Controle das pedras

Empresa é condenada por cartel no comércio de pedra britada

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27 de fevereiro de 2007, 0h01

A empresa Embu Engenharia e Comércio não conseguiu se livrar da multa administrativa aplicada por formação de cartel. A empresa tentou, na Justiça, anular a condenação imposta pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A juíza Cristiane Pederzolli Rentzsch, substituta na 17ª Vara Federal do Distrito Federal, entendeu que a multa era legal e, por isso, a manteve.

A Embu Engenharia e Comércio e outras 17 empresas foram condenadas pelo Cade por formação de cartel no mercado de pedra britada na região metropolitana de São Paulo. O conselho aplicou multa no valor de 20% do faturamento de cada empresa no exercício de 2002. A Embu recorreu à Justiça e conseguiu liminar para que fosse suspensa a obrigação imediata de pagar a multa, desde que fosse apresentada seguro garantia judicial no valor total da multa.

Ao julgar o mérito da questão, a juíza Cristiane não aceitou nenhum argumento da empresa, que pedia a nulidade da condenação administrativa. Para a juíza, o Cade pode sim começar um processo administrativo com base em denúncia anônima. Pode, também, fazer investigações preliminares, ainda que sigilosas, para fundamentar a instauração do processo administrativo.

A juíza observou que, ainda que não tenham sido comprovados os efeitos nocivos do cartel à ordem econômica, o simples fato de os atos praticados terem o objetivo de prejudicar a concorrência já basta para que seja caracterizado o cartel. Para ela, a multa aplicada é razoável e legal.

O advogado da Embu Engenharia e Comércio, Pedro Zanotta, afirmou que vai recorrer da decisão.

Veja a decisão

SENTENÇA Nº / 2007 – B

PROCESSO Nº 2006.34.00.008084-3

AUTORA: EMBU SA ENGENHARIA E COMÉRCIO

RÉU: CADE

SENTENÇA

I – Relatório

Trata-se de ação de rito ordinário, com pedido de antecipação de tutela, proposta por EMBU SA ENGENHARIA E COMÉRCIO contra o CADE, a fim de, liminarmente, suspender os efeitos de decisão condenatória proferida pelo CADE, determinando que este se abstenha de executá-la até o término desta ação.

Em decisão definitiva, objetiva a decretação da nulidade do Processo Administrativo nº 08012002127/02-14 e, conseqüentemente da decisão condenatória nele proferida.

Narrou que, por meio de uma denúncia anônima, foi levado ao conhecimento dos órgãos de defesa da concorrência a suposta existência de um Cartel no mercado de pedras (britas) de São Paulo.

Nesse prisma, aduziu que o CADE, após instauração e julgamento do competente processo administrativo, decidiu pela condenação da parte autora por infração contra a ordem econômica, aplicando-lhe as penalidades de multa pecuniária, correspondente a 20% do faturamento da autora nas suas unidades de negócios de britas no exercício de 2002, e recomendação aos órgãos públicos que não realizem o parcelamento de tributos federais, bem como sejam cancelados incentivos fiscais.

Sustentou a nulidade do processo administrativo em comento, alegando, em síntese:

1- que o processo administrativo originou-se com base em iniciativa não autorizada na Lei nº 8.884/94 ou no art. 3º do Regulamento de Competências da SDE, qual seja, denúncia anônima, sem descrição das condutas ilícitas denunciadas;

2- que a SDE instaurou procedimento administrativo secreto e não previsto em lei, para o qual não é competente, a partir do qual foram colhidas, via busca e apreensão, as provas que motivaram a abertura do processo administrativo;

3- que houve irregular instrução processual, uma vez que:

a. foi determinada a apresentação de defesa antes da juntada aos autos de todos elementos obtidos na busca e apreensão, principalmente da perícia realizada pela Polícia Federal nos computadores apreendidos;

b. foi produzida prova pela SDE após expiração do prazo previsto no art. 35 da Lei nº 8.884/94, tendo sido juntado aos autos, após encerramento da instrução processual, estudo econométrico, com o qual pretendeu demonstrar efeitos no mercado decorrentes das atividades do alegado cartel, sem acompanhamento da produção da prova pela parte autora.

Ademais, sustentou que a decisão condenatória proferida pelo CADE se mostra inadequada, desarrazoada e insustentável de aplicação aos fatos, apresentando os seguintes argumentos:

4- que não foi constatada no caso a necessária correlação entre condutas anticoncorrenciais e efeitos nocivos à ordem econômica, requisito objetivo exigido pela Lei nº 8.884 para configuração do cartel;

5- que a participação da autora nas atividades do Sindipedras era legítima e que não há elemento no processo administrativo que permita concluir a aceitação por parte da parte autora das diretrizes encontradas nos documentos apreendidos na sede do Sindipedras;

6- que o quantum da multa é desproporcional e confiscatório, pois não corresponde ao proveito econômico auferido pela autora e utiliza índice confiscatório;


7- que houve a inobservância do princípio da individualização das penas na fixação da multa em 20% do faturamento da autora nas suas unidades de negócios de britas no exercício de 2002.

Juntou documentos de fls. 51/974.

O processo foi distribuído a esta 17ª Vara por conexão

Foi concedida antecipação de tutela para suspender a exigibilidade da decisão proferida pelo CADE nos autos do Processo Administrativo nº 08012002127/02-14, condicionando a sua suspensão à apresentação de seguro garantia judicial no valor total da multa aplicada, ou ainda, ao depósito integral do valor da multa aplicada (fls. 1062/1063 e 1068/1069).

A apólice do seguro-garantia foi devidamente juntado aos autos (fls. 1072/1079).

O CADE apresentou contestação, alegando a regularidade do processo administrativo objeto desta demanda, com observância do devido processo legal, apresentando os seguintes argumentos:

1. o art. 14, III, da Lei nº 8.884 autoriza a SDE a proceder a averiguações preliminares em face de indícios de infração contra a ordem econômica para instauração de processo administrativo e entre tais indícios pode-se incluir a denúncia anônima;

2. a busca e apreensão foi devidamente autorizada pelo Poder Judiciário;

3. a autora teve ampla oportunidade de defesa, porquanto:

a. a autora teve oportunidade de apresentar defesa enquanto o processo ainda se encontrava na SDE (fls. 9048/9073 do processo administrativo), bem como alegações finais após publicação de despacho que acolheu nota técnica (fls. 12.233/12.295 do processo administrativo);

b. o laudo econométrico não é prova nova juntada aos autos, mas apenas parte integrante do relatório final da SDE, e ainda não foi utilizada para a condenação da autora pela prática do cartel.

Ademais, defendeu o CADE a correição de sua decisão, pois:

4. nos termos do art. 20 da Lei nº 8.884, configuram infração contra a ordem econômica os atos que tenham por objeto gerar os efeitos dos incisos ou aqueles que possam gerar os efeitos dos incisos, e o cartel das britas tinha por objeto as condutas dos incisos I, II, III e IV;

5. a condenação da autora decorre de sua participação nas reuniões do cartel, no grupo G14 e no Comitê gestor, bem como o fato de ter sido “contemplada” como parcela do mercado cartelizado;

6. o percentual da multa aplicado é razoável e obedece o disposto no art. 23, I, da Lei nº 8.884, segundo o qual a multa pode variar entre 1% e 30% do faturamento bruto no último exercício, bem como os critérios expressos no art. 27;

7. não há necessidade de observância da individualização das condutas nas infrações cometidas por associações de pessoas.

Juntou documentos de fls. 1133/1154.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório. DECIDO

II – Fundamentação

Inicialmente, deixo de proceder a intimação do Ministério Público Federal para se manifestar nos autos, conforme requerido pelo CADE em contestação, em virtude da sua participação no processo administrativo objeto desta demanda.

No que tange ao mérito, em virtude da complexidade do objeto desta demanda, assim como do elevado número de argumentos apresentados pelas partes, é necessário o exame dos mesmos pormenorizadamente, como segue.

A – Nulidade do processo administrativo

1. Iniciativa

A parte autora alegou que o processo administrativo originou-se com base em iniciativa não autorizada na Lei nº 8.884/94 ou no art. 3º do Regulamento de Competências da SDE, qual seja, denúncia anônima, sem descrição das condutas ilícitas denunciadas.

Por sua vez, o CADE argumentou que o art. 14, III, da Lei nº 8.884 autoriza a SDE a proceder a averiguações preliminares em face de indícios de infração contra a ordem econômica para instauração de processo administrativo e que entre tais indícios pode-se incluir a denúncia anônima.

Com efeito, o art. 14, III, da Lei nº 8.884/94 concede à SDE a competência para proceder a averiguações preliminares nos seguintes termos:

Art. 14 – Compete à SDE: (…)

III – proceder, em face de indícios de infração à ordem econômica, as averiguações preliminares para instauração de processo administrativo;

O dispositivo legal exige a presença de indícios para que a SDE proceda a averiguações preliminares com vistas a instaurar processo administrativo.

A denúncia anônima que desencadeou as averiguações preliminares por parte da SDE (fls. 58/60), as quais deram origem ao Processo Administrativo nº 08012002127/02-14, pode ser considerada indício para fins do art. 14, III, da Lei nº 8.884/94.

É dever da SDE zelar pelo cumprimento da Lei nº 8.884, monitorando e acompanhando as práticas de mercado, conforme art. 14, I, deste diploma legal. Logo, não poderia a mesma se eximir de averiguar práticas denunciadas como cartel, mesmo que anonimamente.


Ademais, estabelece o art. 30 da lei que a SDE pode promover averiguações preliminares inclusive de ofício ou ainda em face de representação escrita e fundamentada de qualquer interessado, in verbis:

Art. 30. A SDE promoverá averiguações preliminares, de ofício ou à vista de representação escrita e fundamentada de qualquer interessado, quando os indícios de infração à ordem econômica não forem suficientes para a instauração de processo administrativo.

No caso, a denúncia de fls. 58/60, apesar de anônima, foi apresentada de forma escrita e com fundamentação, em respeito ao citado dispositivo.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, no âmbito da instrução criminal, que a denúncia anônima é indício suficiente para instauração de inquérito policial, conforme ementa abaixo transcrita, orientação que se pode aplicar, por analogia, ao Direito Econômico e ao processo administrativo perante a SDE e o CADE.

CRIMINAL. HC. LAVAGEM DE DINHEIRO, SONEGAÇÃO FISCAL, CORRUPÇÃO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. OPERAÇÃO ALBATROZ. TRANCAMENTO DE INQUÉRITO. PROCEDIMENTO INSTAURADO COM BASE EM INVESTIGAÇÃO DEFLAGRADA POR DENÚNCIA ANÔNIMA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. FALTA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. FATOS CONTROVERTIDOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. (…)

Não há ilegalidade na instauração de inquérito com base em investigações deflagradas por denúncia anônima, eis que a autoridade tem o dever de apurar a veracidade dos fatos alegados, desde que se proceda com a devida cautela, o que se revela no presente caso, pois tanto a investigação quanto o inquérito vêm sendo conduzidos sob sigilo.

Não há que se falar em ausência de justa causa para a investigação criminal, a qual só pode ser obstada na hipótese de flagrante e inequívoca atipicidade ou impossibilidade de ser o indiciado o autor dos fatos, o que, primo oculi, não se verifica.

O contexto dos autos não permite, de plano, a conclusão de que a conduta do paciente não é suspeita, como pretende a impetração, tornando-se prematuro o trancamento do inquérito policial instaurado.

Somente após o correto procedimento inquisitorial, com a devida apuração dos fatos e provas, é que se poderá averiguar, com certeza, a tipicidade, ou não, das condutas imputadas ao paciente. Ordem denegada.

(STJ; HC 38093; Quinta Turma; DJ 17/12/2004 página:589; Relator Min. Gilson Dipp)

Portanto, afasto a primeira nulidade apontada pelo autor.

2. Processo secreto e não previsto em lei

Também argüindo a nulidade do processo administrativo, a parte autora alegou que a SDE instaurou procedimento administrativo secreto e não previsto em lei, para o qual não é competente, a partir do qual foram colhidas, via busca e apreensão, as provas que motivaram a abertura do processo administrativo.

Em contrapartida, o CADE argumentou que a busca e apreensão foi devidamente autorizada pelo Poder Judiciário.

Conforme os já citados arts. 14, III, e 30 da Lei nº 8.884, a SDE é competente para proceder a averiguações preliminares com vistas a examinar a necessidade de instauração de processo administrativo.

Logo, as averiguações preliminares realizadas pela SDE tem expressa previsão legal.

Da mesma forma, a Lei nº 8.884, em seu art. 30, § 3º, autoriza que as averiguações preliminares ocorram sobre sigilo, no caso de conveniência para as investigações, a critério do secretário da SDE, in verbis:

Art. 30 (…) § 3º As averiguações preliminares poderão correr sob sigilo, no interesse das investigações, a critério do Secretário da SDE.

Pelos fundamentos expostos, afasto a segunda nulidade apontada pela parte autora.

3. Irregularidade na instrução processual

Ainda, visando a decretação de nulidade do processo administrativo, a parte autora sustentou a ocorrência de irregularidades na instrução processual perante a SDE.

Primeiro, sustentou a parte autora que foi determinada a apresentação de defesa antes da juntada aos autos de todos elementos obtidos na busca e apreensão, principalmente da perícia realizada pela Polícia Federal nos computadores apreendidos.

O CADE contra-argumenta, alegando que a autora teve oportunidade de apresentar defesa enquanto o processo ainda se encontrava na SDE (fls. 9048/9073 do processo administrativo), bem como alegações finais após publicação de despacho que acolheu nota técnica (fls. 12.233/12.295 do processo administrativo).

Embora não haja nos autos cópia da integralidade do processo administrativo, o que se justifica considerando sua extensão, pode-se observar do documento de fls. 85/111 que a autora apresentou defesa datada de 10/11/2003.

Da mesma forma, consta do Relatório da SDE (fl. 181) que a autora apresentou defesa às fls. 9048/9073 do processo administrativo, tendo juntado documentos de fls. 9074/9485.


Também, consta dos autos manifestação do Sindipedras e da autora no processo administrativo sobre o Laudo de Exame em Computador nº 001/2004, preparado pelo perito criminal federal (fls. 409/416).

Por fim, após toda a produção de prova perante a SDE e após a publicação do despacho que acolheu nota técnica, a autora apresentou alegações finais ainda perante a SDE (fls. 482/491), com data de 19/11/2004.

Desta forma, está provado nos autos que a autora teve toda oportunidade de defesa no processo administrativo, podendo se manifestar acerca de toda prova produzida, inclusive acerca do Laudo de Exame em Computador nº 001/2004, preparado pela Polícia Federal.

Segundo, a autora alegou que foi produzida prova pela SDE após expiração do prazo previsto no art. 35 da Lei nº 8.884/94, tendo sido juntado aos autos administrativos, após encerramento da instrução processual, estudo econométrico, com o qual pretendeu demonstrar efeitos no mercado decorrentes das atividades do alegado cartel, sem acompanhamento da produção da prova pela parte autora.

Por sua vez, o CADE sustentou que o laudo econométrico não é prova nova juntada aos autos, mas apenas parte integrante do relatório final da SDE, e ainda não foi utilizada para a condenação da autora pela prática do cartel.

Com razão o CADE. Como constou do próprio voto do Conselheiro relator no CADE (fl. 735), o estudo econométrico elaborado pela SDE é parte integrante da Nota Técnica, não tendo sido utilizado pelo Conselheiro como prova, in verbis:

(…) Não considero qualquer estudo econômico ou parecer técnico como prova, tendo em vista que prova é elemento de convicção sobre os fatos (…)

Além disso, não existe um estudo econométrico diverso da Nota Técnica. O estudo elaborado pela SDE é parte integrante de sua manifestação, baseada nas informações constantes dos autos e de fontes públicas (IBGE, FGV, etc), a que todas as representadas tiveram amplo acesso.

Assim, afasto as alegações formuladas pela parte autora com vistas a decretação de nulidade do processo administrativo.

B – Inadequação da decisão condenatória

Ademais, a parte autora sustentou que a decisão condenatória proferida pelo CADE se mostra inadequada, desarrazoada e insustentável de aplicação aos fatos.

4. Ausência de requisito do cartel

A autora sustentou que não foi constatada no caso a necessária correlação entre condutas anticoncorrenciais e efeitos nocivos à ordem econômica, requisito objetivo exigido pela Lei nº 8.884 para configuração do cartel.

Por sua vez, o CADE argumentou que, nos termos do art. 20 da Lei nº 8.884, configuram infração contra a ordem econômica os atos que tenham por objeto gerar os efeitos dos incisos ou aqueles que possam gerar os efeitos dos incisos, e que o cartel das britas tinha por objeto as condutas dos incisos I, II, III e IV.

O art. 20 da Lei nº 8.884/94 define infração à ordem econômica nos seguintes termos:

Art. 20. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:

I – limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;

II – dominar mercado relevante de bens ou serviços;

III – aumentar arbitrariamente os lucros;

IV – exercer de forma abusiva posição dominante.

A Lei nº 8.884/94 foi editada com fundamento no art. 173, § 3º, da Constituição Federal, in litteris:

Art. 173 (…)

§ 3º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Em decorrência, a Lei nº 8.884 é uma lei de repressão ao abuso do poder econômico. Com essa linha adotada pela Lei nº 8.884, o art. 20 prevê a ilicitude do ato contrário à ordem econômica, ainda que os fins visados não sejam alcançados.

Portanto, não é requisito da configuração da prática do cartel a correlação entre condutas anticoncorrenciais e efeitos nocivos provocados na ordem econômica, bastando que os atos praticados tenham por objeto ou possam produzir esses efeitos.

5. Participação nas atividades do Sindipedras

A parte autora também sustentou que sua participação nas atividades do Sindipedras era legítima e que não há elemento no processo administrativo que permita concluir a aceitação por parte da autora das diretrizes encontradas nos documentos apreendidos na sede do Sindipedras.

O CADE sustentou que a condenação da autora decorre de sua participação nas reuniões do cartel, no grupo G14 e no Comitê gestor, bem como do fato de ter sido a autora “contemplada” como parcela do mercado cartelizado.


A decisão condenatória proferida pelo CADE possui presunção de legitimidade, somente podendo ser desconstituída pelo Poder Judiciário diante de prova robusta a ser produzida pela empresa condenada administrativamente no âmbito do processo judicial.

Não há, nos autos deste processo judicial, prova robusta suficiente da não aceitação por parte da autora das diretrizes encontradas nos documentos apreendidos na sede do Sindipedras.

6. Quantum da multa aplicada

No que concerne à condenação que lhe foi imposta, a autora sustentou que o quantum da multa aplicada pelo CADE é desproporcional e confiscatório, pois não corresponde ao proveito econômico auferido pela autora e utiliza índice confiscatório.

O CADE defendeu a razoabilidade do percentual da multa aplicado, sob o argumento de que este obedece o disposto no art. 23, I, da Lei nº 8.884, segundo o qual a multa pode variar entre 1% e 30% do faturamento bruto no último exercício, bem como os critérios expressos no art. 27.

Com efeito, o art. 23, I, efetivamente estabelece multa pode variar entre 1% e 30% do faturamento bruto no último exercício, in verbis:

Art. 23. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas:

I – no caso de empresa, multa de um a trinta por cento do valor do faturamento bruto no seu último exercício, excluídos os impostos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando quantificável

Por sua vez, o art. 27, prevê os critérios que deverão ser considerados pelo CADE no momento da fixação das penas aplicadas, in verbis:

Art. 27. Na aplicação das penas estabelecidas nesta lei serão levados em consideração:

I – a gravidade da infração;

II – a boa-fé do infrator;

III – a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;

IV – a consumação ou não da infração;

V – o grau de lesão, ou perigo de lesão, à livre concorrência, à economia nacional, aos consumidores, ou a terceiros;

VI – os efeitos econômicos negativos produzidos no mercado;

VII – a situação econômica do infrator;

VIII – a reincidência.

A multa aplicada, correspondente a 20% do faturamento da autora nas suas unidades de negócios de britas no exercício de 2002, obedeceu os limites fixados pelo art. 23, I.

Da mesma forma, a multa aplicada respeitou os critérios para fixação das penas, uma vez que se tratou de prática de cartel, a mais grave das infrações à ordem econômica (art. 27, I). Ainda, segundo conclusões do CADE, a conduta envolvia vantagem considerada a ser obtida pela autora (art. 27, II) e a mesma foi consumada (art. 27, III).

Por fim, o grau de lesão à livre concorrência, à economia nacional e aos consumidores (art. 27, V), assim como os efeitos econômicos negativos produzidos no mercado (art. 27, VI) indicaram a aplicação de multa elevada.

Assim, a multa aplicada não pode ser considerada desproporcional ou confiscatória.

7. Inobservância do princípio da individualização das penas

Por fim, defendeu a parte autora que houve a inobservância do princípio da individualização das penas na fixação da multa em 20% do faturamento da autora nas suas unidades de negócios de britas no exercício de 2002.

Em contrapartida, argumentou o CADE que não há necessidade de observância da individualização das condutas nas infrações cometidas por associações de pessoas.

Com efeito, tratando-se de prática de cartel, ou seja, acordos entre empresas concorrentes para fixação de preços ou divisão de mercado, não há sentido em se individualizar o percentual da multa aplicada a cada empresa que participou do cartel.

Contudo, naturalmente, a multa fixada deve considerar a capacidade econômica do infrator. No caso, a multa fixada em 20 % do faturamento da autora no exercício de 2002 respeita sua capacidade econômica, pois considera seu faturamento bruto no último exercício anterior ao início do processo administrativo.

III – Dispositivo

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora.

Contudo, MANTENHO A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA concedida às fls. 1062/1063, com o complemento de fls. 1068/1069, até o trânsito em julgado desta decisão, por força do art. 65 da Lei nº 8.884/94.

Condeno a parte autora no pagamento de custas e honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), considerando que o valor atribuído à causa não corresponde à pretensão econômica da demanda, a qual pode ser melhor conferida a partir do valor segurado à fl. 1073.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Brasília, 31 de janeiro de 2007.

CRISTIANE PEDERZOLLI RENTZSCH

Juíza Federal Substituta da 17ª Vara/DF

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