Carga ingrata

Brasil tributa demais, mas não investe nada

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28 de dezembro de 2007, 23h00

FHC e Lula não são iguais? A desvalorização do real (FHC) iniciou a fase virtuosa da balança comercial com superávits significativos. Os superávits primários no atual governo até aumentaram. Os juros primários sempre estiveram (e ainda estão) altos, como dantes sob FHC, atraindo capitais externos que forçam o Banco Central (BC) a emitir títulos, a aumentar o tamanho da dívida e a anular o seu peso menor agora que os juros baixaram, mantendo o déficit nominal.

A descida dos juros, recente, aumentou o crédito, as vendas, os investimentos privados, os empregos e, portanto, gerou mais renda. As indústrias que animam todas as cadeias de produção: construção civil e de veículos, deslancharam, com vendas a prazo a perder de vista. Agora notem, quem está empurrando o país é a iniciativa privada e os consumidores. O governo baixou os juros a contragosto. Na verdade, a estabilidade deve ser debitada à macroeconomia do real, jamais aos diretores do BC lulista, que erraram feio na mão durante anos, com medo do bicho-papão da inflação.

O que previram, como sábios do Sião, não ocorreu, ou seja, que “o parque produtivo instalado” não iria dar conta de produzir ante a demanda crescente. Ocorreu o contrário, nunca se investiu tanto em máquinas, mão-de-obra e produção. O mercado interno está salvando a pátria. Agora estão por conta da crise norte-americana. Não baixam mais o juro primário, o maior do mundo. Nunca vi um BC tão ultra-ortodoxo num governo social-democrata. Bolsa-Família? Não passa da unificação de todos os programas que já existiam antes. As despesas correntes não cessam de crescer. A República é sindicalista. Eis a única diferença.

Contudo, se há alguém capaz de abortar o crescimento, o seu nome é governo federal. Não investiu nem privatizou, como seu antecessor falastrão, o setor hidrelétrico. Os apagões do gás e da hidreletricidade não são fantasmas, são reais. Poderia haver mais investimento e mais consumo das famílias e das empresas. Não há porque o governo, perdulário com seus gastos, transfere na marra, via tributação da renda e do consumo, quase 40% da poupança privada para os seus cofres, que são sacos sem fundo.

A carga tributária excessiva, sem investimentos na educação técnica do povo e na infra-estrutura produtiva, é uma muralha que impede o fluxo do crescimento do mercado interno, feito à base de produção e consumo. Ambos dependem de capital próprio. A equação é simples. Menos tributo, mais renda disponível, mais consumo, mais crédito, mais produção, maior arrecadação. Os norte-americanos baixam juros e tributos para crescer o setor privado. Os socialistas aumentam tributos para o governo investir. Nós não fazemos nem uma nem outra coisa. É risível! Tributamos muito, não investimos nada.

O real está supervalorizado. As importações crescem; as viagens ao exterior aumentam, as exportações decrescem, perdemos mercados conquistados a duras penas e desempregamos gente no setor exportador. Entra mais moeda forte do que sai. O Brasil aumenta as reservas, emitindo títulos da dívida pública para esterilizar os reais emitidos pela entrada de dólares. O real está depreciado porque há superávit na balança comercial e especulação financeira. Mas a balança vai zerar nos próximos 13 meses, se tanto. Nessa hora, o juro nominal tem que estar em 9% e o real, em 4,5% (supondo inflação de 4,5%), para secar a arbitragem especulativa e levar o real para baixo.

Se os juros não baixarem e nos tornamos deficitários na balança comercial, perdendo reservas para fechar as contas externas, de quem será a culpa? Apagão energético, infra-estrutura arcaica e ineficiente, balança comercial deficitária, perda de reservas, juros altos para atrair moeda forte, tributação excessiva, arrefecimento da produção e do emprego são os prognósticos, se nada mudar.

Por que o governo, que cobra tantos tributos, não investe? Se não pode fazê-lo, por que não privatiza? Os governos norte-americano ou japonês ou coreano são donos da economia? São fortes, economicamente? Há risco para a soberania nacional deles? O povo por lá é pobre, como o nosso, mas supostamente dono das estatais? Basta comparar.

Este ano, até outubro, o governo poupou R$ 106 bilhões para pagar juros e não deu conta de pagá-los inteiramente. O Tesouro bancou o resto. Vejam os números. Dívida pública: R$ 1,280 trilhão e aumentando — 44% do PIB (Produto Interno Bruto) —, numa visão conservadora. Arrecadação total estimada: R$ 1 trilhão. A chave do enigma: continuar a baixar a taxa Selic e diminuir a carga tributária. De repente, o país se resolve para melhor, sem perder em arrecadação, mas o Produto Interno Bruto cresce. Nosso PIB será em 2008 de R$ 3 trilhões, mais ou menos. Nada desprezível. Acorda oposição. Acorda.

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    é advogado tributarista, professor titular de Direito Financeiro e Tributário da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e sócio do escritório Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados.

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