Honra no bate-bola

TJ paulista livra Trajano de indenizar Milton Neves

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30 de agosto de 2007, 19h56

O apresentador Milton Neves, hoje da TV Record, perdeu um round na queda de braço que trava com o jornalista José Trajano, diretor da ESPN Brasil. A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo completou, nesta quinta-feira (30/8), o julgamento do recurso de Trajano e deu sentença favorável a ele.

Em dezembro do ano passado, o juiz Vitor Frederico Kümpel, da 27ª Vara Cível da Capital de São Paulo, havia condenado Trajano a pagar R$ 100 mil de indenização por danos morais para Milton Neves. Nesta quinta-feira (30/8), a turma julgadora, por votação unânime, inverteu o placar e decidiu que a ação é improcedente. Trajano é defendido pelo advogado Walter Vieira Ceneviva.

Milton Neves acusa Trajano de ofender e macular sua honra e de ter extrapolado sua função de informar ao fazer comentários “infames” contra ele. De acordo com ação, Trajano teria usado expressões contra Milton Neves num tom injurioso e difamatório. A defesa do atual apresentador da Record lembrou que o réu foi condenado pelos crimes de injúria e difamação no mesmo caso.

A briga entre os dois jornalistas começou em junho de 2001, quando Milton Neves estava no estúdio da rádio Jovem Pan de São Paulo. Ele apresentava o programa Plantão de Domingo. Na época, recebeu em seu celular uma ligação telefônica do presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira.

No telefonema, Ricardo Teixeira informou que estava fazendo uma votação informal entre especialistas para saber quem deveria substituir Leão como técnico da seleção brasileira para a Copa do Mundo de 2002. Escolheu sete pessoas supostamente conhecedoras de futebol e ligou para saber o nome que escolheriam, se estivessem em seu lugar.

Depois de seis consultas, o placar estava empatado: três votos para Luiz Felipe Scolari e três para Vanderlei Luxemburgo. O voto de minerva coube a Milton Neves, que escolheu Scolari. Ricardo Teixeira foi fiel ao resultado e convocou o vencedor.

Aí começou a confusão. Em abril de 2002, já com Felipão à frente da seleção e quando a imprensa esportiva discutia a convocação ou não do jogador Romário, Milton Neves revelou, em seu programa de rádio na Joven Pan, a história da eleição e o voto de desempate. Trajano ficou indignado e criticou a forma de escolha em seu programa na TV: “Na hora que um Milton Neves vira o voto de minerva para ser o cara que vai decidir quem será o técnico da seleção brasileira, nós estamos perdidos, minha gente”, alfinetou.

E disse mais: “Ele passa a ter, pelo meu conceito, o rabo preso com esse presidente da CBF, economicamente, porque eu não sei se levou alguma vantagem com esse negócio da Ambev, um dos patrocinadores da CBF, escamoteando uma informação”. À época, Milton Neves fazia publicidade da cervejaria Schincariol, concorrente da Ambev, patrocinadora da CBF.

O juiz Vitor Frederico Kümpel, 27ª Vara Cível da Capital de São Paulo, entendeu que Trajano fez uma acusação perigosa de irregularidade econômica e passou ao ouvinte do programa a sensação de desonestidade. Segundo ele, o jornalista extrapolou a sua função de informar e causou dano à honra de Milton Neves.

O recurso

O relator do recurso no Tribunal de Justiça, desembargador Maia da Cunha, entendeu de forma diferente do juiz de primeira instância. Para ele, Trajano disse palavras duras, mas usou seu direito de crítica contra o jornalista da Jovem Pan. Na opinião de Maia da Cunha, a expressão “de rabo preso”, usada por Trajano, não foi nenhum ataque pessoal ou teve a intenção de ofender Milton Neves.

De acordo com o relator, Milton Neves não deveria esconder da sociedade brasileira um fato tão importante como a escolha do técnico da seleção brasileira. Ao fazê-lo, segundo Maia da Cunha, feriu o Código de Ética da profissão que determina que o jornalista deve divulgar o fato que é de interesse público e complementa que o profissional não pode se valer do momento para divulgar o caso por interesse unicamente pessoal.

O revisor, desembargador Teixeira Leite, acompanhou o argumento de Maia da Cunha. Teixeira Leite reconheceu que Trajano foi deselegante nas afirmações feitas contra o colega de profissão, mas não ultrapassou o direito de crítica e que, portanto, não estaria sujeito ao pagamento de indenização por dano moral. O mesmo entendimento teve o terceiro julgador, Francisco Loureiro.

A defesa de Milton Neves sustentou que seu cliente sempre se pautou pelo culto da verdade e agindo com absoluta isenção em seus comentários e opiniões sobre fatos e personagens do futebol. O advogado de José Trajano,Walter Vieira Ceneviva, argumentou que o jornalista usou expressões contra seu colega de profissão num contexto de crítica jornalística. Alegou que o cerne da manifestação de Trajano diz respeito à isenção e imparcialidade do jornalista e de que a atividade comercial é incompatível com a profissão.


A ESPN foi defendida pelo advogado José Rubens Machado de Campos.

Leia a apelação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VIGÉSIMA-SÉTIMA VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DE SÃO PAULO.

ESPN DO BRASIL LTDA., por seu advogado, na “Ação Ordinária de Indenização” contra si e outro movida por MILTON NEVES (proc. nº 02.137082-6), intimado das rr. decisões de fls. 1.813 a 1.823 e 1.837 e com elas não se conformando, vem, tempestivamente e como previsto nos arts. 513 e segtes., do Código de Processo Civil, ofertar APELAÇÃO ao Eg. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, fazendo-o pelos fundamentos e para os fins declinados nas inclusas alegações.

Termos em que, a esta se anexando os comprovantes de recolhimento do preparo e do porte de remessa e retorno exigidos, da juntada e regular processamento,

P. Deferimento.

São Paulo, 14 de fevereiro de 2007

JOSÉ RUBENS MACHADO DE CAMPOS

OAB/SP nº 27.646

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO!

COLENDA CÂMARA!

I

SUMA DA ESPÉCIE

1. A Apelante é co-ré em ação ressarcitória por alegados danos morais, desencadeada pelo Apelado em razão de críticas televisivas exaradas, no programa “LINHA DE PASSE – MESA REDONDA”, pelo co-réu jornalista JOSÉ TRAJANO, em sua edição de 08.04.2002, acerca da já vetusta nomeação de LUIZ FELIPE SCOLARI como técnico da Seleção Brasileira de Futebol na COPA DO MUNDO DE 2002.

2. Assentada na paixão nacional e revestida de manifesto interesse público oriundo de “um dos aspectos de maior vitalidade do patrimônio cultural brasileiro …”(1), o Apelado, com a demanda, quis receber R$ 100.000,00 mais as cominações de praxe, dizendo-se “injuriado” e “difamado”.

3. Nacionalmente conhecido sob o brilho dos holofotes que tanto o atraem, o jornalista Apelado, MILTON NEVES, pretextando o cultivo da veracidade jornalística e a isenção profissional em seus comentários e opiniões sobre os fatos e personagens do universo futebolístico, invocou gravame moral decorrente das críticas recebidas no dia imediato à revelação que fez, com um ano de atraso, sobre ter sido consultado, por telefone, pelo Presidente da CBF, acerca do melhor nome para ocupar aquele apaixonante e sempre contestado cargo.

4. Antecipando considerações, note-se que, em temática sobre-modo relevante para a maioria do público brasileiro ao menos, quando o clamor popular questionava a convocação do então preterido campeão mundial ROMÁ-RIO, o Apelado lembrou-se de que, ano antes recebera o tal telefonema de RICARDO TEIXEIRA.

5. Fato esse que, escondido da coletividade e contrariando as mais elementares regras do bom jornalismo, somente foi revelado, em proveito próprio e como se de furo se cuidasse, no auge do conhecido imbroglio convocatório que a torcida brasileira bem lembra, por isso – e apenas por isso – ensejando as legítimas críticas subseqüentes, todas elas corroboradas no abrangente acervo probante produzido.

6. Sumulando, malgrado sobejamente conhecidas as sucessivas incursões do Apelado no congestionado JUDICIÁRIO, fato é que, na espécie demonstrando a sua nenhuma razão, as litisconsortes passivas, contestando, sustentaram a licitude de conduta informativa, fincada no Código Civil (art. 188), no ESTATUTO DA COMUNICAÇÃO e em suas excludentes (art. 27 e incisos) e na CONSTITUIÇÃO FEDERAL, por certo garantidora da liberdade de pensa-mento e de expressão, livre de censura, sempre respeitados os direitos de informar e de ser isentamente informado (arts. 5º, incs. IV, IX, XIV, LIV e LV c.c. 220, caput e §§).(2)

7. Se nenhum o ânimo detrator, guardados os limites da autêntica crítica, a ora Apelante resgata que invocou, em seu prol e porque nelas subsumida, a melhor doutrina(3) e a iterativa jurisprudência dos Tribunais Nacionais(4), do Apelado reclamando a inocorrida comprovação do dano alegado.

Tanto quanto denunciou, como lhe competia, em defesa do direito de informação e da veracidade, o caráter emulatório da ação, afastada que está do princípio da eticidade e da exigida boa-fé informativa, subtraindo-se ao coração da brasilidade futebolística, pelo decurso de cerca de ano, informação de incontroversa relevância, tal qual manifesta e vedada censura

II

A R. SENTENÇA APELADA

8. Não fora o ineditismo da mágoa alegada pelo Apelado – homem público confrontado por colega igualmente conhecido da torcida, ambos ex abundantia habituados às afogueadas, rotineiras e inofensivas reverberações da crônica desportiva, ínsitas a qualquer aficcionado – é fato que o Magistrado, contrariando seus precedentes acertos judicantes, desta feita moveu-se por vedada impressão pessoal, dissociada do conjunto probatório e da realidade dos autos, desnudando, ele próprio, nas sucessivas audiências que resolveu convocar, haver sido obnubilado, enquanto sãopaulino roxo, pelo envolvente thema decidendum.


9. Julgando a demanda procedente como proposta, ditou condenação solidária indexada ” … desde o ajuizamento da ação, e juros legais de 1% (hum por cento) ao mês a partir da citação até o efetivo desembolso … .”, sem prejuízo de honorária em seu percentual máximo do valor da condenação, mais as custas e despesas processuais (cf. r. sentença, fls. 1.823).

Em nova antecipação meritória, a Apelante permite-se ressaltar, desde logo, a curiosa e condicionante motivação embasadora do elevado montante ressarcitório prestigiado pelo operoso juiz, verbis:

” … Na quantificação do dano, cabe verificar o tremendo grau de repercussão já que a ESPN Brasil tem uma excepcional audiência,conforme documentalmente demonstrado, além da notoriedade e credibilidade dos jornalistas Milton Neves quanto de José Trajano, de forma que é razoável o montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais), principalmente se o jornalista Milton Neves cumprir sua palavra e beneficiar integralmente uma instituição de caridade (fls. 1.161, antepenúltima linha). A responsabilidade solidária da ESPN é inquestionável, na medida em que José Trajano não somente é seu funcionário como ocupa cargo de confiança …” (cf. r. sentença, fls. 1.822/1.823, grifos nossos).

10. Muito embora o r. decisório silencie no tocante ao possível descumprimento, pelo Apelado, da hipotética e benemérita intenção que a inicial não contempla, é certo que os arrimos sentenciais evidenciam error in iudicando autorizador do conhecimento e provimento deste apelo, aqui postulados.

ESTEIOS SENTENCIAIS

11. Confiram-se. O alentado relatório evidencia que o Apelado, de fato, se falou com RICARDO TEIXEIRA em meados de 2001, somente em 07.04.2002 – quando eclodiu o “tema polêmico da convocação do jogador de futebol Romário …” – decidiu tornar público que há muito opinara sobre a escolha do técnico da Seleção (cf. fls. 1.813/1.814), materializando-se, portanto, dois momentos distintos com implicações manifestas no desate jurisdicional acerca do que vem a ser, como de rigor, o legítimo DIREITO DE INFORMAÇÃO em temática de inafastável interesse público.

12. Resumindo as defesas colacionadas – y compris as prefaciais levantadas – é certo que S. Exa. guardou fidelidade aos fundamentos nelas lançados, o que lhe permitiu bem perceber, por isso, os corretos lindes da disputa, ainda referindo a extensa dilação probatória perseguida e as múltiplas audiências realizadas (cf. fls. 1.814 a 1.817).

13. Para assim decidir, em visão desafiadora de manifesta reforma, a r. sentença prestigia os seguintes fundamentos:

13.1. – a controvérsia se resumiria à constatação da existência, ou não, de abuso informativo a partir da crítica feita, pelo co-réu e sob o prisma jornalístico, ao Apelado, acerca do “segredo” tardiamente revelado ao povo brasi-leiro, logrando-se conclusão afirmativa, com indicação dos artigos que sustentariam tal inteligência (cf. fls. 1.818);

13.2. – o juiz criminal teria inclusive assim decidido, em excelente decisão que faria coisa julgada no cível, malgrado inaproveitada ” … porque se deixou prescrever o fato típico e antijurídico, reconhecendo-se de ofício a prescrição da pretensão punitiva do Estado, conforme bem noticiado a fls. 1.799 a 1.803.”, qualificando-se assim, portanto, a eleição de arrimo decisório que, para todos os fins e efeitos de Direito, nenhuma repercussão pode ter (cf. fls. 1.818/ 1.819, grifamos);

13.3. – haveria animus injuriandi que seria decorrente (no entanto sem qualquer indicação de sua pertinência) ” … da narrativa do requerido José Trajano, tendo a referida narrativa como pano de fundo a nomeação do técnico Luis Felipe Scolari para dirigir a seleção brasileira de futebol durante a Copa do Mundo de 2002, tendo ainda como episódio menor a não convocação do jogador Romário para participar da referida Copa do Mundo.” (cf. fls. 1.819, n.g.);

Ora, como incontroverso, se foi justamente essa notícia segregada por quase um ano a causa das críticas por isso lançadas contra o Apelado, estaria contida, nela própria, o animus ofensivo visto pelo Juízo ???

13.4. – pouco importaria, para o Magistrado, ” … se o jornalista Milton Neves escondeu ou não durante um tempo o fato de ter sido consultado.”, mesmo porque, como se possível fosse a alteração do libelo inaugural ” … Desde o depoimento pessoal, afirma Milton Neves ter divulgado a informação de ter dado o voto de minerva na escolha do técnico da Seleção Brasileira, logo após ter feito a escolha junto ao Presidente da entidade …”, reconhecimento esse que, data maxima venia, constitui notável e vedada inversão, pelo Juiz, da postulação trazida a Juízo, substituíndo-a no momento de decisão com a seguinte complementação primorosa: ” … Na referida degravação o próprio Milton Neves chega a dar a impressão que não divulgara tal informação quando diz: ‘Vou falar uma coisa para o senhor agora, uma coisa que eu nunca tinha dito com todas as letras.’ … (cf. fls. 1.819/1.820, g.o.);


13.5. – seria “extremamente depreciativa e desnecessária no contexto, já que não há nada de errado com a crítica em si mesma” a alusão, de JOSÉ TRAJANO, de que ” ‘Na hora que um Milton Neves vira o voto de minerva para ser o cara que vai decidir quem será o técnico da seleção brasileira, nos estamos perdidos minha gente‘” (g.o., fls. 1.820), muito embora, COLENDA CÂ-MARA, tal frase jamais haja sido por aquele pronunciada(5), é preciso ressaltar, desde já;

13.6. – teria sido passada a impressão, em desfavor do Apelado, do cometimento de irregularidade econômica e conseqüente desonestidade, a partir da alusão de que ele ” ‘… passa a ter, pelo meu conceito, o rabo preso com esse presidente da CBF, economicamente, por que eu não sei se levou alguma vantagem com esse negócio da Ambev, papapa, um dos patrocinadores da CBF, escamoteando uma informação.’ ” (g.o), traduzindo acusação incomprovada (cf. fls. 1.820);

13.7. – inexistiria animus criticandi, apesar do reconhecimento pelo Magistrado de que o linguajar esportivo, relevando qualquer epíteto aviltante, é pleno de significados dissociados dos tipos penais com os quais possam, aparentemente, guardar similitude (cf. fls. 1.820), e, finalmente,

13.8. – estaria comprovado o dano moral sustentado, a repercutir nos familiares do Apelado, mercê do contido em um testemunho colhido, sendo inaplicáveis, ao caso, as excludentes fincadas no ESTATUTO DA COMUNICAÇÃO (cf. art.27, fls. 1.821/1.822).

Apesar de variados, fato é que, porque revestidos de conceitos genéricos e, alguns deles, qualificados por omissão e contradição manifestas, tais fundamentos necessitam de imediata reforma, como adiante demonstrar-se-á.

III

DECLARATÓRIOS MANEJADOS

14. Visando à integração do v. julgado, sanados os vícios percebidos e diante da generalidade ali externada, repita-se, a Apelante intercalou tempestivos aclaratórios (cf. fls. 1.825 a 1.831), denunciando a uma a constatada colidência entre o pleito manifestado na inicial e aquele preferido, pelo Juiz, ao decidir, como se lhe fosse lícito alterar a causa de pedir (cf. Embargos, itens 2 a 5).

A duas, buscando eliminar o malabarismo judicial empreendido na r. decisão, a Apelante mostrou que a censura empreendida pelo Apelado, omitindo da população brasileira a sua intervenção no processo de escolha de FELIPÃO, não traduziu hipótese e sim configurou, queira-o ou não o equivocado Juiz, fato concreto passível de crítica legítima, somente desvelado quase um ano decorrido, no meio do retumbante affaire ROMÁRIO, com o IBOPE alcançando convenientíssimos índices estratosféricos … !!! (cf. Embargos, itens 6 e 7).

Buscou-se, aqui, conhecer as razões motivadoras desse específico juízo contido na r. decisão que, no pertinente, é silente.

15. Ademais, afora a transformação do libelo inaugural pela versão preferida, pelo Juiz, a partir do “depoimento pessoal” do Apelado, impressionou – e muito – o fato de haver S. Exa., demonstrando desconhecer a realidade dos autos, considerado ofensivo aquilo que JOSÉ TRAJANO jamais disse (um Milton Neves), para daí extrair motivação condenatória que, à toda evidência, não se sustenta.

Essa constituiu a terceira contradição manifestada nos anotados declaratórios. É que, com parcialidade flagrante, S. Exa. simplesmente se esqueceu que, em audiência, depois de degravada certa fita, aceitou-se, como versão definitiva, que aquele jornalista dissera “o Milton Neves“, nenhuma intenção depreciativa manifestando então, portanto (cf. Embargos, itens 9 e 10, fls. 1.828/1.829, grifamos).

16. Fica claríssimo, até aqui, que a r. sentença lastreia-se em evidências que os autos não exibem. Há mais. Como também denunciado nos embargos, enquanto quarto fundamento, é indubitável que o Magistrado não externou, direta ou indiretamente, como chegou à conclusão de que JOSÉ TRAJANO extrapolara seus comentários, praticara dano ressarcível e injuriara o Apelado.

Por que assim considerou S. Exa.? Não se sabe.

17. Idem cabe dito, insistindo, no atinente à afirmada e incomprovada repercussão do fato, supostamente gravosa, só porque a ora Apelante seria economicamente poderosa. Ora, não existe, no processo, prova concreta da assinalada riqueza e não tratou o Apelado, por qualquer meio ou modo, isso evidenciar para fins sancionatórios.


Por derradeiro, o que acontecerá se o Apelado, mantida a condenação ditada, não destiná-la à benemerência ??? Seu montante se altera, aumenta, diminui ou fica suprimido ???

18. Desnecessário manifestar que, improvidos os declaratórios com o habitual recurso à inexistente infringência, a r. decisão a respeito prolatada é igualmente alcançada neste apelo, na medida em que, com ela, ficam revigorados os desacertos sentenciais por ora prevalentes.

IV

RAZÕES DE RECURSO

19. Seguindo a ordem da análise adotada pelo Magistrado, aduz a Apelante que o thema decidendum cá agitado, inversamente ao por ele divisado, é muito mais abrangente do que o eventual desbordamento, por qualquer dos inter-locutores, do direito de informar.

Com efeito, reportando-se, por economia, ao exarado na contestação apresentada (cf. fls. 230 a 245), a Apelante recorda que, por razões óbvias, o assunto motivador de toda a pendenga é de incontroverso interesse público.

20. Intimamente ligado ao direito primeiro de todo cidadão de ser correta, tempestiva e verdadeiramente informado (CF, arts. 220, §§ 1º e 2º c.c. 5º, incs. IV e IX), o bom e o isento jornalismo preza, mais do que tudo, a acuidade da notícia e a sua imediata veiculação, em assunto de tamanha relevância para a comunidade esportiva brasileira, predicados esses que o Apelado, por razões ignoradas, preferiu ignorar.

Ou seja, censurando a bombástica informação que a torcida adoraria conhecer(6), desprezou o assinalado direito de ser informado, ao mesmo tempo em que, maculando o próprio direito de informar, certamente preferiu guardar o valioso segredo para divulgação em momento mais oportuno aos seus interesses, ainda que perdido o furo jornalístico(7). Recorde-se que o tema veio à baila de modo acessório, no meio da tormenta ROMÁRIO … .

21. Ainda infringiu, o Apelado, os preceitos deontológicos da pro-fissão(8), de igual modo afrontando o ressabido ” direito-dever de bem informar ao leitor“, de que cuidou o ilustre Desembargador ÁLVARO LAZZARINI em v. ares-to de sua lavra (g.n.)(9).

Portanto, guardadas tais relevantes premissas e inversamente ao percebido pela r. sentença, a crítica lançada contra o Apelado, fincada nas excludentes legais (L. de Imp., art. 27) teve, como antecedente, também legitimando-a, o confessado desprezo, por aquele, ao direito da coletividade, em questão de interesse público, em ser tempestivamente informada.

22. Tal constatação, outrossim, permite que se conclua pelo caráter aventureiro da demanda. Afinal, proclama a doutrina especializada, ” … os litigantes têm o dever de não deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso (e assim por diante). …” (n.g.)(10), aduzindo a melhor jurisprudência que “A ocultação de fato que seria relevante para a solução da questão, inclusive a simples alteração, pode caracterizar a infração do dever de veraci-dade” (1º Grupo de Câmaras Civis do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE S. PAULO, na RT 177/651, n.g.).

Equivocada, portanto, a vestibular ao consignar que o Apelado obedeceu o ” … sagrado dever de cultuar a verdade …”, bem ainda que, profissionalmente, sempre atuou “… com absoluta isenção no que respeita a seus comentários e suas opiniões sobre os fatos e sobre os personagens do mundo futebolístico …” (cf. fls. 04, n.g.).

23. A seu turno, resgate-se que RUI STOCO registra que “… um ato escorado no direito positivo que, portanto, se mostra lícito na sua morfologia ou aspecto formal, mas, na sua gênese ou formação, desborda para o excesso abusivo, vicia-se e contamina-se. Nesse momento ingressa no campo das nulidades, de modo que … ofende o ordenamento jurídico como um todo. … No plano do Direito Processual Civil, como se verá, o ato abusivo assume outras feições, ou seja, expressa e retrata a má-fé processual, o dolo e a fraude processual e o abuso de estar em juízo ou de utilizar os remédios jurídicos postos à disposição das partes. …”.(11)

Portanto, como lançada, a r. sentença apelada apoucou, sem lastro, o espectro decisório, deixando de considerar a especifidade acima aludida. Pormenor esse sobremodo relevante que valida, venia permissa, a crítica desferida pelo jornalista JOSÉ TRAJANO.

24. Na espécie, outrossim, impressiona haja o d. Magistrado ignorado que

“De todas as críticas que a lei acoberta com o manto da impunidade, a mais desabrida, por ser a mais apaixonante e cujo juízo de valor se afere mais pelo entusiasmo ou aficionismo do que pelo conhecimento técnico, é a desportiva. Todo mundo entende de esportes, todo mundo se arvora em crítico de seu esporte predileto, (…) As opiniões mais estapafúrdias a respeito de jogadores, corredores, determinadas partidas futebolísticas ou corridas de cavalos etc., são, quase sempre, emitidas em tom de censura, acrimoniosas por vezes, contundentes mesmo, sem que o fato constitua abuso da liberdade de informar ou de criticar. Nem sempre justas, nem sempre imparciais, nem sempre técnicas, mas sempre opiniões, sem o intuito de ofender. (…). Para que esta crítica deslize para a ofensa à honra, deverá ressumar, inequívoca, sem a menor dúvida, a intenção de injuriar ou difamar.” (12)

25. É o nomeado autor que invoca, estancando eventual dúvida, o escólio de PIETRO NUVOLONE, quando lançou que ” ‘… o único limite ao direito de crítica é assinalado pelo próprio conceito de crítica. Além do mais crítica signi-fica dissenso decorrente de opinião ou do comportamento de outrem; será estra-nha à atividade crítica toda a apreciação negativa imotivada ou motivada por uma mera animosidade pessoal e que encontre, portanto o seu fundamento em uma aversão de caráter sentimental e não uma contraposição de idéia‘ (Reati di Stam-pa, Milão, Giuffrè Editore, 1.951, pp.18 e 19)” (ob cit., pág. 537, g.n.).

Em suma, liberdade de expressar pensamento distinto, próprio do Estado de Direito e que, no Brasil, a Constituição sabidamente assegura, ao lado dos direitos de informar e de ser informado (LM, arts. 5º, incs. IV, IX e XIV c.c. 220, caput e §§ 1º e 2º), como bem o sabe o Apelado.


26. Surpreende haja S. Exa. afrontado a melhor jurisprudência, na qual se lê: “Não se pode considerar injuria a crítica, ainda que enérgica e veemente (RT, 671:369 e 664:288)”, mesmo porque, se presente dúvida quanto à intenção criminosa, não se configura a injúria (RT, 525:391)(13), ou ainda, como fincado perante o Eg. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, desprezado que

“ I – Observações críticas, ainda que irritantes, nos limites da divulgação da situação fática, não configuram, de per si, crime de imprensa (art. 27, inciso VIII da Lei de Imprensa). II – Não se pode alçar à condição de ilícito penal aquilo que somente é desejado pela especial suscepti-bilidade da pessoa atingida e nem se deve confundir ofensa à honra, que exige dolo e propósito de ofender, com crítica jornalística objetiva, limitada ao animus criticandi ou ao animus narrandi, tudo isto, sob pena de cercear-se a indispen-sável atividade da imprensa. III – ‘A relação entre lei e liberdade é, obviamente, muito estreita, uma vez que a lei pode ou ser usada como instrumento de tirania, como ocorreu com freqüência em muitas épocas e sociedades, ou ser empregada como um meio de pôr em vigor aquelas liberdades básicas que, numa sociedade democrática, são consideradas parte essencial de uma vida adequada.’ (DENNIS LLOYD). Writ concedido, trancando-se a ação penal.” (14)

27. Ademais, em monografia sobre a natureza jurídica do crítico e o abuso da liberdade de expressão, a canadense CHANTAL SAURIOL registra, na mesma linha da legislação brasileira, que “Les tribunaux américains ont affirmé, de façon constante, que l’expression d’une opinion, ‘even in the most pejorative words, … however unreasonable or vituperous’ bénéficiait de la protection cons-titutionnelle. … La justice qui vient en aide à la victime d’une diffamation ne doit pas oublier que la presse écrite et parlée est indispensable et constitue une valeur essentielle dans une société libre et démocratique … En condamnant un organe d’information à verser une somme considérable à la suite d’une diffamation, on risque d’en paralyser le fonctionnement, voire, dans certains cas, de mettre en péril son existence meme. …”.(15)

Na doutrina nacional, GILBERTO HADDAD JABUR conden-sa, com a habitual proficência, a evolução constitucional e doutrinária da questão, com acerto indicando que

” Seria ilógico, incalculável e inútil que o atributo de pensar ficasse confinado, permanecesse oculto no intelecto. Decorre da natureza humana um dever de expressão associado à liberdade de pensa-mento. Sem essa intenção o homem não progride. Liberdade de pensamento sem liberdade de expressão é, pois, como já se frisou, de pouquíssima valia para o homem e de nenhuma serventia para a sociedade. … A liberdade de imprensa surge, portanto, como componente inseparável da liberdade de expressão na sua acepção mais larga. … Impende, pois, reconhecer-lhe amplitude de atuação, liberdade significativa, mas jamais plena, no sentido de intangível ou absoluta. …” (g.n.) (16)

28. E como tem certeza o Apelado, “A pessoa notória tem sua circunscrição privada naturalmente diminuída pelo reconhecimento que alcan-çou perante o público ou certa comunidade. A impossibilidade de vetar as intrusões em sua esfera íntima cresce ou diminui na mesma proporção do aumento ou redução de sua determinada projeção. … Não é qualquer motivo, fato ou pretensa notícia que legitima a quebra, mesmo que parcial, da privacidade, a intromissão no círculo recôndito da pessoa. A pretensa divulgação deve estar necessariamente ligada, umbilicalmente jungida, a um dado ou aspecto pessoal responsável pela celebridade alcançada. … O interesse público inequívoco sobre-leva, diante da hipótese concreta, a manutenção serena – mas parcial e condicionada – da privacidade. …” (autor e ob. cit., p. 287, n.g.).

Não sem razão confirmava o saudoso CARLOS ALBERTO BITTAR, a propósito, que ” … excepciona-se da proteção a pessoa dotada de notoriedade e desde que no exercício de sua atividade, podendo ocorrer a revelação de fatos de interesse público, independentemente de sua anuência. Entende-se, nesse caso, existir redução espontânea dos limites da privacidade (como ocorre com os políticos, atletas, artistas e outros que se mantêm em contato com o público com maior intensidade) …”.(17)

29. Na espécie, portanto, partindo-se dos contornos dados pelo suposto ofendido, percebe-se que, na verdade, ilícito algum existiu. Ao contrário, desafiando a iterativa inteligência, doutrinária e pretoriana, a propósito, o que se constata é que a exordial, pinçando trechos isolados da fala do co-réu, a todo o custo buscou construir, com desfaçatez manifesta, condutas penalmente atípicas.


Havendo atuado o jornalista, no contexto geral da legítima crítica externada, apenas animus criticandi, sem intento algum injurioso ou difamatório (L. de Imp. art. 27, incs. I, III e VIII), em temática de incontroverso interesse público, que à época resultou, como público e notório, inclusive na instalação da tristemente famosa CPI DO FUTEBOL (cf. CBF – NIKE, ed. Casa Amarela, 2.001), qualquer indenização é indevida.

OUTROS VÍCIOS SENTENCIAIS

30. Tornando ao decreto condenatório, sobremodo impressiona haja o ilustre Magistrado invocado, dentre as razões decisórias e como se possível fosse, sentença criminal fulminada pela prescrição e, por certo, sabidamente inoperante para todos os fins e efeitos de Direito, ainda que para mera argumentação.

Ou então, ao que parece imbuído em condenar – nada obstante ausentes, dos autos, os postulados legais para tanto – tenha se animado a anotar a presença injuriosa na crítica tirada contra o Apelado, sem precisar, porém, como subsumir-se-ia, naquele tipo, o suposto assaque já que, como ressaltado (cf. 13.3. supra), o d. Juízo apenas enxergou, na propalada narrativa, justamente o fato da segredada participação, do Apelado, na indicação do antigo técnico da Seleção Brasileira de Futebol.

Trata-se de juízo manco da constitucionalmente exigida motivação.

31. Há mais, todavia. Contrariamente ao consignado na r. sentença, importa – e muito – na isenta aferição da crítica combatida, o antecedente exame do alcance da censura perpetrada pelo Apelado, ao ceifar, do conhecimento da população brasileira, a relevante notícia da sua participação decisória.

Tem–se aí exemplo flagrante de mau jornalismo e, para em-piorar, da desconsideração explícita da coletividade, maculado o lídimo direito de informação de todos, circunstâncias suficientes para inclusive justificar, de modo legal, crítica ainda mais exacerbada do que aquela publicamente manifestada.

32. Sempre mantida a vênia, tal constatação se agrava quando se colhe, do exame da r. sentença, que S. Exa., na tentativa de validar a condenação imposta, sequer se preocupou em manter incólumes as previsões constante da lei instrumental, no dizente à inalterabilidade da causa de pedir (CPC, arts. 128, 282, inc. III c.c. 459 e 460 – cf. Embargos de Declaração, itens 3 a 6, fls. 1.826).

Tendo assim atuado, força reconhecer que o r. decisório nega vigência a tais dispositivos, desafiando reforma. Afinal, a própria r. sentença admi-te, em quiçá involuntário lapso, não haver ” … nada de errado com a crítica em si mesma.” (cf. fls. 1.820, grifamos).

33. Ou quando se percebe o absurdo recurso, data maxima vênia., a frase jamais dita pelo jornalista co-réu, para assim considerar depreciativo o pronunciamento analisado, equivocadamente reputando-o ressarcível.

Finalmente improspera, diante do elenco probante e do ver-dadeiro ânimo do autor da cogitada crítica dirigida ao Apelado, o entendimento sentencial no sentido de que fora este vítima de acusação de eventual desvio econômico.

34. “Rabo Preso”, malgrado o sentido dos léxicos, comporta ou-tros, em direção oposta e evolutiva, significando fidelidade irrestrita (cf. Cam-panha Publicitária de diário paulistano). Ademais, ninguém disse que o Apelado recebera dinheiro de Ricardo Teixeira (cf. Inicial, fls. 19 a 23).

Inversamente, afirmou-se, isto sim, o completo desconheci-mento acerca do tema. É isto o que importa e assim deveria ter sido percebido pelo Juiz. Leia-se: ” … Ele passa a ter, pelo meu conceito, o rabo preso com esse Presidente da CBF. Economicamente, eu não sei se levou alguma vantagem, com esse negócio de AMBEV, pa pa pa, com os patrocinadores da CBF, escamoteando uma informação. …. não estou falando como jornalista, nem como nada, muito mais como cidadão brasileiro. Na hora que um cidadão brasileiro, como o Milton Neves, decide em nome do torcedor brasileiro quem deve ser o treinador da seleção, nós estamos fritos porque eu acho que ele não me representa, ele não me representa e não representa o torcedor brasileiro. Se houvesse que ser feita alguma consulta, essa consulta deveria ser feita ao torcedor brasileiro, deveria gastar o dinheiro da CBF para fazer uma votação. Aquele desejo que muita gente, né, imagina que um dia será feito, o torcedor votar em quem ele acha que deve ser o técnico. Não é o Sr. Milton Neves, que de agora em diante passa a ter o rabo preso com o Presidente da CBF, e tem mais um agravante, …, se o Ricardo Teixeira me liga, eu ficaria constrangido em receber o telefonema do Ricardo Teixeira, um cidadão cuja CPI já apontou uma série de irregularidades em sua vida à frente da CBF. Ao contrário o senhor Milton Neves ficou orgulhoso, orgulhoso com o telefonema. Eu ficaria constrangido se um cidadão como esse me telefonasse para perguntar alguma coisa. …” (grifamos).


35. Não houve a afirmada “expressa acusação do cometimento de um delito” e muito menos a condicionante, em visão míope adiantada pelo Apelado, de que o tal “escamoteamento” da relevantíssima informação decorrera do recebimento de dinheiro (cf. Inicial, fls. 23). Isso, insistindo, o co-réu não disse e a Apelante, evitando repetições, permite-se, a propósito, ora subscrever as substan-ciais explicações por ele trazidas na resposta que também ofereceu.

De igual modo, relativamente às outras ocupações paralelas do Apelado, é evidente que o co-réu nenhuma atenção, dolosa ou culposa, lhes em-prestou. Menos ainda revelou fato ignorado da coletividade, na medida em que todo mundo conhece seus outros rentáveis trabalhos alheios ao específico mister futebolístico …!!!

36. Sentir-se agravado por haver merecido a legítima crítica é revelar sensibilidade exacerbada que o Direito não protege. O choro masculino deixou de ser, há tempos, sinal de virilidade comprometida e não ostenta a conotação depreciativa como quis o Apelado fazer crer (cf. Inicial, fls. 13).

Por derradeiro, não subsiste a condicional sentença prolatada, conclamando a melhor doutrina a sua incontroversa nulidade.(18) Afronta, ademais, a iterativa jurisprudência, de que são exemplos os acórdãos citados nas corres-pondente nota.(19)

37. Vale transcrever, para superar as propositais arestas deixadas pelo Apelado, viabilizando a isenta análise, nessa parte, desse MM. Juízo, o que JOSÉ TRAJANO efetivamente disse, como segue:

” … Mas o que me escandaliza e o que eu choro agora, não é o choro do Romário. Quem vai chorar agora sou eu. Não chorar no sentido de chorar de derramar lágrima e tal. Chorar pela pouca vergonha, chorar pela desfaçatez, chorar pela, pela, pelo lamento mesmo que este país parece que não tem jeito mesmo.

Quando soube, com essa revelação feita, confessada, inclusive pelo presidente da CBF, Ricardo Teixeira, que foi o jornalista, vejam vocês, Milton Neves, que decidiu que o Luiz Felipe Scolari deveria ser o técnico da seleção brasileira. Na hora que o Milton Neves vira o voto de minerva para ser o cara que vai decidir quem será o técnico da seleção brasileira, nós estamos perdidos, minha gente, porque, primeiro, que esta não a função do jornalista, nem eticamente falando, nem moralmente falando.

Se, por exemplo, o Ricardo Teixeira me ligasse, espero que não faça nunca isso, mas vamos dizer que ele me ligasse para dizer, ô Trajano, pô, lembrei de você, vejo lá, a exemplo do Luiz Felipe Scolari, que disse que vinha sempre aqui, eu vejo sempre a mesa lá, então resolvi ligar para você, eu tenho três aqui que já vot…, eu tô consultando sete pessoas, três resolv…, porque é essa a história que ele mesmo contou, três votaram no Luxemburgo e 3 no Scolari, e eu tô votando, eu tô ligando para você para você votar, para decidir quem deve ser o técnico, Luxemburgo ou Scolari. Aí um parêntesis.

Curiosamente, o Luxemburgo tava na lista, praticamente já quase lá. Isso era em julho do ano passado, que quando o Scolari começou, na hora em que a CPI tava no auge, na hora em que o nome Luxemburgo tava no auge das acusações. Curiosamente, curiosamente então ia se pisar em cima de todas aquelas acusações e deixar de lado. Mas também o Presidente da CBF também era alvo de todas acusações e ele mesmo estava convidando então era o sujo com um mal lavado. O roto com …. Os dois se entendendo (alusão esta, na verdade, ao anterior técnico e o Sr. Teixeira, e não ao Apelado !!!).

Se ele liga, eu digo, meu senhor, não é função do jornalista ser voto de minerva ou responder a uma enquete para ao Presidente da CBF. O senhor procure outra pessoa. E no dia seguinte, diria aqui na ESPN BRASIL, ou escreveria na coluna do “Lance”, se fosse o dia, já que não escrevo todo dia: O senhor Ricardo Teixeira, Presidente da CBF, telefonou e disse que estava fazendo uma consulta a algumas pessoas para decidir quem seria o técnico da seleção brasileira. Disse que o Luxemburgo tinha três votos e o Scolari três votos e eu seria o voto de minerva. E eu respondi isso, isso e isso. …” (grifamos).

V

CONCLUSÃO e REQUERIMENTOS FINAIS

38. Concluíndo, insta notar, escusando-se pelo alentado destas razões, que o conjunto probatório desfavoreceu o Apelado, não havendo ele, ademais, evidenciado o dano moral que disse ter sofrido. Menos ainda sua própria família, a qual, não integrando a lide, mesmo por ricochete, não poderia haver sido considerada atingida, como pronunciou o d. Juiz em mais um equívoco decisório.

No pertinente, evitando repetições, a Apelante conclama a atenção da C. CÂMARA para o contido no Memorial que apresentou (cf. fls. 1.739 a 1.748).


39. Por fim, o valor condenatório a que alude a r. sentença, por ora vedadamente condicional, está dissociado dos critérios estabelecidos para a sua fixação, na medida em que, além de inexistente qualquer comprovação idônea das condições econômicas da Apelante – sendo certo que a prova colhida não se ateve a tal indagação – o seu excessivo montante/, caso por hipótese mantido o decreto condenatório, haverá de ser em muito reduzido.

Se a Apelante, por um lado, se não confunde com a ESPN INTERNACIONAL, por outro, à míngua de motivação adequada que, ao menos em tese, pudesse justificar minimamente a preferência do Magistrado, esse Eg. TRIBUNAL DE JUSTIÇA não referendará o malferimento do melhor Direito, a agressão à remansosa jurisprudência e, por fim, o até aqui prevalente esquecimento do lídimo Direito de Informação, tal como contemplado na Constituição Federal e no vigente Estatuto da Comunicação.

40. Por tais fundamentos, desde logo invocando-se os elevados su-plementos da C. Câmara, a Apelante pede e aguarda o provimento do recurso para, reformada a r. sentença guerreada, julgue-se improcedente a demanda, com in-versão dos ônus sucumbenciais, ou ainda, em hipótese de inteligência distinta, seja reduzido o vultoso valor condenatório para montante mais condizente com a realidade do feito, ou ainda, se admitida a nulidade do r. decisum, que também sobrevenha o esperado provimento recursal, com determinação de retorno dos autos à origem, a fim de que nova r. sentença seja proferida, suprimindo-se, de vez, a insustentável condicionalidade aqui denunciada.

Afinal, “Para viabilizar a procedência da ação de ressarci-mento de prejuízos, a prova da existência do dano efetivamente configurado é pressuposto essencial e indispensável. Ainda mesmo que se comprove a violação de um dever jurídico, e que tenha existido culpa ou dolo por parte do infrator, nenhuma indenização será devida, desde que, dela, não tenha decorrido prejuízo. A satisfação pela via judicial, de prejuízo inexistente, implicaria, em relação à parte adversa, em enriquecimento sem causa. O pressuposto da reparação civil está, não só na configuração de conduta contra jus, mas, também, na prova efetivados ônus, já que não se repõe dano hipotético” (STJ – 1ª T. – Resp. rel. Min. Demócrito Reinaldo, j. 23.05.94 – RSTJ 63/251 apud Rui Stoco in Responsa-bilidade Civil, ed. Revista dos Tribunais, 4ª ed., 1999, pág. 657).

São Paulo, 14 de fevereiro de 2007

JOSÉ RUBENS MACHADO DE CAMPOS

OAB/SP nº 27.646

Notas de Rodapé

1- cf. ALDO REBELO e SILVIO TORRES, CBF-NIKE, Casa Amarela, 2001, p. 18, grifamos.

2- cf. Contestações, fls. 143 a 195 e 221 a 245.

3- cf. Contestação, fls. 225 a 230 e 232 a 234.

4- cf. Contestação, fls. 232/233.

5- cf. Termo de Audiência, fls. 1.224, onde justamente o inverso constata o examinador isento.

6- cf. “É mais perigoso o segredo e a falta de informação que a difusão de notícias. Tão perigoso, que o segredo é nada menos que cegar a fonte mesma da notícia e, portanto, da verdade”, escreveu José Maria Desantres (apud Ignácio Burgos, Derechos Individuales, p.682), in ANTONIO JEOVÁ SANTOS, Dano Moral Indenizável, Lejus, 1.999, 2a. ed., p. 310, grifamos.

7- cf. “A atualidade tem direta relação entre o acontecimento e o tempo. Deixa de despertar o interesse do leitor ou do ouvinte, ou do telespectador, a notícia de um acontecimento que não esteja ligado ao elemento temporal, que não tenha sido dada a conhecer em seu tempo. Quando isso acontece, o fato perde a sua condição de ser noticiado. ” apud ANTONIO JEOVÁ SANTOS, ob. cit., p. 316, grifamos.

8- cf. CEJB, art. 2º: ” A divulgação da informação precisa é dever dos meios de comunicação pública independente da natureza de sua propriedade.”; Art. 5º – “A obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação e a aplicação de censura ou auto-censura são um delito contra a sociedade.” e Art. 9º – “É dever do jornalista: a) Divulgar todos os fatos que sejam de interesse público.”, dentre outros dispositivos aplicáveis, apud NOEMI MENDES SIQUEIRA FERRIGOLO, Liberdade de Expressão – Direito na Sociedade de Informação, Editora Pillares, S. Paulo, 2005, págs. 321 e segtes, grifamos.

9- cf. ANTONIO JEOVÁ SANTOS, ob. cit., p. 315.

10- cf. CANDIDO RANGEL DINAMARCO, A Reforma da Reforma, Malheiros Editores, 2.002, pág. 67, n.g..

11- cf. RUI STOCO, Abuso do Direito e Má-Fé Processual, Rev. dos Tribs., 1a. ed., 2.002, págs. 65 e segtes., grifamos.

12- cf. DARCY ARRUDA MIRANDA, Comentários à Lei de Imprensa, Ed. Revista dos Tribunais, 3ª ed., nota ao art. 27, pág. 491, g.n..


13- cf. PAULO LÚCIO NOGUEIRA, Em Defesa da Honra, Saraiva, 1.995, p. 23, n.g..

14- cf. Rel. Min. FELIX FISCHER, HC 16982/RJ, j. em 20.09.01, DJ de 29/10/2001, pág. 229, n.g..

15- cf. Les Abus de la liberté d’expression: l’encadrement juridique du rôle du critique, Les Éditions Yvon Blais Inc., Québec, 1.993, págs. 17 e 31, grifamos.

16- cf. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada, Rev. dos Tribs., 2.000, págs. 154 e segtes., n.g..

17- Os Direitos da Personalidade, p. 104, corroborando as inteligências precedentes e sempre atuais de RENÉ ARIEL DOTTI e de PAULO JOSÉ DA COSTA JUNIOR (cf. Proteção da Vida Privada e Liberdade de Informação, Rev. dos Tribs., 1.980, pp. 207 e segtes. e O Direito de Estar Só: Tutela Penal da Intimidade, Rev. dos Tribs. pp. 40 e segtes., respectivamente.

18- “Sentença condicional é aquela que submete seus próprios efeitos a algum evento futuro e incerto. O Código de Processo Civil a põe na ilegalidade e a jurisprudência afirma sua nulidade, porque sentenças com esse vício são a negação da oferta da segurança jurídica que pela via do exercício da jurisdição o Estado se propõe a fornecer às pessoas ou grupos envolvidos em conflitos. Pacificação alguma existiria, nem eliminação de conflito, quando a sentença ficasse assim na pronúncia de um verdadeiro non liquet, que o sistema repudia (CPC, art. 126: supra, n. 510). Diz o art. 460, par., do Código de Processo Civil: “a sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional.”cf. CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, vol. III, Malheiros Ed., 1 ed., S. Paulo, 2001, pág. 214). Conceitua Pontes de Miranda o vocábulo “certo” citado no referido art. 460, do CPC: “O juiz tem de dizer, com exatidão, aquilo a que condena o réu. Assim, tem-se por certa a prestação.” cf. PONTES DE MIRANDA, “Comentários ao Código de Processo Civil”, Tomo V, Ed. Forense, 3 ed., Rio de Janeiro, 1997, pág. 73, n.g.

19- cf. “… IV – O ordenamento jurídico pátrio não veda que relações jurídicas condicionais sejam decididas pelo órgão julgador, como dispõe o art. 460, parágrafo único, do CPC. Exige-se apenas que a sentença seja sempre certa e, em regra, determinada. … V – O que não é permitido pelo nosso sistema jurídico é a “sentença condicional”, que, no dizer do ilustre Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, “mostra-se incompatível com a própria função estatal de dirimir conflitos, consubstanciada no exercício da jurisdição”. Não pode o resultado do processo, se procedente ou improcedente o pedido, ficar pendente da ocorrência de evento futuro e incerto. Precedente: REsp nº 164.110/SP, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 08/05/2000. … VII – Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido.”(REsp 861.296/CE, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28.11.2006, DJ 14.12.2006 p. 312) e “PROCESSO CIVIL. RELAÇÃO JURÍDICA CONDICIONAL. POSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA CONDICIONAL. INAD-MISSIBILIDADE. DOUTRINA. ART. 460, PARÁGRAFO ÚNICO, CPC. RECURSO PROVIDO. I – Ao solver a controvérsia e pôr fim à lide, o provimento do juiz deve ser certo, ou seja, não pode deixar dúvidas quanto à composição do litígio, nem pode condicionar a procedência ou a improcedência do pedido a evento futuro e incerto. Ao contrário, deve declarar a existência ou não do direito da parte, ou condená-la a uma prestação, deferindo-lhe ou não a pretensão. II – A sentença condicional mostra-se incompatível com a própria função estatal de dirimir conflitos, consubstanciada no exercício da jurisdição. III – Diferentemente da “sentença condicional”(ou “com reservas”, como preferem Pontes de Miranda e Moacyr Amaral Santos), a que decide relação jurídica de direito material, pendente de condição, vem admitida no Código de Processo Civil (art. 460, parágrafo único). IV – Na espécie, é possível declarar-se a existência ou não do direito de percepção de honorários, em ação de rito ordinário, e deixar a apuração do montante para a liquidação da sentença, quando se exigirá a verificação da condição contratada, como pressuposto para a execução.” (REsp 164110/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 21.03.2000, DJ 08.05.2000 p. 96).

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