Casos de desapropriação

É culpa do Judiciário dívida dos precatórios por desapropriação

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14 de agosto de 2007, 13h58

De onde se origina a dívida dos ‘Precatórios’ provenientes de ações de desapropriação? Os chefes do poder executivo — Federal, Estadual e Municipal — culpam os juros pelos valores absurdos devidos pelos entes governamentais. Será verdade ou é uma tentativa de se eximir da parcela de responsabilidade que lhes cabe? Os cálculos contábeis e alguns esclarecimentos podem ajudar a responder esta questão.

Vejamos, os precatórios de “Outras Espécies” são constituídos basicamente por valores decorrentes de desapropriações compulsórias de imóveis, efetuadas pelo poder público por necessidade, utilidade pública ou interesse social. E que deveriam ser feitas mediante prévia e justa indenização, paga em dinheiro. (Dec. Lei 3.365 de 21 de junho de 1941, artigo 5º inciso XXIV; artigo 182, III e artigo 184 da CF). É bom lembrar, também, que se estas normas fossem cumpridas integralmente, não existiriam precatórios decorrentes de desapropriações, cujos valores, sem dúvida, compõem a maior parte dessas dívidas.

Além disso, nas ações de desapropriação, normalmente as fazendas públicas são condenadas ao pagamento do principal, corrigido e acrescido de juros compensatórios de 12% ao ano, destinados a compensar a perda do bem e a renda proveniente dele, quer pela atividade econômica, quer pela perda do aluguel de imóvel residencial e ou comercial. Incidem, ainda, juros moratórios de 6% aa., pelo atraso da liquidação do débito, além de honorários advocatícios e despesas judiciais de reembolso.

É necessário registrar que pelo Brasil afora, existem inúmeras áreas desapropriadas, cujos projetos não foram executados, e, portanto, geraram uma despesa desnecessária e às vezes absurda aos cofres públicos. E que o vultoso montante devido pelos entes governamentais em precatórios de desapropriação vem sendo acumulado há décadas, em decorrência tanto de parte do Executivo como de parte do Judiciário. O Executivo quando desapropriava, solicitava ao judiciário a imissão provisória da posse do imóvel, sem pagar, previamente, o valor justo e em espécie, como previsto na legislação. Normalmente, faziam o depósito do pífio valor venal atribuído ao imóvel a ser desapropriado e a solicitação, atendida pelo judiciário, dava início ao ciclo dos precatórios.

A sentença final de uma ação de desapropriação previa a atualização monetária do valor atribuído ao imóvel pelo perito judicial, desde a data do laudo apresentado até a data da conta homologada. Portanto, sobre o valor atualizado, deveriam ser acrescidos: juros compensatórios de 12% ao ano contado da data da imissão na posse (Súmulas 618 do STF e Súmulas 69; 113 e 114 do STJ); juros moratórios de 6% ao ano, contados do trânsito em julgado (Súmula 70 do STJ), além da cumulatividade dos juros moratórios sobre os juros compensatórios, sem que esse procedimento caracterizasse “anatocismo” (Súmula 102 do STJ), ou seja, incidência de juros sobre juros.

Previa também a inclusão dos juros compensatórios e moratórios no cômputo da base de cálculo dos honorários advocatícios (Súmula 131 do STJ). Como o valor da oferta inicial era insignificante, é óbvio que o saldo devido já era significativo. Além disso, os juros compensatórios seriam contados, por vezes, sobre décadas e os juros moratórios, contados desde o trânsito em julgado até a data da homologação dos cálculos, além da sucumbência em honorários advocatícios. E para engordar o já astronômico valor do precatório, inclui-se a atualização dos valores homologados e a aplicação em continuidade dos juros determinados em sentença, contados desde a data da homologação dos cálculos até a data efetiva do pagamento, que na maioria das vezes nunca aconteceu.

Vejamos um exemplo. Uma desapropriação cujo depósito inicial foi de Cr$ 12.300.000,00, efetuado em 21/04/93; valor do imóvel fixado em acórdão para 20/08/95 – R$ 2.416.288,02; data da imissão da posse: 30/04/93; data do trânsito em julgado 30/11/96 e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. Após os cálculos, os valores de juros compensatórios são de R$ 8.450.000,00; juros moratórios cumulativos R$ 8.473.500,00 e o de honorários advocatícios, de R$ 2.192.350,00. O valor total devido na data de 31/05/07, acreditem, é de R$ 24.115.850,00. Note-se que o total dos juros correspondem a 70,18% de R$ 24.115.850,00, ou seja, R$ 16.923.500,00. À primeira vista pode parecer um montante absurdo, porém, é necessário enfatizar que se o valor justo tivesse sido pago, não haveria dívida.

E ainda tem mais. Some-se a isso, a atualização dos valores homologados e a aplicação em continuidade dos juros determinados em sentença, contados desde a data da homologação dos cálculos, até a data efetiva do pagamento, que na maioria das vezes nunca aconteceu.

Felizmente, em diversos processos, há juizes que não se limitam apenas a negar a imissão da posse ao executivo, como também exigem, uma avaliação pericial previa do valor real e o correspondente depósito, para somente depois, deferir a imissão solicitada. Nesses casos, normalmente não há emissão de precatórios, por não haver saldo a favor do desapropriado, ou se houver, o valor devido é mínimo. Também, não há incidência de juros de nenhuma natureza. Esse procedimento correto põe por terra a idéia de que os juros originam a maior parte da dívida de precatórios.

A verdade é que a falta de planejamento do executivo e, principalmente, a falta de uma ação mais austera por parte do judiciário é que geram os valores tidos como absurdos pelo executivo. Se o judiciário exigisse do ente governamental, o pagamento do valor devido de acordo com as normas legais para conceder a “imissão da posse”, com certeza essa situação não existiria.

Infelizmente, o discurso de muitos chefes do poder executivo insiste na tese de que o povo é que é o maior prejudicado por arcar com os juros exorbitantes das ações de desapropriações. Tentam passar a impressão de que os desapropriados é que são os culpados pelas dívidas de precatórios. Muitos administradores, no afã de construir obras, às vezes, desnecessárias, acabam empurrando a responsabilidade de seus atos para os credores de precatórios.

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