Falta de planejamento

Cidades insistem em elaborar Plano Diretor sem observar leis

Autor

  • Cesar Augustus Mazzoni

    é advogado inscrito na OAB/SP sob no 193.657 militante na comarca de Tatuí/SP nas áreas de direito civil – responsabilidade civil direito aeronáutico e direito do consumidor e piloto e instrutor de vôo Código DAC 879.601 desde 1.991

1 de agosto de 2007, 0h00

A Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, que instituiu o Estatuto das Cidades, regulamentando assim o disposto nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, determinou a elaboração por parte dos municípios o Plano Diretor Municipal até 10 de outubro de 2006 (artigo 50 c/c artigo 41), com os objetivos definidos na redação dos incisos I a XVI, do artigo 22.

Dentre os vários objetivos, temos o que determina a ordenação e controle do uso do solo, em razão do crescimento do município (artigo 2o, inciso V).

Dessa forma, quando da elaboração do Plano Diretor pela administração pública municipal, esta deve atentar para as limitações impostas as uso do solo em decorrência da existência de aeroportos dentro de seu limite geográfico, que é regulada pela legislação específica (Código Brasileiro de Aeronáutica, Instituições de Aviação Civil, Norma e Portarias do Ministério da Aeronáutica, etc.).

No entanto, várias são as cidades que estão elaborando o seu Plano Diretor sem a devida observância às leis especiais que limitam o uso do solo nas imediações dos aeroportos. Pois certo é que dada a sua existência as construções ao seu redor e a ocupação do solo sofrem restrições.

Plano Diretor Aeronáutico

A Instruções de Aviação Civil (IAC) 4.196 editada pelo Ministério da Aeronáutica, tem por objetivo orientar os responsáveis pela administração dos aeroportos (artigo 36 do CBAer.) a elaborar o respectivo Plano Diretor Aeronáutico.

Segundo a citada norma, na elaboração do Plano Diretor Aeronáutico, os seguintes tópicos devem ser obrigatoriamente seguidos: “Dados estatísticos do aeroporto; Tráfegos que operam no aeroporto (regular e não regular); Maior aeronave em operação; Planta Geral do Aeroporto; Planta baixa do terminal de passageiros; Planta da Área de Entorno do Aeroporto; Plano Diretor Urbano; Planos de Zona de Proteção e Plano de Zoneamento de Ruído.” Dentre os citados, os que nos interessa são os que impõem restrições ao uso do solo e as construções nas proximidades do aeroportos, qual sejam: I) O Plano de Zona de Proteção; e II) Plano de Zoneamento de Ruído, sobre os quais passo a tecer breves comentários.

Plano de Zona de Proteção (PZP)

O objetivo do Plano de Zona de Proteção, ou também, Zona de Proteção Aeronáutica, é estabelecer o espaço aéreo que deve ser mantido livre de obstáculos, a fim de permitir que as operações de pouso e decolagem sejam feitas com segurança, que é aplicável a todo tipo de aeródromo, eis que o PZP, impede as construções de obstáculos que possam restringir a capacidade operacional dos aeroportos.

Assim, para se estabelecer qual é o espaço aéreo do PZP, utiliza-se à regra constantes no artigo 8o, da Portaria 1.141/GM5 do Ministério da Aeronáutica.

Nesse momento, somente as áreas de aproximação, decolagem e transição, é que nos interessa, pois são essas áreas as mais invadidas pelas construções.

Segundo a Portaria, para as áreas de aproximação e decolagem, imagina-se uma rampa, que possui seu início, em média, 60 metros além dos limites das cabeceiras das pistas, se prolongando até, em média, 2.500 metros de distância, na horizontal. Já no plano vertical, esta rampa vai subindo, até a altura de 100 metros. Ou seja, para cada um metro de altura que o obstáculo tiver, ele deve estar afastado 25 metros da pista.

Exemplificando: se uma linha de energia, tiver que cruzar a proximidade de um aeródromo, considerando a altura média de um poste ser de nove metros, essa linha terá que estar, no mínimo, 225 metros de distância do limite de 60 metros do inicio da pista, isto é, a 285 metros do inicio da pista. Nesse exemplo se a linha de energia estiver a uma distância menor que 285 metros, os administradores do aeródromo podem, e devem, requerer a seu afastamento, uma vez que estará ela colocando em risco as operações aéreas.

Da mesma forma, essa regra se aplica para as demais construções como exemplo os prédios, torres, fabricas, etc.

Já no caso da área de transição, que é o espaço aéreo localizado nas laterais da pista, também, imaginando-se uma rampa onde seu inicio é, em média, 30 metros após o término da lateral da pista, se prolongando até 225 metros de distância no plano horizontal e a uma altura de 45 metros em relação à altura da pista, no plano vertical. Assim, utilizando-se o exemplo da linha de energia, com nove metros de altura, se a mesma for passar na lateral da pista, deverá estar no mínimo, 45 metros de distância do limite dos 30 metros da lateral da pista, isto é, a 75 metros da lateral da pista.

Dessa forma, qualquer tipo de construção ou aproveitamento do uso do solo que estiverem dentro dos limites dessas áreas deverão ser submetidos à autorização prévia do Comando Militar do Ar (COMAR), da respectiva região, sob pena das obras serem embargadas (artigo 45 do CBAer), em processo administrativo ou judicial.

Outrossim, dentro do Plano de Zona de Proteção, temos também a Área de segurança Aeroportuária (ASA). Ela tem por objetivo eliminar ou reduzir o risco de colisões entre aeronaves e aves, através da fiscalização de atividades que proporcionem grande atração de aves, conforme determina o artigo 1o, da Resolução do COMANA 4, de 09 de outubro de 1995.

Com isso, dentro dessa área, que possui um raio de 13 a 20 quilômetros, não são permitidas a implantação de atividades de natureza perigosa, segundo determina o artigo 46 e seu §1o, da Portaria no 1141/GM5, emitida pelo do Ministério da Aeronáutica.

Portanto, as normas acima citadas, quando da elaboração do Plano Diretor Municipal, deverão ser observadas pela administração pública.

Plano de Zoneamento do Ruído

É de conhecimento geral que as atividades de pouso e decolagem das aeronaves geram certo ruído que, na quase totalidades das vezes, em se tratando de aeronaves de grande porte, produzem um nível de incomodo na população estabelecida nas proximidades dos aeroportos. Isso cria uma sensação subjetiva e negativa da pessoa.

Para minimizar este problema foi criado o Plano de Zoneamento de Ruído (PZR), cujo objetivo é ordenar a implantação, do uso e desenvolvimento de atividades já localizadas ou que venha a se localizar nas proximidades dos aeroportos, na forma do artigos 64 e 68, da portaria 1.141/GM5.

Diante disso, foram definidas duas áreas de proteção de ruído, cuja classificação se dá em função da intensidade do ruído aeronáutico. Na área I, que é a localizada mais próxima à pista e onde o ruído é mais intenso. Nessa área, a maioria das atividades urbanas é proibida. Já na área II, onde os níveis de ruídos são menores e, por conseguinte, o incomodo também, já é possível o estabelecimento de algumas atividades urbanas.

As restrições às atividades urbanas na área I, estão definidas no artigos 69 da Portaria 1.141/GM5. Já as restrições da Área II estão definidas no artigo 70 da Portaria 1.141/GM5.

Da mesma forma, a Portaria 1.141/GM5 determina expressamente o tamanho da área I e II da PZR. Assim a Área I, para as pistas de aviação de pequeno e meio porte e de baixa densidade, possui uma área lateral de 100 metros a partir do eixo da pista e 300 metros junto às cabeceiras. Já a Área II, para o mesmo tipo de pista, possui uma área lateral de 200 metros a partir do eixo da pista e 500 metros a partir das cabeceiras.

Por conseguinte, se existir alguma reclamação por parte das pessoas de que o movimento do aeroporto está causando muito ruído, primeiramente é preciso verificar se as construções não estão nas restrições impostas pelos artigos 69 e 70 da Portaria 1.141/GM5, pois se tiverem a mesma é em vão. A atividade não poderia estar sendo desenvolvida naquele local, sendo que tais limitações deverão ser inseridas no Plano Diretor Municipal.

Das limitações dos direitos de construir

No Brasil, toda propriedade deve cumprir a sua função social, conforme previsto do artigo 5o, incisos XXII e XXIII, da Constituição Federal. Assim, esse princípio constitucional tem eficácia plena e aplicação imediata, ressalvado as restrições de seu uso pelo Poder Publico.

Com isso, visando à segurança da navegação aérea, das operações nos aeroportos e das aeronaves, o Código Brasileiro da Aeronáutica impõem restrições às propriedades vizinhas aos aeródromos, na forma de seu artigo 43, que deve ser considerado na elaboração do Plano Direito Municipal, por força do artigo 23, inciso I, da Constituição Federal. A norma determina que é de competência da União, dos estados e Distrito Federal e dos municípios zelar pela guarda da Constituição e das Leis.

Dessa forma, o município deve observar e cumprir as leis, eis que ninguém se escusa em cumprir as leis sob a alegação de que não as conhece (artigo 3o da LICC).

Logo, os municípios devem observar e cumprir as leis que restringe o direito de propriedade das áreas vizinhas aos aeroportos, dado a sua obrigatoriedade, devendo a Administração Pública Municipal promover inclusão das citadas restrições em seu Plano Diretor.

Diante do apresentado acima, quando da elaboração do Plano Direito Municipal, a administração pública deverá seguir as diretrizes do Ministério da Aeronáutica contidas no Código Brasileiro de Aeronáutica e nas demais normas aplicáveis ao caso, quando da ordenação e controle do uso do solo em torno das áreas aeroportuárias, por força do artigo 4o, § 1o, do Estatuto das Cidades, sob pena do mesmo ser embargado, em decorrência da violação de sua finalidade (artigo 2º, inciso I a XVI).

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    é advogado inscrito na OAB/SP sob no 193.657, militante na comarca de Tatuí/SP, nas áreas de direito civil – responsabilidade civil, direito aeronáutico e direito do consumidor, e piloto e instrutor de vôo, Código DAC 879.601, desde 1.991

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