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Supremo acolhe denúncia contra 19 acusados no mensalão

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24 de agosto de 2007, 20h53

Dos 40 denunciados pelo mensalão, 19 já são réus. Esse é o saldo no fim do terceiro dia de julgamento, no Supremo Tribunal Federal, sobre o suposto esquema de pagamento pelo PT a partidos da base aliada em troca de apoio político no Congresso Nacional. O julgamento será retomado na segunda-feira (27/8).

Na tarde desta sexta-feira, o ex-ministro Luiz Gushiken, da extinta Secretaria de Comunicação Social, se tornou réu por crime de peculato. E o ex-ministro José Dirceu se livrou dessa acusação.

Foram aceitas também denúncias por lavagem de dinheiro (artigo 1º, incisos V, VI e VII, da Lei 9.613/98) contra o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e seu ex-chefe de gabinete José Luiz Alves, o deputado Paulo Rocha (PT-PA) e a assessora Anita Leocádia, os ex-deputados Professor Luizinho e João Magno. Aparentando cansaço, os ministros acompanharam por unanimidade o relator Joaquim Barbosa. Não houve os costumeiros inspirados debates.

Segundo denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, Adauto e Luiz Alves receberam R$ 1 milhão do esquema do mensalão. Já Paulo Rocha ganhou R$ 920 mil — R$ 600 mil por intermédio de Anita Leocádia.

Ainda para o procurador, o ex-deputado Professor Luizinho sacou R$ 20 mil na agência do Banco Rural em Brasília por meio de seu assessor parlamentar. Enquanto, João Magno recebeu R$ 350 mil do esquema. As denúncias foram aceitas pelo relator, que não foi contestado pelos colegas.

Lavagem no núcleo publicitário-financeiro

Antes de julgar aqueles que teriam recebido o mensalão, o Supremo também acolheu denúncia contra os ex-dirigentes do Banco Rural e o chamado núcleo do publicitário-financeiro (encabeçado por Marcos Valério) por crime de lavagem de dinheiro. Eles seriam aqueles que viabilizavam as verbas. Novamente, por unanimidade, foi seguida recomendação do relator Joaquim Barbosa.

Na denúncia da Procuradoria-Geral da República, o núcleo financeiro engendrou os mecanismos e estratagemas “para omitir o registro no Sistema do Banco Central dos verdadeiros beneficiários/sacadores de recursos das contas SMP&B Comunicação Ltda”. O núcleo é formado por Marcos Valério, Rogério Tolentino, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Simone Vasconcellos e Geiza Dias. Valério, Hollerbach e Cristiano Paz também serão réus por corrupção ativa e peculato.

Na outra ponta dos angariadores, segundo Antonio Fernando Souza, estavam os quatro dirigentes do Banco Rural que foram denunciados pelo crime de lavagem de dinheiro. São eles Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório Torres de Jesus e Vinicius Samarane. Os mesmo denunciados responderão por gestão fraudulenta de instituição financeira.

No governo

Nesta sexta-feira, os ministros aceitaram, por maioria, denúncia contra o ex-ministro Luiz Gushiken, da extinta Secretaria de Comunicação Social, por crime de peculato. Como ele era o responsável pela coordenação de comunicação do governo à época, a maioria dos ministros avaliou que é possível iniciar uma Ação Penal contra ele por suposto contrato irregular de propaganda de uma autarquia do governo. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, também se tornou réu por este crime.

A decisão foi uma das mais polêmicas até o momento no julgamento do mensalão: quatro ministros votaram contra. O ministro Eros Grau disse que a denúncia era apenas uma ilação. “É lícito a mim como julgador fazer uma ilação deste tipo”, respondeu o ministro Cezar Peluso.

No entanto, os ministros, por unanimidade, rejeitaram a denúncia contra o chamado núcleo político-partidário do mensalão — formado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-secretário do PT Silvio Pereira e o deputado José Genoino.

Para o relator, a participação deles não foi explicada de maneira satisfatória pelo procurador-geral da República. Ficou entendido que Dirceu não era responsável político pela área de marketing do BB. “Só afirmou que o valor foi empregado para pagamento de propina por ordem do núcleo central”, anotou o relator.

O Supremo votou pelo recebimento de denúncias contra o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato.

Preliminares

Na quinta, o Supremo rejeitou as preliminares apresentadas pelos advogados que defendem os 40 denunciados. Entre as questões levantadas estavam a suposta incompetência do STF para julgar os acusados que não têm prerrogativa de foro, a obtenção de provas ilícitas (sem autorização judicial) e a ilegalidade no compartilhamento de dados com a CPMI dos Correios.

Todas as preliminares foram afastadas. Os ministros discutiram longamente sobre a legalidade de algumas das provas (especialmente as que continham sigilo bancário), que teriam sido obtidas pelo procurador-geral diretamente com o Banco Central, sem autorização judicial. Mas ao cabo das discussões, decidiu-se

O mensalão

O inquérito do mensalão foi aberto no STF em agosto de 2005, a pedido do procurador-geral da República, depois que o então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) acusou líderes e dirigentes do PL e do PP de receberem mesada do PT em troca de apoio político ao governo. Em março de 2006, Antonio Fernando Souza denunciou 40 pessoas acusadas de envolvimento no esquema, em 136 páginas entregues ao Supremo.

De acordo com procurador-geral, o esquema do mensalão funcionava como uma organização criminosa dividida em três núcleos: o político-partidário, o publicitário e o financeiro. Para garantir apoio no Congresso, ajudar na eleição de aliados e fazer caixa para novas campanhas, o PT desembolsava altas quantias aparentemente recebidas em troca de favorecimento da máquina pública.

O núcleo político-partidário, de acordo com a denúncia, pretendia garantir a permanência do Partido dos Trabalhadores no poder com a compra de suporte político de outros partidos e com o financiamento irregular de campanhas. Esse núcleo era o responsável por repassar as diretrizes de atuação para os outros dois núcleos.

O segundo núcleo — formado, entre outros, por Marcos Valério, Rogério Tolentino, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Simone Vasconselos e Geiza Dias — recebia vantagens indevidas de integrantes do governo federal e de contratos com órgãos públicos (como, por exemplo, os contratos de publicidade da Câmara dos Deputados, do Banco do Brasil e da Visanet).

E o terceiro núcleo — composto, entre outros, por José Augusto Dumont, Kátia Rabelo José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane — teria entrado na organização criminosa em busca de vantagens indevidas e facilitava as operações de lavagem de dinheiro.

O esquema atingiu grandes nomes do governo Lula, como o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, acusado pelo procurador-geral da República de formação de quadrilha, peculato e corrupção ativa. O deputado federal José Genoíno (PT-SP), ex-dirigente do PT, é alvo das mesmas acusações. O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza bate recorde de acusações: formação de quadrilha, falsidade ideológica, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Placar parcial

Denúncias aceitas

Kátia Rabello, ex-presidente do Banco Rural; denúncia: gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro.

Jose Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural; denúncia: gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro.

Vinícius Samarane, ex-diretor do Banco Rural; denúncia: gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro.

Ayanna Tenório Tôrres de Jesus, ex-diretora do Banco Rural; denúncia: gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro.

Marcos Valério Fernandes de Souza, empresário e publicitário; denúncia: corrupção ativa (2x), peculato (3x), lavagem de dinheiro.

Ramon Hollerbach Cardoso, ex-sócio de Marcos Valério; denúncia: peculato (3x), corrupção ativa, lavagem de dinheiro.

Cristiano de Mello Paz, ex-sócio de Marcos Valério; denúncia: corrupção ativa (2x), peculato (3x), lavagem de dinheiro.

João Paulo Cunha, deputado federal do PT-SP; denúncia: corrupção passiva, lavagem de dinheiro, peculato.

Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil; denúncia: peculato (2x), lavagem de dinheiro, corrupção passiva.

Luiz Gushiken, ex-ministro da Secom; denúncia: peculato.

Simone Reis Lobo De Vasconcelos, ex-gerente da SMP&B, uma das agências de Valério; denúncia: lavagem de dinheiro.

Geiza Dias Dos Santos, funcionária da SMP&B; denúncia: lavagem de dinheiro.

Rogério Lanza Tolentino, advogado e ex-sócio de Marcos Valério; denúncia: lavagem de dinheiro.

Paulo Roberto Galvão da Rocha, deputado federal (PT-PA); denúncia: lavagem de dinheiro.

Anita Leocádia, ex-assessora de Paulo Rocha; denúncia: lavagem de dinheiro.

Luiz Carlos da Silva (Professor Luizinho) – ex-deputado (PT-SP); denúncia: lavagem de dinheiro.

João Magno, ex-deputado (PT-MG); denúncia: lavagem de dinheiro.

Anderson Adauto Pereira, ex-ministro dos Transportes; denúncia: lavagem de dinheiro.

José Luiz Alves, ex-chefe de gabinete de Anderson Adauto; denúncia: lavagem de dinheiro.

Denúncias não aceitas*

Rogério Lanza Tolentino, advogado e ex-sócio de Marcos Valério; denúncia: peculato, corrupção ativa.

José Dirceu de Oliveira e Silva, deputado cassado do PT e ex-ministro da Casa Civil; denúncia: peculato.

José Genoino, deputado federal do PT-SP e ex-presidente do partido; denúncia: peculato.

Delúbio Soares de Castro, ex-tesoureiro do PT; denúncia: peculato.

Sílvio José Pereira, ex-secretário-geral do PT; denúncia: peculato.

* Alguns deles ainda podem ser responsabilizados por outras acusações que ainda estão sendo julgadas pelo Supremo Tribunal Federal

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