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Rio está impedido de usar verbas destinadas à publicidade

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16 de janeiro de 2007, 18h16

A Justiça Federal impediu o estado do Rio de Janeiro de usar as verbas destinadas para a publicidade. A juíza Regina Coeli Medeiros de Carvalho, da 18ª Vara Federal do Rio de Janeiro, também determinou o bloqueio dos valores oriundos do Fundo de Participação dos Estados e de todas as transferências voluntárias.

A medida foi tomada em Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal. De acordo com o MPF, o Rio não tem respeitado o percentual de 12% que deve ser gasto na área de saúde, conforme determina a Emenda Constitucional 29/00.

O MPF alega que o Projeto de Lei Orçamentária, para o exercício de 2007, prevê a destinação de R$ 26,6 milhões para a Secretaria de Comunicação Social. Para o MPF, 50% desse valor garantiria, em parte, a melhora do sistema de saúde no Rio.

O Ministério Público Federal também contesta a constitucionalidade das Leis estaduais 4.617/03 e 4.179/03, que permitem que os recursos destinados à saúde sejam usados em outros serviços como Farmácia Popular e Programa Suplementação Alimentar. Para o MPF, esses serviços não podem ser considerados como ações de saúde e sim de assistência social, pois não atendem a todos os cidadãos.

Veja a decisão:

PODER JUDICIÁRIO – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

18ª VARA FEDERAL – RIO DE JANEIRO

PROCESSO: 2006.51.01.023830-0

AUTOR: ministério público federal

RÉ: > UNIÃO FEDERAL e outro

DECISÃO

Vistos, etc.

Trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo ministério público federal em face da UNIÃO FEDERAL e do estado do rio de janeiro, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, inaudita altera pars, objetivando que seja determinado o remanejamento de receitas públicas que estão destinadas à Secretaria de Estado de Comunicação Social, para publicidade e divulgação de ações do Governo do Estado do Rio de Janeiro, conforme previsão no Projeto de Lei Orçamentária para o exercício de 2007, para aplicação em ações e serviços de saúde, ou, alternativamente, que seja o segundo Réu impedido de alocar recursos do Fundo Estadual de Saúde nos programas previstos pelas Leis Estaduais nos. 4.167/2003 e 4.179/2003, questionados na presente ação, sob pena de multa diária a ser fixada pelo Juízo, em caso de descumprimento.

Alega, em síntese, que a presente demanda visa a condenação do Estado do Rio de Janeiro na obrigação de ressarcir os danos decorrentes da destinação e aplicação incorretas da verba orçamentária vinculada à saúde, no ano de 2005, em desobediência à Emenda Constitucional nº. 29/2000, bem como a condenação da União a condicionar a entrega dos valores do Fundo de Participação dos Estados – FPE, ao cumprimento dos artigos 198, §2º, inciso II e 160, parágrafo único, inciso II, da Constituição da República e, ainda, relativamente às transferências voluntárias previstas no artigo 25, da Lei Complementar nº. 101/2000.

Aduz que a Emenda Constitucional nº. 29/2000 estabeleceu um percentual mínimo de recursos a ser obrigatoriamente aplicado na área da saúde, de 12% (doze por cento) desde o ano de 2004, cuja base de cálculo foi regulamentada e definida por meio das Resoluções nos. 316/2002 e 322/2003 do Conselho Nacional de Saúde, devendo o referido percentual incidir sobre os recursos chamados “fonte 00”, a saber, recursos ordinários não vinculados e decorrentes de impostos.

Assevera que, não obstante a determinação legal para a aplicação do referido percentual, o Estado do Rio de Janeiro (segundo Réu) vem sonegando à área de saúde os recursos que a ela deveriam estar vinculados, desviando-os para outras áreas.

Afirma que, ao apreciar a prestação de contas, no ano de 2005, o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro – TCE/RJ excluiu, da base de cálculo para a apuração dos valores a serem destinados à saúde, a parcela relativa à transferência compulsória ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento de Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF, desatendendo à Portaria nº. 328, da Secretaria do Tesouro Nacional – STN, de 21/08/2001, a qual determina que o montante correspondente a 15% (quinze por cento) dos impostos transferidos ao referido Fundo “deveria ser registrado em conta retificadora da receita de impostos” (sic), sendo, por conseguinte, originários de “fonte 00”, pelo que não podem deixar de integrar a base de cálculo para apuração dos gastos com a saúde.

Menciona que, em razão da referida exclusão, a base de cálculo para apurar os gastos destinados à área de saúde totalizou, em 2005, segundo o Relatório do TCE/RJ, R$ 12.283.699.164,09 (doze bilhões, duzentos e oitenta e três milhões, seiscentos e noventa e nove mil, cento e sessenta e quatro reais e nove centavos), ao passo que deveria ser de R$ 13.899.637.397,84 (treze bilhões, oitocentos e noventa e nove milhões, seiscentos e trinta e sete mil, trezentos e noventa e sete reais e oitenta e quatro centavos).

Aponta, ainda, que o limite mínimo constitucional de gastos com a saúde foi calculado erroneamente pelo Estado do Rio de Janeiro, sendo o montante apresentado diverso daquele obtido pelo TCE/RJ, eis que naquele foi incluído o equivalente a duas vezes a cota do empregador para a contribuição patronal de natureza previdenciária ao RIOPREVIDÊNCIA, embora esta não possa ser considerada como aplicação em saúde, eis que são despesas do Estado como pessoa jurídica de direito público interno.

Acrescenta que várias outras despesas, como pagamentos por terceirizações efetuadas em substituição de servidores e de empregados públicos, bem como a implementação de programas não universais e não gratuitos, previstos nas Leis Estaduais nº. 4.167/2003 e nº. 4.179/2003, cuja inconstitucionalidade é suscitada de forma incidental na presente demanda, foram indevidamente incluídas como gastos e aplicações na área de saúde.

Conclui que o real gasto com a saúde no Estado do Rio de Janeiro, no ano de 2005, não ultrapassou R$ 1.024.931.848,57 (um bilhão, vinte e quatro milhões, novecentos e trinta e um mil, oitocentos e quarenta e oito reais e cinqüenta e sete centavos), correspondendo a um percentual de 7,37% (sete vírgula trinta e sete por cento) da base de cálculo prevista na EC nº. 29/2000, pelo que o segundo Réu teria deixado de aplicar, em ações e serviços de saúde, o valor de R$ 643.024.639,17 (seiscentos e quarenta e três milhões, vinte a quatro mil, seiscentos e trinta e nove reais e dezessete centavos).

Questiona a constitucionalidade das Leis Estaduais nos. 4.167/2003 e 4.179/2003, as quais prevêem a aplicação dos recursos do Fundo Estadual de Saúde em programas de trabalho que não podem ser considerados como ações e serviços de saúde, e sim de assistência social, eis que os referidos programas não atendem aos princípios da universalidade e do acesso gratuito, tais como Farmácia Popular, Programa Suplementação Alimentar, “Compartilhar/Cheque Cidadão”, dentre outros.

Reputa que a primeira Ré deve condicionar a entrega dos recursos referentes ao Fundo de Participação dos Estados – FPE ao cumprimento do art. 198, §2º, incisos I e III, da Constituição da República, de acordo com o disposto no art. 160, inciso II da referida Carta, em razão da não observância, pelo segundo Réu, ao prescrito pela EC nº. 29/2000, eis que se tratam de verbas sujeitas à fiscalização da União Federal, do mesmo modo que as chamadas “transferências voluntárias” (sic), nos termos do art. 25, §1º, item “b”, da Lei Complementar nº. 101/2000.

Com relação ao pedido de antecipação dos efeitos da tutela, destaca que o Projeto de Lei Orçamentária para o exercício de 2007 prevê a alocação de R$ 26.679.222,00 (vinte e seis milhões, seiscentos e setenta e nove mil, duzentos vinte e dois reais) para a Secretaria de Estado de Comunicação Social, sendo verba destinada à publicidade das ações de governo, pelo que entende que o remanejamento pleiteado, ao menos de 50% deste valor ou do que for aprovado para a referida rubrica, consistiria em medida útil para garantir o suprimento parcial da área de saúde, face à precariedade em que esta se encontra.

Ainda, a título de antecipação dos efeitos da tutela, requer que seja determinado à primeira Ré o depósito em juízo dos valores do Fundo de Participação dos Estados, destinados ao Estado do Rio de Janeiro, bem como os valores relativos às transferências voluntárias previstas no art. 25, da Lei nº. 101/2000, em razão de a primeira Ré estar realizando as mencionadas transferências sem a fiscalização devida da aplicação dos referidos recursos, pelo segundo Réu, nos moldes ditados pela Constituição da República.

Ressalta, como periculum in mora, o tempo despendido para o trâmite processual, em contrapartida com a falta de cumprimento do segundo Réu para com a sua parte no pacto federativo à assistência à saúde, havendo risco de danos irreversíveis para a sociedade, a qual depende do atendimento do sistema público de saúde.

É o relatório do necessário. Passo a decidir.

Com efeito, da leitura da exordial, verifico que o pedido formulado, pelo Parquet, a título de antecipação dos efeitos da tutela, diverge do pedido meritório, consubstanciando-se, na verdade, em uma medida de natureza cautelar, que visa a resguardar o bem jurídico que se pretende tutelar por meio da presente, qual seja, o da adequada e satisfatória aplicação dos recursos financeiros destinados à área de saúde, nos termos disciplinados pela Emenda Constitucional nº. 29/2000.

Desta feita, considerando-se a gravidade do tema, tenho que a situação em tela autoriza a aplicação do artigo 798, do Código de Processo Civil, consagrador do poder geral de cautela do Juiz, a fim de assegurar os efeitos da prestação jurisdicional, em caso de eventual provimento positivo na presente demanda, pelo que entendo cabível determinar o bloqueio das verbas mencionadas na exordial.

Nesse giro, defiro parcialmente a liminar para determinar o bloqueio das verbas previstas para a Secretaria de Comunicação Social do Estado do Rio de Janeiro, destinadas à publicidade e/ou divulgação das ações de Governo, conforme previsão no Projeto de Lei Orçamentária para o exercício de 2007, bem como dos valores oriundos do Fundo de Participação dos Estados, destinados ao Estado do Rio de Janeiro e, ainda, dos recursos relativos às transferências voluntárias, previstas no art. 25, da Lei nº. 101/2000, até a apreciação do pedido formulado em sede precária.

Outrossim, consoante o disposto no art. 2º, da Lei nº. 8.437/92, intime-se os representantes judiciais dos Réus, para manifestação, em 72 (setenta e duas) horas, sobre o pedido de antecipação dos efeitos da tutela formulado na inicial da presente Ação Civil Pública.

Oportunamente, voltem conclusos para decidir.

P.I.

Rio de Janeiro, 12 de janeiro de 2007.

REGINA COELI MEDEIROS DE CARVALHO

Juíza Federal Titular da 18ª Vara

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