Exame da Ordem

Anulação de prova reabre discussão sobre Exame da OAB paulista

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10 de dezembro de 2007, 14h52

A possibilidade de fraude do 134º Exame de Ordem da OAB paulista, que seria feito no domingo (9/12), colocou em xeque a credibilidade da prova. A lista de suspeitos é grande. Nela, constam representantes da Vunesp, responsável pela coordenação do Exame, representantes de cursinhos, integrantes da Comissão de Exame de Ordem e os próprios bacharéis em Direito. Seja quem for o autor da ilicitude, a punição será severa, segundo Luiz Flávio Borges D´Urso, presidente da OAB de São Paulo, que é elogiado pelos advogados por ter agido rapidamente no caso.

A Polícia Federal já foi convocada a instaurar inquérito. D’Urso também quer que o procurador-geral de Justiça, Rodrigo Pinho, designe um promotor para acompanhar as investigações. Uma sindicância interna ainda será constituída para apurar a responsabilidade pelo suposto vazamento das questões.

A diretoria da OAB paulista soube da possibilidade de fraude na tarde de sábado (8/12). D’Urso recebeu um telefonema em que se afirmou que alunos de um cursinho, cujo nome foi mantido em sigilo, já tinham conhecimento de algumas questões da prova. Ele pediu que as questões lhe fossem repassadas por e-mail. Das oito que recebeu, duas constavam na prova. Imediatamente, comunicou o cancelamento do Exame.

Na noite de sábado, a notícia foi dada no Jornal Nacional, da TV Globo, e estava disponível nos principais sites de notícias do país. A OAB nacional também emitiu um comunicado. A intenção foi levar a informação para o maior número de candidatos possível e diminuir os transtornos no domingo, (9/12). Somente 10% dos candidatos compareceram ao local da prova.

Essa é a primeira vez que um Exame de Ordem da OAB-SP é suspenso por suspeita de fraude, de acordo com D’Urso. O Exame é aplicado aos bacharéis em Direito desde 1970.

Caminho certo

A atitude da OAB paulista foi elogiada por advogados, professores e diretores de cursinhos. O advogado Luiz Flávio Gomes, dono de uma rede de ensino do mesmo nome, que prepara candidatos para concursos e Exame de Ordem, acredita que a OAB agiu corretamente. Ele defende que deveria ser divulgado o nome do cursinho preparatório. E mais: o responsável deve ser punido com pena de prisão. Para ele, a suspeita de fraude mostra que está na hora de mudar as regras.

Segundo Luiz Flávio Gomes, o Exame da OAB tem de ser nacional para diminuir o risco de fraude. “Quanto mais local, maior o risco”, garante. Além disso, professores de cursinho deveriam ser proibidos de atuar como fiscais, por entender que existe “um jogo de interesses”. “O que a OAB-SP deve fazer é apurar a responsabilidade e levar o caso para a Polícia”, afirma. A atitude já foi tomada por D´Urso.

Marcelo Conetti, coordenador pedagógico do curso preparatório para a OAB do Complexo Jurídico Damásio de Jesus, discorda de Luiz Flávio Gomes. Para ele, o fato de o Exame ser local não facilita a fraude. “O risco é proporcional. Na prova de âmbito nacional, a suspeita de fraude traz muito mais prejuízos do que em âmbito estadual”, considera.

De acordo com Conetti, também não se pode falar que foi um diretor de cursinho o responsável pela fraude. “Só quem tem os dados da prova é a OAB e a Vunesp. Foi um membro de uma dessas duas instituições quem rompeu o dever de sigilo e não o diretor do cursinho. E alguém pagou para ter essa informação. É isso que deve ser investigado e não se começar uma campanha contra os cursos preparatórios para o Exame de Ordem”, assegura.

Para João Grandino Rodas, diretor da faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, a possibilidade de fraude não o preocupa, porque é possível de acontecer em qualquer tipo de concurso, ainda mais no caso de provas públicas com grande número de candidatos e muita visibilidade.

Segundo Grandino, a suspeita de fraude, por si só, também não justifica defender que São Paulo tenha de participar do Exame unificado — hoje, apenas São Paulo e Minas Gerais aplicam prova individualizada. “O Exame de Ordem precisa evoluir, mas não por essa razão, pura e simplesmente. Confio na OAB-SP, na capacidade de detectar a fraude e de apresentar uma nova prova, isenta de problemas”, afirma.

Na tarde de domingo, o Conselho Federal da OAB nacional se reuniu para discutir, entre outros problemas, a fraude no Exame de Ordem. O conselheiro Alberto Zacharias Toron, informou que a decisão foi a de apoiar integralmente qualquer decisão da Ordem dos Advogados do Brasil paulista.

“Todos estamos sujeitos a fraude. O importante é que a OAB-SP tomou todas as medidas compatíveis”, diz. De acordo com ele, ainda é cedo para pensar que um candidato, que pretender atuar defendendo a aplicação da lei, possa ter tentado fraudar o concurso. E é cedo também para a suspeita recair totalmente em um cursinho preparatório.

O presidente nacional da OAB, Cezar Britto, condenou a suposta fraude. Britto afirmou que o bacharel em Direito que tenta entrar na profissão a partir de fraude certamente será um advogado a serviço do crime. “Quem ingressa nessa profissão a partir de meios fraudulentos comete dois vícios: ausência de qualificação técnica e falta de ética, sendo este último o mais grave”.

Por essa razão Britto vem defendendo veementemente a realização do Exame de Ordem unificado tanto em datas de aplicação como em conteúdo das provas. Segundo Britto, 25 estados já aderiram ao unificado, faltando, apenas, São Paulo e Minas Gerais. “Consideramos fundamental essa unificação para que haja uma maior segurança nas provas e melhor fiscalização do ensino jurídico brasileiro,” afirmou.

A estrutura

O presidente da Comissão de Estágio e Exame de Ordem, Braz Martins Neto, é a única pessoa que tem conhecimento de todo o conteúdo da prova. Um grupo de advogados faz sugestões de perguntas, que são reunidas em um banco de dados. A partir daí, o presidente da Comissão de Exame de Ordem seleciona cem questões. Elas são levadas à Vunesp, onde a prova é digitada e revisada por Braz e uma pessoa da Fundação. Só aí a prova é impressa, na gráfica da própria Vunesp. Elas são lacradas, guardadas em um cofre e saem de lá apenas no dia do Exame. O local da prova é alugado. Milhares de voluntários são convocados para aplicá-la – entre eles, professores de cursinhos.

O promotor de Justiça André Luís Alves de Melo, que atua em Minas Gerais, defende uma solução simples para o fim de suspeitas de fraude nos Exames de Ordem. Segundo ele, a OAB deveria ter como exigência que os examinadores tivessem mestrado ou doutorado, além de experiência acadêmica. Além disso, alguns dos examinadores deveriam ser indicados pelo MEC.

“Tenho observado outros dois problemas práticos: um é o fato de professores de cursinhos serem examinadores em salas de aplicação de provas, o que acaba gerando insegurança acerca da imparcialidade. E outro mais complexo é o fato de que nos recursos tem havido identificação dos recorrentes quebrando com a impessoalidade principalmente na segunda fase. Uma questão estrutural é que o Exame da OAB não tem seguido o currículo indicado pelo MEC que prioriza matérias fundamentais como sociologia, filosofia e outras básicas”, diz.

Ainda não há data para a realização da primeira fase da prova, que terá de ser elaborada novamente. A OAB-SP pretende pedir o ressarcimento do prejuízo que teve com o cancelamento da prova, quando os responsáveis forem identificados. D’Urso não soube dizer quanto custa a realização do Exame, mas citou gastos com a locação dos espaços, pagamento à Vunesp, mobilização de voluntários, transporte, correio e xerox.

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