Recurso como dever

Entrevista: Álvaro Augusto Ribeiro Costa, advogado-geral da União

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3 de fevereiro de 2007, 23h01

Sapcca
Álvaro Augusto Ribeiro - por SapccaO Estado é o maior cliente da Justiça brasileira, fato que incomoda muita gente e deixa indignada mais gente ainda. Além de acionar e ser acionada pelos contribuintes, a administração pública, em seus vários níveis, ainda cultiva o hábito de recorrer até o último recurso, o que, para muitos, além de demonstrar os maus modos do Governo, é o principal motivo da morosidade do judiciário.

São raras as pessoas que discordam desta quase unanimidade. Uma delas, até por dever de ofício, é a de Álvaro Augusto Ribeiro Costa atual titular da Advocacia-Geral da União, o órgão encarregado de defender e representar o Estado judicialmente. E de recorrer. “Desenvolvemos todo um trabalho para não recorrer quando existe jurisprudência pacificada. Mas se a matéria não está pacificada seria um ilícito não recorrer quando há possibilidade de se obter uma vantagem para a sociedade”, afirma o ministro.

Em entrevista à revista Consultor Jurídico, em Brasília, o ministro diz que a palavra de ordem na AGU é evitar litígios e reduzir processos. Medidas alternativas de solução de conflito, como a conciliação, têm preferência na entidade. As Câmaras de Conciliação e Arbitramento, desenvolvidas desde 2004 pela Consultoria-Geral da União (órgão da AGU), nasceram para resolver pendências entre órgãos da administração pública federal antes que elas cheguem à Justiça.

A experiência revela que a solução de litígios nas Câmaras de Conciliação é obtida com mais simplicidade, menos custos e maior velocidade do que pela via judicial. O tempo médio de solução dos casos é de cinco meses. O caso mais demorado levou um ano.

O esforço para estancar o fluxo abusivo de ações do Estado para o Judiciário tem outras frentes. A Secretaria-Geral do Contencioso, órgão que auxilia o advogado-geral da União na atuação perante o Supremo Tribunal Federal, é uma delas. No ano passado a secretaria examinou 16.506 intimações para decidir em qual delas seria possível não interpor recursos. A partir desta análise, a AGU deixou de recorrer em 10.364 decisões proferidas pelo Supremo em 2006.

O dirigente da AGU faz um balanço: “Muito foi feito, mas muito ainda há por fazer para que a AGU atue como deve ser um grande escritório de advocacia pública em favor da comunidade e do país”. Para ele, a própria criação da AGU é um avanço institucional, mesmo reconhecendo que as circunstâncias da criação foram de acomodação com relação a estruturas que existiam antes. “É como se colocasse dentro de um recipiente, várias partes, sem uma previa combinação do ajuste. É uma instituição que ainda está se fazendo, não está completa e, por isso, traz muitas dificuldades”, afirma o ministro.

Ribeiro Costa deve deixar a AGU em breve. Espera apenas que o presidente Lula bata o martelo no nome do próximo dirigente da instituição. O nome mais citado para sucedê-lo é o do advogado particular do presidente da República, José Antonio Toffoli. “Eu estou à disposição do presidente”, diz o candidato, pronto para aceitar o convite.

Além de Toffoli também é citado Antenor Madruga. Advogado da União de carreira, Madruga é o atual diretor do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça e professor da Universidade Católica de Brasília. “Quem vier para cá, encontrará uma instituição invejável, a despeito da sua juventude e das dificuldades que são próprias dessa fase de crescimento”, diz Ribeiro Costa.

Nascido em Fortaleza (CE), Álvaro Augusto Ribeiro Costa, de 60 anos, se formou bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará. É mestrando em Direito Público pela Universidade de Brasília. Atuou na advocacia privada de 1972 até 1997. Depois disso foi advogado do Incra e procurador da República. Tornou-se advogado-geral da União em 2003

Também prestou consultoria à ONU, em matéria de controle de drogas e substâncias entorpecentes, em missão na África do Sul e em Moçambique. Foi, ainda, professor de Direito Processual Penal, no Centro de Ensino Universitário de Brasília (Ceub).

Leia a entrevista

ConJur – A União recorre demais?

Álvaro Ribeiro Costa — Não é verdade. A AGU não recorre muito e faz todo um trabalho para não recorrer. Quando há jurisprudência pacificada, não recorre. Mas se a tese não está pacificada, não há porque não recorrer. Isso significa um benefício para o patrimônio público, para a administração pública, para a coletividade como um todo. Seria até ilícito não recorrer quando há possibilidade de se obter uma vantagem para a sociedade.

ConJur – Qual é o critério, então?

Álvaro Ribeiro Costa — O trabalho de prevenção torna seletiva a atividade de recorrer e, proporcionalmente, torna menos necessário o recurso. Se a Administração recorre é porque ela teve um insucesso no primeiro grau ou no grau intermediário. Na medida em que o trabalho melhora, o sucesso do primeiro grau aumenta, então, a necessidade de recorrer também diminui. Por outro lado, se a Administração resolve dentro dela mesma os seus litígios, como temos feito, um número significativo de ações não vai parar no judiciário. Se desenvolve, também, uma melhor atividade consultiva isso também diminui a quantidade de litígios.


ConJur – A AGU divulgou uma nota recentemente dizendo que a Procuradoria Federal saiu vitoriosa em 60% das ações que correm nos Tribunais Superiores. Não é pouco?

Álvaro Ribeiro Costa — Um número isolado como esse de 60%, embora seja significativo para refutar a idéia de que a Administração recorre demais, é insuficiente para se saber se pode e em que medida pode ser melhorado. É como se dissesse assim: o objetivo da AGU é atuar em tantos mil processos. Não. O objetivo da AGU é não ter processos.

ConJur – Mas é exatamente esta a imagem da União, de que ela recorre demais e paga de menos.

Álvaro Ribeiro Costa — Na atividade da Administração em juízo, nós podemos separar a atividade de cobrança do Fisco das outras atividades. A atividade de cobrança é algo que se faz em juízo quando o devedor não paga administrativamente. É obrigação do Fisco cobrar aquilo que não é pago. Isso é uma coisa. Já a outra atividade que vai a juízo é aquela atividade em que a Administração atua em defesa do interesse comum. É o que acontece quando ela cria um parque de conservação ambiental e as pessoas da área não se conformam com isso e vão a juízo. Não se pode limitar o direito constitucional do cidadão de levar a juízo a discussão daquilo que entenda como indevido ou lesivo aos seus interesses ou direitos. Nesta área, o mais normal é que os particulares acionem a administração e não a Administração acionar o particular.

ConJur – Então podemos dizer que a AGU está investindo para evitar litígios?

Álvaro Ribeiro Costa — Essa experiência mostra como algumas coisas simples podem resolver grandes absurdos. Não tem sentido que a própria Administração, diante de um conflito dentro dela mesma, leve a questão ao Judiciário, quando toda a Administração está submetida a uma hierarquia própria. Não pode haver interesses opostos entre órgãos da Administração. Pode haver incompreensões sobre um fato ou direito, mas a administração não ganha nada quando um órgão ganha um processo contra outro. Isso é um absurdo. Se a Funai tem um imóvel, e discute a utilização deste imóvel com outra entidade, não tem sentido levar essa discussão para o Judiciário. O que interessa é saber de que maneira o público é melhor servido com a destinação do imóvel à entidade A ou à entidade B.

ConJur – Existem causas pelas quais a AGU vai brigar eternamente e causas que, vamos dizer assim, vai abandonar?

Álvaro Ribeiro Costa — Não, veja bem, não há nem permanência na briga, nem briga abandonada. O que há é o seguinte: um litígio, existe quando há divergência quanto ao fato ou ao direito. Se a Administração, por definição, tem que atuar de acordo com a legalidade, presume-se que a atuação da Administração é correta. Quando essa atuação é questionada, essa presunção deve ser defendida até a última instância.

ConJur – Tem de ir até as últimas instâncias sempre?

Álvaro Ribeiro Costa — As instâncias existem exatamente para rever as instâncias anteriores. Mas, quando as últimas instancias pacificam uma posição, nós instruímos, através de uma instrução normativa de súmula, para que não haja mais recursos. Neste caso, há um trabalho piloto: nós não esperamos que o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, diga naquele caso, o que já disse em alguns, de maneira pacífica. Nós fazemos uma triagem para desistência desses recursos. Só em 2006 deixamos de recorrer em mais de 10 mil decisões proferidas pelo STF.

ConJur – No ano passado vimos a União perder uma indenização bilionária contra a Varig num julgamento onde se quer houve sustentação oral por parte da AGU. Como está a atuação da AGU nos Tribunais Superiores?

Álvaro Ribeiro Costa — Bom, nesse caso a que você se refere eu preciso saber exatamente, pra poder lhe dar uma resposta. Mas eu tenho de informação de que, embora não esteja ótima pela insuficiência de advogados, a presença da AGU está muito mais freqüente do que antes. A verdade é que essa é uma atividade que tem de ser aperfeiçoada. É a questão de saber se a estrutura quantitativa e o corpo de advogados está adequado ou não. Eu lhe diria que não está. Muito pode e ainda deve ser feito para que a AGU esteja presente em todo o momento e em todo o lugar em que seja necessária e com ótima qualidade.

ConJur – Como o senhor avalia o comportamento do Judiciário em geral em relação ao governo?

Álvaro Ribeiro Costa — Não há que se falar em Judiciário em geral. Existe o juiz e o caso. E o caso é julgado segundo o direito posto. Seja um juiz singular, seja um colegiado, tem um conteúdo de valor que coloca no julgamento.Isso varia segundo a origem do juiz, a região, o status social, econômico, ideológico, religioso. Eu não posso dizer que exista uma postura do judiciário, ou de um juiz, ou da maioria dos juízes em relação à administração pública, seja positivo ou negativo. Justamente em razão desta diversidade tão grande é que se impõe a escala de níveis para recurso pra que alguém possa errar por último, no caso o Supremo Tribunal Federal ou o STJ, e errando por último possa traduzir uma média do que seja o direito à margem dos fatos e a ponderação dos valores.


ConJur – A AGU confia no Judiciário?

Álvaro Ribeiro Costa — Nós temos uma composição muito boa no Supremo Tribunal Federal, tanto pela qualificação profissional, como da integridade dos seus membros ou das experiências diversas que todos eles tiveram. Eu sou muito confiante no Supremo e no Judiciário como um todo. Tem muito que melhorar,, mas não caberia fazer qualquer tipo de afirmação ou levantar dúvida, sobre uma posição, a priori, a favor ou contra a Administração Pública por parte do Judiciário.

ConJur – Muitas vezes os advogados da União são obrigados a enfrentar advogados de grandes escritórios em condições bem superiores. Existe um movimento da AGU no sentido de promover melhorias e investir nos advogados da casa?

Álvaro Ribeiro Costa — Foi criada a escola da AGU pra dar aos advogados outros estímulos, de natureza intelectual ou profissional, pra que eles possam se sentir plenamente gratificados com o exercício da atividade em si. Há certas coisas que não há como mudar, porque quando se faz a opção pela advocacia pública há muitos fatores levados em conta. Na atividade pública não há como pretender uma remuneração de quem vai para uma atividade em que o lucro é o objetivo em si. É gratificante trabalhar na advocacia pública porque se trabalha, ao mesmo tempo, pela pessoa, pela família, pelas gerações futuras, pela comunidade mais próxima, até pela comunidade universal. Para quem se gratifica com o próprio crescimento profissional e com o crescimento da instituição, não há atividade mais linda. Se alguém fez uma opção por ganhar dinheiro e esperava ganhar aqui, vai ser um eterno infeliz. Aqui vai ter remuneração para dar uma condição digna de vida a ele e à família dele.

ConJur — A estrutura da AGU está pronta para cumprir sua missão?

Álvaro Ribeiro Costa — A missão da AGU é extraordinária. Ela está presente em toda a atividade da administração pública em termos de consultoria, está presente em tudo o que interessa ao cidadão no que diz respeito às políticas públicas, está presente em todo o contencioso que se coloca em todos os níveis do Poder Judiciário. É uma atividade quase incomensurável. Ao lado disso também estão as atividades relativas a políticas públicas específicas, como questões indígenas, dos quilombolas, dos idosos, das crianças e adolescentes, dos portadores de deficiência e a questão ambiental. Na sua atividade consultiva e litigiosa, a AGU está presente em quase tudo, embora de forma não muito visível observadores menos atentos.

ConJur – A atividade da AGU não é reconhecida?

Álvaro Ribeiro Costa — Não se trata de reconhecimento. É uma questão cultural que as instituições se conheçam elas mesmas, e a população conheça suas instituições. Até pelo seu caráter constitucionalmente recente, a AGU ainda não tem essa visibilidade. E as vezes essa falta de visibilidade se reflete dentro de divisões muito particulares, juízos muito particulares do que seja a atividade da AGU sem compreendê-la como um todo.

ConJur – A AGU está estruturada para cuidar de tanta coisa?

Álvaro Ribeiro Costa — Não. A criação da AGU é um avanço institucional muito importante. Mas as circunstâncias desta criação foram de acomodação com relação a estruturas que existiam antes. É como se colocasse dentro de um recipiente, várias partes, sem uma previa combinação do ajuste, o que aqui foi feito depois, por intermédio de leis ou normas de conveniência e de adaptação. É necessário, agora, que se parta para um outro projeto, uma nova lei orgânica, que sistematize, defina e distribua melhor essas atribuições. Muito foi feito, mas muito ainda há por fazer para que a AGU atue como deve ser um grande escritório de advocacia pública em favor da comunidade e do país como um todo.

ConJur – O que ainda precisa ser feito?

Álvaro Ribeiro Costa — A primeira é a estruturação normativa, a necessidade de uma nova lei que sistematize todos os aspectos e supra também algumas omissões. Nós temos um trabalho já desenvolvido, já houve uma comissão que apresentou o primeiro esboço. Agora, esse esboço foi publicado para que uma nova comissão receba sugestões e, a partir daí, encaminhar uma proposta de projeto ao Executivo. É um avanço muito grande.

ConJur – Teria como pontuar a atuação da AGU no governo Lula?

Álvaro Ribeiro Costa — A atividade consultiva da AGU está presente em todas as áreas da administração pública direta ou indireta. Qualquer contrato, convênio, licitação, toda a atividade administrativa pressupõe a orientação da AGU. Na administração indireta atua a Procuradoria-Geral Federal, que abrange cerca de 180 entidades. São autarquias e fundações públicas. Além disso, a AGU faz a consultoria para os ministros e o presidente da República.


ConJur – E no contencioso?

Álvaro Ribeiro Costa — No plano contencioso, a AGU atua em toda a Justiça Federal, desde as varas interiorizadas até o Supremo Tribunal Federal. Atua também através da Procuradoria-Geral Federal junto aos órgãos da administração indireta. Em algumas questões de contencioso a presença da AGU se revela de uma maneira mais visível. A AGU está presente também na aplicação de políticas públicas. Desde a reforma da previdência, a reforma tributária, a reforma do judiciário, as questões indígenas, as relativas ao setor elétrico e ao petróleo. Quando estes temas afloraram questões levadas ao Supremo ou a outros níveis do judiciário, a atuação da AGU foi, e teve que ser decisiva.

ConJur – Tem algum tema que o senhor destacaria por sua dificuldade ou vulto econômico?

Álvaro Ribeiro Costa — Se as questões chegam à AGU é porque houve divergência, ou porque as partes interessadas já levaram a questão a juízo, dando uma dimensão maior. Essas divergências podem ser econômicas, políticas, administrativas, financeiras e, quase todas, são de elevadíssima importância. A AGU atua num campo de erupção de vulcões. A nossa função é justamente apagar fogo, espalhar cinzas, isolar aquilo que não pode ser contaminado.

ConJur – E as dificuldades na defesa do erário? Como foi a evolução deste trabalho desde que o senhor assumiu a AGU?

Álvaro Ribeiro Costa — A AGU foi criada de forma, historicamente, circunstancial. Não houve um projeto que levasse em conta a dimensão da tarefa. É como se nós estivéssemos consertando um avião no meio da batalha aérea. Essa dificuldade de ajuste, de construir ou continuar a construção institucional em meio à própria guerra é uma das maiores dificuldades, e isso traz problemas na atividade do dia-a-dia. Há também um descompasso na atuação que se faz no Judiciário. Isso porque em toda atividade judiciária, especialmente na Justiça Federal e nos Tribunais Superiores, se faz necessária a presença da AGU, mas não houve e não tem havido um planejamento harmônico. São criadas, por exemplo, inúmeras varas na Justiça Federal sem que se planeje, paralelamente, a criação e instalação de um advogado da União ou um procurador federal.

ConJur – Essa é a mesma reclamação da Defensoria Pública e do Ministério Público.

Álvaro Ribeiro Costa — Exato. E nós todos aqui trabalhamos com a idéia de que não adianta você chegar e dizer, “olha, eu quero mais um advogado”. Não. Você tem que ter um advogado, um espaço físico, um computador, e estrutura de apoio. Eu creio que isso pode mudar com a criação dos Conselhos do Ministério Publico e da magistratura. Quando eles começarem a perceber que o papel mais relevante é o de planejamento da atividade judiciária como um grande serviço público. Eles vão ter que levar em conta, e o Poder Executivo vai compreender melhor, que não adianta dar seqüência a um projeto de uma área se, ao mesmo tempo, não elabora projetos correspondentes pra outras. Esse dimensionamento e racionalização, vai permitir o crescimento e uma utilização melhor das estruturas que já existem.

ConJur – Como o senhor tem avaliado a atuação dos dois Conselhos (Conselho Nacional de Justiça e Conselho Nacional do Ministério Público)?

Álvaro Ribeiro Costa — Os Conselhos, em si, são um avanço muito grande. Não digo nem na parte disciplinar, mas sim no fato de que agora ilhas isoladas têm um foro. É a partir dos Conselhos que se pode ver onde está a demanda da prestação judiciária ou do Ministério Público. Verificar quando esta demanda está sendo atendida ou não, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, e constatar, a imensa disparidade em relação a isso: areas que não estão sendo atendidas, áreas com um ótimo atendimento e áreas desatendidas. É importante essa visão de conjunto, que tira um juiz do trabalho do caso a caso e o traga à atividade jurisdicional do conjunto. Se esses Conselhos ficarem presos ao casuísmo vai se perder a grande oportunidade de contribuir para dar para uma visão de conjunto da prestação jurisdicional.

ConJur – Quanto custa um advogado para a União?

Álvaro Ribeiro Costa — Não sei. É algo que nós estamos tentando estimar. Nós não sabíamos nem quanto custava a remuneração deles. Nessa gestão, conseguimos unificar a folha de pagamento dos advogados da União e dos procuradores federais. A partir daí foi possível, inclusive, saber quantos eles são. Hoje temos 3.974 procuradores federais e 1.466 advogados da União. Em 2003, o vencimento básico deles era de R$ 4.913,14 somando o salário de R$ 3.779,34 e a gratificação de desempenho de atividade jurídica de R$ 1.133,80. Hoje eles estão recebendo R$ 10.497,56 com a gratificação já incorporada.


ConJur – A gestão Gilmar Mendes tratou de colocar algumas coisas nos eixos e organizou algumas carreiras. Como está hoje a divisão de carreiras e as atividades dentro da AGU nos órgãos vinculados?

Álvaro Ribeiro Costa — Existia dentro da área dos procuradores federais, um número muito variado de regimes. A criação da Procuradoria Federal e da carreira de procurador federal, antes desta gestão, foi um grande avanço, mas não havia sido feita a individualização para saber quem poderia ser inserido no regime novo. Este trabalho foi encerrado agora. Agora a Procuradoria Federal dispõe de um quadro definido de procuradores federais que cuida da representação de autarquias e fundações públicas.

ConJur – E quanto ao quadro de advogados da União?

Álvaro Ribeiro Costa — Em termos de advogados, havia os assistentes jurídicos, que faziam só a consultoria dos ministérios e os advogados da União, que faziam o contencioso. Houve a fusão das duas carreiras e está ainda em processo de conclusão a individualização para saber quem foi alcançado pela integração. Além disso, temos a carreira dos procuradores da Fazenda, que também integram a Advocacia da União.

ConJur – Procuradores da Fazenda no quadro da AGU?

Álvaro Ribeiro Costa — A Procuradoria da Fazenda tem uma singularidade. Os Procuradores da Fazenda integram carreira dentro da AGU, mas a Procuradoria da Fazenda em si está administrativamente subordinada ao Ministério da Fazenda, o que cria uma situação peculiar. Do ponto de vista de racionalidade, gera dificuldades.

ConJur – O ideal seria unir tudo numa mesma entidade?

Álvaro Ribeiro Costa — O natural é que, ao longo do tempo, se tenha uma coisa só, mas não sei se isso é coisa de curto ou médio prazo. Esse é um tema que deve ser visto de uma maneira racional. É compreensível que as categorias tenham os seus pontos de vista, que são situados nas suas circunstancias, mas quem vê o quadro como um todo percebe que a tendência é de uniformização. Esta é uma coisa muito simples, muito óbvia, do ponto de vista racional, mas não é do ponto de vista das circunstancias. É preciso um trabalho cultural de convencimento e de avanço para superar essas dificuldades, mas são próprias das circunstancias como nasceu a AGU.

ConJur – A AGU tem 1.466 advogados. Esse número é suficiente para atender a toda demanda?

Álvaro Ribeiro Costa — Não podemos chutar, nessa matéria. A primeira coisa que nós tentamos fazer aqui foi aperfeiçoar um sistema chamado Sicau — Sistema de Controle das Ações da União, que mede as tarefas das pessoas. Até então nós não sabíamos, e não sabemos ainda hoje com precisão, quantas são e quantas eram as ações em juízo, de que tipo. Também não tínhamos controle sobre as atividades consultivas. Empiricamente, nós poderíamos dizer que temos muito menos, mas eu não posso afirmar com muita segurança. É preciso aperfeiçoar este sistema para dizer, com segurança, onde é que falta e onde pode haver alguma parcela de ociosidade. Eu sei que há locais que precisam de mais gente e locais que não precisam de tanta gente. O Sicau, tem limitações, e já estamos trabalhando num novo sistema que nos informe não apenas como é que são os processos, mas quantos são, como são as atividades desenvolvidas, e a relação dessas atividades com o tempo necessário para cada operador.

ConJur – Ministro, o senhor está aqui desde 2003 e agora deve deixar o cargo. Se possível ficaria por mais tempo?

Álvaro Ribeiro Costa — Eu combinei com o presidente Lula que todo jogo tem que ter um limite. Todas as instituições têm que ter a sua renovação. No que me diz respeito, foi uma experiência enriquecedora ao máximo. É uma atividade extremamente estressante e complexa, mas extremamente enriquecedora. Uma nova administração gera expectativa. Então é preciso renovar esperanças, inclusive do ponto de vista interno. Aqui eu passei tudo; muitas greves, pessoas entregaram os cargos, houve enterro simbólico. Tudo o que se pode imaginar aconteceu aqui.

ConJur – O que o senhor espera do novo Advogado Geral da União? O senhor já sabe quem é, sugeriu alguém?

Álvaro Ribeiro Costa — Não, não sei quem é e não cabe a mim indicar ninguém. O presidente da República, neste período todo em que nós trabalhamos juntos teve, com a AGU, uma compreensão de altíssimo nível. Então ele sabe muito bem da importância da AGU, ele sabe que a AGU é o dia-a-dia, mas também é a UTI nos momentos mais delicados da atividade de governo. Eu espero do novo advogado-geral, antes de mais nada, paciência. Muita paciência. Sou muito otimista. Qualquer que seja a pessoa que venha pra cá, virá dentro de um perfil de responsabilidade e encontrará uma instituição invejável, a despeito da sua juventude e das suas dificuldades que são próprias dessa fase de nascimento.

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