Tiroteio nas redações

Caiu o tabu: jornalista agora processa jornalista

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16 de fevereiro de 2007, 23h00

Jornalista sempre falou mal de jornalista. Mas sempre pelas costas. O corporativismo nunca permitia que as brigas passassem das maledicências de um editor contra o outro, proferidas na intimidade das redações. Ultimamente este cenário vem mudando. O bate-boca editorial ganhou as páginas de jornais e as linhas dos blogs e foi parar nas barras dos tribunais. Não é que tenha crescido o número de ações de entre colegas, mas caiu o tabu de que jornalista não processa jornalista.

Primeiro foi Milton Neves contra Jorge Kajuru, dois polemistas da imprensa esportiva. Depois foi todo mundo contra Milton Neves e contra Kajuru. Em seguida a bola saiu da área esportiva. Todo mundo contra Diogo Mainardi, o Milton Neves da grande imprensa.

E mais Mino Carta, Paulo Henrique Amorim, Franklin Martins, Leonardo Attuch,— todos soltaram o verbo e dispararam ações na Justiça contra coleguinhas.

O colunista da revista Veja, Diogo Mainardi é o preferido para criar e ser desafeto de jornalistas. Sua mais recente condenação aconteceu em novembro do ano passado. Junto com a Editora Abril, foi condenado a pagar R$ 35 mil de indenização por danos morais para o jornalista Mino Carta, que é dono da revista CartaCapital.

Mainardi escreveu em sua coluna na revista Veja que Mino Carta era subordinado a Carlos Jereissati para fazer reportagens contra Daniel Dantas. Além disso, afirmou que Mino se equipararia aos “mensaleiros”.

Mainardi disse também que em CartaCapital havia mais anúncios do governo do que da iniciativa privada, o que configuraria dependência. A condenação do colunista foi imposta pela juíza Camila de Jesus Gonçalves Pacífico, da 1ª Vara Cível de Pinheiros, em São Paulo.

Mainardi é processado também pelo jornalista Paulo Henrique Amorim por injúria e difamação. Amorim se sentiu ofendido por texto publicado pelo colunista da Veja na primeira semana de setembro de 2006.

No artigo intitulado A voz do PT, o colunista associa Paulo Henrique Amorim ao lulismo que, segundo Mainardi, “tomou a Brasil Telecom de Daniel Dantas”. “Paulo Henrique Amorim e Mino Carta se engajaram pessoalmente na batalha comercial do lulismo contra Daniel Dantas”, escreveu Mainardi.

Não é só isso.

Daniel Dantas está mais para banqueiro do que para jornalista, embora se especule que ele estaria interessado em entrar em campo com a aquisição da revista IstoÉ. Mas mesmo antes de se sentar na cadeira de editor — se é que isto vai mesmo acontecer — Dantas se tornou o pivô de seguidas intrigas editoriais.

Em torno dele gira boa parte das contendas provocadas por Mainardi e por causa dele, a Veja também foi condenada a pagar R$ 17,5 mil de indenização por danos morais ao jornalista Leonardo Attuch, da revista IstoÉ Dinheiro. A determinação foi do juiz Régis Rodrigues Bonvicino, da 1ª Vara Cível de Pinheiros, São Paulo.

Motivo: a revista publicou texto, em 22 de fevereiro de 2006, afirmando que Attuch era “negociante de notícias”, “pessoa fraudulenta”, “autor de um livro indecoroso” e “quadrilheiro”.

“O fato de Attuch ser mencionado em processos, como por exemplo, nos da empresa Kroll, não autorizam a ré a qualificá-lo como negociante de notícias, pessoa fraudulenta, autor de um livro indecoroso e quadrilheiro porque a revista Veja, com todo o respeito, não é o Supremo Tribunal Federal do país e tampouco tem qualquer jurisdição”, disse o juiz.

Defesa pessoal

Embora também não seja jornalista, foi no cargo de quem tem por obrigação lidar com a imprensa que Luiz Gushiken resolveu encarar uma briga com vários e destacados profissionais da mídia. Ao tempo que era secretário de Comunicação do governo Lula, Gushiken pediu ao diretor da Polícia Federal para investigar jornalistas que têm o mau hábito de publicar notícias que não são de seu agrado. O pedido foi reiterado no mês passado, quando ele já havia deixado o cargo. A PF não só confirmou o recebimento do pedido como informou que já há um delegado investigando jornalistas sobre a suposta operação em curso que “envolveria escutas ilegais e divulgação de informações falsas, com a finalidade de atingir a honorabilidade” da pessoa do ex-ministro.

As informações e a correspondência à PF foram divulgadas pelo site Conversa Afiada de Paulo Henrique Amorim. Entre os profissionais acusados por Gushiken estão Leonard Attuch, Lauro Jardim e Diogo Mainardi. Os três são alvos de ação judicial.

Gushiken processa Lauro Jardim por ter publicado na coluna Radar a seguinte nota: “Gushiken revelou-se requintado… serviu-se de uma garrafa de Grand Vin de Chateau Latour, safra 1994, um tinto apreciadíssimo. Depois, o “China” acendeu um charuto cubano… Total da brincadeira: 3.500 reais. A conta foi paga em dinheiro vivo”.

O ex-ministro interpela Mainardi por um comentário publicado 24 de janeiro de 2007, sobre o assalto que ele e a família sofreram em dezembro. Ao falar sobre o roubo, o colunista perguntou quanto teria sido subtraído da casa do ex-ministro. “Nos últimos anos, os petistas se acostumaram a lidar com grandes valores, 315.000 dólares? … Por falar em China, quanto ele tinha em Indaiatuba? 3.150.000 dólares?”. Segundo o ex-secretário de Lula, o colunista “sugere maliciosamente que os recursos financeiros em reais que os ladrões roubaram sofreram sonegação fiscal por ação deliberada de minha parte; sugerindo também que os recursos em dólares roubados na mesma ocasião poderiam alcançar cifras elevadíssimas”.

Já Attuch foi acusado pelo ex-secretário de ter recebido suborno da Kroll Associates para “publicar matérias de conteúdo falso e altamente ofensivo” à sua pessoa.

Dono da informação

Uma das primeiras contendas da onda de embates entre jornalistas contrapôs Veja e IstoÉ, duas das três principais revistas de informação geral do país. Aconteceu em 2005 e teve como detonador as revelações do jornalista Luís Costa Pinto de que a Veja publicara, anos antes, informações sabidamente falsas e que custaram a cassação do então presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS).

IstoÉ. decidiu apontar um erro publicado na Veja Costa Pinto, que era editor de Veja na época, diz que a revista recebera a informação de que Ibsen Pinheiro registrou movimento não justificado em suas contas de US$ 1 milhão. Mesmo depois de constatar que a cifra movimentada era de 1 mil e não de 1 milhão, o editor-executivo da Veja, Paulo Moreira Leite, manteve a publicação.

Além da troca de desaforos nas páginas das duas publicações, o episódio rendeu uma ação na Justiça do jornalista Adam Sun, responsável pela checagem das informações publicadas em Veja, contra Costa Pinto e Helio Campos Mello, então diretor de redação da IstoÉ. O processo corre na 23ª Vara Cível de São Paulo.

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