Barão de Mauá

Moradores antigos do Barão de Mauá não serão indenizados

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13 de janeiro de 2007, 23h01

Aqueles que venderam seus apartamentos do condomínio Edifício Barão de Mauá, no município paulista de Mauá, antes da explosão, vão ficar sem indenização. A juíza Maria Lucinda da Costa, da 3ª Vara Cível de Mauá (SP), esclareceu que só têm direito à reparação quem sofreu com a desvalorização dos imóveis por causa da descoberta da contaminação do solo.

O esclarecimento da juíza veio em Embargos de Declaração contra a sentença dada em setembro. Na ocasião, a juíza fixou o prazo de dois meses para que o município de Mauá elaborasse um plano de evacuação para retirar as 1,7 mil famílias que moram no condomínio. Os Embargos suspenderam o prazo, que volta a correr a partir de agora. Para a juíza, não ficou provado que o solo onde ficam os 55 prédios não está contaminado por gases tóxicos. Todos os prédios devem ser demolidos. Segundo o entendimento da juíza, esta é a única forma de descontaminar o solo do terreno.

Depois que o plano de evacuação estiver pronto, o município e os responsáveis pela construção e venda dos apartamentos, réus na mesma ação, terão sete meses para programar o pagamento das indenizações e a saída das famílias. A Ação Civil Pública foi proposta pelo Ministério Público e por mais duas associações co-autoras: Movimento Brasileiro Juventude Comunidade e Justiça e Cidadania e Associação Instituto da Cidadania.

De acordo com Aurélio Okada, que representa o Movimento Brasileiro, esta decisão deverá servir de paradigma para as diversas ações individuais que correm nas varas de Mauá. “Alguns juízes deixaram para decidir depois que a ação coletiva fosse julgada, para que não haja divergência.”

Caixas d’água

Os moradores do condomínio Barão de Mauá entraram na Justiça quando descobriram que suas casas foram construídas num terreno usado como depósito de lixo industrial. Sustentam que há pelo menos 40 tipos de gases tóxicos no local, alguns com substâncias cancerígenas.

O caso do condomínio Barão de Mauá veio a público quando, em abril de 2000, quando um homem morreu e outro teve 40% do corpo queimado numa explosão durante a manutenção de uma caixa d’água. Um deles teria usado um isqueiro na ocasião. A Cetesb atribuiu a explosão ao acúmulo de gás metano e, então, descobriu-se que o conjunto de 72 prédios foi construído num aterro industrial clandestino.

Como ainda vai levar tempo para que todas as pessoas sejam retiradas, a sentença também previu que, dentro de 3 meses, sejam construídas caixas d’água que não sejam no subsolo. Além disso, a prefeitura de Mauá terá de fazer cinco sessões públicas para esclarecer os moradores sobre os riscos de permanência no imóvel.

Veja a decisão

Processo: CÍVEL

Comarca/Fórum: Fórum de Mauá

Processo Nº: 348.01.2001.008501-4

Cartório/Vara: 3ª. Vara Judicial

Competência: Cível

Nº de Ordem/Controle: 1157/2001

Grupo: Fazenda Pública Municipal

Ação: Ação Civil Pública

Tipo de Distribuição: Dependência

Distribuído em: 12/09/2001 16h46

Moeda: Real

Valor da Causa: 1.000,00

Qtde. Autor(s): 3

Qtde. Réu(s) : 5

PARTE(S) DO PROCESSO

Requerido:ADMINISTRADORA E CONSTRUTORA SOMA LTDA

Advogado: 18733/SP WALFRIDO JORGE WARDE

Requerido: COFAP COMPANHIA FABRICADORA DE PECAS

Advogado: 129895/SP EDIS MILARE

Advogado: 188177/SP RENATA PIRES CASTANHO CHECCHINATO

Advogado: 94582/SP MARIA IRACEMA DUTRA

Advogado: 54018/SP OLEGARIO MEYLAN PERES

Advogado: 155228/SP MARCIO SILVA PEREIRA

Requerido: FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MAUÁ

Advogado: 69636/SP WANDERLI BORTOLETTO MARINO DE GODOY

Advogado: 45353/SP DELFINO MORETTI FILHO

Advogado: 124581/SP CACILDA LOPES DOS SANTOS

Requerente:INSTITUTO DE DEFESA DA CIDANIA IDC

Advogado: 140578/SP EDUARDO BARBOSA NASCIMENTO

Advogado: 179977/SP SANDRA REGINA REZENDE NASCIMENTO

Requerente: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SAO PAULO

Requerente: MOVIV BRAS UNIVERSITATES PERSONARUM JC&JC JUV COM JUST E CIDADANIA

Advogado: 177014/SP AURÉLIO ALEXANDRE STEIMBER PEREIRA OKADA

Requerido: PAULICOOP PLANEJAMENTO ASSES COOPERATIVAS HABITACIONAIS SC LTDA

Advogado: 12363/SP JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO

Advogado: 118685/SP EDUARDO PELLEGRINI DE ARRUDA ALVIM

Advogado: 71924/SP RITA DE CASSIA DE VINCENZO

Advogado: 131603/SP ERIKA BECHARA

Advogado: 213873/SP DENIS RODRIGO PUTAROV

Requerido: SQG EMPREENDIMENTOS E CONSTRUCOES LTDA

Advogado: 12363/SP JOSE MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO

Advogado: 118685/SP EDUARDO PELLEGRINI DE ARRUDA ALVIM


Advogado: 33868/SP JEREMIAS ALVES PEREIRA FILHO

Advogado: 113402/SP MARIA DE FATIMA MONTE MALTEZ TAVARES

Advogado: 130493/SP ADRIANA GUARISE

Advogado: 177801/SP LUIZ FILIPE NOGUEIRA VELOSO DE ALMEIDA

Advogado: 191353/SP FÁBIO DA CUNHA MELO

INCIDENTE(S) DO PROCESSO

Incidente Nº 1

Agravo de Instrumento

28/12/2006

PROCESSO(S) APENSO(S)

ANDAMENTO(S) DO PROCESSO

21/12/2006

Despacho Proferido

Processo n° 1157/2001

1- Fls. 9348 e seguintes: Recebo os embargos de declaração e os acolho em parte para aclarar a sentença, esclarecendo que a multa diária não se aplicará à FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MAUÁ, bem como que o valor da multa diária será equivalente a dez mil UFESPs, em caso de atraso na execução do plano de desocupação e recuperação do ambiente.

Por outro lado, aclaro, ainda, a sentença, para ficar constando que cada uma das rés efetuará o pagamento da quantia indicada a título de honorários para o Instituto de Defesa da Cidadania.

Finalmente, para que não restem dúvidas, a sentença estará sujeita ao reexame necessário.

2 – Fls. 9364 e seguintes: Não conheço dos embargos, dado o caráter infringente que possuem, cabendo ressaltar que a sentença descreveu detalhadamente a responsabilidade da embargante.

Ademais, a lei impõe ao juízo o dever de expor detalhadamente as razões de seu convencimento, o que foi feito, não havendo imposição legal para resposta a perguntas que estão comentadas na sentença atacada.

Observe-se, ainda, que as provas são produzidas para convencimento do juízo e não da parte, de onde se conclui que o julgamento do feito no estado em que se encontrava é possível, pois os elementos necessários para formação de seguro juízo de convicção já estavam nos autos.

No mais, a sentença já fundamentou os motivos pelos quais eventuais recursos serão recebidos no efeito meramente devolutivo, não cabendo nova discussão do ponto.

3 – Fls. 9373: Questão a ser decidida em autos próprios.

4 – Fls. 9377: Nada a decidir, pois a sentença não tratou de mudança de nome.

5 – Fls. 9379 e seguintes: Recebo os embargos, para aclarar a sentença, especificando que as obrigações impostas deverão ser cumpridas por todas as rés, de forma solidária, observando-se que em caso de eventual impedimento à entrada das demandadas, deverão elas solicitar intervenção judicial para efetuarem as providências necessárias.

No mais, a sentença apontou com detalhes os motivos de convencimento do juízo, pelo que os demais pontos dos embargos são de caráter infringente, não sendo demais frisar que a prova maior da ausência de regularização do local antes da construção do imóvel é a ocorrência da explosão que vitimou os trabalhadores do local.

Ainda nesse aspecto a falta de regularização pelas responsáveis pelo empreendimento não exime a ré COFAP das responsabilidades, na medida em que não houve especificação, no documento de venda, da restrição à construção no local antes do saneamento.

Observe-se, ademais, a responsabilidade da COFAP em relação aos prejuízos advindos aos consumidores decorre da responsabilidade pela contaminação do ambiente, não cabendo o afastamento da condenação, ainda que não tenha ela mantido relação contratual com os adquirentes das unidades.

A tese que sustenta a necessidade de exclusão da pessoa jurídica, para responsabilização dos sócios não pode ser acolhida, tendo em conta que a empresa responde perante terceiros pelos atos de seus prepostos, sem prejuízo da possibilidade de exercício de eventual direito de regresso, não cabendo nestes autos a discussão da prática de qualquer ato com excesso de poderes.

A sentença analisou, também, a conduta culposa de cada uma das rés, não cabendo a abordagem de outros agentes poluidores ou mesmo da mídia, pois não incluídos na lide, sendo que a necessidade de ampliação do pólo passivo foi analisada por ocasião do saneador, que deve prevalecer por seus próprios fundamentos.

Os demais pontos argüidos pela demandada não bastam para afastar todos os elementos que demonstram a ausência de regularidade do ambiente, a justificar a condenação.

Quanto à possibilidade de cumulação de pena pecuniária, não se pode olvidar que a obrigação de indenizar é prévia à obrigação de fazer (recuperação do local).

Portanto, a multa incidirá caso haja atraso no cronograma de desocupação do local, pelo que não há vedação legal à determinação. No tocante ao reexame necessário, o ponto já foi observado acima.

As impugnações à ordem de demolição devem ser deduzidas em sede de apelação, sendo evidente o caráter infringente do recurso apresentado, pois, como dito na sentença, o empreendimento nasceu viciado, em desrespeito à Lei 6766/79, eis que o ambiente não estava saneado.


Logo, como a ilegalidade não se regulariza com o decurso do tempo, só cabe a demolição. Some-se a isso, a necessidade de respeito ao princípio da precaução, em matéria ambiental.

Sustentou, ainda, a embargante, que há contradição entre o saneador e a sentença, pois decidido anteriormente pela desnecessidade de remoção dos moradores do local. Todavia, não observou que as decisões anteriores se referiam a necessidade de remoção imediata.

Também não considerou a embargante que a habitabilidade não é presumida no caso em tela, em que a concentração de gases foi comprovada, tanto que houve a explosão que vitimou os trabalhadores.

Portanto, não demonstrada a ausência de contaminação, como lecionado pelos doutrinadores, impõe-se o respeito ao princípio da precaução, a justificar a demolição.

Por outro lado, como inúmeras vezes observado, há no subsolo do terreno uma grande quantidade de substâncias tóxicas, sem que exista prova segura de que, a longo prazo, tais componentes venham a entrar em contato com a população do local, o que uma vez mais comprova a aplicação do princípio da precaução ao caso concreto, em que não se comprovou, mesmo após a realização de inúmeros estudos técnicos, que haja outros meios eficazes para a recuperação do ambiente.

A determinação de construção de reservatórios de água se impôs para garantir que os moradores recebam água pura até que a desocupação ocorra. Assim sendo, como a responsabilidade solidária das rés foi reconhecida, não cabia a exclusão de qualquer delas da obrigação apontada. Sustentou, mais, a embargante, que a sentença a condenou a recuperar a mata ciliar, mesmo reconhecendo que a vegetação no local não era significativa.

Ocorre que há diferença entre a inexistência de vegetação e existência de vegetação não significativa, de forma que os limites da recuperação somente poderão ser mensurados em sede de liquidação.

Em suma, em todos os argumentos deduzidos para justificar a reforma da decisão, verifica-se que a ré COFAP tenta negar a contaminação comprovada pelos estudos citados na sentença, tanto que posteriormente postulou a suspensão do processo para apresentar solução para o problema, demonstrando que o reconhece, sem que nada tenha feito nos cinco anos de tramitação do feito, não afrontando a sentença os dispositivos legais indicados, eis que não se aplicam ao caso em tela.

Apenas dois pontos merecem ser reparados na sentença. Há contradição na sentença no tocante ao valor das multas, que são de R$ 10.000,00 para o caso de atraso na construção dos reservatórios e de 10.000 UFESPs para o caso de atraso na demais obrigações referentes às providências necessárias para a total desocupação e demolição. Ainda nesse aspecto, todavia, não cabe a irresignação quanto à exclusão da Fazenda Publica, pelos motivos já expostos em sentença.

O segundo ponto que mercê reparo, diz respeito à necessidade de exclusão da indenização moral e material devida aos adquirentes das unidades que tenham alienado seus imóveis antes da data da explosão, pois não experimentaram desvalorização do bem em decorrência da contaminação e deixaram o local antes de tomarem conhecimento dos problemas ali existentes, alem de não terem sofrido por permanecer em área irregular.

Ainda nesse aspecto, assiste razão à embargante ao deduzir que a indenização é devida apenas uma vez para cada família ou grupo de pessoas que sejam co-proprietários da mesma unidade.

Entretanto, não cabe a exclusão do dano moral dos adquirentes que nunca residiram no local, ainda que fossem apenas investidores, pois não se pode negar a angústia daquele que vê a depreciação de seu patrimônio em virtude de contaminação a qual não deu causa.

Finalmente, não cabe a execução individual nestes autos, mas em autos apartados, em respeito ao art. 98 do CDC, que faz nítida diferença entre execução individual e coletiva, bem como entre juízo da condenação e da liquidação.

6 – Fls. 8817: Para que não se alegue recusa à prestação jurisdicional, passo à análise dos embargos de declaração à decisão saneadora, para esclarecer que não houve prejuízo à concessão de prazo para que as assistentes regularizassem suas representações processuais, pelo que não caberia à suspensão do feito para tal fim.

No tocante à impugnação à inversão ao ônus da prova os embargos tem caráter infringente, pelo que não são recebidos. Também não cabe discutir a não especificação de provas, tendo em conta que o juízo entendeu não haver necessidade de outros elementos para formação de juízo de convicção. Nesses termos, não são acolhidos os embargos.

7 – Fls. 9429: A alegação de nulidade da sentença por ausência de fase instrutória e por decisão ultra petita são pontos a serem discutidos em sede de apelação.


No mais, como já dito acima, não há contradição entre as decisões anteriores e a sentença, que determinou a desocupação da área, pois há nítida diferença entre risco e risco iminente.

Da mesma forma, a sentença explorou detalhadamente as razões de culpa de cada uma das rés, a justificar a condenação solidária, apesar de não ter indicado a SQG como agente poluidor.

Não cabe o acolhimento nos embargos para impor aos lesados o ônus de demonstrar que a desvalorização dos imóveis ocorrera exclusivamente em virtude da contaminação, pois a irregularidade do local é o fator determinante da queda do preço do bem.

Quanto aos reflexos da presente demanda sobre as ações individuais já intentadas, é matéria a ser discutida naqueles autos. Também não prospera a irresignação quanto á determinação de construção de reservatórios aéreos, tendo em vista o longo tempo que será necessário para desocupação da área.

De outro lado, não há impossibilidade legal á concessão de tutela antecipada no corpo da sentença, por ausência de regra legal que a proíba, assim como a especificação dos efeitos do recurso, cabendo à parte que se sentir lesada se valer de seu direito ao duplo grau de jurisdição.

Apenas em relação à necessidade de especificação detalhada do valor da compra do bem merece ser aclarada a sentença para constar que a indenização deve ser calculada com base no valor efetivamente pago pelo bem, incluindo-se valores angariados com financiamentos não contratados junto a agentes financeiros que tenham sido repassados aos vendedores.

Observa-se, também, para que não pairem dúvidas ao final, que as medidas de contenção de riscos a serem executadas são todas aquelas indicadas na sentença, bem como as que sejam indicadas por órgãos públicos de fiscalização.

Finalmente, somente poderão as rés ser compelidas a custearem exames médicos dos moradores que estejam relacionados com doenças causadas pela contaminação, indicadas em receituário médico com tal justificativa.

7 – Fls. 9455: Os motivos pelos quais a lide foi extinta em relação ao embargante já foram expostos em sentença, o que demonstra que o recurso, visando a reforma de tal ponto é infringente.

Todavia, como os demais pontos dos embargos foram reiterados pelo Ministério Público, passo a analisá-los. Não cabe a reforma da decisão no tocante à data da aquisição da propriedade para fins de caracterização do dano moral, tendo em conta que cabia ao adquirente verificar os fatos ocorridos no local após a instalação do condomínio.

Finalmente, os danos descritos na inicial foram abordados na sentença, cabendo a terceiros não beneficiados na decisão demandar em autos próprios para defesa de seus interesses.

Da mesma forma, não havia necessidade de desconsideração da personalidade jurídica de qualquer das rés e a irresignação quanto à forma de desocupação não prospera.

A sentença está fundamentada e caberá a parte deduzir seu inconformismo em sede recursal. Considerando que o interesse na execução do julgado é dos autores, eventual recurso por eles apresentados será recebido no duplo efeito, em relação aos pontos impugnados, restando a possibilidade de execução provisória do julgado em relação às questões não atacadas.

8 – Superados os embargos de declaração, resta apenas analisar o pedido de suspensão do feito, que fica indeferido. Isto porque, a sentença contém ordem de reparação de dano ambiental e dano pessoal.

Ao Ministério Público caberá a execução apenas da condenação referente ao meio ambiente. Ocorre que a petição de fls. 9496 se refere apenas ao dano ambiental, mas se cala quanto ao dano pessoal. Portanto, não pode ser deferida a suspensão do feito para discussão extrajudicial de apenas um ponto.

Ademais, em sessenta dias, por certo, não haverá julgamento de eventual recurso a ser interposto, pelo que nada obsta que a discussão entre as partes prossiga. Lembre-se, ainda, que o pedido formulado é por demais genérico, sem especificar qual ré estaria disposta a custear as indenizações e a cumprir as demais determinações da sentença.

9 – Pelo exposto, aclaro a sentença para especificar os pontos acima destacados. Retifique-se inclusive o registro.

P.R.I.C.

Mauá, 21/12/2006.

MARIA LUCINDA DA COSTA

Juíza de Direito

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