Transporte mais caro

Aumento da tarifa de ônibus em Cuiabá é mantido pela Justiça

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12 de fevereiro de 2007, 11h30

Está mantida a decisão que permitiu o aumento da passagem de ônibus em Cuiabá. A decisão é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que não acolheu recurso do Ministério Público do estado. Cabe recurso.

O relator do recurso, juiz convocado João Ferreira Filho, considerou que mudar a decisão da primeira instância implicaria “dano irreparável ou de difícil reparação”.

No Tribunal de Justiça ainda tramita um pedido de Mandado de Segurança proposto pelo MP. O recurso será analisado pelo desembargador Omar Rodrigues de Almeida.

Agravo de Instrumento 9.744/2007

Leia a decisão:

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal de Justiça – Quinta Câmara Cível

RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 9.744/2007 – Classe 15 – Cível – Capital

Agravante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO

Agravados: MUNICÍPIO DE CUIABÁ e outros

D E C I S Ã O D O R E L A T O R

(CPC, art. 527, II)

Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, contra a r. decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito titular da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da comarca de Cuiabá-MT, que nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA (Proc. nº 040/2007), revogou decisão anteriormente proferida pelo MM. juiz plantonista do dia 12 de janeiro do corrente ano, que havia deferido pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, para nulificar a decisão do Conselho Municipal de Transportes autorizativa do aumento do valor da tarifa do transporte coletivo público no Município de Cuiabá-MT, bem assim para invalidar o decreto municipal que, dando concreção à decisão do CMT, promoveu formalmente a majoração da tarifa.

O agravante alonga em considerações para demonstrar, primeiramente, a estrita legalidade da decisão revogada, submissa, segundo ele, às exigências fáticas e aos requisitos jurídicos do art. 273 do CPC, e depois a necessidade do restabelecimento urgente dos efeitos da decisão, até porque seria defeso ao juiz revogá-la quando inocorrente qualquer mudança dos fatos e do direito. Aponta para a evidente erronia em que teria incorrido o julgador, mormente “quando diz que não existe dano de irreparável ou difícil reparação no caso” (cf. fls. 14) e quando se omite sobre a questão da impossibilidade do reajuste da tarifa em períodos inferiores a doze meses. Pede, pois, a concessão do “efeito ativo”, para que sejam imediatamente restaurados os efeitos da r. decisão revogada.

É a suma recursal.

O art. 522 do CPC, com a redação dada pela Lei nº 11.187, de 19-10-2005, dispõe o seguinte:

Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento (grifei e destaquei).

Abstração dos casos de inadmissão da apelação e de atribuição do efeito com que o apelo é recebido (CPC, art. 520), ou seja, limitado o enfoque à gama variada de questões que se apresentam à solução interlocutória do juiz no curso do processo, a nova lei restringiu o cabimento do recurso de agravo, sob a modalidade por instrumento, apenas àquelas decisões suscetíveis de causarem à parte “lesão grave e de difícil reparação”, significando dizer que o processamento do Agravo, interposto por instrumento, só será admissível quando for cabível e justificável a suspensão acautelatória dos efeitos da decisão combatida em sede de antecipação da pretensão recursal, pois, admitido o processamento do recurso, e não sendo o caso de quaisquer das providências indicadas pelo art. 527, III, do CPC, nisto haveria paradoxo insustentável face à nova sistemática introduzida pela Lei nº 11.187/2005.

Assim, sem dúvida alguma, só será admissível a interposição do recurso de agravo por instrumento quando a decisão for atualmente, e não só potencialmente lesiva a qualquer direto ou interesse da parte, exigindo-se do recorrente demonstração consistente e convincente, com o necessário respaldo probatório (documental), e com aptidão para convencer o relator da ocorrência do alegado prejuízo. Só quando a decisão e seus efeitos práticos e jurídicos devam ser neutralizados com urgência agônica, é que será “admitida a (interposição do agravo) por instrumento” (CPC, art. 522).

Inexistindo prejuízo efetivo e atual, mas só mera constituição futura e eventual de situação adversária, que poderá ou não prejudicar a parte, então, neste caso, será proibitiva a interposição do Agravo por instrumento, não podendo o relator, sob pena de proferir vexativa decisão insustentável jurídica e logicamente, afirmar a inocorrência de prejuízo e, contraditoriamente, admitir o processamento da espécie recursal sob a modalidade por instrumento, contrariando não apenas a letra expressa, mas também o espírito de celeridade e simplificação que inspirou a modificação do processamento do recurso de agravo.

Ocorrência comprovada de lesão efetiva e atual a direito da parte é o primeiro e fundamental critério que, com o advento da Lei nº 11.187/2005, deve filtrar a admissibilidade da interposição do recurso de agravo sob a modalidade por instrumento.

E este, às escâncaras, não é o caso dos autos.

A decisão está bem fundamentada e, no leque de documentos constitutivos da prova pré-constituída, não se vê qualquer demonstração convincente de risco plausível de prejuízo irreparável para o agravante na hipótese de manutenção do atual quadro fático; a questão da proibição da majoração de tarifa em lapso de tempo não inferior a doze meses recomenda pronunciamento cauteloso, especialmente em razão do caráter altamente controvertido e original da hermenêutica jurídica em que se apóia essa sustentação, tema este, aliás, juntamente com a outra questão de mérito da ação, que convoca à cena o anjo da guarda multiuso do art. 37 da CF para pelejar contra a validade da deliberação do CMT, já abordado por mim à exaustão, quando da apreciação do RAI interposto pelo Município de Cuiabá contra a decisão revogada. Ali firmei posicionamento inequivocamente contrário à concessão da tutela antecipada, proferindo decisão, portanto, perfeitamente ajustada aos termos retificatórios da r. decisão gravada.

Ao lado da aparente correção jurídica da decisão, não vejo em que medida ela possa operar efeitos prejudiciais atuais ao agravante, pois, remanescendo latente nos autos, sob a modalidade de agravo retido (CPC, art. 522), a crítica jurídico-recursal à questão da revogação da decisão e consequente negativa do pedido de antecipação da tutela jurisdicional, para ser futuramente reexaminada quando do eventual julgamento da apelação (CPC, art. 523, “caput”), isto no caso também de eventual sucumbência do agravante, a situação deste permanecerá inalterada, o que realmente afasta a admissibilidade da interposição do agravo por instrumento.

A esse respeito, não tenho dúvida alguma em acompanhar cegamente a conclusão estabelecida pelo MM. juiz no desfecho da decisão combatida. Ele, que tem visão privilegiada dos aspectos mais escondidos e fugidios do caso justamente em razão da proximidade permitida pela condição funcional de juiz natural presidente do feito, assegura que a revogação da decisão não implicará “dano irreparável ou de difícil reparação, sequer configura medida irreversível, pois os requeridos, na pior das hipóteses, possuem plena capacidade (financeira) e terão como recompor possíveis danos” (cf. fls. 36).

E, com efeito, primeiro porque, negar ao Município e aos demais agravados capacidade econômica para recompor a diferença de R$ 0,20 (vinte centavos) – valor unitário correspondente à expressão financeira da majoração pretendida –, constitui sustentação minimamente destituída de consistência e seriedade; depois, mantido o pior dos mundos, que para o MP correspondente justamente ao quadro configurado pela r. decisão agravada, e no caso de vitória do agravante apenas em última instância jurisdicional, admito que a própria argumentação desenvolvida pelo culto órgão do Ministério Público convence de que realmente será muito fácil e tecnicamente possível a apuração do “quantum” financeiro dessa recomposição, devida a…(a quem mesmo?).

Aliás, o próprio agravante torna patente essa facilidade quando, ao longo da exposição da letra “B” da inicial (cf. fls. 14/18), demonstrando admirável capacitação técnica para contar e contabilizar, realiza impressionante malabarismo numérico, quase um exercício de numerologia futurista, ao multiplicar centavos de reais por dias corridos, obtendo milhões, milhares, centenas e dezenas de reais como produto exato do possível prejuízo…Como se vê, fácil, extremamente fácil!

Por último, assevero que a manutenção da r. decisão agravada, efeito indireto da aplicação da regra do art. 527, II, do CPC, é medida que se alinha com harmonia sinfônica ao conteúdo e efeitos práticos das demais decisões que já proferi, na fase do art. 527 do CPC, nos demais recursos de agravo, cuja relatoria me coube por força de aleatória distribuição, envolvendo exatamente o mesmo “thema decidendo”.

Assim, com base no art. 527, II, do CPC, inadmito o processamento do recurso interposto sob a modalidade por instrumento, convertendo-a à forma retida nos autos, pelo que determino a remessa dos presentes autos recursais ao Juízo da causa, para as providências legais pertinentes.

Intimem-se e expeça-se o necessário.

Cuiabá-MT, 09 de fevereiro de 2007.

JOÃO FERREIRA FILHO

Juiz de Direito (Conv.) – Relator

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