Trabalho e disciplina

Juíza vai para a calçada trabalhar e pode ser processada

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14 de agosto de 2007, 17h59

A juíza Mônica Labuto Fragoso Machado, da Vara da Infância e Juventude do Fórum Regional de Madureira, no Rio de Janeiro, pode responder a processo administrativo no Tribunal de Justiça do estado. Motivo: ela descumpriu a ordem do tribunal de manter o fórum fechado depois das 21h.

Há tempos a juíza de menores de Madureira vive um dilema. Ou desincumbe de sua tarefa de despachar com os comissários de menores que fiscalizam bares e casas noturnas, ou cumpre a determinação do tribunal que, por razões de segurança, manda fechar o fórum às 21h.

Na última sexta-feira (10/8), decidiu fazer as duas coisas: fechou o fórum no horário determinado e foi para a calçada fazer seu trabalho. Montou sua mesa, duas cadeiras e passou a atender os comissários que chegavam. As 22h um PM chegou a seu local de trabalho para dar segurança. À meia noite, encerrou o expediente.

Neste dia, autuou quatro casas noturnas por desrespeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente. E no dia seguinte virou notícia no Jornal Nacional da Rede Globo. Mas despertou o zelo do Tribunal de Justiça.

O presidente do TJ-RJ José Carlos Schmidt Murta Ribeiro entrou com representação contra a juíza. Em nota, o presidente afirmou que os juizes e servidores devem obedecer a hierarquia e os horários de funcionamento do Judiciário estadual. Ainda segundo a nota, o pedido da juíza para trabalhar até mais tarde não foi atendido por questão de segurança da juíza, dos servidores e da população.

"No que diz respeito à jurisdição, ele é livre. Mas em relação à

administração da Justiça, há uma hierarquia. Temos mais de 900

magistrados, imagine se cada um quiser fazer o seu próprio expediente.

Horário forense é estipulado pela administração. Se há um júri, abrimos

exceção", esclareceu o presidente do TJ.

A representação contra a juíza deve ser julgada pelo Órgão Especial, nos próximos dias. Contra ela e pelo mesmo motivo há também um pedido de afastamento temporário da função.

A juíza deve responder à representação com base na Resolução 30 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por comportamento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. Os autos serão encaminhados ao Órgão Especial pelo corregedor-geral da Justiça, a pedido do presidente do TJ. As penas disciplinares previstas são advertência, censura, remoção compulsória, disponibilidade, aposentadoria compulsória e demissão.

Segundo Murta Ribeiro, em todas as etapas do processo a juíza terá direito a defesa."Que se faça o devido processo legal. A juíza terá 15 dias para apresentar sua defesa e nós vamos tomar as providências. Aqui, na casa da Justiça, não haverá arbitrariedades", ressaltou o presidente do TJ.

Mônica Labuto ingressou na magistratura estadual em junho de 1997 e antes

de ser promovida para a Vara da Infância, da Juventude e do Idoso de

Madureira, instalada em janeiro deste ano, atuou em Paracambi.

Como Juíza da Vara de Infância e Juventude de Madureira, Mônica é responsável pela fiscalização da presença de menores à noite em locais públicos de 30 bairros que somam 1,4 milhão de habitantes. Em maio ela pediu ao TJ autorização para que o fórum permanecesse aberto a fim de recolher os autuações feitas pelos comissários de menores, encarregados da fiscalização. O pedido não foi atendido.

O Estatuto da Criança e do Adolescente determina que haja fiscalização noturna. Com exceção do período de carnaval, a presença do juiz no fórum, durante a fiscalização, é dispensável. Entretanto, a juíza permaneceu no prédio para receber os autos de infração dos comissários, responsáveis por fiscalizar as casas noturnas, sobretudo, as que promovem os bailes funk.

A juíza não quis se manifestar sobre o caso.

Leia nota de esclarecimento

Nota de esclarecimento do presidente do TJ-RJ

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador José Carlos Schmidt Murta Ribeiro, esclarece que a juíza Mônica Labuto, da Vara da Infância e da Juventude do Fórum Regional de Madureira, na Zona Norte do Rio, deve seguir a hierarquia e os horários de funcionamento do Fórum, assim como os demais magistrados e servidores da Casa. "É uma questão de ordem e de disciplina", afirmou.

Murta Ribeiro ressaltou, ainda, a importância de um trabalho coletivo e integrado para o bom funcionamento do Poder Judiciário Estadual e atendimento à população. "E isto deve ser aplicado também à juíza, que é livre e independente para decidir conforme seu livre convencimento, devendo, porém, obedecer às regras administrativas vigentes". Na verdade, a situação colocada pela magistrada já estava sendo estudada pela Administração Superior.

Em 2006, foram julgados na Justiça do Rio 1.066.508 processos, na Primeira Instância, e 126.972, na Segunda Instância, com a distribuição, respectivamente, no mesmo período, de 1.085.870 ações e 129.070, todos em obediência ao devido processo legal.

A juíza Mônica Labuto havia planejado realizar um trabalho de fiscalização em casas noturnas da região de Madureira e pedira para ficar no Fórum até mais tarde. O seu pedido não foi atendido por medida de segurança dela própria, dos servidores públicos e da população. Em casos que fogem à regra, a administração tem que estudar as fórmulas e condições para o atendimento ao público.

Ela decidiu, então, trabalhar na calçada do lado de fora do Fórum. No final da noite de sábado, a administração do TJRJ enviou um policial que se inteirou da situação. E, verificada a precariedade e desnecessidade do atendimento proposto, comunicou à autoridade superior as medidas adotadas. O assunto agora está sendo tratado pela administração do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Texto atualizado com novas informações às 20h30 de 15/08/2007

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