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Jornal vai pagar indenização por danos morais a Luxemburgo

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9 de dezembro de 2007, 12h48

Depois de ser acusado em reportagem jornalística de vigiar seus atletas por meio de câmeras, o técnico do Santos Futebol Clube, Vanderlei Luxemburgo, deverá receber uma indenização de R$ 40 mil do jornal Folha de S. Paulo, por danos morais. De acordo com o juiz, Alexandre Augusto Marcondes, autor da sentença de condenação, ficou comprovado em depoimento de diversas testemunhas que a informação não é verdadeira, como também não houve o necessário cuidado em checar sua veracidade.

“A liberdade de imprensa não é um direito absoluto. Vários são os limites da liberdade de expressão e informação, sendo um deles, se não o mais significativo, o dever de informar a verdade,” anotou o juiz em sua decisão. Para Marcondes, no caso, houve abuso do direito de informar. Vanderlei Luxemburgo foi representado pelo advogado Antonio Carlos Sandoval Catta-Preta.

Na reportagem, Luxemburgo foi acusado de espionar os atletas da concentração santista por meio de câmeras instaladas até nos quartos onde ficam os jogadores. O texto afirmava que “os jogadores do Santos não escapam dos olhares atentos do técnico Vanderlei Luxemburgo nem quando estão dormindo” e que as imagens poderiam ser acessadas de qualquer computador, por meio de uma senha. A reportagem, “Luxemburgo Aparelha e Vigia Santos”, assinada pelo jornalista Rodrigo Mattos, foi publicada na edição do dia 17 de setembro de 2006. O jornalista também responde à ação.

Em sua defesa, o jornal chegou a alegar que na reportagem questionada pretenderam apenas descrever os métodos de trabalho do técnico, bem como os resultados decorrentes de sua presteza e dedicação à frente do Santos Futebol Clube, sem nenhuma intenção de ofender sua honra e imagem. Também argumentou que se limitou a publicar informações a que teve acesso, por meio de fonte cujo sigilo é resguardado pela Constituição Federal, sem sensacionalismo ou insinuação maliciosa.

Mesmo com toda a prova feita no processo, o juiz afirma que o jornal continuou insistindo na veracidade da informação, que teria sido obtida por intermédio de fonte não identificada, “preferindo exercer o direito constitucional ao sigilo jornalístico”. “Isso, contudo, não transforma a informação falsa em verdadeira, nem coloca em dúvida a conclusão de que a informação divulgada não é verídica”, rebate Marcondes.

Segundo o juiz, o jornal lançou mão de “falsa informação” de que Luxemburgo monitorava os jogadores por intermédio de câmeras de vídeo instaladas em seus quartos para equipará-lo ao “Grande Irmão”, personagem central da famosa obra 1984 de George Orwell, protótipo do autoritarismo e do desrespeito ao direito à liberdade, à privacidade e à intimidade. “Tudo para garantir à Folha de S. Paulo, como disse a testemunha José Henrique Mariante, um furo jornalístico”, concluiu.

Leia a sentença

Vistos.

I – Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS movida por VANDERLEI LUXEMBURGO DA SILVA contra RODRIGO DANTAS MENDEZ DE MATTOS e EMPRESA FOLHA DA MANHÃ S/A.

Relata o autor, em síntese, que é técnico de futebol renomado e de sucesso, atualmente exercendo suas funções no Santos Futebol Clube, e que sua honra e imagem foram violadas em reportagem publicada no dia 17/09/2006 no jornal Folha de S. Paulo, redigida pelo jornalista Rodrigo Mattos.

Afirma o autor que na reportagem, com o título “Luxemburgo Aparelha e Vigia Santos”, com o subtítulo “Além do poder fora de campo, câmeras nos quartos da concentração santista transformam técnico em ‘Grande Irmão’”, foi falsamente acusado de espionar os atletas nos quartos da concentração santista, atribuindo-lhe a prática de crimes contra a intimidade e a vida privada de seus comandados e ainda crimes contra a honra e imagem de cada qual, constrangimento ilegal e crime contra a organização do trabalho.

Aduz que nas semanas seguintes, nos dias 19/09/2006 e 26/09/2006, o jornalista publicou novas matérias na coluna “Painel FC”, repercutindo a falsa matéria, com o propósito de destruir sua honra e reputação.

Reputa a conduta dos réus de verdadeira aula prática de abuso da liberdade de manifestação do pensamento e de informação, que violou de uma só vez os arts. 5º, V da CF/88, 186 e 927 do Código Civil e 49 da Lei nº 5.250/67, pedindo que sejam condenados a pagar indenização por danos morais. Juntou documentos (fls. 41/43).

Os réus contestaram a ação, sustentando, em breve síntese, que na matéria questionada pretenderam apenas descrever os métodos de trabalho do autor, bem como os resultados decorrentes de sua presteza e dedicação à frente do Santos Futebol Clube, sem nenhuma intenção de ofender a honra e imagem do autor, agindo apenas com animus narrandi, divulgando fatos de notório interesse público e atendo-se firmemente às informações que lhe foram passadas.


Alegam ainda que não houve sensacionalismo, nem insinuação maliciosa na reportagem, e que se limitaram a publicar informações a que tiveram acesso, através de fonte cujo sigilo é resguardado pela Magna Carta.

Aduzem, por outro lado, que a assessoria de imprensa do Santos Futebol Clube não permitiu a visita do repórter às dependências da concentração, impossibilitando a comprovação da suposta inexistência de câmeras nos quartos dos atletas, monitoradas pelo autor. Acrescentam que em 19/09/2006 publicaram nota na seção “Painel FC”, informando que a assessoria de imprensa do Santos Futebol Clube negou os fatos expostos na matéria questionada, o que corrobora o caráter exclusivamente informativo da mesma.

Arrematam que não houve conduta ilícita e que a matéria é, em linhas gerais, elogiosa à atuação do autor, não se configurando os pressupostos necessários a constituição do dano indenizável, ressaltando que o autor é pessoa pública que possui uma proteção mais tênue no que se refere ao seu patrimônio moral.

Por derradeiro, na remota hipótese de procedência da ação, pugnam pelo arbitramento da indenização em quantia módica e razoável, lembrando o limite de 200 salários mínimos fixado na Lei de Imprensa.

Anexaram um documento (fls. 77/78). Houve réplica (fls. 80/96) e após o saneamento do processo (fls. 104) foi realizada audiência de instrução na qual o autor prestou depoimento pessoal (fls. 135/136) e foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes (fls. 137/148). Encerrada a instrução as partes apresentaram seus memoriais.

É o relatório.

II – Cuida-se de ação de indenização por danos morais em que o autor alega ter o jornal Folha de S. Paulo publicado na edição de 17/09/2006 matéria ofensiva a sua honra e reputação, da lavra do jornalista Rodrigo Mattos, sob o título “Luxemburgo Aparelha e Vigia Santos”, e com o subtítulo “Além do poder fora de campo, câmeras nos quartos da concentração santista transformam técnico em ‘Grande Irmão’” (fls. 41).

O cerne do litígio reside no fato de que de acordo com a matéria questionada os réus publicaram a informação de que “Os jogadores do Santos não escapam dos olhares atentos do técnico Vanderlei Luxemburgo nem quando estão dormindo”, pois “No hotel santista, onde se concentra o time, há câmeras até nos quartos onde ficam os atletas. As imagens podem ser acessadas de qualquer computador, por meio de uma senha”, informação esta que o autor reputa de inverídica.

Antes de analisar se a informação é verídica ou não, e, em caso negativo, seu efeito ofensivo, cumpre lembrar que a liberdade de imprensa não é um direito absoluto. Vários são os limites da liberdade de expressão e informação, sendo um deles, se não o mais significativo, o dever de informar a verdade.

A propósito ensina EDILSOM PEREIRA DE FARIAS que “A liberdade de expressão e informação, que atinge o nível máximo de sua proteção quando exercida por profissionais dos meios de comunicação social, como qualquer outro direito fundamental, não é absoluta, tem limites. Assim, além do limite interno referido da veracidade da informação, a liberdade de expressão e informação deve compatibilizar-se com os direitos fundamentais dos cidadãos afetados pelas opiniões e informações, bem como ainda com outros bens constitucionalmente protegidos, tais como a moralidade pública, saúde pública, segurança pública, integridade territorial, etc.” (“Colisão de Direitos – A Honra, a Intimidade, a Vida Privada e a Imagem versus A Liberdade de Expressão e Informação”, Sergio Antonio Fabris Editor, 2ª ed., 2000, pp. 168-169).

Por sua vez doutrina GILBERTO HADDAD JABUR que “O direito à informação verdadeira, ou liberdade de informação ativa, por intermédio de qualquer meio de difusão, é condição para o saudável e legítimo exercício da liberdade de pensamento, viga mestra dos registros democráticos. O direito de receber informação autêntica depende não só do propósito de quem a presta, mas também dos meios que a divulgam. É direito-pressuposto para o correto encadeamento de idéias, fase do processo de formação de opinião. A correta difusão do pensamento (liberdade de expressão por qualquer veículo), a adequada formação da consciência ou crença, dependem do conteúdo fidedigno da informação, neste ou naquele terreno. Derivam, assim, da preliminar e isenta apreensão dos fatos em torno dos quais se formam, desenvolvem-se e manifestam-se”, concluindo o autor que “O direito à informação verdadeira é, em suma, o germe da correta e livre formação do pensamento e suas ramificações” (“Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada”, Ed. RT, 2000, pp. 165 e 172).

Na mesma linha de pensamento destaca o eminente magistrado e jurista CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY que “o jornalista, no desempenho da atividade de informar, tem inegável dever de verdade, de noticiar sem criar, distorcer ou deturpar fatos. É certo que esse dever de verdade não pode ser levado a extremos, dadas as limitações que ao órgão de imprensa se impõem no mister de apuração fática. Mas não menos certo é que, como acentua João Gualberto de Oliveira, “o jornalista, mais que qualquer outro homem, tem o dever de ser honesto, reto e veraz, pois um dos fins da imprensa é informar ao leitor tão honesta e objetivamente quanto possível” (“A Liberdade de Imprensa e os Direitos da Personalidade”, Ed. Atlas, 2001, pp. 75-76).


Aliás, o dever de informar a verdade que se impõe ao homem de imprensa está expresso no próprio Código de Ética dos Jornalistas, aprovado pela Federação Nacional dos Jornalistas, que reclama “divulgação de informação precisa e correta” (art. 2º), bem como que a informação divulgada “se pautará pela real ocorrência dos fatos e terá por finalidade o interesse social e coletivo” (art. 3º).

À guisa de conclusão pode ainda ser lembrado recente voto do ilustre MINISTRO CEZAR PELUSO, no qual destacou que ocorrerá abuso do direito de informar sempre que a informação divulgada não for verdadeira, verbis: “Em síntese, por força de expressa e específica limitação imanente ao seu perfil normativo, segundo o diagrama que lhe traça a Constituição, a liberdade de imprensa não abrange poder jurídico de violentar o direito fundamental à honra, à boa fama e à intimidade das pessoas. É da sua condição de um dos direitos fundamentais mais complexos, dotado de múltiplas direções e dimensões, dentre as quais a que interessa ao caso: implicar direito de todos à informação, mas não a informação qualquer, senão à informação veraz e não privativa (fato da privacidade), só enquanto tal inocente à dignidade alheia. E não há, aí, nenhuma novidade constitucional: “por isso mesmo que tal é a alta missão da imprensa, é claro que se não deve abusar dela e transformá-la em instrumento de calúnia ou injuria, de desmoralização, de crime. Sua instituição tem por fim a verdade e o direito”. Sem isso, notava outro velho constitucionalista, “reinaria a anarquia e o direito seria o apanágio do forte e o opróbrio do fraco” (STF, RE 447.584-7-RJ, 2ª Turma, j. 28.11.2006).

Pois bem. Colocado em relevo o dever de informar a verdade, da prova colhida dos autos constata-se que com ele faltaram os réus, praticando verdadeiro abuso do direito de informar, pois não é verdadeira a informação de que na concentração do Santos Futebol Clube os quartos dos atletas tenham câmeras de televisão por intermédio das quais são vigiados pelo técnico Vanderlei Luxemburgo.

Com efeito, além da negativa do próprio autor, afirmando categoricamente em seu depoimento pessoal que “não é verdade que o depoente monitora os jogadores enquanto se encontram em seus quartos” (fls. 135), as demais testemunhas ouvidas em juízo também desmentiram a notícia publicada pelos réus. O atleta Fábio Costa disse em seu depoimento que “não é verdade que no Hotel Recanto dos Alvinegros existam câmeras dentro dos quartos dos jogadores, que nunca existiu” e ainda que “não existe e nunca ouviu dizer que existe uma central de monitoramente no quarto do autor. Já entrou no quarto do autor e nele não existe um computador com controle das câmeras do hotel, é um quarto igual aos demais” (fls. 137/138).

Juan Carvalho Reol, assessor de imprensa do Santos Futebol Clube, declarou que “nunca existiram câmeras dentro dos quartos dos jogadores do SFC, no hotel do centro de treinamento do clube. Esta é a informação que não é verdadeira na matéria e que mais chocou”, “não existe computador no quarto do autor no Centro de Treinamento do SFC” e que “o autor não tem senha para acessar os computadores que controlam as câmeras de monitoramento e nunca ouviu falar da existência de tal senha” (fls. 139/140).

O coordenador do centro administrativo do Santos Futebol Clube, Evaldo Pinto Prudêncio, também confirmou que “não existe e nunca existiram câmeras de monitoramento instaladas dentro dos quartos dos jogadores” e que na matéria questionada na ação “o fato não verdadeiro é a existência das câmeras nos quartos dos jogadores”, acrescentando que “o apartamento que o autor ocupa é igual aos demais e nele não existe outra central de monitoramento ou computador” (fls. 142/143).

Até mesmo a jornalista Marília Ruiz Guedes, testemunha arrolada pelos réus, desmente a informação contida na matéria questionada, pois declarou que em dezembro de 2005 visitou as dependências do centro de treinamento do Santos Futebol Clube e “na ocasião não viu câmeras de monitoramento dentro dos quartos dos jogadores”, ressalvando que “não sabe se é verdadeiro ou não o fato publicado na matéria a respeito da existência de câmeras dentro dos quartos dos jogadores, reafirmando que quando esteve visitando o hotel não viu estas câmeras” (fls. 144/145).

A bem da verdade, do conjunto probatório trazido aos autos a conclusão a que se chega é que no centro administrativo do Santos Futebol Clube há sim uma central de monitoramente, mas instalada na recepção da concentração e com câmeras localizadas em áreas externas do hotel, na própria recepção, nos corredores e em outras áreas comuns, mas não nos quartos ocupados pelos jogadores, de sorte que efetivamente não é verdadeira a informação divulgada pelos réus.


Os réus, por seu turno, contra toda a prova dos autos, insistem na veracidade da informação, que teria sido obtida por intermédio de fonte não identificada, preferindo exercer o direito constitucional ao sigilo jornalístico. Isso, contudo, não transforma a informação falsa em verdadeira, nem coloca em dúvida a conclusão de que a informação divulgada não é verídica, além do que, como declarou a testemunha José Henrique Mariante, editor de esportes da Folha de S. Paulo, não houve prévio cuidado em checar a veracidade da informação, pois “o autor e o SFC não foram consultados antes da publicação da matéria, porque naquele momento entenderam que não haveria com a publicação da matéria qualquer informação que pudesse causar algum tipo de contestação ou problema” (fls. 147).

Cumpre ressaltar, por outro lado, não ser convincente a alegação dos réus de que a assessoria de imprensa do Santos Futebol Clube não permitiu a visita do repórter às dependências da concentração, impossibilitando a comprovação da suposta inexistência de câmeras nos quartos dos atletas, monitoradas pelo autor. O jornalista foi convidado a visitar as dependências do centro de treinamento do Santos Futebol Clube, conforme comprova o documento juntado pelos réus a fls. 77/78 e ao que tudo indica não houve qualquer interesse dos demandados em agendar a visita.

Disso tudo resulta muito claro que não só a informação publicada pelos réus não é verdadeira, como também que não houve por parte dos demandados o necessário cuidado de checar sua veracidade. Neste passo, dissertando sobre o dever de cautela do informador o já mencionado GILBERTO HADDAD JABUR observa que “Outro agregado da liberdade de expressão saudável, sensível contribuinte da informação verdadeira e isenta, é o cuidado e a prudência que os responsáveis pela coleta, triagem, edição e aprovação da matéria devem praticar. É compreensível que toda atividade cujo produto atinge extraordinário número de pessoas requer revigorada cautela. Esse dever deriva de um princípio superior que orienta o comércio jurídico e bom fluxo das relações sociais em todos os seus termos e vertentes, conhecido também como dever de boa-fé. A obrigação de afiançar a autenticidade da fonte e verdade do conteúdo é insubstituível em qualquer situação informativa. Não se exige diligência extraordinária, porque se sabe, de antemão, que isso comprometeria o labor jornalístico e a finalidade expedita da informação. Reclama-se diligência séria, algo diverso da mera coleta, da simples obtenção de informes relevantes, ou nem isso, do agrupamento de meros subsídios. A checagem de que se fala encontra seu termômetro e mensuração na natureza e alcance do assunto escolhido (…) O que não se pode admitir – e evitá-la não perpassa os lindes do expediente ordinário, sintomaticamente ao alcance de jornalista – é a verificação incompleta, lacunosa e não-definitiva” (ob. cit., p. 173-174).

Nem se diga, de outra banda, que a informação não verídica divulgada pelos réus na matéria seria de menor importância e que na reportagem em si mesma não teriam ultrapassado o mero exercício do animus narrandi. Ao contrário, a informação não verdadeira foi claramente utilizada como “gancho” para chamar a atenção, com nítido veio sensacionalista.

Os réus lançaram mão da falsa informação de que o réu monitorava os jogadores por intermédio de câmeras de vídeo instaladas em seus quartos para equipará-lo ao “Grande Irmão”, personagem central da famosa obra 1984 de George Orwell, protótipo do autoritarismo e do desrespeito ao direito à liberdade, à privacidade e à intimidade. O que era para ser uma simples narrativa dos métodos de trabalho do técnico Vanderlei Luxemburgo, acabou atraindo para o autor a pecha de profissional ditatorial e invasor da privacidade de seus comandados.

Tudo para garantir à Folha de S. Paulo, como disse a testemunha José Henrique Mariante, um furo jornalístico. E aqui, mais uma vez fazendo uso da lição de GILBERTO HADDAD JABUR, verifica-se que “A omissão, a distorção, a ênfase exagerada ou mal empregada, a ampliação dos fatos, a dramatização de outros e o enfoque definidor de outros mais, sem, para amenizar, franquear aos protagonistas a contraversão, contribui, em larguíssima medida, para a incorreção, que potencializa a desonra e a devassa da vida privada, quantas vezes em nome do “furo”, vez outra em atributo à intrepidez do responsável. Deveras, esse expediente não se funda em qualquer princípio elevado ou sublime que corresponda a um ideal social ou a um valor coletivo” (ob. cit., p. 175).

Destarte, configurado o abuso do direito de informar praticado pelos réus, resta verificar se o autor sofreu dano de natureza extrapatrimonial passível de reparação. A resposta a esta indagação é sem dúvida alguma positiva. Aqui cumpre mencionar, antes de qualquer outra coisa, que ao contrário do que sustenta o autor não há qualquer indício de dolo ou má-fé por parte dos réus.


Apesar da divulgação de informação não verdadeira e da equiparação do autor ao personagem “Grande Irmão”, não se vislumbra por parte dos réus intenção premeditada de ofender a honra e a reputação do autor, ou mesmo de atribuir-lhe a prática de crimes diversos. Isso não significa, entretanto, que não foi causado dano moral ao autor. Em que pese certa dose de exagero do demandante no tocante às conseqüências da informação falsa noticiada, até porque, como ele mesmo afirmou, a matéria não abalou o prestígio de que goza no meio esportivo e futebolístico, o certo é que é restou configurada ofensa à sua honra subjetiva, direito inato, natural e universal da pessoa humana, caracterizado pela auto-estima, pelo amor-próprio, enfim, pelo sentimento da própria dignidade e da consciência do próprio valor moral e social.

Tal ofensa deve ser devidamente ressarcida, ex vi do que dispõem os arts. 5º, V e X da CF/88, 186, 187 e 927 do Código Civil e 49 e sgs. da Lei de Imprensa, lembrando-se que, no dizer do MINISTRO CEZAR PELUSO, “o valor da indenização há de ser eficaz, vale dizer, deve, perante as circunstâncias históricas, entre as quais avulta a capacidade econômica de cada responsável, guardar uma força desencorajadora de nova violação ou violações, sendo como tal perceptível ao ofensor, e, ao mesmo tempo, de significar, para a vítima, segundo sua sensibilidade e condição sociopolítica, uma forma heterogênea de satisfação psicológica da lesão sofrida” (STF, RE 447.584-7-RJ, 2ª Turma, j. 28.11.2006).

Cuida-se de considerar, a um só tempo, o caráter punitivo e compensatório da reparação do dano moral, pois, como obtempera o DES. WALTER MORAES, “A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida; de modo que tampouco signifique enriquecimento despropositado da vítima; mas está também em produzir no agressor, impacto bastante para persuadi-lo a não perpetrar novo atentado. Trata-se então, de uma estimação prudencial, que não dispensa sensibilidade para as coisas da dor e da alegria ou para os estados d’alma humana, e que, destarte, deve ser feita pelo mesmo Juiz, ou, quando não, por outro jurista – inútil por em ação a calculadora do técnico em contas ou em economia. É nesta direção que o citado Brebbia, em sua excelente monografia, aponta elementos a serem levados em conta na fixação da paga: a gravidade objetiva do dano, a personalidade da vítima (situação familiar, social e reputação), gravidade da falta e da culpa, que repercutem na gravidade da lesão e a personalidade (condições) do autor do ilícito” (“Essa Inexplicável Indenização por Dano Moral”, Repertório IOB de Jurisprudência, nº 23/89, p. 417).

Assim sendo, considerando os elementos norteadores do arbitramento da indenização do dano moral e as circunstâncias do caso concreto, com destaque para a inexistência de dolo ou má-fé por parte dos réus, bem como para a ausência de abalo na imagem e reputação (honra objetiva) do autor, condeno os réus ao pagamento de indenização que arbitro no valor de R$ 38.000,00 (Trinta e oito mil reais), equivalente a 100 (cem) salários mínimos, a ser atualizada monetariamente a partir desta data e acrescida de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a contar data da publicação da matéria jornalística (17/09/2006), por se tratar de obrigação decorrente de ato ilícito (Súmula nº 54 do STJ)

III – Do exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação movida por Vanderlei Luxemburgo da Silva contra Empresa Folha da Manhã S/A e Rodrigo Dantas Mendez de Mattos e condeno os réus solidariamente a pagar ao autor indenização por danos morais que arbitro em R$ 38.000,00 (Trinta e oito mil reais), quantia que deverá ser atualizada monetariamente a contar desta data e acrescida de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, calculados a partir de 17/09/2006.

Condeno ainda os réus ao pagamento das custas e despesas processuais, atualizadas desde os desembolsos, bem como honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da condenação.

P. R. I.

São Paulo, 19 de Novembro de 2007.

ALEXANDRE AUGUSTO P. M. MARCONDES

Juiz de Direito

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