Ativos e passivos

A Interpretação Fasb 48 e as novas regras tributárias

Autor

  • Douglas Yamashita

    é advogado tributarista doutor em Direito Tributário pela USP sócio do escritório Advocacia Rodrigues do Amaral e autor do livro Elisão e Evasão de Tributos — Planejamento Tributário: Limites à Luz do Abuso do Direito e da Fraude à Lei.

25 de janeiro de 2007, 23h01

Com a recente entrada em vigor da Interpretação Fasb 48 (“FIN 48”), do Financial Accounting Standards Board, em 15 de dezembro, acerca do Pronunciamento Fasb 109, de 1992, sobre a contabilização de incertezas relativas a tributos sobre a renda, coloca-se em questão para empresas multinacionais o contingenciamento de eventuais passivos tributários relacionados, por exemplo, a preços de transferência, rateio de custos ou planejamentos tributários locais ou internacionais.

Essas normas contábeis norte-americanas afetam tanto as empresas brasileiras listadas na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) como as subsidiárias norte-americanas no Brasil. Mesmo para empresas brasileiras não sujeitas a tais normas, a forte tendência de convergência entre normas contábeis brasileiras e normas internacionais de contabilidade deverá impor, mais cedo ou mais tarde, maior transparência no reconhecimento e mensuração de ativos e passivos tributários. É inclusive o que se vislumbra a partir do Projeto de Lei 3.741/00, para a reforma da Lei das SAs.

Como o Pronunciamento Fasb 109, de 1992, não prescrevia critérios específicos sobre como lidar com incertezas na contabilização de ativos e passivos relacionados a tributos sobre a renda, à mencionada FIN 48 veio estabelecer tais critérios de reconhecimento e mensuração desses ativos e passivos tributários em períodos intermediários ou anuais que possam resultar na redução ou diferimento do pagamento de tributos sobre a renda ou numa mudança na expectativa de realização de ativos tributários diferidos, num processo de dois estágios.

O primeiro estágio é o reconhecimento: a empresa determina se é mais provável do que improvável (more-likely-than-not) que uma situação tributária será sustentada quando examinada, incluindo a solução de quaisquer recursos ou processos litigiosos, baseada nos méritos técnicos dessa situação. Nessa avaliação, a empresa deve presumir que a situação tributária será examinada por uma autoridade fiscal que tenha pleno conhecimento de toda informação relevante.

O segundo estágio é a mensuração: uma situação tributária que cumpre o critério de reconhecimento do “mais provável do que improvável” é mensurada para determinar o montante de benefício a reconhecer nas demonstrações financeiras. A situação tributária é medida pelo maior valor de benefício cuja probabilidade de aproveitamento sob decisão definitiva for acima de 50%.

Uma das situações tributárias, cuja avaliação de risco é da maior complexidade, é aquela envolvendo planejamentos tributários. Segundo a FIN 48, quando uma estratégia de planejamento tributário é contemplada como geradora de uma renda tributável a suportar o aproveitamento de um ativo tributário diferido (por exemplo, prejuízos fiscais acumulados), tal situação deverá passar pelos mencionados estágios de reconhecimento e mensuração.

No Brasil, é o caso de operações destinadas ao aproveitamento de prejuízos fiscais, tais como a incorporação de empresas lucrativas por empresas deficitárias (“incorporação às avessas”), a incorporação ou cisão com exceção à trava de 30%, a conferência de ativos a empresas deficitárias (drop down), etc.. Sublinhe-se, porém, que o que determina se uma operação é um planejamento tributário legitimamente sustentável ou uma evasão de tributos de difícil defesa não é o tipo de operação, mas sim o modo de execução de cada uma dessas operações a determinar sua licitude ou ilicitude. Prova disso é que algumas incorporações às avessas, por exemplo, foram consideradas lícitas e legítimas pelo Conselho de Contribuintes e outras reputadas ilícitas e simuladas.

Para avaliar prudentemente a licitude de uma operação, já não basta verificar apenas se a operação foi real e não simulada (declarações condizentes com a intenção, sem conluio, nem intuito de prejudicar o fisco). É necessário avaliar também se não foi dissimulatória da renda tributável mediante abuso do direito ou fraude à lei tributária (artigos 166, VI, e 187 do Código Civil de 2002 artigo 116, parágrafo único, do CTN).

A experiência tem nos mostrado ainda alguns princípios pragmáticos na avaliação dos planejamentos tributários, cuja inobservância pode prejudicar sua sustentabilidade. São os princípios da transparência, da carga tributária global, da reversibilidade da operação, do custo/benefício e do propósito negocial (business purpose).

Outros importantes critérios de avaliação, como a duração e a freqüência de certas operações, só podem ser extraídos da análise de cada caso concreto, afinal por mais similares que possam parecer, nenhum planejamento tributário é igual ao outro, o que faz da elaboração de cada demonstração financeira ao mesmo tempo uma ciência e uma arte.

[TExto alterado com correção de informação em 1/2/2007]

Autores

  • Brave

    é advogado tributarista, doutor em Direito Tributário pela USP, sócio do escritório Advocacia Rodrigues do Amaral e autor do livro Elisão e Evasão de Tributos — Planejamento Tributário: Limites à Luz do Abuso do Direito e da Fraude à Lei.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!