Mudança sem lei

CNJ avaliza norma que tira juiz de fase inicial de inquérito

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19 de agosto de 2007, 19h16

Desde quinta-feira (16/8), o Ministério Público do Paraná é mais dono do inquérito policial do que era antes. Foi nesse dia que o Conselho Nacional de Justiça julgou válido um Termo de Ajuste de Procedimento firmando entre o Tribunal de Justiça do estado e o Ministério Público.

A norma permite que os inquéritos não sejam enviados ao juiz criminal durante a fase administrativa. A intenção é dar mais velocidade aos casos. A decisão foi criticada pela OAB nacional neste domingo (19/8).

Segundo o procedimento 119/2007, elaborado em maio pela Corregedoria do TJ, os inquéritos são distribuídos diretamente ao Ministério Público para evitar assim intervenção desnecessária do juiz na fase administrativa. Para os defensores da mudança, a fase é meramente burocrática. Neste momento, acontecem procedimentos como a requisição de antecedentes e juntada e expedição de ofícios.

No entanto, um grupo de promotores de justiça não gostou da idéia e ajuizou um Procedimento de Controle Administrativo no CNJ. O grupo afirmava que a norma afronta o artigo 10 do Código do Processo Penal. Outra crítica é que o MP é parte acusadora do processo. Com o inquérito nas mãos, eles poderiam “esquecer” de provas favoráveis ao réu. A mudança reforçaria o poder tanto da Polícia quanto do MP.

Eles lembraram também que uma mudança deste tipo precisa passar por um projeto de lei. Tanto é que uma matéria de igual teor, até na linha de defesa, mofa na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Trata-se do Projeto de Lei 4.254 de 1998, que foi completamente esquecido na atual legislatura.

Os conselheiros do CNJ, porém, não entenderam desta forma. Por maioria, a ação foi julgada improcedente. Segundo Altino Pedrozo (relator), “a fase administrativa do inquérito afigura-se como mero procedimento, burocrático e totalmente dispensável”. Para o conselheiro, este momento “é formalismo que deve ceder aos reclamos gerais para uma prestação jurisdicional particulamente célere”.

Já o conselheiro Rui Stoco, que votou contra, lembrou que “ato administrativo interno que estabeleça rotina procedimental não pode ser editado contra legem“. Ele afirmou, ainda, que “o ato editado significa dar a um estado da federação poder de legislar não concedido a nenhum deles por força do sistema federativo adotado”.

Críticas

A OAB criticou a decisão do CNJ. Nenhum membro do conselho federal esteve presente na sessão de quinta. “Qualquer tentativa de retirar da alçada do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de direito é flagrantemente inconstitucional. E não há lesão ou ameaça maior do que submeter a uma das partes o controle da investigação policial, em detrimento do direito de defesa da outra parte. Submeter o inquérito policial ao controle absoluto do Ministério Publico é o mesmo que dizer que aquele que é parte pensa como parte e age como parte terá o instrumento de enorme teor probatório a sua disposição”, diz nota assinada pelo presidente Cezar Britto.

Em artigo publicado no sábado (18/8) pela Consultor Jurídico, a subprocuradora-geral da República, Delza Curvello Rocha, do Ministério Público Federal, critica duramente o ato do Conselho. “A passagem dos autos de inquérito pelo Judiciário é rito garantidor da cidadania”, afirma. Delza ainda argumenta que se existe projeto de lei é porque essa norma é matéria de lei.

Se a norma do TJ do Paraná for levada ao Supremo Tribunal Federal, ela pode passar por problemas. Em recente decisão, impedindo o uso de videoconferência em depoimento de preso, o ministro Cezar Peluso lembrou que o vídeo não pode ser usado no Processo Penal por falta de lei que o regulamente.

Além disso, reiteradas vezes o Supremo afirmou que o inquérito não é apenas uma peça informativa, mas o começo da formação de culpa e, por isso, está sujeito ao contraditório.

PCA 599

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