Ficha limpa

Delegado de SP consegue afastar indiciamento no STJ

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15 de dezembro de 2007, 23h00

Recebida a denúncia não é licito que o réu seja indiciado policialmente. O ato causa constrangimento ilegal. O entendimento foi reafirmado pelo ministro Nilson Naves, do Superior Tribunal de Justiça, ao acolher pedido de Habeas Corpus de um delegado de São Paulo e sua filha. Eles foram denunciados juntamente com outras pessoas por lavagem de dinheiro.

Com a decisão, pai e filha ficam com a ficha limpa na polícia. A denúncia, no entanto, vai continuar tramitando normalmente.

O advogado dos acusados, Luiz Guilherme de Almeida Jacob, entrou com recurso no STJ contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo. É que os desembargadores negaram pedido de liminar para afastar o indiciamento dos acusados mesmo depois da denúncia. O pedido foi solicitado pela Vara Distrital de Bertioga (litoral paulista).

As investigações contra os acusados começaram após um outro delegado ter denunciado um suposto esquema de corrupção policial em benefício de jogos ilegais no litoral paulista.

Por isso, em agosto passado, o MP pediu o seqüestro de uma casa da filha do delegado. O imóvel, localizado na Riviera de São Lourenço, em Bertioga, está avaliado em R$ 1 milhão. O MP afirma que a fraude só foi desvendada quando se detectou um dano ambiental na construção do imóvel.

Para comprar a mansão de altíssimo luxo, segundo o MP, o delegado e a filha usaram dois laranjas. Estes firmaram um compromisso de compra e venda do terreno. “Entretanto, tal declaração não condizia com a realidade dos fatos e visou única e exclusivamente criar obrigação inexistente, alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante e, por fim, ocultar a verdadeira adquirente do terreno, a filha do delegado de Polícia e testa-de-ferro dele”, diz a denúncia.

O dinheiro, de acordo com as investigações, vinha de crimes contra a administração pública, com prevaricação, concussão, corrupção passiva e outros. “Os valores ocultados tiveram origem na exigência, para si, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos.”

Defesa

O advogado Luiz Guilherme Jacob afirmou que a denúncia do MP carece de credibilidade. E isso, segundo ele, teria sido “esclarecido caso o Ministério Público tivesse ouvido o delegado antes de, bombasticamente, divulgar o fato na imprensa”, criticou.

Segundo ele, “a casa na Riviera não vale um milhão nem pertence ao delegado. A casa pertence a filha, que é advogada, tem família própria (é casada com pessoa de posses) e vida econômica independente do pai.”

Leia a decisão

Superior Tribunal de Justiça

HABEAS CORPUS 96.934 — SP (2007/0300202-4)

RELATOR: MINISTRO NILSON NAVES

IMPETRANTE: LUIZ GUILHERME DE ALMEIDA RIBEIRO JACOB E OUTRO

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO

PAULO

PACIENTE : AAAAA

PACIENTE : BBBBB

DECISÃO

Do habeas corpus impetrado em favor AAAA e BBB colho estas alegações:

“Os pacientes foram denunciados pelo Ministério Público do Estado de São Paulo perante a d. Vara Distrital de Bertioga (proc. n.577/2007).

A denúncia foi escorada em procedimento investigatório criminal (PIC) conduzido pelo parquet.

Ao receber a denúncia, a MMa. Juíza Presidente do feito, dentre outras deliberações, determinou a realização do formal indiciamento dos pacientes.

Mesmo respeitando o entendimento da e. Magistrada, os impetrantes apresentaram habeas corpus junto ao egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, postulando providência liminar suspensiva da ordem de indiciamento.

Para tanto, respaldaram-se no magistério jurisprudencial segundo o qual configura constrangimento ilegal a determinação de indiciamento após o recebimento da denúncia.

“A DD. autoridade coatora, no entanto, negou a liminar, sob o fundamento de que não se vislumbrava ‘perido de lesão evidente a direito certo dos pacientes’.”

Foi, então, formulado pedido de concessão de medida liminar para se suspender “imediata e provisoriamente o cumprimento da v. ordem de indiciamento dos pacientes”.

Quanto ao fato de se tratar de habeas corpus contra decisão unipessoal denegatória de liminar, tal não causa a mim, em princípio, total embaraço quanto à admissibilidade do pedido entre nós, como já fiz constar do HC-42.914 tratar-se de ilegalidade flagrante, motivo por que concedo a liminar a fim de que o defensor constituído tenha vista”) e do HC-46.410 (“Se bem que se cuide de habeas corpus contra a não-concessão na origem da liminar (…), pretendo eu, todavia, logo, logo, reparar a coação, e coação que estou reputando manifestamente ilegal, por isso tenho em mãos estas soluções”.).

(…). Todavia há uma terceira solução, a saber, a expedição, de ofício, da ordem de habeas corpus. Em qualquer caso, estou concedendo ao paciente liberdade provisória mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação”).

De minha parte, entendo, ao menos neste exame preliminar, que têm razão os impetrantes. É que sobre o tema já escrevi a seguinte ementa (HC-39.551, DJ de 23.5.05):

“Denúncia (recebimento). Indiciamento (desnecessidade).

1. Uma vez recebida a denúncia, não é lícito seja o réu policialmente indiciado.

2. O ato judicial que isso determina enseja constrangimento ilegal. 3. Habeas corpus deferido.”

Tal o pedido feito, defiro a liminar para suspender, até o julgamento final do habeas corpus impetrado na origem, o indiciamento dos ora pacientes, nos autos do Processo 577/07, que tramita na 1ª Vara do

Foro Distrital de Bertioga – SP. Comunique-se.

Solicitem-se informações ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Prestadas, dê-se vista ao Ministério Público Federal.

Publique-se.

Brasília, 13 de dezembro de 2007.

Ministro Nilson Naves

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