Hora marcada

Aasp questiona regra de ministra para receber advogados

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30 de agosto de 2007, 18h43

Para organizar a rotina de seu trabalho, a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, teve uma idéia inusitada. Em maio deste ano, ela editou uma resolução chamada de Ordem Interna 1, que disciplina o procedimento a ser cumprido pelos advogados que querem uma audiência para tratar de processos.

Segundo a regra, o advogado deve ir ao gabinete da ministra e protocolar um pedido de audiência. Se for aceito, a Secretaria do Gabinete escolhe a data e o horário do encontro, que é comunicado aos outros advogados do caso.

A medida desagradou a classe. Nesta quinta-feira (30/8), a Associação dos Advogados de São Paulo ajuizou um Mandado de Segurança no STJ contestando a ordem. Para a entidade, a ministra está violando frontalmente a prerrogativa dos advogados no exercício da profissão.

De acordo com a Aasp, a OI 1 contraria o artigo 133 da Constituição Federal, o artigo 7º, inciso VIII, do Estatuto da Advocacia e a recente decisão do Conselho Nacional de Justiça, que reafirmou a obrigação dos juízes em atender advogados independentemente do agendamento de audiência.

O Estatuto da Advocacia determina que são direitos dos advogados “dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada”.

O presidente da entidade, Sérgio Pinheiro Marçal, afirma: "a Ordem Interna 1, além de afrontar diversos princípios legais, tolhe os direitos e prerrogativas dos advogados para o pleno exercício da sua atividade profissional na busca da prestação jurisdicional e da efetivação da justiça”.

Procurada pela revista Consultor Jurídico, a ministra não se manifestou até o momento. Na OI, Nancy justifica a medida afirmando que “a ausência de uma disciplina legal acerca de tal prática apenas incrementa a necessidade de se garantir, em um procedimento informal, as mesmas garantias de paridade de armas que os litigantes têm em suas demais manifestações processuais, ainda em respeito aos incisos LV e LX do art. 5º da CF, sendo verdadeiro dever constitucional proporcionar tratamento isonômico entre as partes”.

A Aasp já tentou demover a idéia da ministra. Nancy respondeu, no entanto, que a norma teria, na verdade, o objetivo de beneficiar os advogados.

Em entrevista ao Anuário da Justiça 2007, a ministra afirmou que atende os advogados pessoalmente com hora marcada e portas abertas. Mas, para tanto, é preciso o prévio agendamento com a secretária do gabinete.

Leia a íntegra do MS

Excelentíssimo Senhor Ministro Presidente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça

ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO – AASP (“AASP”), associação de fins não econômicos e regularmente constituída (doc. nº 1), com sede na Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, na Rua Álvares Penteado, n. 151, Centro, devidamente inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda (“C.N.P.J./M.F.”) sob n.º 62.500.855/0001-39, por seu advogado (doc. nº 2), vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, incisos LXIX e LXX, letra “b”, da Constituição Federal, e no artigo 1º e seguintes da Lei nº 1.533, de 31.12.1951, impetrar

Mandado de Segurança Coletivo

(com pedido de liminar)

contra ato da Excelentíssima Senhora Ministra Fátima Nancy Andrighi, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas.

I. DOS FATOS

1. Em 7.5.2007, a Ministra Fátima Nancy Andrighi editou a Ordem Interna nº 01 (doc. nº 3) disciplinando o procedimento a ser cumprido pelos advogados para realização de audiência com a Ministra.

2. De acordo com a referida Ordem Interna, o advogado que pretender se dirigir ao gabinete e ser recebido pela Ministra Fátima Nancy Andrighi deverá previamente apresentar petição requerendo a designação de audiência e, caso seja deferido o pedido, a Secretaria do Gabinete irá providenciar comunicação informando o dia e horário da audiência não só ao advogado requerente, mas também aos demais advogados constituídos nos autos. Assim dispõe o inteiro teor da Ordem Interna n. 01:

“A MINISTRA NANCY ANDRIGHI, no uso de suas atribuições legais (RISTJ, art. 325) tendo presentes as contínuas solicitações de audiências, por parte de advogados, e:

a) Considerando que o Superior Tribunal de Justiça é uma instância extraordinária destinada a uniformizar a interpretação da Lei Federal, tendo atuação limitada à análise de questões jurídicas que devem ser veiculadas pelo interessado nos termos de rígidos padrões legais de admissibilidade (CF, art. 105);


b) Considerando que, em face desses pré-requisitos de admissibilidade, não só quaisquer discussões a respeito de matérias fáticas são vedadas, como a própria questão jurídica controvertida deve ser apresentada, em sua completude e por escrito, no âmbito da peça processual tempestiva do interessado, sem o que não poderá influenciar o destino da controvérsia (CF, art. 105);

c) Considerando que, apesar de tais restrições e da ausência de disposição regimental disciplinando a audiência entre Ministros do STJ e advogados, tal prática é costumeira e, em última análise, encontra, igualmente, respaldo na CF (art. 5º, LV);

d) Considerando, outrossim, que a ausência de uma disciplina legal acerca de tal prática apenas incrementa a necessidade de se garantir, em um procedimento informal, as mesmas garantias de paridade de armas que os litigantes têm em suas demais manifestações processuais, ainda em respeito aos incisos LV e LX do art. 5º da CF, sendo verdadeiro dever constitucional proporcionar tratamento isonômico entre as partes, conforme reconhecido pelo Conselho Nacional de Justiça no Projeto de Código de Ética da Magistratura, segundo o qual “O juiz, no desempenho de sua atividade, deve dispensar às partes tratamento materialmente igualitário, vedada qualquer espécie de indevida discriminação” (art. 8º),

RESOLVE:

Art. 1º. As solicitações de audiências serão formuladas por escrito e subscritas por procurador constituído do interessado.

§ 1º. A petição deverá ser recebida na Secretaria do Gabinete, podendo ser apresentada via fax, ou e-mail.

Art. 2º. Uma vez deferido o pedido, com designação de data para a audiência, serão cientificados, por telegrama, carta registrada, fax, e-mail ou qualquer outro meio eficaz de comunicação, os procuradores da parte contrária e os procuradores de eventuais interessados já admitidos no processo, ficando estes convidados a participar da audiência, caso tenham interesse em fazê-lo.

§ 1º. O aviso de recebimento e/ou cópia de telegrama, fax ou e-mail será arquivado na Secretaria do Gabinete.

Art. 3º. Comparecendo ou não os procuradores dos demais interessados, a audiência será realizada, em dia e hora marcados, atendendo-se ao pedido formulado.

§ 1º. Os procuradores poderão ser acompanhados pelas partes, que só poderão manifestar-se por intermédio daqueles.

Art. 4º. Esta Norma Interna entra em vigor na data de sua publicação.”

3. Logo após a edição da Ordem Interna nº 01, a Ministra Fátima Nancy Andrighi divulgou nota aos advogados esclarecendo que:

“A comunicação feita ao advogado da parte contrária em face de pedido de audiência, conforme disciplinada pela Ordem Interna nº 01, de 07.05.2007 infra, não implica atendimento simultâneo das partes. Se houver comparecimento de ambos, os advogados serão atendidos separadamente.

A Ordem Interna nº 01, de 07.05.2007 infra não se aplica, por sua vez, às audiências relacionadas a Medidas Cautelares e a pedidos de vista.”

4. Conforme se verifica dos termos da referida Ordem Interna nº 01, a Ministra Fátima Nancy Andrighi estabeleceu um regramento específico e particular para disciplinar o atendimento dos advogados, em flagrante violação à Constituição Federal e à Lei nº 8.906 de 4.7.1994 (“Estatuto da Advocacia”).

5. Em 2.7.2007, a Impetrante enviou ofício à Ministra Fátima Nancy Andrighi solicitando a revogação da referida Ordem Interna (doc. nº 4).

6. Em 17.8.2007, a Ministra Fátima Nancy Andrighi, em resposta ao mencionado ofício, explicitou que a determinação de prévio agendamento teria, na verdade, o objetivo de beneficiar a classe dos advogados. A Ministra Fátima Nancy Andrighi entende ter criado uma nova prerrogativa “que nem mesmo a Lei nº 8.906/94 teve a iniciativa de prever”, posto que teria estabelecido regra de interesse e conveniência do advogado para ser atendido sem perda de tempo e em igualdade de condições (doc. nº 5).


7. É contra esse ato ilegal da Ministra Fátima Nancy Andrighi que se insurge a Impetrante AASP, associação que congrega mais de 80.000 advogados de todo o país. Frise-se que a impetração do presente mandamus é feita com expressa autorização do Conselho Diretor da AASP, conforme comprova o anexo extrato da ata de reunião realizada em 8.8.2007 (doc. nº 6).

II. DA AFRONTA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL E AO ESTATUTO DA ADVOCACIA

8. Inicialmente, cumpre desde já destacar que o ato da Autoridade Coatora viola frontalmente o disposto no artigo 7º, inciso VIII, da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia). In verbis:

Art. 7º São direitos do advogado:

VIII – dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada;

9. Verifica-se que o Estatuto da Advocacia assegura expressamente o direito do advogado de ter acesso aos magistrados sem qualquer condição, direito esse que está sendo frontalmente violado pela Ordem Interna nº 01 da Ministra Fátima Nancy Andrighi.

10. O Estatuto da Advocacia foi editado em 1994 para regulamentar o sentido e o alcance da indispensabilidade do advogado na administração da justiça estabelecido no artigo 133 da Constituição Federal:

“Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”(grifamos)

11. Nesse sentido, verifica-se que a própria Constituição Federal consagra e resguarda o papel do advogado na administração da justiça. Isso porque a ratio da indispensabilidade do advogado é de evidente ordem pública e de relevante interesse social, como instrumento de garantia de efetivação da cidadania.

12. Com relação ao significado do termo “justiça” empregado no artigo 133 da Constituição Federal, vale destacar o entendimento da doutrina:

“O período (gramatical) composto, no pórtico expressa que o profissional a que se refere é indispensável à administração da justiça. Justiça, como vem escrito, i. é, letra minúscula, refere-se a direito como justo e não ao Poder Estatal que dispõe o Capítulo III do mesmo pergaminho fundamental. Vale observar que o Constituinte refere-se aos órgãos judiciários, de modo respeitoso e adotando a regra da linguagem (substantivo próprio), gravou-a em caracteres maiúsculos (sic, v.g. arts. 106, 111, 118 … CF). (…) Por outras palavras, o profissional referido, passou, com a promulgação da CF a elemento insubstituível e indeclinável em todas as projeções do termo justiça no sentido de “direito”.” (Roberto J. Pugliese, A Constituição, a advocacia e o advogado, RT, ano 84, março de 1995, volume 713, p. 296 – grifamos)

13. Ao “permitir a projeção de uma ponte de justiça”, Ives Gandra da Silva Martins, que discorre sobre a função social do advogado, ressalta a função primordial do advogado de realização da justiça, na medida em que este interpreta o próprio sistema jurídico:

“Sendo o Direito o instrumento social da convivência comunitária, é o profissional, que o conhece e maneja, aquele de maior responsabilidade na sociedade. (…). É o advogado, portanto, o mais relevante dos profissionais sociais, porque lhe cabe a função mais transcendente no organismo social, ou seja a de defesa e interpretação da sua própria estrutura primeira, que é o sistema jurídico. (…). A nossa missão social. A missão transcendental de permitir a projeção de uma ponte de justiça, que é a essência do próprio Direito (…)” (Ives Gandra da Silva Martins, A função social do advogado, Revista do Advogado, n. 14, ano 4, p. 95 – grifamos)

14. Foi exatamente para regulamentar e assegurar a participação do advogado na administração da justiça que o Estatuto da Advocacia estabeleceu, entre outros direitos e prerrogativas, o de se dirigir diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho independentemente de agendamento ou qualquer outra formalidade (artigo 7º, VIII do Estatuto da Advocacia).

15. Segundo interpretação teleológica desta norma, resta evidente que o dispositivo não vislumbra criar privilégio aos advogados, mas sim estabelecer prerrogativa profissional indispensável ao exercício da sua atividade tendo em vista o interesse social. Cuida-se de garantia da parte, e não do profissional, de que seus interesses serão defendidos. Nesse sentido, leciona Paulo Luiz Netto Lôbo:


“Se, no passado, prerrogativa podia ser confundida com privilégio, na atualidade, prerrogativa profissional significa direito exclusivo e indispensável ao exercício de determinada profissão no interesse social. Em certa medida é direito-dever e, no caso da advocacia, configura condições legais de exercício de seu múnus público” (Paulo Luiz Netto Lôbo, Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, 4ª edição, Editora Saraiva, 2007, p. 53).

16. É fundamental o completo entendimento do que está sendo defendido neste Mandado de Segurança por uma associação com mais de 60 anos de história dedicada ao aprimoramento da Justiça. Não se trata nem de longe de disputa vil de uma vaidade estéril, de jogo de poder ou de prevalência pela força.

17. O que a Associação dos Advogados de São Paulo defende, e admita-se com intransigência, é o pleno exercício da advocacia sem restrição que coloque em risco não a imagem do advogado, mas a sua essencial função de mensageiro dos clamores da sociedade e dos direitos individuais. Os advogados jamais se dirigem diretamente ao magistrado em seus gabinetes para solicitar favor, nem em interesse próprio, mas sim para o cumprimento de seu dever, já que o advogado é o profissional que predominantemente pode postular no Poder Judiciário os direitos dos cidadãos na busca da prestação jurisdicional e da realização da justiça.

18. Não se pode admitir que o volume de trabalho ou o anseio do magistrado em disciplinar o seu tempo, afete um princípio fundamental ao Estado Democrático de Direito que é a inexistência de barreira entre o advogado e o juiz. É claro que bom senso, cortesia e respeito recíprocos são esperados em qualquer relacionamento, mas é muito perigoso violar norma legal de sábia ratio para adequar o que é na verdade uma mera conveniência.

19. O ato da Ministra Fátima Nancy Andrighi fere as diretrizes da busca da justiça pelo advogado e da prestação jurisdicional pelo Estado, na medida em que a Ordem Interna nº 01 cria verdadeiro obstáculo para que o advogado possa ser recebido pela Ministra e cumpra seu múnus público, contrariando todo o sistema legal em vigor, especialmente o artigo 133 da Constituição Federal e o artigo 7º, inciso VIII, da Lei nº 8.906/94.

20. Por dever de lealdade, a Associação dos Advogados de São Paulo deixa claro que sempre reconheceu na Ministra Fátima Nancy Andrighi uma defensora das instituições da Justiça e uma magistrada de fácil diálogo. E esse fato só faz aumentar a responsabilidade da Ministra na manutenção da coerência com sua história e com o exemplo à magistratura.

21. Cumpre destacar que a questão de se restringir o recebimento de advogados por magistrados foi recentemente analisada e rechaçada pelo Conselho Nacional de Justiça, por meio de decisão proferida pelo Conselheiro Marcus Faver (doc. nº 7):

“1) NÃO PODE o magistrado reservar período durante o expediente forense para dedicar-se com exclusividade, em seu gabinete de trabalho, à prolação de despachos, decisões e sentenças, omitindo-se de receber profissional advogado quando procurado para tratar de assunto relacionado a interesse de cliente. A condicionante de só atender ao advogado quando se tratar de medida que reclame providencia urgente apenas pode ser invocada pelo juiz em situação excepcionais, fora do horário normal de funcionamento do foro, e jamais pode estar limitada pelo juízo de conveniência do Escrivão ou Diretor de Secretaria, máxime em uma Vara Criminal, onde o bem jurídico maior da liberdade está em discussão

2) O magistrado é SEMPRE OBRIGADO a receber advogados em seu gabinete de trabalho, a qualquer momento durante o expediente forense, independentemente da urgência do assunto, e independentemente de estar em meio à elaboração de qualquer despacho, decisão ou sentença, ou mesmo em meio a uma reunião de trabalho. Essa obrigação se constitui em um dever funcional previsto na LOMAN e a sua não observância poderá implicar em responsabilização administrativa”. (Pedido de Providências nº 1465, Conselheiro Marcus Faver, Conselho Nacional de Justiça, j. 4.6.2007)

22. Ou seja, verifica-se que o CNJ reafirmou a obrigação legal dos magistrados de atender aos advogados, independentemente de agendamento de audiência, razão pela qual resta patente a ilegalidade da Ordem Interna nº 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi.

23. Além disso, o ato da Ministra Fátima Nancy Andrighi também provoca um evidente desequilíbrio na isonomia existente entre advogado e magistrado. Isso porque, o advogado, juntamente com o Juiz e o Promotor de Justiça, desempenham papel fundamental na realização da justiça no Estado Democrático de Direito, cada qual com a sua atribuição, inexistindo entre estes qualquer tipo de hierarquia e subordinação.

24. O artigo 6º do Estatuto da Advocacia estabelece expressamente a inexistência de hierarquia e subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público:

“Art. 6º. Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo-se todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”.

25. Ou seja, na medida em que os três entes indispensáveis à administração da justiça, mencionados no artigo 6º da Lei nº 8.906/94, exercem funções distintas e complementares no âmbito da realização da justiça, a relação entre advogados, membros do Ministério Público e magistrados necessariamente será de paridade.

26. Assim sendo, os magistrados no exercício da função jurisdicional não podem criar quaisquer tipos de óbice ao livre acesso de advogados ao seu gabinete, sob pena de violação também ao artigo da 6º da Lei 8.906/94, que consagra tratamento isonômico entre magistrados e advogados. A criação de normas internas dessa natureza geram um desequilíbrio e atribuem ao magistrado uma posição privilegiada em detrimento do advogado, razão pela qual não podem subsistir. Cite-se as palavras do Min. Peçanha Martins sobre a função do advogado:

"RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 6.312-SP

VOTO – VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO PEÇÁNHA MARTINS:

O advogado é indispensável à administração da justiça e o seu ingresso no Fórum não pode ser limitado ao período estabelecido para as demais pessoas, estas, sim, subordinadas ao horário de funcionamento. Aberto o Fórum, nele poderá penetrar o advogado, desde que se identifique, como, por certo, ocorrerá com os juízes, promotores e serventuários.É que não há distinção entre magistrados, membros do ministério público e advogados. Todos têm as mesmas prerrogativas legais, dentre as quais a de livre trânsito na casa da justiça, onde se não lhe pode opor cancelas intransponíveis, seja nos Tribunais, seja nas serventias. E não se argumente que cresceu demais o número dos advogados, aumentando, dentre eles, os que não se comportam dentro nos rigores da ética. Dentre os magistrados, promotores e serventuários também não se surpreende a totalidade de justos e honestos, como se viu no célebre caso da previdência.

O ingresso livre nas salas de sessões dos Tribunais, de audiências, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais, delegacias e prisões e em qualquer edifício em que funcione repartição judicial ou serviço público onde deve praticar ato ou colher prova, em qualquer assembléia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente; constitui prerrogativa necessária ao exercício da nobre e indispensável profissão. É direito estabelecido em lei – art. 7°, inciso VI, alíneas “a”, “b”, “c” e “d”, da Lei 8.906, de 04.07.1994 e do qual não podem renunciar os advogados.

No caso dos autos, é inafastastável, “data maxima venia” dos que pensem em contrário, as regras do art. 7°, VI, "a", "b" e “c…

No caso dos autos, tem o Autor o direito de penetrar no Fórum federal a qualquer hora, desde que aberto o Fórum e presente um funcionário na casa da justiça, nos termos do art. 7°, VI, alíneas “a”, “b” e “c”, da Lei 8.906, de 04.07.1994, como pedido no “mandamus”.

Conheço, pois, do recurso e lhe dou provimento".

27. Isso sem falar que caso se admita a possibilidade de se editar atos ou portarias por magistrados disciplinando o atendimento de advogados, cada magistrado de cada Comarca do nosso país acabará particularizando a forma e os procedimentos para recebimento de advogados, gerando um verdadeiro colapso para o exercício da advocacia. Nada mais absurdo!

28. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que a delimitação pelo magistrado de horário para atendimento a advogados configura violação das regras de convivência profissional harmônica e reciprocamente respeitosa entre advogados e magistrados. Vale citar os seguintes julgados:

“ADVOGADO – DIREITO DE ENTREVISTAR-SE COM MAGISTRADO – FIXAÇÃO DE HORÁRIO – ILEGALIDADE – LEI 8.906/94 ART. 7º, VIII). É nula, por ofender ao Art. 7º, VIII da Lei 8.906/94, a Portaria que estabelece horários de atendimento de advogados pelo juiz.” (STJ, 1ª Truma, RMS nº 13262/SC, Rel. Desig. Min. Humberto Gomes de Barros, in DJ 30/09/2002, p. 157)

“ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DELIMITAÇÃO DE HORÁRIO PARA ATENDIMENTO A ADVOGADOS. ILEGALIDADE. ART. 7º, INCISO VIII, DA LEI N. 8.906/94. PRECEDENTES. 1. A delimitação de horário para atendimento a advogados pelo magistrado viola o art. 7º, inciso VIII, da Lei n. 8.906/94. 2. Recurso ordinário provido.” (STJ, 2ª Turma, RMS nº 15706/PA, Rel. Min. João Otávio de Noronha, in DJ 07/11/2005, p. 166)

29. Isso sem falar também que a Ordem Interna nº 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi viola o princípio da legalidade, que está consagrado no artigo 5º, II, da Constituição Federal, segundo o qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. O Professor José Afonso da Silva ensina que a expressão “em virtude de lei” deve ser entendida como:

“(…) Só a lei cria direitos e impõe obrigações positivas ou negativas, ainda que o texto constitucional dê a entender que só estas últimas estão contempladas no princípio da legalidade” (José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 28ª edição, Malheiros Editores, 2006, p. 421).

30. Ou seja, uma Ordem Interna editada por Ministro de Tribunal Superior disciplinando o recebimento de advogados em gabinete não tem o condão de alterar o ordenamento jurídico em vigor, pois somente à Lei é dado o poder de criar ou revogar direitos e impor obrigações.

31. Sobre o conceito de princípio da legalidade vale mencionar a estreita relação do Estado de Direito com o princípio da legalidade:

“O princípio de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei surge como uma das vigas mestras do nosso ordenamento jurídico. A sua significação é dúplice. De um lado representa o marco avançado do Estado de Direito que procura jugular comportamentos, quer individuais, quer dos órgãos estatais, sob as normas jurídicas, das quais as leis são a suprema expressão. (…). De outro lado, o princípio da legalidade garante o particular contra os possíveis desmandos do Executivo e do próprio Judiciário. Instaura-se, em conseqüência, uma mecânica entre os Poderes do Estado, da qual resulta ser lícito apenas a um deles, qual seja, o Legislativo, obrigar aos particulares. Os demais atuam as suas competências dentro dos parâmetros fixados pela lei. A obediência suprema dos particulares, pois, é para com o Legislativo. Os outros, o Executivo e o Judiciário, só compelem na medida em que atuam a vontade da lei. Não podem, contudo, impor ao indivíduo deveres ou obrigações ex novo, é dizer, calcados na sua exclusiva autoridade. (…) É pelo princípio da legalidade que o Estado de Direito mais se afirma, ou, ainda, em outras palavras, não há Estado de Direito sem o princípio da legalidade. Porque não é a qualquer ato jurídico que a concepção moderna de Estado empresta o poder de estabelecer as normas estatuidoras daquilo que o indivíduo está obrigado a fazer ou a deixar de fazer” (Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 2º volume, 2ª edição, Editora Saraiva, 2001, pág. 25/26)

32. Pelo exposto, resta claro que a Ordem Interna editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

33. Resta claro, portanto, que a Ministra Fátima Nancy Andrighi tem o dever legal de receber quaisquer advogados em seu gabinete independentemente de horário previamente marcado ou outra condição. Qualquer tipo de óbice ao livre acesso de advogados ao gabinete de qualquer magistrado no exercício da função jurisdicional configura abuso de autoridade do magistrado, segundo lição de Paulo Luiz Netto Lôbo:

“Se os magistrados criam dificuldades para receber os advogados, infrigem expressa disposição de lei, cometendo abuso de autoridade…” (Paulo Luiz Netto Lôbo, Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, 4ª edição, Editora Saraiva, 2007, p. 76)

34. Assim, ao persistirem os efeitos da Ordem Interna nº 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi, estar-se-á prestigiando um ato contrário a um princípio basilar do Estado Democrático de Direito, qual seja, o princípio da legalidade. Dessa forma, faz-se necessária a concessão da liminar para suspensão imediata dos efeitos da Ordem Interna nº 01, de 7.5.2007 que tolheu os direitos e prerrogativas dos advogados de serem recebidos no gabinete pela Ministra Fátima Nancy Andrighi.

III. DOS REQUISITOS DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO

35. O mandado de segurança coletivo, nos moldes do que dispõe o artigo 5º, incisos LXIX e LXX, da Constituição Federal, deve ser utilizado para a proteção do direito líquido e certo, violado por ato praticado por autoridade pública. Confira-se o dispositivo mencionado:

“Art. 5º.

………….

LXIX. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por hábeas corpus ou hábeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ao agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

LXX – o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

……….

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.”

36. O conceito de direito líquido e certo, no entender da melhor doutrina, remete à forma de prova do respectivo direito. Assim, é considerado direito líquido e certo aquele comprovável de plano, por via exclusivamente documental, sem que, para que se determine a verdade dos fatos e/ou existência do direito, seja necessária a produção de qualquer tipo de prova complementar.

37. No presente caso é evidente a existência do direito líquido e certo da Impetrante na defesa de seus associados, uma vez que, nos termos do artigo 7º, VIII do Estatuto da Advocacia, os advogados podem se dirigir diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada. Por meio de ilegal Ordem Interna nº 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi, os advogados foram alijados desse direito.

38. No caso dos autos agiu a Autoridade Coatora contra os dispositivos da Constituição Federal e do Estatuto da Advocacia, tendo violado não só o princípio da legalidade como também outros direitos e prerrogativas dos advogados.

39. Resta demonstrado, portanto, que o direito invocado pela Impetrante constitui direito líquido e certo de seus associados no exercício da atividade profissional, violado por ato ilegal da Ministra Fátima Nancy Andrighi, podendo ser, consequentemente, plenamente amparado via mandado de segurança.

IV. DOS FUNDAMENTOS PARA CONCESSÃO DA LIMINAR

40. A liminar se justifica em face da relevância dos fundamentos invocados e da gravidade dos direitos violados pelo ato exarado pela Ministra Fátima Nancy Andrighi. Se não forem suspensos os efeitos da Ordem Interna n. 01, os advogados terão direito líquido e certo violado, em clara afronta a seus direitos e prerrogativas do exercício da profissão, bem como ao princípio da legalidade, pedra angular do Estado Democrático de Direito.

41. Caso não seja concedida a tutela liminar ao presente mandamus, os advogados não poderão ser recebidos no gabinete da Ministra Fátima Nancy Andrighi caso não cumpram com os termos da Ordem Interna n. 01, o que é inadmissível diante do que estabelece a Constituição Federal e o Estatuto da Advocacia, especialmente 0 seu artigo 7º, VIII. Por isso, a medida liminar é imprescindível.

42. Cada dia em que a lei deixe de ser cumprida, será um dia a mais de afronta à Justiça. Cada vez que um advogado tenha que se submeter a uma ordem ilegal que impede o livre exercício da sua atividade, será um dia a mais em que o Estado Democrático de Direito sofrerá um arranhão e um dia a mais onde a sociedade estará menos representada. Princípios democráticos não devem sofrer arranhões, nem por um dia!

43. Resta claro, pois, que no caso em tela os pressupostos da liminar previstos no artigo 7°, da Lei n° 1533, de 1951, quais sejam, relevância dos fundamentos (fumus boni iuris) e periculum in mora encontram-se presentes.

44. A certeza do direito invocado repousa nos ditames da própria Constituição Federal e do Estatuto da Advocacia, cujo desrespeito evidencia as irregularidades que se pretende obstar com o presente mandado de segurança. Assim, a relevância dos fundamentos invocados, plenamente demonstrados, evidenciam a ocorrência do fumus boni iuris.

45. A iminência de dano, por se tratar de violação aos direitos e prerrogativas dos advogados, os quais poderão ser alijados do pleno exercício da profissão e cumprimento do múnus público na busca da justiça, é inquestionável.

46. É imperioso que o processo civil caminhe para o futuro. A tendência mundial é que prevaleça a verossimilhança nos julgamentos, principalmente em sede liminar. Aliás, essa é a exigência da própria dinâmica das relações processuais, nas quais o jurisdicionado não pode ser punido com a demora na prestação jurisdicional. Assim, a concessão liminar da segurança é medida que se impõe.

V. CONCLUSÃO E O PEDIDO

47. Como conclusão de todo o exposto, a Impetrante tem como plenamente demonstradas a liquidez e certeza do direito de seus associados se dirigirem ao gabinete de trabalho dos magistrados independentemente de agendamento e a Ordem Interna n. 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi viola frontalmente essa prerrogativa legalmente conferida aos advogados para o exercício da sua atividade profissional na busca da prestação jurisdicional e da efetivação da justiça.

48. A presença dos requisitos autorizadores da ordem liminar são claros. A Ordem Interna n. 01 editada pela Ministra Fátima Nancy Andrighi ofende o princípio da legalidade (artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal) e o artigo 133 também da Constituição Federal, além do próprio Estatuto da Advocacia (artigos 6º e 7º, inciso VIII).

49. Demonstrado, assim, o direito líquido e certo, a Impetrante requer a concessão de medida liminar, com base no artigo 7°, inciso II, da Lei n.º 1.533, de 1951, para o fim de suspender os efeitos da Ordem Interna n. 01 e assim possibilitar que os advogados associados da Impetrante se dirijam ao gabinete da Ministra Fátima Nancy Andrighi independentemente de qualquer agendamento ou deferimento de audiência, dando-se cumprimento a0 disposto no artigo 7, VIII do Estatuto da Advocacia.

50. Assim sendo, concedida a liminar, a Impetrante requer ao final a concessão em definitivo da segurança, para o fim indicado nos itens anteriores, nos termos do artigo 5°, incisos LXIX e LXX, da Constituição Federal de 1988, já que a liquidez e certeza do direito, bem como a ilegalidade praticada pela Autoridade Coatora, resultam claras.

51. Termos em que, requerendo-se a distribuição, registro e autuação do presente, com os anexos documentos, bem como a notificação da D. Autoridade Coatora para que preste as informações que entender convenientes, no prazo da lei, obedecidas todas as cautelas legais e demais requisitos processuais, e dando à presente ação mandamental o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais),

pede deferimento.

De São Paulo para Brasília, 30 de agosto de 2007

Sérgio Pinheiro Marçal

OAB/SP 91.370

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

fere o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, uma vez que impõe aos advogados requisitos para serem recebidos em seu gabinete que não estão previstos em lei.

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