Autonomia no julgamento

Juizados Especiais vão poder julgar ações contra governos

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17 de dezembro de 2007, 23h00

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, na quinta-feira (14/12), o relatório do deputado Flávio Dino (PCdoB-MA) ao Projeto de Lei 7.087/06, que cria os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados e do Distrito Federal.

De autoria do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) — número original no Senado PLS 118/2005 —, o PL irá, na prática, estender a competência dos atuais Juizados Especiais Estaduais, permitindo que eles passem a julgar ações em que os governos estaduais e municipais são partes, o que atualmente é impedido pela Lei 9.099/95 (Juizados Especiais Criminais).

De acordo com Flávio Dino, a necessidade dessa mudança surgiu após a criação dos Juizados Especiais Federais, em 2001, que gerou uma situação desigual entre os cidadãos que entram em litígio contra a União e os que precisam discutir com os governos estaduais e municipais.

“Ou seja, se o cidadão tiver uma ação contra o governo federal que envolva valores de até 60 salários mínimos (hoje R$ 22, 8), ele pode apelar aos Juizados Especiais Federais, que são mais rápidos e menos burocratizados (por exemplo, não há previsão de precatório para pagamento). Já se for contra o governo do estado ou do município, precisará apelar para a Justiça comum, que enfrenta sérios problemas de morosidade”, explicou.

O deputado destacou, ainda, que um bom exemplo são as multas de trânsito. “Se forem emitidas numa rodovia federal, elas podem ser questionadas e resolvidas rapidamente nos Juizados Especiais Federais. Já se ocorrerem em vias urbanas ou em rodovias estaduais, não”, compara o relator.

Outro exemplo são os servidores públicos, na medida em que os federais dispõem de um mecanismo hoje vedado aos estaduais e municipais.

O objetivo do PL 7087/06 é permitir que os benefícios proporcionados pelos Juizados Federais — celeridade, simplificação do trâmite processual, informatização e facilidade de acesso — sejam estendidos a todos os cidadãos. “Afinal, um jurisdicionado que discute com a Fazenda Pública municipal ou com a estadual não é menos cidadão que aquele em disputa com a União, e merece, em igualdade de condições, ter a faculdade de dispor de um rito mais célere”, sustentou Flávio Dino.

Juiz federal por 12 anos antes de se eleger deputado, Dino apontou a necessidade de correção de algumas impropriedades e de reparos formais na futura norma. Para tanto, apresentou o Substitutivo (Projeto de Lei 7.087/06) que foi aprovado agora pela CCJ, amparado na Lei dos Juizados Especiais Federais (10.259/2001) e em sugestões do Fórum Nacional de Juizados Especiais (Fonaje) e da Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

Nele, Flávio Dino prevê, por exemplo, a possibilidade de a instrução do processo ser conduzida por um conciliador ou juiz leigo nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, como já ocorre atualmente nos Juizados Estaduais. Para o deputado, esses atores simbolizam a participação popular na administração da Justiça, “uma das singularidades do Estado Democrático de Direito”.

O Projeto de Lei irá agora a votação em Plenário.

Leia o projeto

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

PROJETO DE LEI 7.087, DE 2006

Dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios e dá outras providências.

Autor: SENADO FEDERAL

Relator: Deputado FLÁVIO DINO

I – RELATÓRIO

A proposição em análise, de autoria do Senador Antônio Carlos Valadares, pretende dispor sobre a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, órgãos da Justiça Comum, a serem criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução nas causas de sua competência.

Em cumprimento ao despacho do Presidente da Câmara dos Deputados, foi a proposta analisada, inicialmente, no âmbito da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, que se manifestou pela sua aprovação. Posteriormente, a Comissão de Finanças e Tributação entendeu que a matéria não implica aumento de despesa ou diminuição da receita ou da despesa da União.

É o relatório.

II – VOTO DO RELATOR

Cabe a este Órgão Técnico, nos termos regimentais, apreciar o Projeto de Lei nº 7.087 de 2004, aferindo sua constitucionalidade, sua juridicidade, sua técnica legislativa seu mérito.

Não vislumbramos inconstitucionalidade concernente à competência legislativa ou à iniciativa legiferante. O conteúdo material da proposta está incluído no dispositivo que regula a competência legislativa privativa da União, qual seja, o art. 22, caput e inc. XVII da Carta Política. Da mesma forma, cumpriram-se os preceitos relativos à iniciativa legiferante, previstos na cabeça do art. 61 da Constituição Federal.

De forma geral, não há entraves quanto à juridicidade da medida, pois não colide com norma legal, posição doutrinária ou jurisprudencial do ordenamento jurídico brasileiro. Pontualmente, apontamos algumas impropriedades a serem corrigidas.

Quanto à técnica legislativa, também há reparos formais que se fazem necessários, de forma a atender às previsões da Lei Complementar 95, de 1998, alterada pela Lei Complementar 107, de 2001.

Quanto à avaliação de conveniência e oportunidade, entendemos tratar-se de proposição que merece prosperar, pois vai ao encontro dos anseios do Legislador Constituinte derivado, manifestado por meio da Emenda Constitucional 45, de 30 de dezembro de 2004, que acolheu o princípio da razoável duração do processo e assegurou a todos os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Apresentamos Substitutivo amparado na disciplina dos Juizados Especiais Federais (Lei nº 10.259/2001) e sugestões do Fórum Nacional de Juizados Especiais (FONAJE) e da Associação de Juízes Federais do Brasil (AJUFE). Consideramos, ainda, algumas críticas que a doutrina apresenta ao funcionamento dos Juizados Especiais Federais.

Ao art. 1º do PL acrescentamos a expressão “integrantes do Sistema dos Juizados Especiais”, de forma a denotar que os Juizados existentes não restarão secundários na estrutura dos Tribunais.

O art. 2º do PL relatado estabelece distinção entre os valores hábeis a fixar a competência dos Juizados da Fazenda Pública Estadual e Municipal, ambos inferiores à importância que assenta a competência dos Juizados Especiais Federais. Sugerimos que o valor seja unificado, em atendimento ao princípio da isonomia, inserto no art. 5º de nossa Constituição

Federal. Afinal, um jurisdicionado que contende com a Fazenda Municipal ou com a Estadual não é menos cidadão que aquele em disputa com a Fazenda Federal, e merece, em igualdade de condições, ter a faculdade de dispor de um rito mais célere, em atendimento ao princípio da razoável duração do processo, a teor do

inc. LXXVIII do art. 5º da CF

Quanto ao § 3º do art. 2º, sugerimos que a redação adotada seja a exata antítese da que consta do PL relatado. A prescrição original determina que os valores hábeis a fixar a competência do juizado serão considerados por processo e não por autor, em discordância com enunciado do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais – FONAJEF 1.

Excluímos a possibilidade de intimação pessoal da Fazenda Estadual e da Municipal, prevista no art. 6º. Ressalvadas as execuções fiscais2, que não se inserem na competência dos Juizados Especiais, em nosso sistema normativo, apenas a Fazenda Nacional goza dessa prerrogativa. Ela está prevista no art. 38 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, e no art. 6º da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995 e é questionada mesmo nos Juizados.

1 Enunciado FONAJEF 18: No caso de litisconsorte ativo, o valor da causa, para fins de fixação de competência deve ser calculado por autor.

2 PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. INTIMAÇÃO

PESSOAL. LEI Nº 6.830/80, ART. 25. PRECEDENTES. 1. Na execução fiscal, de regra, qualquer intimação dirigida a representante da Fazenda Pública será feita pessoalmente, não sendo válida, pois, a efetuada exclusivamente por publicação no órgão oficial ou por carta, ainda que registrada com aviso de recebimento. 2. Recurso especial provido. (REsp 595.812/MT, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03.10.2006, DJ 06.11.2006 p. 306)

Especiais Federais1. As Fazendas Públicas dos demais entes da federação devem ser intimadas na forma do Código de Processo Civil.2

Acrescentamos novo artigo 16, que prevê a possibilidade de designação de conciliadores e juízes leigos para os Juizados Especiais da Fazenda Pública. Tais atores simbolizam a participação popular na administração da Justiça, uma das singularidades do Estado Democrático de Direito. Ademais, a eficiência de sua atuação já restou comprovada pela experiência dos Juizados Especiais Cíveis. A medida concorre, em grau significativo, para a satisfação da tutela almejada pelo jurisdicionado.

O substitutivo prevê, ainda, a possibilidade de a instrução ser conduzida pelo conciliador, sob a supervisão do Juiz. Salvaguardando os interesses das partes, ressalvamo-lhes o direito de impugnar a aptidão probatória da instrução assim realizada e requerer que a audiência seja presidida pelo Juiz.

Em nosso substitutivo, os artigos 16 e 17 da proposição primitiva foram modificados, enquanto o antigo artigo 18 foi suprimido. A redação original ofende o art. 125 da Constituição Federal, que confere aos Estados a competência para a organização de sua Justiça. Evitamos, assim, que Lei Federal imiscua-se em peculiaridades locais.

Sugerimos, ainda: a atualização da referência à Lei que dita o conceito de Microempresa; a inserção de prazo para instalação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública; a alteração da regra de transição entre os sistemas, mediante aumento do período em que a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública pode ser limitada; a fixação de mandato para os integrantes das Turmas Recursais.

O PL conferiu ao sistema recursal dos Juizados Especiais da Fazenda disciplina parcialmente diversa do regime previsto para os Juizados Especiais Federais, na Lei 10.259, de 12 de julho de 2001.

A proposição prevê que as divergências entre turmas recursais do mesmo Estado serão sanadas em reunião conjunta, a exemplo do que prevê a Lei 10.259. Quanto às divergências entre turmas recursais de Estados distintos, sob a disciplina prevista na Lei nº 10.259, as dissensões interestaduais são sanadas por uma Turma de Uniformização interestadual e, quando a orientação acolhida por esta, em questões de direito material, contraria súmula ou jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça – STJ, a parte interessada pode

1 As Turmas Recursais do Rio de Janeiro editaram o seguinte enunciado: Enunciado nº 39: A obrigatoriedade de intimação pessoal dos ocupantes de cargo de Procurador Federal, prevista no art. 17 da lei nº 10.910/2004, não é aplicável nos Juizados Especiais Federais.

2 DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL.INTIMAÇÃO. CAPITAL DE ESTADO. PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO OFICIAL. PRECEDENTES.RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Tratando-se de intimação da Fazenda Pública realizada na Capital do Estado, o termo a quo para a contagem do prazo recursal inicia-se com a publicação da decisão no Diário Oficial, nos termos do art. 236, caput, do CPC. Precedentes. 2. Recurso especial conhecido e improvido. (REsp 749.099/RN, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 28.06.2007, DJ 06.08.2007 p. 627) provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência. Por sua vez, o PL em exame prevê que as divergências interestaduais serão debeladas diretamente pelo STJ.

Verifica-se que a alteração empreendida suprime uma das instâncias recursais, sem causar prejuízo às partes. Por esta razão, aderimos à modificação proposta.

Em função do exposto, manifesto-me pela constitucionalidade, juridicidade, técnica legislativa e, no mérito, pela aprovação do Projeto de Lei nº 284, de 2007, na forma do substitutivo anexo.

Sala da Comissão, 2007.

Deputado FLÁVIO DINO

PC do B/MA

RELATOR

COMISSÃO

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