Pílula de farinha

TJ-SP livra fabricante de Microvlar de indenização por dano moral

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5 de fevereiro de 2007, 23h00

O Tribunal de Justiça de São Paulo mudou o entendimento que dava ao caso que envolve a Schering e o uso do anticoncepcional Microvlar — “a pílula da farinha”. O julgamento em questão envolveu uma consumidora que ficou grávida e teve um filho, no final dos anos 90, enquanto tomava o medicamento.

A 3ª Câmara de Direito Privado do TJ livrou a empresa de pagar indenização, por danos morais, para a mãe e o filho. A interpretação dada agora pelo tribunal é a de que o nascimento de uma criança é fonte de alegria e não de sofrimento exigido para a lesão moral indenizável.

“Uma nova vida foi trazida para a família e o amor ao filho é conseqüência natural, embora não desejado inicialmente”, justificou o desembargador Beretta da Silveira, que abriu divergência com o relator, Donegá Morandini.

Por decisão do juiz Airton Pinheiro de Castro, da 3ª Vara Cível Central da Capital, mãe e filho teriam de ser indenizados, por danos morais e materiais, pela Schering do Brasil Química e Farmacêutica Ltda.

A sentença favoreceu a consumidora Maria das Graças Souza e seu filho M.H.L.A. Por dano moral, a Schering estava obrigada a pagar R$ 350 mil, acrescida do dano material: pensão mensal de dois salários mínimos (R$ 700) e do pagamento do plano de saúde do garoto até ele completar 21 anos.

Por maioria de votos, a 3ª Câmara modificou a sentença e inaugurou nova jurisprudência para o caso: afastou a condenação por dano moral, manteve na íntegra o dano material e reconheceu a sucumbência recíproca.

Pílula de farinha

A Schering é acusada por dezenas de mulheres, que tomavam Microvlar, de ser a responsável pela gravidez delas. A empresa reconheceu que no final de 1998 produziu duas toneladas do anticoncepcional. Eles foram feitos na forma de pílulas de farinha (placebo), para usar em testes de uma nova máquina de embalagem. Parte do lote foi distribuído e chegou ao mercado após suposto roubo.

A empresa sustenta que não pode ser responsabilizada pelos medicamentos falsos. Diz que o lote de placebo só foi comercializado por causa do roubo em sua fábrica. No recurso encaminhado ao tribunal, pediu a improcedência da ação e, como alternativa, o afastamento da indenização por dano moral.

Seu pedido alternativo foi aceito por dois dos três desembargadores que julgaram o caso. Beretta da Silveira e Adilson de Andrade votaram pelo afastamento da indenização por dano moral, por entenderem que, no caso, este não ficou configurado.

O relator, Donegá Morandini, foi voto vencido na defesa da tese de que era patente a lesão moral. Para ele, a gravidez acarretou, no mínimo, aflição, angústia e preocupação com o aumento do número de filhos. “Nem a alegria pelo nascimento do filho seria capaz de afastar esses sentimentos que envolveram a autora à época dos fatos, que influíram negativamente em seu comportamento psíquico”, rebateu.

Ele chegou a defender a redução do valor da indenização para R$ 175 mil, como meio de satisfazer o dano sofrido e servir de punição à empresa para que não reincidisse na conduta. Mas seu esforço não sensibilizou os colegas.

Por fim, também por maioria, a 3ª Câmara de Direito Privado, decidiu que o ônus da sucumbência deveria ser dividido, em igual proporção, entre as partes. Ou seja, empresa e consumidora terão cada uma que arcar com os honorários de seus advogados.

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