Manual de instrução

Guardião não grava ligações indiscriminadamente, diz Dígitro

Autor

4 de agosto de 2007, 0h00

Sem a operadora de telefonia, o sistema Guardião, menina dos olhos da Polícia Federal, nada faz. Para que as conversas sejam gravadas no sistema, a operadora tem de transferir os dados de voz para o aparelho.

A explicação é oficial. Vem da Dígitro, fabricante do Guardião, e tenta amenizar a principal preocupação com o sistema de grampo — a de que ele grava indiscriminadamente. Roberto Pedro Prudêncio Filho, diretor de negócios de Segurança Pública da Dígitro, afirma que as operadoras de telefonia têm necessariamente de participar da escuta.

“A interceptação é feita pelas operadoras de telefonia — somente com determinação judicial — que enviam, então, ao Guardião, os dados e a voz referentes ao telefone monitorado.” O diretor afirma não é verdadeira a informação de que o Guardião grampeia um número e automaticamente todos aqueles que ligarem para esse primeiro número. “O Guardião não monitora automaticamente novos telefones.”

Segundo Prudêncio Filho, o sistema tem um mecanismo de controle para que a escuta não ultrapasse o prazo determinado pelo juiz, assim como as operadoras. “O Guardião gerencia automaticamente os prazos de validade dos alvarás de interceptação, gerando alarmes quando os mesmos estão para se extinguir.”

Em entrevista à Consultor Jurídico, Prudêncio Filho também tentou tranqüilizar aqueles que temem ser alvos de chantagistas privados. O Guardião, segundo ele, não pode ser vendido para a iniciativa privada. Só para Polícia Federal, Secretarias de Segurança Pública, Ministério Público, entre outros órgãos e instituições públicas.

Há notícias, contudo, de que os aparelhos seriam usados, sim, por empresas. Ao propor a limitação do uso do Guardião à Polícia Federal, o senador Romeu Tuma (DEM-SP) declarou que o sistema já caiu nas mãos da iniciativa privada. “Quando digo que está tudo avacalhado, me refiro ao Guardião nas mãos dos MPs e até nas mãos da iniciativa privada”, disse o senador à ConJur.

Ainda que as gravações não sejam feitas pela iniciativa privada, a ConJur revelou que as conversas gravadas são usadas para chantagens. No Rio de Janeiro, interceptações telefônicas legais, feitas para investigar esquema de supostas fraudes nas licitações da Petrobras pelos donos da empresa Angraporto, caíram nas mãos de um ex-sócio e atual desafeto dos proprietários da empresa. O vazamento agora será investigado pela Polícia.

Na Dígitro, o procedimento padrão é destruir o back up das escutas assim que a operação de grampo é desativada, diz a empresa. “O sistema de back up das gravações feitas, bem como sua guarda e manutenção, são de responsabilidade única e exclusiva do cliente”, explicou a empresa em ofício enviado à Justiça Federal do Paraná, em junho deste ano.

Perto da aposentadoria

O uso do Guardião pode estar chegando ao fim no país. Fontes na Polícia Federal afirmam que o sistema será substituído, em breve, por um outro muito mais sofisticado desenvolvido em Israel. A Polícia Federal não confirma a informação, mas na planilha de gastos de maio de 2006 da PF há quatro viagens da cúpula da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) para Israel, todas passando pela Bélgica.

A informação da assessoria de imprensa da Senasp é a de que as viagens foram motivadas pelos jogos Pan-americanos. Segundo a assessoria, a cúpula da Senasp esteve na Bélgica e em Israel para conhecer tecnologias e instrumentos da área de inteligência para ajudar na elaboração do plano de segurança para o Pan. O curioso é que, quando a equipe da PF viajou para aprender com o esquema de segurança da Copa de 2006 na Alemanha, na planilha de gastos da PF com passagens e diárias aparece escrito que a viagem foi motivada pela Copa. Para a Bélgica e Israel, não aparece a descrição.

Viajaram para Bélgica e Israel o secretário nacional de Segurança Pública, Luiz Fernando Corrêa; o coordenador de Tecnologia da Senasp, Odécio Carneiro; o coordenador de ações de segurança dos jogos Pan-americanos, José Hilário Medeiros; e o coordenador da Força Nacional de Segurança Pública e coordenador de Operações de Segurança dos jogos, Aurélio Ferreira Rodrigues.

O sistema

O Guardião é um sistema de software e hardware fabricado exclusivamente pela Dígitro, de Santa Catarina, com tecnologia própria. É capaz de gravar simultaneamente centenas de ligações. Segundo a empresa, o sistema é desenvolvido de acordo com as necessidades do cliente e o preço varia. Por isso não podem dizer quanto custa um Guardião. Especula-se que seu custo gira em torno de R$ 500 mil, além dos gastos com a manutenção — o MP de Mato Grosso comprou um por R$ 413 mil em dezembro do ano passado.

Por motivos de segurança e impedimentos contratuais, a Dígitro não informa quantos aparelhos do Guardião existem em operação no Brasil. Além da Polícia Federal e da Civil, sabe-se que a Procuradoria-Geral da República também tem seu Guardião. O ex-procurador-geral da República Cláudio Fontelles admitiu em junho que comprou o sistema. Em Mato Grosso, o Ministério Público já usou o Guardião em pelo menos duas operações este ano. O estado de Alagoas também anunciou a compra do seu aparelho de grampo.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!