a hipótese de ofensa a dignidade ou decoro do casal.

Argumenta, ainda, que só citou a defensora pública como mulher de seu colega de promotoria, porque ela usou como argumento para convencer os jurados o fato de ser mulher de promotor de justiça. “A honra pessoal é o valor espiritual, a alma, os quais, definitivamente, não foram atingidos com as expressões proferidas pelo querelado (Hidejalma) durante julgamento do Júri, uma vez que além de não serem injuriosas, tinham relação com a discussão em tela”, afirmou o promotor de justiça por meio de seu advogado, Luiz Carlos Galvão de Barros.

Por fim acrescenta, que caso houvesse algum crime contra a honra, nos fatos narrados na ação penal, este seria o de difamação e não de injúria. “Isso porque a difamação, segundo a doutrina, é imputar a alguém fato determinado, ofensivo à sua reputação, enquanto que a injúria é uma afirmativa genérica ofensiva à dignidade da pessoa”, afirmou Hidejalma.

Os ofendidos alegam que o acusado não estaria protegido pela imunidade jurídica e que por causa disso deve responder criminalmente pelas frases pronunciadas durante o julgamento. Cembranelli ainda acusa o colega de “useiro e vezeiro” em atacar a honra alheia e de que “sapateia e enxovalha a honra do seu adversário e, depois, se esconde atrás de suas prerrogativas, quando não de mentiras”. Na queixa-crime, o casal cita outros dois julgamentos, no 1º Tribunal do Júri, em que constou em ata supostas ofensas de Hidejalma contra advogados e defensores públicos.

Antes de chegar ao Judiciário, o caso passou pela Corregedoria-Geral do Ministério Público paulista. O corregedor à época, Paulo Hideo Shimizu, abriu sindicância para apurar suposta infração de descumprimento do dever funcional (zelar pelo respeito aos membros do Ministério Público, aos magistrados e advogados). A corregedoria arquivou o caso em julho do ano passado.

A chefia do Ministério Público paulista, por meio do procurador de justiça Hermann Herschander se manifestou no julgamento pela rejeição da queixa-crime. O procurador argumentou que não pretendia sustentar que o Júri pode ser palco para ataques verbais “irrefreados”, mas que se pode adotar maior tolerância com respeito ao linguajar usado pelas partes.

“No caso dos autos, a querelante (defensora pública), validamente, procurou convencer os jurados de suas teses, invocando, entre outros argumentos, sua honrosa condição de esposa do querelante (Cembranelli). O querelado (Hidejalma), procurando rebater seu argumento, proferiu expressões fortes, que pretendiam retirar do argumento extrajurídico da defesa qualquer força persuasiva”, afirmou o procurador de justiça.

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