Hora de debate

Especialistas debatem no STF pesquisas com células-tronco

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20 de abril de 2007, 19h18

Pela primeira vez, o Supremo Tribunal Federal promoveu uma audiência pública para orientar um julgamento. Durante toda esta sexta-feira (20/4), especialistas se reuniram na Corte para opinar sobre o uso de células-tronco em pesquisas científicas, com base na Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105/05).

A Procuradoria-Geral da República sustenta, em Ação Direta de Inconstitucionalidade, que não há permissão legal para a utilização de células-tronco. Como o STF entendeu que o tema é muito amplo e de difícil conceituação jurídica, o relator da matéria ministro Carlos Ayres Britto optou pela audiência pública. Segundo ele, do ponto de vista técnico, não existe na Constituição um conceito claro de quando começa a vida. Por isso, a partir da audiência, os ministros do STF poderão formular “um conceito operacional de vida, do início da vida, da própria dignidade da pessoa humana para tornar a Constituição eficaz” e voltar a julgar o assunto.

Na audiência, os palestrantes foram divididos em dois blocos: os que são a favor de dispositivos da Lei de Biossegurança e os que se posicionam contra.

A cura de doenças degenerativas

Em vez de se discutir quando a vida começa, os pesquisadores favoráveis ao desenvolvimento de pesquisas com células-tronco entendem que a dúvida deveria ser: qual destino será dado aos embriões que não chegam a ser implantados no útero?

Quando não implantados no útero, os embriões são congelados. Segundo a cientista Patrícia Pranke, “o próprio congelamento diminui a possibilidade de o embrião se desenvolver depois”. Dentre esses embriões, há os que são descartados. “Os embriões de má qualidade, chamados embriões inviáveis, chegam a nem ser congelados por algumas clínicas. Por que não doá-los para pesquisa?”, questionou Pranke.

A dúvida também é comungada pela geneticista Mayana Zatz, considerada uma das maiores autoridades do assunto. Ela é pioneira no estudo de doenças neuromusculares. A pesquisadora questiona o que seria eticamente mais correto: “Preservar um embrião congelado, mesmo sabendo que a probabilidade de ele gerar um ser humano é praticamente zero, ou doá-lo para pesquisas que poderão resultar em futuros tratamentos?”.

Mayana Zatz sustenta que a possibilidade de serem desenvolvidas pesquisas com células-tronco de embriões definirá, no futuro, a existência ou não de tratamento para inúmeras doenças degenerativas que atingem a população. Ela pondera também que se o Brasil ignorar essa tendência, só a população pobre será afetada. “A gente precisa começar a fazer aquilo que se faz em outros países porque, caso contrário, os ricos vão para o exterior e os pobres? O que vão fazer?”, questiona.

Para o presidente da Sociedade Brasileira de Neurociências e chefe do laboratório de células-tronco embrionárias do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Steven Rehen, a pesquisa com células-tronco embrionárias é a única possibilidade de se chegar à sua plena utilização terapêutica. Ele trabalha com células-tronco embrionárias humanas desde 2006.

O cientista salientou que essas células embrionárias jamais terão contato com o útero materno. Segundo o pesquisador, elas são produzidas ‘in vitro’, excedentes das clínicas de fertilização.

Além disso, ele disse que a pesquisa com células-tronco embrionárias é importante porque possibilita entender como se formam os órgãos e a origem de várias doenças, como câncer e Alzheimer.

O músico Herbert Viana também participou da audiência. O vocalista da banda Paralamas do Sucesso engrossou o grupo dos defensores da Lei de Biossegurança.

O convite a Herbert partiu da neurocientista e pesquisadora chefe da Rede Brasil Sarah de Hospitais de Reabilitação, Lúcia Willadino Braga. A médica, que palestrou no Supremo, faz o acompanhamento neuropsicológico do cantor desde que ele ficou paraplégico, em 2001, depois de um acidente de ultraleve em Mangaratiba (RJ).

Para Herbert, quem defende a pesquisa com células embrionárias não comete um “pecado mortal”. Ao contrário, rompe com os “ranços de conservadorismo” da sociedade brasileira ao permitir o debate.

“O milagre da vida por fertilização artificial inclui essa aspecto das células já fecundadas. Devemos ter consciência de quantos pais, mães e trabalhadores carregam nas costas a batalha da vida, o peso da criação da família. Quantas pessoas dessas, que eventualmente tenham sido inutilizadas em um acidente, possam voltar à ativa, a trazer comida ao prato de seus filhos”, disse o músico.

O pai do músico, Hermano Viana, tornou-se um estudioso do assunto. O militar aposentado percorreu o Congresso em busca de apoio à causa, se uniu a ONGs e divulgou a polêmica na imprensa, tendo o filho como personagem.

Por outro lado…

Os contrários às pesquisas com células de embriões questionam se o mesmo benefício clínico não pode ser obtido com as células adultas. Pesquisadores de células-tronco adultas acreditam que a vida humana começa na fecundação. Para eles, realizar trabalhos com células-tronco embrionárias é interromper o ciclo natural de vida. O argumento é o mesmo sustentado na Ação Direita de Inconstitucionalidade.

O médico Marcelo Vacari Mazzenoti comemora o êxito das experiências com células-tronco adultas nas várias especialidades médicas. Cirurgião plástico especializado em lidar com má formação, não vê necessidade em se utilizar células-tronco embrionárias para a medicina.

“Podemos utilizar células-tronco adultas em diversas situações, como doenças de chagas, doenças auto-imunes, acidentes vasculares cerebrais, lesões de medula espinhal e doenças genéticas, dentre outros. Já com relação à utilização de células-tronco embrionárias, não há fato objetivo e concreto que confirme a sua utilidade”, declarou Mazzenoti.

O médico alega que há 72 aplicações clínicas descritas com o uso de células-tronco adultas e nenhuma aplicação descrita de células-tronco embrionárias. “Não é preciso interromper a vida para trabalhar com células-tronco”, concluiu.

Para Alice Teixeira Ferreira, da Escola Paulista de Medicina, a utilização das células-tronco embrionárias na pesquisa científica não é indispensável. No Brasil, em maio de 2005, segundo relata, nasceu uma menina gerada de um embrião congelado por seis anos. Logo, segundo a médica, não há certeza científica de que os embriões congelados há mais de três anos seriam inviáveis e, conseqüentemente, se prestando para a pesquisa científica.

Como sugestão, a pesquisadora fala da criação de um banco de líquido amniótico, dispensado após o parto, para aproveitamento futuro. Para a pesquisadora, todos os relatos provam que não há necessidade de utilizar células-tronco embrionárias, que sacrifiquem o embrião humano, diante das alternativas apresentadas.

ADI 3.510

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