Critério discriminatório

Juiz catarinense diz que cotas para negros são inconstitucionais

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3 de dezembro de 2007, 16h32

Por entender que estabelecer cotas para negros nos vestibulares viola o princípio constitucional da igualdade, o juiz Carlos Alberto da Costa Dias, da 2ª Vara Federal de Florianópolis, concedeu a um estudante o direito de concorrer a todas as vagas em disputa no próximo vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A decisão vale apenas para o autor da ação. A UFSC pode recorrer.

Na sentença, o juiz entende que é possível eleger um grupo de pessoas a fim de diminuir desigualdades sociais, como é o caso do percentual de vagas aos portadores de deficiência em concursos públicos. Mas “o fator de discrímen, para não ser arbitrário, inconstitucional, deve ser pertinente, guardar relação de causa e efeito, ser determinante, explicar o motivo por que se considera aquele grupo ou categoria inferior”, afirmou.

O estudante entrou com pedido de Mandado de Segurança contra a universidade, alegando que a reserva de vagas estabelecida por normas da universidade seria ilegal e abusiva. De acordo com resolução do Conselho Universitário de 10 de julho, para execução da “ação afirmativa de acesso aos cursos de graduação”, 30% das vagas do próximo vestibular estão reservadas: 20% são para candidatos que tenham cursado o ensino fundamental e médio integralmente em escolas públicas e 10% para candidatos que se declarem negros.

No entendimento do juiz, o maior obstáculo ao acesso do negro ao ensino superior não seria a condição de negro, “mas o fato de o ensino público anterior ao vestibular ser de má-qualidade e a sua condição social, eventualmente, não possibilitar dedicação maior aos estudos, ou outros fatores que devem ser melhores estudados e debatidos”.

O juiz também disse que o modelo norte-americano de ação afirmativa não pode ser aplicado à realidade brasileira. “Diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos da América, a miscigenação entre os denominados brancos e negros torna a identificação por fenótipo absolutamente inconsistente”.

Além disso, para o juiz, “o processo seletivo americano não é baseado constitucionalmente no princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, havendo seleção de candidatos com aptidão para determinados esportes, por exemplo. “Se há dívida social — como de fato há – não é exclusivamente com o negro, mas com toda a universalidade dos que estejam socialmente em desvantagem”, concluiu.

Concurso sem reserva

Em setembro passado, o Tribunal de Justiça catarinense decidiu que a política de cotas raciais em concurso público é uma forma de discriminação. Por unanimidade, os desembargadores declararam inconstitucional a Lei Complementar 32/04 de Criciúma (SC), que prevê a reserva de vagas para afro-descendentes.

Os desembargadores mantiveram decisão de primeira instância que garantiu o cargo a uma candidata que passou no concurso público para auxiliar administrativo na prefeitura da cidade, mas foi preterida por candidato que ingressou pelo sistema de cotas. Ela se classificou em 14ª posição e a frente dos candidatos com menor resultado, mas que foram classificados por serem negros.

Para garantir sua vaga no concurso, a candidata recorreu à Justiça contra o prefeito do município. Alegou que teria direito à vaga independentemente da reserva aos negros estabelecida pela lei e pelo edital do concurso.

A primeira instância reconheceu o direito da candidata à vaga. O município de Criciúma recorreu da decisão ao tribunal catarinense. Afirmou que o prazo para questionar quaisquer ilegalidades no concurso, que era de 120 dias, havia encerrado. Por esse motivo, pediu a reforma da decisão.

O Pleno do Tribunal negou o recurso e decretou inconstitucional a lei municipal que prevê a reserva de vagas para negros. De acordo com o relator, desembargador Luiz Cezar Medeiros, “não há distinção entre a condição de afro-brasileiro e a candidata branca”.

De acordo com o relator, a Constituição Estadual de Santa Catarina em momento algum previu a reserva de vagas para os descendentes de afro-brasileiros e a Constituição Federal repudia atos de racismo. “O caso não está negando o acesso dos negros ao concurso, mas sim facilitando, na medida em que reserva vagas para descendentes afro-brasileiros, é inegável se tratar de discriminação, e distinção entre brancos e negros.”

Processo: 2007.72.00.011867-0

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