Imposto pelo ralo

Governo investe menos de 1% do que arrecada, diz especialista

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1 de dezembro de 2007, 9h18

O governo federal investe menos de 1% do que arrecada. O restante escoa por dois grandes ralos. “O maior vilão é o funcionalismo e depois a previdência pública”, diz Paulo Arvate, membro do Centro de Estudos de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas. Por isso, na avaliação de Arvate, o benefício da alta carga tributária, para a sociedade em geral, é zero, porque não se vê investimento e sim gastos.

Segundo o advogado e consultor da ONU (UNCTAD) em Tributação Internacional, Antônio Carlos Rodrigues do Amaral, o governo prevê a criação de mais 10 mil novos cargos federais, em 2008. O que, segundo Arvate, caracteriza como “eu gasto e você paga a conta.”

“O projeto de Orçamento para 2008 prevê um aumento de 44% no custo da máquina administrativa, o que não é investimento, e um aumento de apenas 14% no investimento em estrutura”, afirma Antônio Carlos.

O advogado e o professor participaram do evento “Brasil em Debate”, durante o XVI Simpósio IOB do Direito Tributário, em São Paulo, na sexta-feira (30/11).

Para Arvate, a carga tributária está associada ao que a pessoa recebe em troca. O único ponto positivo que o professor vê neste sentido é a aplicação dos recursos na área social. “Os R$ 8 bilhões aplicados no programa Bolsa Família, por exemplo, vêm tirando milhões de pessoas da linha da pobreza e melhorando a distribuição de renda. Mesmo assim, é pouco perto do que ele [governo] arrecada.”

De janeiro a novembro deste ano, a União arrecadou mais de R$ 565 bilhões em tributos federais, segundo dados da Associação Comercial de São Paulo. O valor é quase o total da arrecadação de 2006 (R$ 570 bilhões).

Mesmo com uma arrecadação recorde, o governo não sinaliza qualquer interesse em desonerar o contribuinte, afirma Antônio Carlos. “Este seria o melhor momento para se acabar com a CPMF, por exemplo. O governo, porém, aceita falar sobre tudo, menos em reduzir a arrecadação.”

Somando os tributos federais, estaduais e municipais, ainda de acordo com a Associação Comercial de São Paulo, até sexta-feira (30/11), a quantia chegava a mais de R$ 816 bilhões, em 2007.

O governo federal espera encerrar o ano com um aumento de 4,7% na economia, o que não significa um enriquecimento da população. Segundo vários participantes do Simpósio, enquanto o cofre do governo se abastece, o contribuinte fica cada vez mais pobre, graças a uma carga tributária cada vez maior.

O incremento da economia, segundo os tributaristas, está no aumento da arrecadação tributária, do Imposto de Renda e da Previdência. A transferência do trabalhador do mercado informal para o formal melhorou a arrecadação da Previdência. Já o IR bate às alturas graças à maior fiscalização por parte dos governos.

Em São Paulo, por exemplo, o governador José Serra adotou, recentemente, a Nota Fiscal Eletrônica, um mecanismo de controle que beneficiaria também o contribuinte. Ao pedir a NF eletrônica, o consumidor soma pontos junto à Receita estadual e estes pontos podem ser descontados no pagamento do IPTU.

Para o professor Paulo Arvate, a NF eletrônica pode gerar um outro problema, já que o lojista poderá usá-la como argumento de venda. “Com a nota fiscal o valor é um e sem a nota o valor seria menor, ou seja, pode acabar levando à sonegação.”

A tão falada reforma tributária não deve sair tão cedo. Segundo o advogado Antônio Carlos, “o governo não tem interesse na reforma porque está nadando em dinheiro. Não tem interesse, também, em entrar em conflito com os municípios nem com os estados até o final do mandato”.

Por outro lado, o advogado comemora o fato de esta reforma, do mesmo como está, não ser colocada em votação. A ineficiência da proposta parece ser unânime entre os especialistas. “Mexe-se em apenas três ou quatro impostos secundários.”, afirma o presidente da IOB, Gilberto Fischel. “O objetivo é reduzir o número de impostos e não o valor dos tributos”, completa Paulo Arvate.

Em resumo, a proposta do governo se baseia em substituir os tributos sobre bens e serviços (ICMS, IPI, Cofins, Cide-combustíveis) por dois impostos sobre o valor adicionado: um estadual (IVA-E) e um federal (UVA-F).

Sendo as leis tributárias as que mais sofrem alterações no país, o advogado Antônio Carlos sugere, ironicamente, uma “moratória tributária” por dois anos, ou seja, que não se mexa nelas por este período. “Sempre que aprece uma lei, ela é pior do que a que estava antes.”

Impostos, taxas e contribuições. São tantas as obrigações fiscais, que uma empresa gasta, em média, cerca de 2.600 horas por mês para efetuar estes pagamentos. O levantamento é da consultoria PricewaterhouseCoopers, com base em dados reunidos pelo Banco Mundial, e coloca o Brasil no último lugar deste quesito, entre os 178 países pesquisados.

A carga tributária do país representa quase 38% do Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, para cada R$ 100 que se produz, cerca de R$ 38 vão para pagar impostos, taxas e contribuições. Burocracia, falta de transparência na aplicação dos recuros, carga tributária sufocante e sem perspectiva de redução. Para equacionar tudo isso, o professor Paulo Arvate diz que o fundamental seria investir na gestão pública, evitando os desperdícios, e na educação.

“A ineficiência e a corrupção andam de braços dados. Não se sabe se o Estado é ineficiente para facilitar a corrupção ou se não sabe fazer mesmo. Assim, está se matando o país no presente e no futuro.”

Arvate aposta na educação como controle futuro da aplicação dos recursos. Segundo ele, “países que investiram efetivamente na educação tiveram uma geração de eleitores mais qualificados e, como conseqüência, uma oposição mais eficiente, pois os políticos reagem à medida que são cobrados e você só consegue cobrar alguma coisa quando tem informação, conhecimento.”

Apesar de tudo, o professor diz ser otimista. “O processo é a longo prazo, mas creio em uma sociedade e em um governo melhores daqui a 25 anos.”

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