Decisão ao vento

Veto à Emenda 3 não trouxe conseqüência jurídica de peso

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23 de agosto de 2007, 14h28

Primeiro foram as investigações sobre o presidente do Senado, Renan Calheiros, depois as discussões sobre o caos aéreo, potencializado depois da queda do vôo 3054 da TAM, e em meio a todos esses fatos, o veto à Emenda 3 foi relegado a segundo plano. Mas o assunto continua atual e importante.

Para tanto, vale situá-la no contexto atual. A mencionada emenda foi proposta em junho de 2005 pelo então senador Ney Suassuna, no Projeto de Lei da Super-Receita, que deu origem, neste ano, à Secretaria da Receita Federal do Brasil, nada mais que a fusão da Secretaria da Receita Federal com a Secretaria da Receita Federal Previdenciária.

O texto da Emenda 3 proibia os auditores fiscais da Receita Federal de autuar ou fechar empresas prestadoras de serviços formadas por uma só pessoa, quando entendessem que a relação de prestação de serviços com outra empresa era relação trabalhista, sem a decisão judicial anterior. Como já foi dito, ela foi vetada pelo Presidente Luís Inácio Lula da Silva, que cedeu às pressões de sindicatos, dos fiscais e de outros setores da sociedade.

Não faltaram argumentos a respeito de tal dispositivo. De um lado, fez-se coro que ele prejudicaria o trabalhador ao conceder aos empregadores uma inapropriada liberalidade e repassar a fiscalização do trabalho ao Poder Judiciário. De outro, fez-se ouvir que ao Fisco não poderia ser concedido “super poderes”. Porém, poucos atentaram e adentraram aos aspectos técnico-jurídicos que pairam sobre a questão.

Cabe aqui, lembrar alguns conceitos. O Direito Brasileiro é um conjunto de normas jurídicas, todas construídas sob o pilar constitucional, sem o qual não haveria parâmetros para um sistema jurídico-político. E entre os dispositivos previstos na Constituição da República está o primado da legalidade.

A legalidade condiciona toda atividade da administração pública, o que é um imperativo para a configuração do Estado de Direito, ou seja, “a vontade do príncipe” não se sobrepõe à “vontade do povo”. Ela também anda junto com princípios como os da impessoalidade, moralidade, entre outros de igual importância.

Assim, a atividade de desconsideração de atos dos contribuintes, mesmo que para a cobrança de impostos, envolve enorme gama de subjetividade. A linha divisória entre decisões arbitrárias e adequadas é muito tênue. E quando pensamos que no pagamento de tributos há transferência de propriedade do particular ao Estado, nota-se o quão grave se torna essa circunstância.

Eis, então, por que caberia ao Congresso Nacional regulamentar o tema, prevendo um procedimento a ser seguido pelos auditores fiscais para atos de tal calibre. Com isso, obter-se-ia mais segurança jurídica, tanto para os contribuintes, como para o Fisco e os próprios trabalhadores.

O que não se pode é admitir a desconsideração antes que essa Lei venha a ser instituída. Sobre isso, o artigo 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional determina que a desconsideração de negócios jurídicos feitos pelos contribuintes deve ser efetivada mediante procedimento previsto em lei. Daí porque, ante a inexistência da Lei em questão, verifica-se a impossibilidade de o Fisco assim proceder.

O que leva à conclusão que a Emenda 3 pouco inovava, acrescentando uma proibição já implícita no sistema. Por isso que o veto presidencial, em si, não trouxe conseqüência jurídica de peso. Quando muito, contribui para acarretar insegurança jurídica, o que se tornou ainda mais acentuado pelos tipos de discussões travadas em diversos diálogos da sociedade, gerando mais confusão do que esclarecimento. É hora de observar um pouco mais o que prevê nosso Direito Positivo.

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