Jovem espírito

Pinheiro Neto conta sua experiência na 2ª Guerra Mundial

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12 de agosto de 2007, 0h00

“E eu fiz mesmo a loucura! Estou viajando para a Inglaterra! Ninguém acreditava — nem eu, e agora estou neste navio todo pintado de preto e marrom, todo fechado, indo para a Europa. Nem ao menos pára no Rio — vou diretamente para qualquer ilha no meio do Atlântico — não sei nem o nome desse primeiro porto que verei”.

Assim como muitos garotos, que na inquietude da juventude sonham em conhecer outro país e viver experiências palpitantes, José Martins Pinheiro Neto, então com 23 anos, partiu para a Inglaterra durante o reveillon de 1940.

Eram tempos de guerra e, escondido da família, o jovem advogado fugiu em um navio rumo a Londres. Lá ele viveu e trabalhou durante um ano como correspondente da histórica British Broadcasting Corporation (BBC), em plena 2ª Guerra Mundial.

Apesar de a Inglaterra não se aliar diretamente a nenhum país em guerra, Londres era bombardeada pela Alemanha. Certamente o que Pinheiro Neto viveu neste tempo foi adrenalina suficiente para qualquer jovem aventureiro. Em meio a essa atmosfera, ele acompanhou de perto a guerra e a relatava a vários países em um programa diário na BBC.

O livro Crônicas da Guerra, do advogado José Martins Pinheiro Neto, é a junção desses relatos. Em certos momentos, chega a parecer um filme, tamanha a sensação de tensão que a história traz quando narra os bombardeios, os mortos e o desespero das pessoas. Em outros, nos faz imergir, de forma rápida, na Londres dos anos 40.

Para quem nunca esteve na cidade, fica a impressão de ter passado por lá e conhecido um povo resistente à guerra. As pessoas não deixavam de freqüentar teatros, cinemas, bares e nem de trabalhar. Os trens e serviços de utilidade pública só não funcionavam quando eram atingidos por alguma bomba e, mesmo assim, eram consertados da forma mais rápida possível. O povo chegou a aceitar pagar mais imposto para manter os soldados e vencer a guerra.

Em Crônicas da Guerra, é possível entender por que Pinheiro Neto montou uma das mais importantes e prestigiosas bancas de advocacia da América Latina. Ele usou grandes idéias e seu caráter empreendedor para construir o escritório que começou com um office-boy, uma secretária e ele. Atualmente conta com cerca de mil funcionários e 61 sócios.

Fernando Pinheiro, filho do respeitado advogado, afirma que o fato do pai acompanhar, diariamente, o sofrimento do povo inglês, com os ataques aéreos e, mesmo assim, sempre prontos para ajudar uns aos outros, contribuiu para completar o caráter e a determinação de Pinheiro Neto.

O livro Crônicas da Guerra foi editado por seu filho Fernando Pinheiro e será lançado no próximo dia 21 de agosto, data em que o advogado completaria 90 anos. O coquetel de lançamento acontecerá no MAM — Museu de Arte Moderna, a partir das 19 horas.

Com a curiosidade e inquietação de um garoto, Pinheiro Neto criou um novo modelo para a advocacia. Ao voltar de sua aventura na Europa, ele mudou paradigmas, exultou a ética e abriu novas perspectivas de trabalho para os advogados brasileiros.

Em 1945, ao término da 2ª Guerra Mundial, Pinheiro Neto inovou. Ele determinou que o advogado deve ir até o cliente. Isso representou uma transformação na prática da advocacia. Até então, o advogado ficava no escritório esperando chegar um cliente com um “causo” para ser levado ao Judiciário. O Pinheiro Neto visitava o cliente para mostrar que ele poderia se prevenir antes de ir ao Judiciário. A prática resultou no que é hoje a chamada advocacia preventiva.

O objetivo do jovem advogado era atender sempre bem. Organizado, metódico, curioso e determinado, Pinheiro Neto fez o que já foi considerado o melhor escritório de advocacia da América Latina.

Sempre à frente do seu tempo, ele buscou nos escritórios internacionais novos modelos para a profissão. “O Pinheiro foi um advogado que vivia 20 anos na frente de sua época. Não tinha vergonha de copiar o que faziam de bom no resto do mundo, e dirigia o escritório com mão de ferro. Talvez um pouco de tudo isso o tornou uma referência na advocacia nacional”, conta Fernando Pinheiro.

Pinheiro Neto também deu um grande salto para o desenvolvimento dos escritórios. Criou, em 1956, a primeira sociedade de advogados no país. O objetivo era dividir clientes e despesas. O modelo contribuiu para o desenvolvimento de outros grandes escritórios e estabeleceu um padrão de atuação profissional que hoje é praticado em grandes bancas.

Um advogado inquieto e criativo. Certamente a importância e grandeza de Pinheiro Neto não podem ser mensuradas apenas pelo número de sócios e advogados, pela carteira de clientes e representações no exterior. Mas, também, pelas inovações que ele introduziu, mudando o perfil da advocacia brasileira para sempre.

Por sua trajetória profissional, o advogado José Martins Pinheiro Neto constitui um capítulo importante da história jurídica brasileira. Foi um homem que nunca envelheceu. Morreu jovem aos 88 anos. Tinha como premissa muito trabalho. Afirmava que quem trabalha sempre obtém resultados. Deixou um legado exemplar, a ser seguido por todos os advogados brasileiros, uma vez que reúne exemplos de ousadia, pioneirismo, competência e integridade no exercício profissional.

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