Ponte de inimizade

Polícia Federal reclama de falta de estrutura na fronteira

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4 de julho de 2007, 14h33

A Federação Nacional dos Policiais Federais, a Fenapef, divulgou nesta quarta-feira (4/7) um dossiê em que chama a atenção para o descaso das autoridades brasileiras com a chamada tríplice fronteira. Segundo o relatório, “só 5% do que entra no país através da Ponte da Amizade é fiscalizado, o restante passa. Mesmo assim, só em 2006 as apreensões somaram US$ 60 milhões, o equivalente a 25% do valor de todas as apreensões feitas no território brasileiro”.

O dossiê tem trechos polêmicos como, por exemplo, o que diz que “a cerca de 200 metros da Receita Federal existe um buraco feito na grade da Ponte. Por esta brecha contrabandistas arremessam suas mercadorias”.

A Fenapef reclama também da falta de estrutura para o trabalho dos policiais federais. “A falta de estrutura está fazendo com que um grande número de policiais federais peça transferência de Foz do Iguaçu o que em curto prazo pode representar uma deterioração ainda maior do serviço prestado ao país”, afirma.

380, que institui o Regime Tributário Unificado (RTU) na importação de mercadorias do Paraguai. O novo regime terá alíquota única que engloba quatro impostos federais: o Imposto de Importação (II), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a Cofins e o PIS. O teto dessa alíquota será de 42,5% do preço de aquisição da mercadoria importada. A medida pretende ser um esforço para controlar o fluxo de mercadorias na fronteira objeto das críticas da Fenapef.

Leia a íntegra do relatório:

De um lado está Ciudad del Este no Paraguai. De outro, Foz do Iguaçu no Brasil. A separar estas duas cidades o rio Paraná e sobre ele a Ponte Internacional da Amizade. Pouco mais de 500 metros de aço e concreto que se transformou em rota obrigatória para quem vive do comércio de produtos “importados”, na sua maior parte, ilegalmente.

Segundo estimativas da Receita Federal todos os dias 40 mil pessoas e 5 mil veículos, atravessam a ponte. Este exército é formado em sua maior parte de sacoleiros que buscam no país vizinho produtos baratos para serem revendidos no Brasil. As estimativas mostram que deste total só 5% do que entra no país através da Ponte é fiscalizado, o restante passa. Mesmo assim, só em 2006 as apreensões somaram US$ 60 milhões, o equivalente a 25% do valor de todas as apreensões feitas no território brasileiro.

Acontece que nem só de cigarros, pneus, produtos eletrônicos e quinquilharias em geral vive a Ponte da Amizade e suas cercanias. A região serve também como porta de entrada de armas e drogas para o Brasil. E não é preciso ir muito longe para ver a falta de controle na fronteira.

A cerca de 200 metros da Receita Federal existe um buraco feito na grade da Ponte. Por esta brecha contrabandistas arremessam suas mercadorias. Na outra ponta do “atalho do crime” estão os carregadores que juntam a mercadoria lá em baixo e a colocam nos carros que já esperam pelas encomendas.

Neste caos instalado durante 24h por dia quatro policiais federais fazem das tripas coração para manter alguma ordem, mas apesar de todo o esforço a ponte sempre vence. É humanamente impossível 4 pessoas cuidarem de 40 mil transeuntes e mais 5 mil carros todos os dias. O trabalho tem que ser feito por amostragem reduzindo, portanto, sua eficácia.

Na última semana, num dos turnos de trabalho, um único policial federal arriscava a vida no meio da multidão para impedir que criminosos jogassem mercadorias pelo buraco na cerca da ponte. Bastou o policial federal sair do local para executar outra tarefa para uma chuva de caixas começar a cair de cima da ponte numa cena que nem o mais surrealista dos cineastas conseguiria reproduzir.

Outra saída encontrada pelos contrabandistas para introduzir no Brasil suas mercadorias são os portos clandestinos próximos à ponte Internacional da Amizade. Da própria ponte é possível visualizar três bases utilizadas pelos criminosos. A saída seria uma política permanente de destruição destes locais e perseguição às embarcações clandestinas. Mas para isso a PF precisaria de mais efetivo, mais condições de trabalho e principalmente melhor gestão por parte de seus administradores de plantão. Resultado: vitória da ponte de novo.

SINDICATO – O mais curioso de tudo isso é que todo mundo está careca de conhecer esta realidade. Em 23 de junho de 2003 a delegacia Sindical do Sindicato dos Policiais Federais no Paraná já alertava para o quadro que estava se formando. “Temos consciência da gravidade do problema nesta fronteira, que diga de passagem é a maior porta de entrada do país para drogas ilícitas”, diz o documento.

Mais adiante o documento aponta a falta de condições de trabalho para que os policiais federais consigam combater o crime com eficácia. Segundo o texto, em uma das operações realizadas os policiais federais que realmente conhecem a região sequer foram ouvidos para que pudessem contribuir com o planejamento operacional da ação.

Além disso, o documento enviado ao delegado chefe da PF em Foz do Iguaçu pede providência para melhor administração das escaladas de serviço e dos plantões dos policiais federais. “É comum os policiais federais solicitarem apoio da Polícia Militar para atenderem ocorrências externas por não contarem com plantão na sede”.

O documento de 2003 finaliza dizendo que “As desculpas são muitas para justificar os problemas e já estamos cansados de ouvir expressões tais como: Não há servidores em número suficiente, viaturas, instalações, etc…para cumprir nossas missões. Desculpas essas, perfeitamente cabíveis para a administração de uma agência bancária, mas nunca para a Delegacia de Polícia Federal mais importante do País”.

Passados quase quatro anos da elaboração deste documento pouca coisa mudou. Ao invés de otimização dos serviços e respeito aos policiais federais o administrador de plantão, delegado Carlos Aldair Medeiros dos Santos investe em iniciativas estapafúrdias, como normatizar o uniforme dos policiais Ou normas orientando como e quando eles devem fazer as refeições. As iniciativas, não é preciso ser gênio para descobrir, em nada contribuem com o bom trabalho policial.

Na última semana o diretor de Relações do Trabalho da Federação Nacional dos Policiais Federais, Francisco Carlos Sabino esteve em Foz do Iguaçu e pode comprovar de perto a situação. “Os policiais federais trabalham incansavelmente naquela fronteira, no entanto, os administradores do órgão no local, não conseguem dar o respaldo necessário às ações da polícia”, diz o diretor.

A falta de estrutura está fazendo com que um grande número de policiais federais peça transferência de Foz do Iguaçu o que em curto prazo pode representar uma deterioração ainda maior do serviço prestado ao país.

Uma das últimas iniciativas do administrador de plantão foi transferir o agente federal Adão Luiz Sousa Almeida, que coordenava os trabalhos realizados na ponte, para uma função burocrática. Toda a experiência do agente federal no combate ao crime foi desconsiderada, por talvez ele ser delegado sindical e isso não ser do agrado do delegado executivo. “A medida adotada contra o colega Almeida vem revestida de uma falta de inteligência sem precedentes dentro da Polícia Federal. E isso nos faz perguntar: A quem interessa a saída do APF Almeida da Ponte?”

Quem vem da Argentina para o Brasil pela tríplice fronteira encontra uma situação de arrepiar os cabelos. A Aduana brasileira fica a cerca de 1 km da ponte Tancredo Neves que separa os dois países. Acontece que antes de chegar lá uma estrada vicinal serve de atalho para quem quiser. Uma estrada de terra que conta com um intenso movimento. Certamente o atalho não é utilizado para coisa boa, mas ele está lá para quem quiser ver.

Fora isso, os dois policiais federais que trabalham nesta fronteira estão jogados a própria sorte. As dificuldades dos federais começam pela estrutura de trabalho. Falta Banheiro, o único disponível é um local público na própria aduana. Além disso, os policiais não dispõem de viatura. Caso for necessário perseguir um criminoso ou vai correndo ou utiliza o próprio carro.

“Essa é a Polícia Federal que o Brasil não vê”, diz o diretor Francisco Sabino.

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